Louquética

Incontinência verbal

sábado, 24 de abril de 2010

Minha casa


Experimentei a gostosa e ímpar anestesia/sinestesia de estar em minha casa no final da tarde deste sábado. Ah, como é bom estar em casa.
Vejam que a Odisséia é uma narrativa movida à base da batalha e da jornada: Ulisses precisa retornar à sua casa, apesar dos percalços, apesar do caminho.
O caminho foi meio surpreso: eu ia descer em Irecê e aguardar meu ônibus das 12h 30min, para evitar o desconforto e o calor do ônibus comercial.
Saí no ônibus de seis da manhã até Irecê - e iria esperar cerca de 04 horas para embarcar num outro ônibus. Para minha sorte, o velho e chato comercial tinha ar-condicionado e eu pude permanecer nele até descer em Feira às 15h40min.
Há quanto tempo eu não ficava em casa numa tarde de sábado?
Sabe o que é viajar na noite de sábado e chegar a Feira de Santana às 05 da manhã? é a certeza de acordar às 09 com o culto da Assembléia berrando bênçãos e seguir num domingo inútil, percorrendo o circuito cama-sofá, toda desgraçada, desgrenhada, sonolenta, lenta, no mal-estar da noite desperdiçada...horrível!
Dormi pouco, eu sei. Mas ao chegar no ônibus, após Irecê, imitei aos meus colegas de trabalho que são "bons de cama": dormi até quase meio-dia, sentada na poltrona, sem ninguém ao meu lado para me encher o saco e me acotovelar.
Antes de chegar em casa fui à padaria que eu amo, comprar os melhores pães do planeta - eu não almocei e comi bem pouco durante a viagem, mas nem notei a fome.
Não me importo por chegar em casa e pôr tudo em ordem: tenho orgulho de cuidar do que é meu; de lavar minha própria roupa; de limpar o que o tempo sujou...talvez me dê prazer porque é opcional. Acho que ninguém cuida das minhas coisas como eu cuido.
Tomar banho em minha casa tem outro sabor, é outro prazer...
Amo a minha casa.
Meu sonho (tantas vezes repeti isso) é um dia ganhar o meu pão na cidade em que moro. Sair do trabalho e voltar para casa é uma dádiva! Para alguns pode não ser, mas para mim é o máximo! talvez porque minha vida seja dura - de vez em quando eu nem me importo com isso porque sou independente. Portanto, nao tenho a quem pedir dez reais para nada, nem tenho quem fique comigo se eu adoecer: minha vida é minha, minha existência é uma responsabilidade minha - isso tem suas contrapartidas, mas passei a infância sonhando com a independência e, como Sônia Coutinho,sei que a liberdade é um tesouro duvidoso.
Gosto da minha liberdade e da minha independência.
Não tenho em quem me escorar - ainda que eu tivesse, meu orgulho não me permitiria isso.
Logo que eu tiver um emprego fixo, que deixar de ser substituta e puser o pé em terra firme, quero ter meus 20 metros quadrados em Salvador.
Lógico, prefiro um "barraco" bem localizado, a uma mansão na favela. Então poderei me sentir em casa em mais uma casa quando houver necessidade de ir à capital.
Já tive dois lares quando eu estava em Sergipe: meu apartamento lá, que eu não propus dividir com ninguém, arcando com o ônus desta decisão. Mas casa sempre será esta minha casa.
Amo tanto minha casa que não me sinto bem na casa de ninguém.
Posso, quando me aprouver, chegar em casa na tarde de sábado,dormir até às 22 horas e sair para as festas, que aqui só começam a partir das 23h30min.
Adoro ter o sábado para mim, minha noite de sábado!
Viajar à noite é um martírio para mim. Não sou de dormir sentada sem que isso resulte em mal-estar diurno e indisposição.
Enquanto isso vejo o que fazer com as finanças, já que de forma prudente, o meu chefe disse que salário somente em junho. Prefiro assim: pratos limpos! Conforme ele me disse, pode ser que haja grana em maio, mas essa é uma perspectiva mínima. De modo honesto ele disse que é possível, mas não provável. Assim, me previno, me preparo.
O caso é que Marla me disse uma coisa - e ela é muito prudente neste aspecto - que realmente sacudiu minha alma: consultada sobre a pertinência de eu prestar dois concursos para os quais estou mal-preparada cognitiva e financeiramente, além de indisposta, ela me disse: " Mara, por mais que renovem o seu contrato, é um contrato. Está entendendo? é um contrato!e tudo isso é temporário, instável, inseguro. Pense no exemplo de agora" e ainda me recomendou prestar os dois concursos independentemente de simpatias, de preferências, que neste caso, vale o amor e o interesse.
Pois é, parece que eu não sabia o que era temporário.
Este trabalho é feito para ser mesmo assim, por tempo determinado. E o depois? e o devir? se me falta feijão, não tenho onde ir em busca. Então tenho que ter mais responsabilidades comigo mesma porque dependo de mim.
Há um tempo eu até tinha um amigo para quem pedir opiniões, mas aprendi que ele não quer mais se prestar a isso, nem nutre a mesma simpatia por mim ou interesse pelo meu destino. Mas não tive vergonha de pedir a opinião das pessoas amigas e prudentes que não se importam em me dar esta ajuda de elencar prós e contras contextualizando minhas circunstâncias. Para estes aspectos sou dependente de todos cuja opinião eu respeito. Acho que me sinto em casa para isso.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Tende piedade de nós!


