Louquética

Incontinência verbal

domingo, 31 de julho de 2011

Momentos decisivos


Tomar decisões sempre levanta nossas suspeitas acerca do que estamos perdendo, do que poderá acontecer, sobre que preços pagaremos, do que iremos ganhar... eu preferia tomar um copo de conhaque a ter que tomar umas decisões mais sérias, mas já que eu não bebo mesmo, foi a seco e sobriamente que me decidi.
Acho terrível quem esfrega na cara dos outros alguma decisão, mas volta atrás em poucos minutos. Por isso cozinho um pouco tudo que tenho a decidir – claro, também lamento que optar por um é perder o outro. Mas, está feito e eu não estava me referindo a relacionamentos, não.
E por falar em relacionamento, estavam me perguntando uma dessas verdades construídas pela banalidade, mas que nem por isso são menos valiosas, e assim enunciaram diante desta minha cara de louca: “Se as coisas são feitas para serem usadas e as pessoas para serem amadas, por que será que amamos as coisas e usamos as pessoas?”.
Não economizei na objetividade e respondi: “Por que somos vaidosos e escrotos!”
Para quê eu iria procurar filosofia se a resposta mais crua e grossa era também a mais verdadeira?
Todo dia eu estou aqui falando naqueles que usam os outros como instrumentos de sua vaidade, como adereço para o seu ego, criando correntes de dependência emocional, lançando suas chantagens, oferecendo suas preciosas migalhas, deixando as pessoas em stand by, fazendo o jogo da vaidade...ainda não entendi porque não se pode falar sobre coisas que todo mundo sabe que existe.
Também hoje à tarde Tati me informou da decisão dela: para mim, uma pena! É que havíamos combinado fazer um concurso juntas. Ela estava desanimada – e eu, então, não quero conta com o concurso em termos reais – mas eu fiquei incentivando porque acredito que é bom ter opção.
À medida que você é aprovado, eis uma alternativa. Depois de aprovado em alguns concursos, podemos fazer escolhas e não estarmos na posição de reféns.
Mas é extremamente desgastante um concurso no Magistério Superior: na inscrição tem que ter currículo pronto e atualizado, com a comprovação de todas as xérox de certificados e etc. devidamente autenticados, na ordem determinada pela "X " instituição, além de memorial e do pagamento de taxas absurdas, em torno dos 150 reais.
Aí vêm as provas: prova escrita chatésima; aula pública cansativa; defesa de memorial enfadonha e muita, muita paciência para vencer cada uma dessas etapas ao longo de uma semana de mergulho nessa rotina.
O concurso que eu quero, no lugar em que eu quero, na disciplina em que eu quero,eu já passei. Mas quem faz concurso sabe que não tem a mínima garantia: friso bem a parte dos editais que dizem que a aprovação no concurso gera apenas a expectativa de preenchimento da vaga.
Pior é na convocação: mil exames, mil comprovantes – dos quais estar em dia com o erário público – mil documentos, mil exigências e muita, muita espera porque aí são outras etapas: homologação dos resultados; publicação no Diário Oficial da União; Convocação, nomeação e posse. Quem não se desgastaria? Por isso Tati me disse: “Não! Não vou. Sinto muito!”.
Como nem sempre faço o que eu quero, mas o que eu preciso, sublimei o meu querer.
E quanto à tese, escrevi dois parágrafos no final desta tarde e me dou por muito feliz: cheguei em casa às cinco da manhã, após meu último dia de aula na UNEB, dormi pouco porque a igreja de crentes que fica no fundo de minha casa estava em ensaio da banda; comi sem apetite, apesar do almoço estar delicioso e fiquei num infinito blábláblá ao telefone com a minha amiga Tati, por um bom tempo. Diante disso tudo, eu nem esperava ter raciocínio para nada, muito menos para escrever.
Remoí as minhas decisões – elas, que não têm nada de novo, mas eu esperava de mim mesma uma outra opinião, uma mudança, sei lá... mas, sim, confirmei hoje a decisão de dois anos atrás – e acho que vou ficar ruminando o preço a pagar, ou melhor, o que deixarei de ganhar... de fato, não perco. Perdida eu estaria se não soubesse que rumo tomar nas tantas estradas que se bifurcam à minha frente.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

