Louquética

Incontinência verbal

terça-feira, 30 de junho de 2009

Nunca fui tão ariana


Tenho uma tia astróloga. Cresci ouvindo suas histórias de mapas astrais, Luas, Ascendentes...sei que minha lua é em escorpião.
Como Marina Lima, "Não acredito em nada, só não duvido da fé"...e o fato é que eu nunca me vi tão ariana.
Agora meu signo se impõe na minha personalidade. Reconheço: assim como predizem dos nativos de meu signo, gosto de mandar, falo desmedidamente, falo com uma sinceridade que desafia o bom senso das relações cotidianas. Oh, como eu falo!
Quem comanda áries é a cabeça. Gosto do trabalho intelectual.
Também é pela cabeça que sou conquistada, seja pelo carinho nos meus cabelos, seja porque me deixo seduzir por homens inteligentes, seja porque gosto de acariciar os cabelos deles.
Áries é o deus da guerra, regente Marte. Também sou guerreira, porque batalho meu espaço e minha sobrevivência.
Brigo com facilidade, porque tenho o pavio curto.
Sou ariana de 12 de abril.
Acho linda a pronúncia: "áries".
"Sou ariano torto, vivo de amor profundo" e também sei que enjôo cedo daquilo que deixa de se tornar novidade. É ,tem que ser novidade e se tornar novidade, processual renovação.
Sou o carneiro que representa Áries, primeiro signo do zodíaco: tanto sofro calada e gosto da solidão, quanto gosto de ser primeira, estar em primeiro plano.
Sou estabanada e gesticulo demais: como prevêem aos arianos, machuco minhas mãos com facilidade, bato minhas mãos nos objetos...
Signo de elemento fogo: ardo e queimo mágoas. Ardo nas paixões que tenho, nos desejos que assumo.
Também ardo na lealdade a quem amo como amigo, na solidariedade com os outros, nas lembranças, nas labaredas de muitas memórias que deveriam virar cinzas ou ressuscitar delas.
Estou sempre apaixonada pelos homens de elemento água ou ar: piscianos para deter o elemento fogo; aquarianos para espalhar-me.

terça-feira, 23 de junho de 2009

A persistência da memória


Os contos de fada que nos encantaram na infância e que viram teoria na fase adulta sempre começam por "era uma vez".
Era uma vez uma grande amizade.
Era uma vez minhas parcas certezas.
Era uma vez todos os clichês que eu já ouvi nesta vida e suas subentendidas convicções.
Era uma vez e uma vez é nunca, é passado.
Mas, que bom que as águas rolam, por maior que seja nosso apego ao passado.
Um dia tudo se torna lembrança.
Que bom quando vemos o passado como passado e não deixamos que ele nos afete!
Que bom quando ele se torna uma inofensiva saudade.
Que pena, quando temos saudades do passado em demasia.
Que ódio eu tenho de quando ele queimou todas as minhas fotografias com alguém do meu passado, do meu pretérito-mais-que-perfeito.
Que ódio por ele ter fuçado meus diários, meu passado por mim escrito.
Era uma vez ele.
Em uma carta que ainda guardo, um outro "ele" me disse que "o tempo só serve para amarelar papéis e vender relógios"... o tempo amarelou o papel, o acaso me jogou de volta no caminho dele e estamos flexionando o verbo ficar.
Cada amizade que morre é, para mim, uma experiência de luto.
Choro o meu morto, hoje.
Cada lugar de que me desapego me diz que não sei trabalhar no inferno e que o Inferno não depende da presença do Diabo.
Mexo-me, infeliz por enxergar o que ninguém quer ver, em seus mundinhos cor-de-rosa, em que as pessoas se amam, onde o Céu é mais azul e onde reina a harmonia.
Sim, Dra. Gilka estava certa: a gente só dura num lugar o tempo suficiente para ser útil.
Em breve, aquela estrada será passado.
Meu sono curto naquela casa será passado.
As gordas sextas-feiras serão passado.
Os risos e as brincadeiras, os ridículos, as piadas e as festas, serão passado.
Minha gratidão às pessoas não será passado.
As decepções, as perplexidades que sofri e que causei, não serão só passado.
Ainda assim, que bom que tudo passa!
Sai da frente: sou eu quem estou passando.