Senhor, tende piedade de nós!
Oh, doce, sempre Virgem, Maria, tende de piedade de nós.
Cordeiro de Deus,que tirai o pecado do mundo, tende piedade de nós.
Muito bonito rogar a piedade dos santos. Precisamos.
Mas já faz um tempo que a gente procura não ter piedade de ninguém, não ter pena de ninguém, como se ter piedade, pena, compaixão, fosse humilhar o outro.
E é.
E pode ser.
Se a gente fabrica esta piedade em detrimento do outro e ainda lhe diz: "és digno de pena!".
Saída de mestre do nosso mundo frio isso de ter vergonha de ter pena do outro, de ter pena de si mesmo. Se é seu caso, nem venha na minha casa. Sou gente de verdade e sinto. E das coisas que eu sinto, eu sinto pena.
Esvazie agora mesmo o meu discurso e exponha com profundida seu ponto de vista certo e inquestionável: quem tem pena é galinha. Ôpa, profundidade do pires, como diria um finado amigo meu!
Quem te ensinou isso, menina, de que não é digno ter piedade do outro? quem te disse que é feio se compadecer da dor alheia? isso tudo é ânsia para se tornar incapaz de se colocar no lugar do outro? quem não consegue se pôr no lugar do outro, não pode ter lugar nenhum - não se desloca, não sai de si, não se irmana com o outro, não toma suas dores, não se permite...Mas logo você que reza tão bem! Logo você, em suas ladainhas nesta sua existenciazinha medíocre-repetitiva-segura-falsificada? assim a gente não conversa.
"Todas as línguas derivadas do latim formam a palavra "compaixão" com o prefixo com - e a raiz passio, que originariamente significa "sofrimento". Em outras línguas, por exemplo em tcheco, em polonês, em alemão, em sueco, essa palavra se traduz por um substantivo formado com um prefixo equivalente seguido da palavra "sentimento" (em tcheco: soucit; em polonês: wspol-czucie; em alemão: Mitgefuhl; em sueco: med-kansla).
Nas línguas derivadas o latim, a palavra compaixão significa que não se pode olhar o sofrimento do próximo com o coração frio (...) Uma outra palavra tem mais ou menos o mesmo significado: piedade ( em inglês pity, em italiano pietà, etc.)"
O trecho acima foi transcrito do livro da minha vida, claro, A insustentável leveza do ser, de Millan Kundera. O exemplo literário, claro, é só para confirmar meu amor por esta obra e mostrar sua pluralidade, mas a piedade está acima dos conceitos formados. Não precisa ler para saber o que é.
Não quero ter olhos indiferentes diante da dor de ninguém nem esconder de mim minha auto-piedade, quando ela ocorrer.
Couraças de proteção anti-sentimental todo mundo usa. Se não usasse, também, não sobreviveria a uma ida na esquina nem a um instante parado no semáforo, mas deixemos de exagero que a gente sabe muito bem em que lugar se encontra o assunto agora!
Não lembro que teórico ao certo, mas desconfio que foi o Edouard Glissant quem escreveu que é preciso defender o oprimido, que não se deve ter vergonha de defender o mais fraco, de se apiedar e de se compadecer da dor do outro. Eu apenas concordo, porque não tenho os argumentos elaborados para endossar com maior firmeza este pensamento de que também comungo.
Outras coisas de que sou menos capaz, aprendo com Ilmara Valois, a exercitar e a compensar, nas coisas que ela não me diz, mas que me ensina com maestria e afinco, como cabe a um bom mestre a uma pessoa sábia:que é preciso prescindir da espera pelas desculpas por parte do outro, porque estas desculpas não virão sob a forma de palavras, mas de gestos e que, por isso, eu não cobre mais: aquilo ali é o máximo a que a pessoa pode chegar.
Está bem, amiga: aprendi. Não sei se perdoei, mas aí é falta de prática de minha parte, mas superei...
Eu também fui cobrada e entendi que não poderia dar o que não tenho. No segundo caso, entendi que a outra pessoa só tinha mesmo aquilo para dar - aquele era seu pedido de desculpas, era seu sinal de que havia visto seus enganos, sua injustiça para comigo. Tudo bem. Valeu o gesto: era tudo o que ela tinha para me dar. Aceitei sem orgulhos, como aceito o que você me ensina.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Vendendo o peixe


Cuidado, meninos, com este blog: um blog é um blog! E aqui você encontra verdades inventadas, mentiras verídicas, ficções da vida real, realidades ficionalizadas e muitas ficções baseadas em fatos reais. Estou vendendo meu peixe! venham! Venham! que os tempos estão difíceis e eu estou abrindo a banca, camelô de idéias loucas e pouco confiáveis.
Olha que amanhã eu amanheço vendendo cremosinho na praça porque o meu parco saber não me dá dinheiro.
Olha que eu não tenho nada, nem a dignidade da vendedora da Natura; nem a perseverança do vendedor ambulante...aliás, encarno o feiraguai e estou contrabandeando umas narrativas para fazer de conta que aquilo é uma tese.
E por falar em tese,doei minha dissertação.É, dei ao MEC, está lá no Domínio Público. Bom proveito!
Fala-se sempre disso:que a gente se trancanfia nas Universidades para ler, pensar e escrever coisas que nunca serão lidas. Conhecimento inútil e ensimesmado. Para onde é que eu ia mesmo com aquela angústia chatas das leituras poéticas? E poeta é gente chata, nunca festeja nada, vive de angústia, reclama da vida e tem medo de morrer...
E eu amava isso! Eu vivia este cemitério das estéticas certas, das purezas e das fontes inquestionáveis dos gênios ímpares da poesia. Ora, puta que o pariu!!!onde eu estava com a cabeça?
Ah, já sei, estava com a cabeça nas dores...Oh, dolores de cabeza, muchachos!!!
Por que raios eu achava que literatura era um negócio de dor? logo eu, que não quis parir por medo da dor do parto e da dor de carregar outra existência que não fosse a minha? quem foi que me enganou, hein? ah, foi algum fingidor.
Eu que não quero mais ler aquilo que um dia escrevi. Deixa lá.
Não levo em consideração a boa nota obtida, não: ela não amortizou em nada esta partenogênese. Ou foi cissiparidade?deve ter sido, né? corre ali no livro de Biologia e refresque essa memória de meia-tigela, Aretuza, que eu sei que você está lendo isso. Vou facilitar, tá? na partenogênese um indivíduo gera outro sem contato sexual, reprodução assexuada que gera organismos haplóides. Lembra? e cissiparidade é quando o mesmo organismo/ser se biparte para dar origem a outro. Voltei ao Ensino Médio agora - Oh, não! estou velha: no meu tempo era segundo Grau que se chamava isso.
Ah, certo, sou apaixonada por Biologia. Acho que por Biólogos também, mas aí é outro assunto.
Pensando bem, e falando neste troço de vender o peixe, eu bem poderia ter esquecido a escrita metódica da dissertação e ter ido vender peixe...E não é que me lembrei de Forrest Gump por causa disso? é, o protagonista abraçando a causa do seu amigo que sonhava em abrir uma empresa de pesca e venda de camarões...
O velho Forrest passou pela História ( e essa lição da graduação esta ignorante que vos fala nunca esqueceu: "A História existe/acontece independente da vontade dos homens")e pela própria história dele sem ter a menor noção do que estava acontecendo. Putz, esse filme é fantástico mesmo!
Mas olha eu aqui, após um mestrado e um caminho trilhado, sem emprego fixo, sem esteios econômicos!
Tenho um bruta orgulho de todas as demissões e exonerações que eu já pedi e até já comentei sobre a dignidade de não me fixar em empregos psicologicamente aviltantes ou ideologicamente avesso à minha vontade, que eu aprendi com a minha inimiga Carol. Aprendi! tenho orgulho disso, da lição que aprendo com os meus desafetos.
Então o caminho trilhado não me garantiu o pão...Por falar em pão, minha gente, o que eu estou economizando para sobreviver nestes tempos de salário suspenso, vocês não têm idéia.
Ah, sim, eu acentuo idéia. Poxa, eu não admito que meus amados hiatos,ditongos abertos e tritongos tenham perdido o acento (e eu, gente, que nem tenho cadeira cativa em nenhum lugar , só penso que um assento em que descansar meu magro traseiro pós-graduado iria bem num momento em que eu tenho rebolado tanto pelo meu sustento)...
Reforma ortográfica é um bicho chato que quer resolver conflitos e diferenças históricos-culturais a partir de mudanças de grafia das palavras...Como é que pode? E eu sempre penso no pinguim. Poxa, se o pinguim perde o trema vira um pingo pequeno, um pinguinho, um pinguim como se fala em nordestinês, né? isso é que é se sentir diminuído! É, vou praticar a auto-ajuda agora: se o pinguim, que é o pinguim, isto é, um animal que usa casaca em estilo black-tie, todo elegante, pode ser diminuído pela ausência do trema, sem perder sua magnitude, porque serei eu a me sentir pisada, humilhada, aviltada, derrotada, inútil, diminuída, fracassada, quase-morta, miserável, indigna, desesperada, negligenciada e menor que uma bactéria por motivos tão banais, não é?
Estava esperando o quê para o final de um texto de uma pessoa louca?questões metafísicas? discussões supremas?ah, pode esquecer!