O tamanho do problema


Sempre que aparece alguma notícia que eu reproduzo aqui, tomo o maior cuidado com as fontes. Mas, onde há fumaça, alguma coisa está queimando...
Foi com uma indignação do outro mundo que captei as declarações do Enrique Iglesias, sobre o ínfimo tamanho do próprio pênis. Pesquisei os vários sites que noticiaram esta tragédia e as fontes mais confiáveis que, infelizmente, confirmaram as declarações dele.
Minha indignação deve-se ao fato de que a natureza foi muito injusta com ele: como é que faz um sujeito ser assim tão gato e carismático, mas economiza numa das áreas mais importantes,prioritárias?
Acho que ele é corajoso, sim: quando eu falei que havia fumaça, foi porque anteriormente ele tinha proposto que a indústria de preservativos fizesse um tamanho para os desafortunados - algo aí abaixo do tamanho mínimo.
Esse papo de que mulher não se importa com o tamanho do pênis é pura ilusão. Claro, há compensações e há outros motivos que fazem com que uma mulher fique com um cara, independentemente de volumes e extensões, ou seja, de tamanho e de diâmetro.
Num exemplo claro de que os homens uma hora percebem isso, um contato meu (kkkk!!!) estava dizendo há uns dias, mui sabiamente: "Esse negócio de que mulher não repara no tamanho do pau (sic) é tudo mentira! Você está lá *** e a mulher está pedindo mais e mais e mais...de repente você **** tudo e ela ainda quer mais, pede mais..."
Com este mesmo contato aprendi outra coisa: Segundo ele, pedofilia é quando um homem mais velho procura situações sexuais de qualquer tipo com uma menina ou com um garoto menor de idade. Todos os casos que envolvem os garotos e as mulheres mais velhas, desde que sejam eles a provocar a situação, não configuram crime desta natureza.
Pelo menos ele já é maior de idade há algum tempo - ufa!!!
Uma vez, apresentando uma comunicação sobre gênero e sexualidade, falei que a sociedade brasileira é falocêntrica. Mas falei em tom intelectual, toda condoída pelo absurdo da situação.
Era uma associação retórica que eu estava fazendo sobre machismo, hegemonia e sexualidade... depois eu me toquei que falocêntricas podemos ser nós, mulheres, que ficamos reparando no tamanho do "tal".
Lembro do filme "Do que as mulheres gostam", quando a personagem da Helen Hunt, que tem seu pensamento lido por Mel Gibson, pensa: "Não vou olhar para o pau dele; não vou olhar, não vou...ai, meu Deus, estou olhando!".
Sofro da mesma síndrome: olho o volume dianteiro da calça dos policiais; olho o "quebra-molas" que se forma em frente ao zíper dos jeans que os homens usam - não quero nem saber se são heterossexuais ou homossexuais...meu olho não é assim seletivo.
Lembro do Homem-Berinjela (e não tem uma vez que eu escreva berinjela e deixe de cogitar se é com J ou G...por sorte, não gosto mesmo de berinjela), personagem do Pânico na TV: ele atrai todos os olhares. E a receita é simples: o ator coloca um volume fenomenal na parte dianteira da cueca e sai de bermuda de lycra, falando distraidamente ao celular...
No último domingo, parodiando a novelinha " O astro" o Pânico lançou "O mastro", que trazia um mágico, vestido de calça branca de lycra, ressaltando um super-mega-máxi-plus-golden volume peniano, nas ruas paulistanas. E o povo? ah, sorriu feliz - uns aquiescentes, outros, invejosos e não poucos cobiçosos. Sucesso desde o primeiro minuto!
Minhas amigas de hoje em dia já não são hipócritas como as de outrora: assumem que não há talento oral ou versatilidade manual (digital?) que compense as faltas que um bom tamanho faz.
Pessoalmente, creio que não é qualquer coisa que preenche o vazio existencial de uma mulher - daí minha inaptidão para frequentar ou morar na Ilha de Lesbos.
Coitadinho do Enrique Iglesias,cujo pai, Júlio Iglesias, alardeia as mais de mil mulheres que ele já levou para cama ( e para a sauna, para a piscina, para o chão...). Eu jurava que tamanho era um negócio genético, predeterminado geneticamente...
Os laboratórios Louquética Medical and Science Research, em pesquisa de amostragem, observou através de um percentual reduzido de população, o predomínio da genética na determinação do tamanho do..hrum-hrum!
As falhas no resultado da pesquisa deve-se, justamente, ao fato de que a amostragem foi mínima e, neste caso, não adentrou aos vários graus de parentesco, ficando apenas na observação de incidências entre irmãos e primos. E aí a semelhança foi total, segundo a conclusão dos pesquisadores.
O caso do Enrique Iglesias levou os laborátorios a repensarem suas práticas de pesquisa e a rever determinados pontos do estudo. Certamente, o Júlio Iglesias não conseguiria atrair tantas mulheres se não tivesse lá um grande, um enorme ou um avantajado motivo para isso. Mas, seja como for, é uma maldade da natureza deixar um sujeito assim, tão bonito, numa situação delicada.