Todas que eu sou


Um dia certo professor comentou a respeito do autor que eu pesquisava durante o mestrado: "Ele é um menino triste. Um velho menino triste".
Durante minha fase de escrita, cometi o lapso de me confundir com meu autor - nossa decepção com o mundo, nosso pavio curto, nossa pouca paciência com a simulação, com os falsos "bom-dia", nossa eventual misantropia é realmente isso: nossa.
Também eu sou uma menina triste. Sou uma velha menina triste.
Desmancho-me nos risos que quero dar, nos gozos que a ironia me dá, nas felicidades instantâneas e sem a menor garantia, nas festas, na comunhão do corpo, no prazer de comer o que gosto, nas delícias do sol da Reserva da Sapiranga, no mar gostoso de Guarajuba e naquela estrada por onde gosto de dirigir na volta, enquanto o sol está se despedindo e que me avisa que minha tia me espera em casa com boas porções de arroz doce
Nas horas vadias, gosto de peregrinar nas lojas, nas livrarias, de me perder num rosto bonito de homem ou num romance que me conquiste, numa música e num videoclipe, em tudo que me revela humana.
Mas, sou, sim, uma menina triste.
Sou aquela que não sabe perdoar e remói ressentimentos.
Sou quem não esquece as feridas e não consegue conceder indultos.
Meu autor dizia em um dos seus poemas algo como "não pise no rabo da onça". Sou a onça.
Lamento as perdas em longos e caudalosos queixumes.
Sou intensa. Prefiro as cacetadas aos falsos bom-dia, conforme meu autor também escreveu.
Tenho prazo de validade, sou geniosa, sou independente, tenho pouca paciência, sou generosa, procuro não ser injusta, tenho apego a quem amo, sei passar e só duro nos lugares o tempo em que sou útil. Tenho pouca paciência para conviver com quem eu não gosto. Sei ser grata. Acredito no que faço. Faço o melhor que posso. Considero meus sonhos, Gosto de mim. Sei dividir o pão. Não gosto de pedir.
Não gosto de permanecer na casa dos outros. Não gosto de permanecer longe de minha casa. Não gosto de beijos de saudações. Gosto dos abraços reais. Gosto de vermelho, de branco e de preto. odeio verde. Odeio listradas. Adoro bolinhas. Odeio saltos plataforma. Odeio macacão. Adoro banhos. Adoro perfumes e sapatos. Amo a quem eu não devia amar. Magoei um homem que não merecia mágoas. Muitos homens me magoaram.
Sou a Tigresa de Caetano Veloso que "Com alguns homens foi feliz/ com outros foi mulher."
Sou a Vaca profana e digo que "Respeito muito minhas lágrimas, mas ainda mais minha risada"
Sou quem não quer vivenciar o Salmo 23 todos os dias: "Preparas uma mesa para mim diante de meus inimigos. O meu cálice transborda".
Sou a outra, a do Salmo 70, que diz: "Apressa-te, oh, Senhor!"
Sou essa, sim. E sou muitas outras. Mas não tenho várias cara e várias personalidades.
Dizem que a frase do ariano é "Eu sou". Sim eu sou. E não quero ser outra coisa além do que as circunstâncias e o tempo possam me transformar.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Enquanto uns choram, outros vendem lenços


Fiquei perplexa quando ouvi no rádio, em algum programa cujo nome não me lembro:"Enquanto uns choram, outros vendem lenços!"
Aí estendi o raciocínio: enquanto uns morrem, outros vendem caixões;
Enquanto uns adoecem, outros vendem remédios...e assim por diante.
Nem parece, pela complementaridade dos atos que de tão repetidos tornam-se naturalizados, mas, de fato, há esses contrapontos e uma lógica de lucro em detrimento de alguma perda de uma outra parte.
Mas, é: alguém me dirá que sempre haverá uma outra parte a tirar proveito das situações. Entretanto, pergunto: e precisa ser assim? Nossos limites éticos são tão vulneráveis que fazem de nós indivíduos práticos?
Se for, que pena!
Não há mais tempo para a gente sofrer a dor do outro, de ter compaixão e solidariedade: aprendemos a praticidade e a tal da falta de tempo - queridos álibis.
Até o amor é prático.
Amor de pais e filhos: ter um filho como investimento, como proteção contra a solidão e as restrições da velhice;
Amor conjugal: pelas garantias supostamente dadas (econômicas, sexuais, afetivas, sociais);
Ah, é tanto amor, não é?
Deixa para lá.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