sábado, 17 de abril de 2010

Dura lex


Foi preciso cursar Estudo de Narrativas para saber que para além do nome de um filósofo pré-socrático ou sua suposta origem grega que lhe conferiria o significado de "verdejante", Thales se relaciona com a Lei de Talião, isto é, Lex Talionis, em que Lex= lei e Talis= igual, tal.
Então, o que o senso comum traduziu em "olho por olho; dente por dente", fundamenta, no âmbito da Lei, a reciprocidade do crime e da pena. Disse o meu professor que Talis teria por significado real a igualdade (tal).
Não sou dada a etimologias, mas não deu para ignorar que o meu "Th"tem tudo a ver com o Código de Hamurábi - e isso me deixa louca porque sei que de alguma maneira ele pode ser tirânico, sob aquela pele mansa da compreensão aparente, nos desvios de conversa, no tangenciamento de uma resposta dada ou recebida.
A correspondência, a correlação entre o crime e o castigo não estaria sob o liminar da vingança?
Brinco com o nome dele por ser este o menor dos seus mistérios - há tantos, há as coisas insinuadas e outras que deixam indícios...Mas, ao mesmo tempo, "no misterioso livro do teu ser" se inscrevem tantos fascínios, incitando a vontade de devorar o tempo e avançar as conclusões...para quê mesmo, hein? para te lançar no tédio, para descobrir o vampiro sob a máscara do cavalheiro, para me proteger, para não me iludir quando você me diz: "Moça!",desestruturando as minhas certezas.
Mas você me cobra confiança - aplico seu princípio: reciprocidade. Não consigo dar aquilo que não recebo. Ninguém pode dar aquilo que não tem, nem roubando!
E minha amiga diz: "Como pode ser assim,racionalizando para fugir dos sentimentos?"! Agora virou um tango dançado a três, porque ela me protege e me desafia...e eu, que não sou a Justiça cega, não enxergo um palmo à frente do nariz. Sou pior do que quem só vê aquilo que quer: eu não vejo nada.
Eu nunca fui boa nisso, eu escorrego e te magôo e já não sei o qeu dizer para consertar as coisas - típico de quem desaprendeu a ser feliz (eu, que acho toda felicidade suspeita!). Intercalo as várias vozes do nosso "triálogo" porque agora sou incapaz de assumir a minha voz...
Dura lex! (que se Deus quiser alguém vai associar rapidinho a uma marca de pratos e quebrar a rigidez chata dos assuntos sérios. O lado bom de ser louca é escapar pelas minhas próprias fraquezas!).

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Todos os nomes


Não é nada com a obra homônima de José Saramago - esta eu comento depois, porque não terminei de ler.
Eu estava me lembrando dos apelidos que já ganhei ao longo da vida - pelo menos os apelidos conhecidos, porque quando a gente se torna professor ganha apelidos que ignora.
Então, os primeiros, os da infância: Narizinho, porque eu parecia a protagonista do Sítio do Pica-pau Amarelo e isso desafia qualquer lógica genética hoje em dia. Na época, todo mundo falava e acabou virando apelido.
Na universidade eu era Mara Tara, personagem de Angeli.
Nem pensem mal: eu fui careta na universidade: só transei no D.A. uma vez; nunca usei drogas, tinha nojo de maconha, aquela porcaria cheirando a cocô queimado, todo babado de um monte de bocas...credo!não vivi nenhum clichê de minha época.
A porcaria desse apelido foi dado por um ex-namorado meu, de Administração, que andava com os maconheiros de minha turma.
Eles acharam a total compatibilidade entre mim e a personagem, porque Mara Tara era extremamente estudiosa, casta e reprimida. Entretanto, ela contraiu um virus, o Ninfus Maniacus...e não estou nem doida de contar os pormenores dessa história.
Entrei no Corpo de Bombeiros e, quando recruta, meu apelido era História, porque era o que eu cursava.
Nessa época descobriram que eu achava que E. P.Giostri era um gato. Ah, descendente de italianos, super gostoso!!! vivia preso o tempo todo, igual a mim!
Depois foi o próprio menino que descobriu e me deu um aperto - e eu, tímida, me encolhi em silêncio.
Isso originou uma infame paródia de uma música, um forró de sei lá quem, o Xote ecológico( aquele lá que diz: "Não posso respirar, não posso mais nadar/a terra está morrendo,/não dá mais para plantar/se plantar, não nasce/ se nascer não dá...") em que eu e minha turma éramos caluniados:

" História estava aqui, Giostri comeu;
Lu estava aqui, o sargento comeu;
Nery estava aqui, o capitão comeu,
Nem finado Plínio sobreviveu!"