Em primeiro lugar...


Nunca deveríamos perder a nossa capacidade de aprender.
Pode ser que do ensinamento mais vago, das proposições mais irrelevantes e até das coisas sem sentido aparente possamos subtrair alguma mensagem válida e conferir outros sentido ou ampliar sentidos mesmo quando eles não estão ali.
Quando escrevo gosto de embolar as coisas. Isso às vezes é para confundir, outras vezes é para ocultar e às vezes é para cansar quem lê, porque não estamos em outro tempo senão o tempo da rapidez - e da fugacidade, claro.
Então ouvi de meu amigo uma daquelas verdades enlatadas, nas quais não costumamos prestar atenção: ele estava me dizendo deste momento, "da sorte de um amor tranquilo", que enfim, chegou.
Ele afirmou que agora tudo mudou porque ele passou a "tratar como opção a quem antes ele tinha por prioridade", explicando que no jogo sujo das relação informais, o cara o tratava como opção e era ele quem o tratava por prioridade.
É difícil conciliar essas tensões, porque a gente acaba sobrevivendo de migalhas, com medo de morrer de fome.
De vez em quando a gente olha a repetição das atitudes dos amigos que parecem não mudar nunca e eternamente narrar os mesmos problemas. Entretanto, quantas vezes adiamos uma decisão, à espera de que alguém decida por nós e nos livre do ônus da responsabilidade e do risco posterior? e o jogo da eterna espera, apostando que alguém vai mudar, que tudo vai mudar e melhorar? e aquele olhar rotacional para o passado, como se o passado nunca passasse, como se as dívidas de mágoas nunca fossem pagas, como se o devir nunca viesse e como se fossemos os mesmos que fomos há tantos anos atrás?
Parece pouco e banal colocar a prioridade como opção, mas não é bem assim: é uma troca valorativa.
Se alguém é, para nós, prioridade, mostra seu lugar na ordem de importância. Isso quer dizer estar em primeiro lugar, ter um valor incomensurável que o coloca acima das coisas mais imediatas e das mais urgentes. Uma vez que deixamos para segundo plano, tratamos a referida pessoa como uma opção, como uma alternativa, estamos não apenas trocando as coisas de lugar, mas trocando de posição - e é a nossa posição em relação àquela pessoa que muda também, porque depois de um tempo as coisas viram submissão.
"O quereres e o estares sempre a fim", conforme cantou Caetano Veloso em O quereres, parece convencer o outro de uma permanência das condições, dos sentimentos, da situação... mas, cá entre nós, eu acho que as coisas mudam não somente porque somos nós a relutar contra o papel secundário de ser "opção", mas porque passamos observar quais são as nossas reais opções - daí optamos, temos escolhas, escolhemos diferente, mudamos.
Devo dizer que foi uma grande lição ouvir isso dele, do meu amigo.
Temos uma certa hipnose em relação ao que desejamos e, talvez por isso, obedecemos ao que nos é solicitado - e eu bem sei o que é a lista de espera e que o humorista está certo ao dizer que "Quem espera sempre CANSA".
Houve um dia em que C. me perguntou sobre os meus desejos. Nesse tempo nós não tínhamos nenhum rolo, mas sabíamos exatamente da tensão do flerte recíproco.
Ele me perguntou tão freudianamente sobre o objeto dos meus desejos e seus entornos e então foi procurar a objetividade sobre sobre o que queria saber. Esta foi uma das nossas melhores conversas, senão a melhor.
Engasguei, gaguejei, fiquei vermelha, rebati argumentos, mas não fugi pela tangente. Porém, ao lhe pedir objetivamente uma resposta, ele se furtou à clareza e à objetividade de que eu também precisava.
Lembrei, todavia, que minha analista me advertia sobre "fazer aquilo que não se deve fazer a um homem", e me resignei, pensando que no meu namoro anterior eu chutei o pau da barraca e fui extremamente castradora com Bruno, em situação análoga.
Eu sempre odiei a lista de espera. Odeio ainda mais porque sou impaciente.
Odeio ser dependente de qualquer coisa - conserto tudo em minha casa, me viro sozinha nas minhas dificuldades, não colocaria a minha vida sob responsabilidade de terceiros, não tenho propensão alguma a vícios de qualquer espécie - e por isso mesmo, qualquer sensação de que dependo do outro para estar bem me faz correr a léguas de distância do que me inclina à dependência.
O problema, que talvez seja a solução, é que a distância começa a se erguer como distância emocional - e esta é invencível. Nossa marca de segurança, a base de contenção e de autopreservação ficam visíveis quando acionamos quando a distância emocional.
Ser a prioridade ou ser " a terceira pessoa depois de ninguém", conforme falava uma ex-colega de trabalho não é disputar o ranking das atenções: é muito além disso - e olha que eu estou só aprendendo.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