São Jorge e a sereia


Tenho uma amiga linda. Linda, competente, inteligente e admirável: não lhe falta nada, pois ela foi presenteada com a beleza interna e externa. Ela é uma sereia!
Contudo, ela está de mal de mim. De mal: como aquelas crianças de cinco anos, que ficam correndo na rua, de pés descalços, com caldo de manga escorrendo pela barriga, brigando para não dividir seus brinquedos, puxando os cabelos das amiguinhas...e torcendo para chegar o domingo e ter festinha de aniversários para ir. Bem assim!
Interessante é que, diante de tamanha criancice, perguntei a ela porque do afastamento. Ela não quis responder. Forcei e ela se limitou a dizer superficial e laconicamente que eu falei mal dela junto aos seus inimigos.
Nem preciso dizer que não tive sequer o benefício da dúvida.
Nem preciso dizer que ela se negou a discutir o assunto ou a verificar a veracidade do dito e do suposto. Ok!
De fato, sai com uma inimiga da Sereia, que é minha amiga. Não vejo onde uma coisa exclui a outra, uma vez que não perdemos tempo com assuntos transversais aos nossos próprios. Tampouco eu não me sentiria bem num papel duplo. Pelo contrário, quem me odeia sabe que o que eu tenho a dizer é na cara - não mando recados e não gosto de mal entendidos.
Também, verdade seja dita: sou uma pessoa atrapalhada. Já levei minha melhor amiga à casa da amante do pai dela - obviamente, eu não sabia de nada: nem que o pai de Jau era o namorado de Dona Kena, nem que todo mundo sabia do caso. Resultado: a mãe (e o pai) de minha melhor amiga me odeia porque acha que eu quis expor todo mundo, e Dona Kena sustentou o mesmo raciocínio - mas pelo menos, posteriormente, chamou os neurônios à ativa e viu que não faria sentido e que tudo não passou de um equívoco.
Diz-me com quem andas...é, esta minha melhor amiga teve psicose pós-parto, recentemente.
A irmã dela, maníaco-depressiva, tentou o suicídio, é sexólatra e saiu do hospício recentemente. Adivinhem quem foi a primeira pessoa para quem ela ligou ao sair do manicômio? eu mesma! e me sinto lisonjeada, porque não sou Louquética à toa. Até parece música de Falcão (não o dO Rappa, gente, o do Black people car, o cearense): "Quando eu saí do sanatório/era pleno mês de agosto"...
Bem, dizer melhor amiga é meio excludente, não é? mas é para frisar a qualidade da amizade.
Meu melhor amigo se apaixonou. É, João Neto mudou muito com a paixão - é que passa a ter outro círculo de atenções, outras coisas a viver...e o laço da amizade afrouxa um pouquinho. Mas, muda.
Bem, quanto á minha amiga, lembrei de uma dessas fábulas internéticas em que se fala sobre o fato de São Jorge estar eternamente matando o dragão. Ora, mas que gerúndio! Nunca matará este dragão? é o processo que interessa, o estar a matar?
Então alguém sentenciou que São Jorge aprendeu a se dedicar a matar o dragão. Ele não sabe amar. Se ele deixar de matar o dragão, a existência dele perde o sentido. Ele só sabe fazer isso.
Também lembro que os Estados Unidos sempre viveram de construir um inimigo, um opositor: num princípio, era o Comunismo. Beleza: Guerra Fria para distrair os ânimos, filmes e ideologias derramadas para lascar com o time do Comunismo.
Aí a experiência Comunista/Socialista ruiu. O que seria dos Estados Unidos sem os seus inimigos? O desejo de potência fala alto: é preciso ter inimigos. Então, vieram os Extraterrestres...a idéia não perdurou, mas rendeu boas lendas urbanas e filmes para Hollywood.
Atualmente, o inimigo dos Estados Unidos é o terrorismo. Ainda bem: real ou fictício, eis uma razão para viver!
Acho que a sereia, assim como São Jorge e como os Estados Unidos, não sabe viver sem inimigos. É preciso fabricar um. Aqui estou!
Amigo é coisa para se guardar debaixo de sete palmos?