Esses eram os meus colegas de turma e suas calúnias, mas nunca houve nada entre mim e Giostri - besta que eu fui!
No final do recrutamento eu já era Abadá, por conta da minha detenção de 04 dias por ter chamado assim à farda militar - longa história de que tenho vergonha. Eu vivia presa o tempo inteiro no final do curso, sempre aprontando alguma coisa.
Vou saltar os apelidinhos fru-fru que meus namorados me puseram, mas em compensação vou confessar que minha super-amiga me chama de Lola, por causa de um filme.
Finalmente, vem o apelido que mais me causou problemas, no sentido de que ainda sou lembrada por ele e ardi em vergonhas naquelas aulas: Apaga-fogo.
Eu fui fazer uma extensão em Arqueologia, curso noturno, excelente.
Para a minha sorte, as mulheres eram minoria e aí sempre tem os assanhadinhos e eu dei de cara com uma galera deles.
Eles combinava com o professor ficar me chamando a dar opiniões, a subir a descer, a circular pela sala, a discutir a droga do carbono 14 e do carbono 16 aplicados, em blablablá dos sítios arqueológicos e etc., e eu ouvia toda hora:"Chama a Fire Girl, professor!"...e a noite era de Apaga-fogo e Fire girl, numa chatice!!!
Acabaram erotizando minha profissão, minha farda e esse negócio de conotação sexual que o fogo e a mangueira fornecem, até a Amiga Secreta do curso, em que o professor lastimou que ninguém tivesse me dado uma cinta-liga vermelha.
Aí está a outra arqueologia: a dos nomes dados, da identidade que os outros nos atribuem...no final das contas, até que me diverti com essas personas.

O espelho das relações


Quando eu comentei que a nota dos orientadores aos seus orientandos era tendenciosamente padronizada, certas pessoas não contiveram o ódio que sentem por mim.
Quando este mesmo comentário foi feito em reunião, por várias outras pessoas, elas ficaram passivas e impassíveis: o problema era mesmo comigo.
Qualquer coisa que eu diga será encarado por elas como um crime de lesa-majestade, porque antes de qualquer coisa que eu fale, falará mais alto o ódio que elas têm por mim.
E pensei muito nesse ódio, porque a gente sempre procura as razões para tais sentimentos. Não precisa ter razões para amar , nem para odiar, não se trata de coisas racionalmente determinadas, não.
Queria que elas ficassem em paz com aquele ódio: sentimento autêntico.
Temos medo de amar. Temos medo de odiar e parecermos monstruosos, imbecis, ruins, maus...e todo mundo quer ser bonzinho e amado. Eu não estou fora desta estatística: não quero ser vilã.
Vivo colocando o espelho no meio do caminho e sei que isso é irritante.
Gente, é tão desagradável ter que conviver com quem a gente não gosta. Imagino a agonia delas, a necessidade de me vigiar para catar algum pretexto para comentários depreciativos, a constante observação aos meus passos, para ver se desautorizam minha fala...ah, gente, eu estou de passagem.
Eu estou de passagem, tudo é transitório e eu não desejo me eternizar, não faço a menor questão de nada, principalmente, do que não me faz bem.
Acontece que há coisas que estão fora da esfera de nossas escolhas: não as escolhi por companhia e a recíproa é verdadeira. Contudo, me espanto com quem confunde as coisas: não gosto de trabalhar com inimigos, mas não me ponho contra seus feitos nem vou prejudicá-los nem deixar de reconhecer suas competências, seus acertos etc. O trabalho, a realização dele, está acima destas inimizades.
Uma das melhores inimigas que tive até hoje foi Carol: a gente se detestava assumidamente, reciprocamente, mas aprendi muito com ela.
Ela nunca se furtou a reconhecer a coerência de minhas propostas e vice-versa, e também com ela eu aprendi a preservar minha dignidade e, por exemplo, pedir demissão de um outro lugar.
Inimigo digno é este que separa as coisas, não persegue, vota com coerência, não joga areia no plano do outro, cuida de si sem prejudicar a outrem, não deixa que o ódio resulte em injustiça.
Seguindo a filosofia do mestre Antônio Carlos Magalhães, "Aos amigos, tudo; aos inimigos, a justiça".

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Meu aniversário e os melhores presentes


e por falar em sexo quem anda me comendo
é o tempo
na verdade faz tempo mas eu escondia
porque ele me pegava à força e por trás

um dia resolvi encará-lo de frente e disse: tempo
se tem que me comer
que seja com o meu consentimento
e me olhando nos olhos

acho que ganhei o tempo
de lá para cá ele tem sido bom comigo
dizem que ando até remoçando

De tanto repetir os primeiros versos deste poema de Viviane Mosé, festejei meu aniversário, hoje, com um bolo inusitado, dado de presente para mim pelos meus amigos, especialmente, Ninno e Márcia, com a aquiescência quente e massiva da turma do quartel em que servi.
Meu bolo traz esculturas fálicas de chocolate: pênis imensos, pênis finos e grandes, casais se pegando, torso de um homem nu e atlético, com o pênis aparecendo na abertura do zíper: bolo idealizado com muita base nos meus queixumes.
Foi um aperto o pós-bolo: Márcia o fez, mas era moralment eincômodo guardar na geladeira da casa dela; os outros amigos também se eximiram deste mico e foi muito engraçado ver o embraço da galera até mesmo para trazer o bolo hoje para a aminha casa.
Que bom que neste ano meu aniversário foi melhor do que em 2009.
Agradeço a Deus pelo devir - ainda bem que as coisas mudam.
Tive um dia agradabilíssimo, me senti amada, amparada, no aconchego de muitos dos que eu realmente amo, dos que têm importância verdadeira para mim, de gente que eu achava que havia me esquecido...apesar do dia cinzento.
Aqui em casa foi uma expurgação maravilhosa ao som dos Beatles, de Manu Chao, de Raul Seixas...dancei, minha amiga amada dançou, evocamos os outros amados e ausentes amigos, suamos na felicidade do momento. Isso numa segunda-feira!
Obrigada , meus amigos, por estes gestos de carinho!
É, não parece, mas quem anda me comendo é o tempo!
Hoje, minha melhor amiga e quase-irmã me corrigiu: antes eu dizia quem quem iria me comer era a terra. Ela disse que é o chão quem vai me comer, porque é necessário substituir a terra por um substantivo masculino, já que sou heterossexual.
Antes que a terra me coma, espero ainda viver muitas coisas boas.
Os melhores presentes eu já ganhei - e não estou falando das calcinhas, dos perfumes, dos sabonetes,do CD, dos paparicos, mas do que está acima de tudo isso: o carinho dos que eu amo, o carinho dos que me amam.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Nosso amor por Gabriel