À imagem dos semelhantes


Sabe quando você está falando de uma coisa e, de repente, conclui outra? Pois, então, andei falando de como prefiro os semelhantes a mim, os parecidos... bem, eu me referia aos homens. Daí cruzei este pensamento com os relatos de intolerância étnico-racial de que ouço falar na televisão e que presencio em gestos silenciosos no meu dia a dia. Concluí, que sim, desde sempre dizem que, conforme os preceitos cristãos, devemos amar aos nossos semelhantes. Logo, se os semelhantes são os parecidos, está explicado o ódio pelos diferentes.
Não só porque "Narciso acha feio o que não é espelho", mas porque somos exímios em segregar.
Também estive conversando sobre uns amigos próximos que querem mudar o mundo. São aqueles que, de fato, querem mudar o mundo, desde que a mudança não tenha que passar por suas próprias cozinhas.
Os anti-racistas que conheço, majoritariamente negros, exigem que suas empregadas e diaristas os tratem por "senhor" e "senhora", que todos os territórios hierárquicos sejam bem marcados, bem delimitados - e se alguém não entendeu, isso sim é dizer: "Coloque-se no seu lugar".
Outros tantos vivem os conflitos religiosos: querem viver seus cultos de matriz africana, desde que a família não saiba disso. Estes são os mesmos que, mui prudentemente, descontróem este suposto sincretismo religioso brasileiro.
Não estou chamando estas pessoas de hipócritas. Afinal, elas não sabem ler os próprios gestos, as atitudes, as condutas que adotam - introjetaram o negócio, que se há de fazer?
Uns tantos pegam carona na superioridade de ser e de estar de seus mentores, orientadores, diretores e afins: copiam tanto tudo deles, para se inserir, que acham mesmo que chegaram a um ponto onde ninguém mais é capaz de chegar, a menos que possam se igualar à suas genialidades, inteligência e sagacidade incomuns. Mas, fazem o discurso da igualdade.
Não querem, no fundo, igualdade nenhuma: querem ser singulares, querem estar onde é difícil chegar e não permitir que mais ninguém chegue.
Às vezes falo na maior dureza aos meus alunos: " Todos são iguais perante Deus. Mas até lá, as leis são outras". Não estou me referindo a autoridade, a coisas do gênero, mas ao fato da Justiça, da Educação, das oportunidades não serem as mesmas para todos. Convém olhar o mundo como ele é.
Faço as minhas maldades se eu me sentir aviltada: sei ser reativa. Em pouco tempo devolvo na mais alta retórica qualquer agressão que eu venha a sofrer. Tive uma professora que me ensinou isso perfeitamente e me disse; "Você pode ser agressiva sem ser violenta!". Então já coloquei muita gente em seu lugar, porque sei o jogo e as cartadas.