"Era inevitável: o cheiro das amêndoas amargas lhe lembrava sempre o destino dos amores contrariados." Gabriel García Marquez sempre faz isso comigo: me conquistar desde a primeira frase de seus livros. Foi assim com todos os livros dele que já li até hoje e está sendo assim com O amor nos tempos do cólera.
Gabriel é uma paixão para mim. Somente por ele redobrei a atenção para a recorrência/repetição dos personagens de Cem anos de solidão, porque fixar quem é quem em meio a tanto Aurelianos e tantas Amarantas, não é fácil - mas é encantador.
Estão Gabriel Elígio García e Luíza Santiago Márquez, pais de Gabriel García Márquez, como facilmente se pode deduzir, ilumina esta história de assumidos traços auto-referenciais deste fantástico escritor (nas várias acepções do fantástico, claro!), assumindo, obviamente, os nomes fictícios dos protagonistas.
"Florentino não deixara de pensar nela um único instante desde que Fermina Daza o rechaçou sem apelação depois de uns amores contrariados, e haviam transcorridos a partir de então cinquenta e um anos, nove meses e quatro dias."
Os amores contrariados, claro: amor e contrariedade são pares inseparáveis. O amor em Gabriel García Marquez não é inadvertidamente doce, é amargo, tem um cheiro amargo, o cheiro amargo das ilusões dissipadas, se lido no contexto do livro.
Agora, também eu tenho que abandonar esta paixão: a paixão por este livro que tem uma longa história. Mas meu abandono é por conta das minhas ocupações formais, pelos infinitos livros de História de Portugal que tenho para ler, obrigatoriamente, em prol de minha tese e pelos (Os) Lusíadas que me amarraram de novo, nos cantos VII e X, com urgência e data determinadas para prestar contas de minhas conclusões.
Pelo mesmo motivo abandonei Anna Karennina e o Conde Vronski me esperando no final do volume I - e dói largar os que amo em favor das teorias de que preciso e dos compromissos formais.
Mas a longa história que cerca O amor nos tempos do cólera, vai além de um simples desejo de ler: eu queria ter o livro. Sou assim, possessiva com livros: quero ter o meu.
Adiei a compra por dureza umas vezes, por forçadas opções, noutras.
Ontem eu estava chegando para minha aula e fui saudar um amigo. Ao virar na direção dele, dei de cara com uma edição do livro. Não resisti, parei tudo, peguei o livro, namorei, perguntei o preço...e meu amigo vendedor esclareceu que havia poucas horas que o livro tinha sido exposto, falou do antigo dono também.
Ora, o antigo dono, meu amigo, poeta,em situação de penúria - o que justificava a venda do livro.
Então também para mim há um gosto amargo de saber que o meu amigo está em dificuldade - ele, apaixonado por Literatura, a se desfazer de um grande amor porque precisa comer e pagar o aluguel.
Não pus o meu nome no livro. Talvez nunca o faça, no intuito da devolução; e melhor seria comprar um outro e dar de presente a ele, num contexto em que não lhe fira o orgulho e a dignidade.
É necessário dizer que por mais que odiemos o capitalismo, é sob ele que vivemos.
Por mais, Bruno, que você seja poeta, a vida não é poesia - a poesia pode ser a sua vida, mas a vida não é poesia. Aprenda com Ferreira Gullar que "o preço do feijão não cabe no poema", mas é preciso comer feijão, viu? o meu também está pouquinho.
Então, sigo aqui, com este amor contrariado sob várias formas, mas amando e amando muito Gabriel García Marquez...

quarta-feira, 7 de abril de 2010

História e Verdades


Eu sei que tem uns amigos e uns inimigos que pensam que certas coisas que eu escrevo são cartas com endereço certo ou indiretas para algumas pessoas, mas a coisa é mais genérica do que parece.
Sou a pessoa que está no lugar errado na hora certa, por isso há coisas que fico sabendo porque vi, presenciei, testemunhei, mas estas viram segredos, quase sempre. A minha vida é que tem episódios comuns, como por exemplo, meus vários amigos gays e suas histórias, os casos amoroso, as situações de trabalho, as minhas amigas casadas várias vezes e seus maridos machistas, as amigas que são esquizóides, as amigas tarja-preta, gente medíocre, gente fina, gente generosa, casos de família, brigas de vizinhos, intrigas em geral...quando é para alguém o recado, dou muitas pistas. Até recentemente eu dizia o exato nome de quem se tratava, mas passei a ser mais cautelosa porque quis preservar aqueles que têm um círculo social maior, só isso.
Então, quem respira sabe que qualquer cachorro dá aulas de história. O que quero dizer é que a carga horária de qualquer professor é complementada com aulas de História, que não há cuidado com a escolha do profissional específico para dar aulas de História e que esta é uma constante estratégia , isto é, negligenciar o conteúdo e a importância de História.
Não é só isso: se você cursou História e fez concurso pelo Estado da Bahia, ou você é o primeiro colocado, ou nunca será convocado, salvo naquela progressão de um convocado por ano.
Hoje, finalmente, meu primo Nanno foi convocado pela DIREC. Poxa, tem tanto tempo esse concurso que eu nem me lembro mais.
Até me perguntaram como eu fui parar no Corpo de Bombeiros. Simples: fiz concurso para professora do Estado, em História - fiz três, ficando em décimo lugar, em vigésimo oitavo e um que esqueci a classificação - e nem eu nem o restante fomos convocados jamais.
Fiz o concurso para o Corpo de Bombeiros e fui convocada imediatamente - salário, plano de sáude, estabilidade, aporrinhações, disciplina e hierarquia, mano véio!
Mas, meu primo foi convocado e a gente nem acredita...poxa, há quanto tempo!
Aí rimos de um velho e querido defunto gay: Kleber Gouveia - meu amigo assassinado pelo namorado. Falo de gay todo dia, se for possível - eles formam a maioria dos meus amigos e, invariavelmente, algum sofre violências físicas, porque a simbólica é cotidiana.
Citei o nome porque eu e os que me conhecem terão uma lista de histórias semelhantes e aí algum panaca pode pensar que a indireta é para não sei quem. Não é não: estou falando de um cara legal e batalhador, brutalmente assassinado há dois anos, meu colega e meu amigo, presidente do grupo Gay de Feira - e a indignação pela insolubilidade do caso não tem palavras para descrever.
Bem, a gente riu porque finalmente ele foi convocado pela DIREC.
Rirei de novo: KKKKKKKKKKK! Rimos, meu primo e eu, porque o cara morre esperando ser convocado, o cara morre e mais fácil você morrer ao Governo do Estado dar sua vaga, meu irmão. Convocação post mortem
Onde quer que Kléber esteja, sabe que não zombamos: ele deve estar rindo também. Ele, sétimo colocado no tal concurso. Pois é amigo, não é piada...depois, eu é que sou maldita, hein?
Entrem para a História, mas não cursem História se depender do Estado da Bahia: é voto de pobreza.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Fora de controle


Eu estava tão em paz com as minhas decisões. Aí me vem uma ameaça para desestabilizar minhas convicções.
Fico quietinha, na minha, na minha casa: eu e minhas decisões, eu e minhas dificuldades, eu e minha vontade de não precisar nunca mais voltar para onde eu sequer quero ir, eu e minhas convicções; eu e meus planos para resolver as coisas; eu e meus desesperos; eu e minhas conclusões; eu e minha rinite que me deixou de molho a Semana Santa inteira...
Aí lá vem ele e sua perfeição.
Ele vem, com aquela hipnose que desafia minhas decisões, minhas certezas, meu bom senso, meu senso de auto-preservação...ah, lá vem ele!!!
Ele nunca vem sozinho: ele vem com aquelas palavras doces, escritas e ditas ("...E ainda teve a cara-de-pau/de me dizer, assim, em tom tão educado: Oh, pero que letra más hermosa!") e eu vou resistindo, sabendo que não posso ficar feliz desse jeito que meu coraçõa idiota fica me cobrando. Coração besta, pulando igual a cachorro com a chegada do dono! É, eu tenho vergonha disso, eu pratico a auto-censura.
Paro tudo, acudo esses meus dois neurônios - a julgar pelas minhas atitudes interiores, estes neurônios já morreram! - não tem jeito: sinal de ilusão chegando.
Não precisava ser assim: ele sabe que é lindo e administra esse capital simbólico.
Convencido, mas cortês, educado, cavalheiro, lindo, simples, doce, delicado...e aquele velho problema de ser tudo o que eu queria para mim - ao passo que, também é impossível ter segurança com um sujeito desses.
Quando a gente se via na boate, minhas próprias amigas se desmanchavam para ele, outras se ofereciam. Nem dá para condenar: aqueles olhos cor de violeta, aqueles cabelos, aquela pele, aquela estatura, com a maior pose de protagonista de filme de Hollywood...ah, tão lindo, tão desejado! tão de acordo com os sonhos que a gente nem acredita que ele existe.
Mas ele existe. Eu apago, mas ele existe.
Ele sabe ser galante, ele não se exibe pelo que tem, ele anda com amigos de todas as classes, ele encanta mesmo - aquele olhar sedativo, anestésico, aquele abraço que ampara todas as dores e me faz crer que Deus está de brincadeira comigo ou que me ama muito, aquele jeito de pegar em minhas mãos... tudo que poderia ser um clichê, mas que com ele não é.
Aquele jeito de me chamar de Dona Moça, mas nunca omitir meu nome...hum, que veneno! ele sabe que esse é o mantra que eu gosto de ouvir. Ele sabe que eu não sou daquelas nojentas que chamam e gostam de chamar aos seus de "mô", de "benhê" e similares...ele nunca me chamaria assim - ele me singulariza, mostra que sabe com quem ele está - e nunca me ouviria chamá-lo assim. Por isso suas mentiras são mais verdadeiras.
Não sou ninguém para falar de mentiras com ele.
E eu perdi minha chance: quando a gente se conheceu eu tinha namorado e não acreditei que um cara daquele fosse querer rolo com uma mortal como eu. Então, não namoramos.
Da segunda vez ele me deu todas as chances. Novamente eu não acreditei na relação, eu saí pela tangente quando a coisa ficou séria. Eu menti. Menti porque eu não sabia o que fazer diante daquela pergunta.
Eu não menti à toa, eu fiz de tudo para não mentir, tanto foi assim que fiquei muda, eu fiz cara de paisagem, eu discuti os rumos da Física Quântica para mudar de assunto e fui escorregadia.
Não adiantou, ele insistiu e eu aí eu tive que mentir. Ele ficou uma fera...a pior das feras é silenciosa, não é ruidosa, não rosna nem assusta às presas. Sei disso porque sou assim também: enquanto eu reclamo, está tudo bem. Se faço muito barulho, está tudo bem, tudo sob controle. Mas se calo, é o anúncio da tempestade que varrerá a Terra e sacudirá os Continentes.
Um grande amigo meu - grande pelos meus sentimentos por ele, não pela recíproca - sempre me falou sobre dar respostas silenciosas - essas são as piores mesmo.
Não vou, claro, levar desaforos para casa - problema é para ser discutido mesmo, intriga se resolve é no bate-boca , que eu não estou aqui para ser uma hipocritazinha educada, não...mas, finalmente, quando as situações não valem nem mesmo uma palavra, tenha medo!
A melhor resposta é aquela que te alivia de engolir do que você tem para falar - não é melhor ser direto, a falar em paralelo, nos corredores, nos bares, com terceiros? esse negócio de remoer a mágoa apenas para preservar o suposto amigo, namorado, ficante, parente ou sei lá quem, em mim viraria úlcera.
Esperei a raiva dele passar, contei a verdade e perdi totalmente a credibilidade. Não sou, para ele, uma pessoa confiável. Não ofereço sentimentos confiáveis nem esboço nada que o faça imaginar que eu sustentaria uma relação confiável.
Assumo os meus erros. Não sou covarde não, porque eu acho feio não assumir as coisas, as palavras, os atos, as posturas. Aceito o castigo, mereci. Sou covarde com outras coisas que, alías, "Dessa coisa que mete medo/ pela sua grandeza/ não sou o único culpado / disso eu tenho a certeza."
Tenho tanto a aprender...tenha paciência, Thales!