Acredito que não possamos passar à margem das agressões: seja quando fui lembrada em minha condição de mulher, de afrodescendente, ou inferior hieraquicamente ( aqui incluídos meus duelos com os superiores hieráquicos na pós-graduação e no trabalho), nunca deixei de explicitar o que eu pensava e de devolver a pancada na justa medida. Uma das primeiras coisas que também aprendi foi o direito constitucional à "resposta à altura do agravamento".
E se ensino aos meus alunos o valor da sapiência - pois defino a sapiência como a capacidade de engolir sapos -é porque reconheço que em certos momentos a coerção pode ser grande e as consequências punitivas piores ainda. Mas acaba sendo uma questão de tempo - mais na frente a gente se encontra e descarrega os desaforos engolidos. Logicamente, a prudência é excelente conselheira. Mas, eu que sou vingativa, espero o tempo que for, remoendo na memória, com o mais sincero e assumido rancor. Está aí algo de que não tenho vergonha: minhas mágoas. O cordeiro está apenas como símbolo do meu signo: não sofro resignada.
Sim, bato a cabeça na parede, sou ariana. Entretanto, acho que devolver o tapa é uma questão de Justiça: bateu, levou. E se me oferecerem a outra face eu jamais bato: devolvo exatamente o que me deram, sem trapaças.
Mas, voltemos aos semelhantes: pois é, acho que não sou a única a gostar deles... prova disso é quanta gente quer converter a gente, quer fazer a gente mudar, mas mudar para ficar parecido COM (!). Como se não bastasse a cultura e todas as massificações pós-modernas, aliás, humanas, que esse troço não é coisa de anteontem. Takiupariu, hein, gente, não mudamos nunca! a humanidade é isso aí, uma agressão contra as diferenças - e tanto faz se se tratar de aqueus, hebreus, saxões, incas, ianomami, ostrogodos, maias,visigodos,tupinambá, astecas ou sãopaulinos - basta uma diferença no sotaque, na cor da pele, na sexualidade, no culto, no trejeito, na língua, no time, no bairro...

Gilberto Gil - A Raça Humana

A raça humana é
Uma semana
Do trabalho de Deus.
A raça humana é a ferida acesa,
Uma beleza, uma podridão.
O fogo eterno e a morte,
A morte e a ressurreição.
A raça humana é o cristal de lágrima
Da lavra da solidão,
Da mina, cujo mapa
Traz na palma da mão.
A raça humana risca, rabisca, pinta,
A tinta, a lápis, carvão ou giz
O rosto da saudade
Que traz do gênesis
Dessa semana santa
Entre parênteses.
Desse divino oásis
Da grande apoteose ,
Da perfeição divina
Na grande síntese
A raça humana é
Uma semana
Do trabalho de Deus.
A raça humana é
Uma semana.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Dádivas nada duvidosas