O peso do amor


Eu me desculpei com minha amiga por ter comemorado tanto a separação dela.
Também, como não comemorar, se ela nunca amou aquele panaca? se ela casou por causa das pressões da mãe, sempre a convencendo que ele era uma boa pessoa, como se fosse o último homem do mundo.
Acho que eu nem deveria ter pedido desculpas, porque a primeira coisa que ela fez quando ele puxou o carrinho de lá da casa deles foi me chamar para viajar para Morro de São Paulo. E acho que ela não iria tão longe apenas para chorar as mágoas de um amor perdido.
Ah, quer saber? o que eu acho é que ela está feliz, feliz como pássaro que escapa da gaiola.
Nem sei os motivos da separação, mas sei que os efeitos dela são ótimos.
Quando eu perguntei, há 200 anos, se era bom estar casada, ela me disse: "Casar é bom, mas ser solteira é melhor".
Imagine, uma moça como aquela, que me arrastava da cama em Porto Seguro, porque queria aproveitar cada minuto da viagem, que até reclamava de que eu "Só pensava em dormir" (sem notar, ao que parece, as incontáveis noites perdidas nas festas e na Passarela do Álcool e os dias socados na praia e na Axé Moi, em plena badalação), pense se uma pessoa dessas poderia ser feliz ao lado daquela múmia paralítica cenozóica?
Graças a Deus ela (nem ele) nunca lerão este blog, porque assim posso me desmanchar em sinceridades.
Volto à questão:a moça bonita, saudável, bem formada, com emprego estável e cheia de fogo no espírito, vai e casa - porque nos dias de hoje ninguém acha casamento, seguiu aquele raciocínio do Ultraje a Rigor: "preferiu a segurança/de uma vida certa/ ponderou que bom marido/não estava em oferta" - agora, bem feito, é mãe dela quem fica com bebê enquanto a gente sai. Em situações inevitáveis, o bebê vai junto. Paciência!
Encontrei, neste final de semana, meu grande amigo (não sou muito desses negócios de dizer melhor amigo, mas não posso negar que ele é mesmo meu grande e melhor amigo), há muito desaparecido.
Sabe como é: amigo está perto quando as coisas do coração não vão bem. Quando têm relacionamentos, vivem apenas para seus pares, anulam a humanidade, nem lembram dos amigos se estão em "lua-de-mel". E se são amigos verdadeiros, reconhecem isso. Assim foi.
Aí lá vou eu pagar conta e pegar fila no supermercado e encontro ele. Surpresa boa e bem-vinda! adoro ele.
Vem então a avaliação: poxa, meus amigos, parece até regra, mas eles, se a relação amorosa vai bem , o primeiro sintoma é ganharem peso. Tá lá a fartura de gordura e alguns desleixos próprios de quem já tem o que quer.
Não tem dois meses o fulano estava correndo e malahndo para perder peso. Ficou lindo, mais lindo aliás, com a barriga de tanquinho, saradão, todo tesudo...até voltar para ela e se dar ao desprezo.
Meus amigos gays se deixam convencer pelos seus companheiros de que estão "fofos", "cheiinhos" e outros termos para consolar baleias, achando que serão aceitos exatamente como são.
Ora, pois:o efeito contrário é verdadeiro. Mulheres, quando desprezadas, mudam logo o cabelo (vide Amarelo manga), cuidam do corpo, procuram se enfeitar - se para enganar a si, buscando novos efeitos na imagem que possam refletir na imagem interior que têm de si e, desta forma, curar feridas narcísicas, ou se o fazem porque querem estar atraentes para outras possibilidades, tanto faz!e se for só para provar ao ex "olha o que você perdeu", pouco importa. É bom cuidar de si.
A dor não precisa estar na cara, não precisa expressar a auto-comiseração. Meu amigo bem notou isso e assim que levou um kick, se cuidou. Contudo, de volta ao aconchego, está lá, gordura pura.
O ministério da louquética adverte: "Relacionamentos estáveis causam gordura localizada e dependência emocional"

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Em memória de um amigo abandonado


"Todos são iguais perante Deus". Oh, meu amigo, tenho que te informar que não estamos no Céu, certo? entendeu? então, aprenda rapidinho que vivemos em hierarquias, por mais que seu chefe ou o seu amigo poderosão se faça de camarada. Isso não é coisa do dia primeiro de abril, não é mentira!apenas as pessoas - aquelas pessoas perfeitas, melhores do que todo mundo, aquelas que são melhores do que você e eu, aquelas de espírito nobre e bons sentimentos - gostam de repetir essas frases para parecerem ainda mais superiores que nós, os medíocres que conseguimos ver o que todos vêem mas ninguém admite. Eu, pessoalmene, sou ainda mais má e medíocre que qualquer outro, porque assumo posturas e declaro minhas inimizades. Mas, como dizia o sábio filósofo do forró de duplo sentido, que eu tanto cito com estima e consideração, o mestre Sandro Becker,"esta vida é um buraco/o forte pega o mais fraco/ e...Ó!"
Tive aula ontem com um ex-colega de mestrado. Ele estranhou minha presença na sala dele, brincou, pensou que era pegadinha, mas a gente conversou sobre a vida acadêmica e profissional,após o horário de aula.
Putz, que não se mude da água para o vinho sem o risco de embebedar, o menino está antenado! Meu Deus do Céu: ele me contou que no primeiro ano como substituto, fez e aconteceu, arrasou, arrotou bibliografias,mostrou tudo que sabia, procurou aprender o que não conhecia, fez jus ao lugar conquistado...até perceber as regras do jogo.
Eu estou falando de um "queridinho", não das arraias-miúdas, dos peixes-pequenos como eu. Olha que se a vida do preferido foi recheada de perseguições, oxalá a minha, que nem fui elevada à categoria de gente?
Há um tempo atrás eu falava disso com meu professor de Metodologia do Trabalho Científico, o senhor Eurelino Coelho: da Mais-valia.
A Mais-valia é um conceito marxista plenamente válido para o tempo presente, segundo o qual o proprietário dos meios de produção, além de toda exploração explícita que possa praticar contra o proletariado, dispõe do tempo desse mesmo proletário que, num processo complexo de se explicar em poucas linhas, redunda na apropriação de excedentes por parte de quem domina os meios de produção.
Então, sobretudo, o proletário é explorado em seu tempo.
Não à toa, o capitalismo dirá que tempo é dinheiro.
Aí o meu colega me mostrou que administra seu tempo na universidade de modo a defender sua Mais-valia. E está certo. Levo a lição na mala: se você já é explorado em várias situações, naquilo que leva para casa para corrigir, no que elabora, nas reuniões de que participa, nos projetos de que faz parte, na assistência que dá aos seus alunos extra-classe, nos eventos em que colabora, em tantas outras situações, é você quem deve perceber esta exploração e se defender.
Horários desumanos ou horários em que a formalidade fala mais alto que o aproveitamento, são coisas descabidas. Infeliz de quem não vê, mas, por outro lado, se você é super beneficiado, se seu trabalho é reconhecido, se seu chefe não subestima suas necessidades, se seus superiores hierárquicos não desdenham de sua palavra, não desautorizam suas posturas nem lhe diminuem profissionalmente - e há muitos para os quais "seu desejo é uma ordem!" - porque não ser certinho, palmatoriazinha do mundo, perfeitinho e cumpridor? é a contra-partida. Eu não condeno, não.
Então me vem outra situação absurda: meu amigo, competente no que faz, não foi aprovado num concurso. Não, ele não perdeu: quem perdeu foi a universidade, ao não classificar alguém competente. Ele apenas foi reprovado. Justamente pela incoerência do resultado, sei que ele está ferido.
Vejam como a coisa funciona: o campus ao qual pertencia a vaga, declinou de mandar seus representantes para a banca. Isso faz presumir uma neutralidade da banca, porque seria até suspeito e provavelmente tendencioso aprovar um professor que já pertence à casa, como era o caso do meu amigo (substituto num campus, concorreu a uma vaga real daquele mesmo campus).
Ocorre que nos muros já não cabe mais ninguém, porque ficar em cima do muro é uma beleza: você senta a sua bunda lá e contempla as misérias lá do alto.
Eu, que acredito em acaso, afirmo que o acaso foi dando pistas para ele: num intercâmbio entre os candidatos, o meu amigo descobriu que a sua concorrente (que veio a se tornar a única aprovada) era amicíssima de sua outra colega de trabalho.
Sou suspeita, eu sei, porque a tal amicíssima da candidata aprovada não está na lista dos meus amigos - até porque, esta eu conheci quem é rapidinho e dou graças a Deus por ela não saber o que eu realmente sei sobre ela - mas o caso é que meu amigo se decepcionou com isso: a figura não quis compor a banca porque a sua amiga estaria concorrendo. Logo, lavou as mãos, para não ficar "mal" com ninguém, digamos.
Além dos mais, foi ela quem compôs os slides, quem cedeu o material e quem preparou a candidata aprovada. Sabiamente, naquela terra de gente em cima do muro, ela alegou "desconforto" para estar na banca. Ui! adoro gente boazinha!!!Êta Bigbrother.
De todo modo, a banca depreendeu que o meu amigo estivesse cheio de si e que presunçosamente se julgava o "dono da vaga". Esta é a desvantagem que poderia ser compensada se o tal campus tivesse representação na banca.
Assim, a banca foi endógena: todos eram professores de uma certa universidade e aprovaram sua pupila (naturalmente, da mesma instituição de origem dos membros da banca, ex-aluna deles).
Já fiz um concurso na UESB em que eu fui para lá de medíocre: dei uma aula pública que nem o pior professor de Ensino Fundamental daria. Mereci perder.
Por duas vezes fiz concursos em que reconheço que apliquei conceitos pertinentes, mas desconhecido da banca e, também fui vítima de preconceito de formação, por ter feito o percurso História-Letras.
Ser reprovado sem merecer é doloroso.
A gente fica pensando: "Será que a aula era sobre História da África e eu discuti os novos parâmetros da mídia audiovisual nos realities shows?"
É, porque costumamos ter noção do que sabemos e sobre nosso limites e deficiências, também. Não tem ego que seja tão forte a ponto de mascarar tanto um desempenho.
Das conversas com meus dois amigos, cada um a seu tempo e em seu contexto, eis que resolvo cuidar de mim - e eu já disse que a maré não está para peixe, mesmo sendo Semana Santa - está lá a droga da vaga disponibilíssima, feita para mim. Deveria se chamar: disciplina: Mara Vieira. Pois bem, está lá a disciplina de Cultura e Literatura, que pede experiência na área de Estudos Culturais, trabalhos publicados como os meus, pesquisas como as minhas e, juro, parece que pegaram a marca d'água de mim mesma, a sombra e o contorno e fizeram a vaga.
Como nada é tão bom que não tenha seus defeitos, devo dizer que a vaga é na UFRB, justamente num lugar para o qual eu não volto nem amarrada, nem por desespero: Amargosa.
Não quero dizer, presunçosamente, que a vaga seria minha: muito pelo contrário, minha experiência por lá mostrou a endogenia, também. Mas é a vaga sob medida, que corresponde à minha formação, indicando, inclusive, graduação em Letras ou História.
Na UFRB o campus dos meus sonhos é Cachoeira.
Aí vêm os problemas: a vaga de lá não corresponde ao que sei, nem à minha formação. Se minha inscrição for deferida, terei a desvantagem de tratar sobre o que eu não sei. Pode uma coisa dessas?
Não trabalho nunca mais em lugares distantes. Não, não quero. Osmando que me perdoe - ele é quem diz que eu tenho a teoria da minhoca: isso de ser apegada à terra - mas, sou telúrica mesmo.
Não há lugar melhor que a minha casa.
Quero uma vida normal, gente: não quero dormir sentada uma noite inteira, dar aula sem descansar, sem disposição e achar que isso é assim mesmo; quero ir ao cinema sábado, ou me trancar em casa e comer pipoca; não quero chegar em casa na madrugada de domingo depois de 07 horas de viagem...o problema é a distância - o cansaço, claro! Por exemplo, amo Xique-Xique como jamais gostei de Aracaju. Mas entre ambos e eu, há a distância...e aí voltamos à Mais-valia, porque eu não sou (ninguém é) remunerada pelo despêndio temporal, pelo tempo e saúde perdidos no trajeto. E nem sei se há preço que pague tudo isso em suas implicações indiretas.
Mas, conforme Machado de Assis, "Matamos o tempo,ele nos enterra." Ou mais exatamente como os Engenheiros do Hawaii, "Não querer perder a razãopara ganhar a vida/nem perder a vida para ganhar o pão".