Eu acho que, realmente, algumas pessoas são sorteadas para usufruto pleno da felicidade.
Olha aí um dos meus ídolos, os Strokes: pegando somente o Julian Casablancas que, claro, mobiliza meus olhos e meus ouvidos (além de uns pensamentos inapropriados para este momento), tem fama, dinheiro, beleza, criatividade e uma série de coisas materiais e imateriais que não são para qualquer cristão. Eis um cara totalmente agraciado pelas dádivas divinas, pela sorte, pela genética, sei lá mais pelo quê porque o pacote é completo.
Desafiando as críticas contra as bandas com caras bonitos, nada consta contra os Strokes - o som é bom mesmo, não é rolo comercial para promover banda coloridinha, não.
Lembro daquela máxima que eu sigo por acreditar: Se não tens um palácio, enfeita a tua tenda.
Para o resto isso é aplicável - se não temos o corpo de topmodel, que pelo menos sejamos bem cuidados e saudáveis; se não temos inteligência, tenhamos capital cultural, leitura, criatividade, sagacidade... seja como for, é preciso compensar a falta antes de ficarmos olhando a grama do vizinho crescer vigorosa e as dádivas serem todas destinadas a um só sortudo.
Já falei e repito, porque me repito todo dia mesmo: sou a favor de qualquer mudança que traga bem-estar - então, faça plástica, vá à academia, procure um amante, mude de cidade, faça concurso, coma menos, poupe mais, se encha do que lhe dá prazer, saiba fazer abstinências, reconheça o momento de desistir e parta para outra; pare de gritar para quem não te ouve; duvide, acredite, aposte, dê um tempo
E isso eu diria especialmente a minha amiga Tella: se você não mudar essa história, sua história não vai mudar!
Quem sou eu para dar lições de vida a ninguém - eu , que mal sei da minha própria vida. Contudo, se abusam de minha solidariedade, tomem aí a resposta coletiva, minhas queridas amigas chegadíssimas.
De fato, cansei de ouvir os mesmos lamentos, chegar às mesmas conclusões e me apegar ao mesmo. Vamos trocar os mesmos por outros? mas tem que ser outros bastante diferentes, senão serão os mesmos! ah, adoro maluquices nonsense!
Por falar nessas coisas, pensei naqueles narigudos que eu adoro, do Arctic Monkeys: esteticamente, nada a ver com os Strokes. Mas, tá bom, gosto dos magrelinhos, branquelos e de cabelinhos meio Beatles. Explico que este é o meu tipo preferencial, mas não exclusivo.
Eles têm a beleza possível e têm talento - gosto de ouvir, de dançar, e de ver os clipes...
Não sei por que misturamos as estações: a beleza e o talento. Mas, poxa, que dupla!
Olhando bem para a foto, eu é que fico espantada com o Julian: vai ser bonito assim na casa da mãe!
Fora que as músicas deles embalaram tantos momentos felizes em minha vida, o que reforça o meu apreço - sorte que ganhei todos os álbuns da banda! Admito: o Ex-Grande Amor da Minha Vida era exímio em música e excepcional em notar minhas preferências - está difícil que issos e repita em outro cara! e não digo por saudosismo do Ex, mas de certos pontos da relação.
Mas, quanto à dádiva de ser feliz, pois é, se os deuses não me deram, eu vou construindo a minha, com alguma teimosia e a maior satisfação - e sou mesmo muito feliz em enfeitar a minha tenda.

The Strokes - Under Cover Of Darkness

Slip back out of whack at your best
It's a nightmare
So I'm joining the army
Know how folks back out, I still call
Will you wait for me now?
We got the right to live, fight to use it
Got everything but you can just choose it
I won't just be a puppet on a string
Don't go that way
I'll wait for you
And I'm tired of all your friends
Listening at your door.
And I want, what's better for you
So long my friend and adversary
But I'll wait for you
Get dressed jump out of bed and do it best
Are you ok?
I've been out around this town
Everybody's singing the same song for ten years
I'll wait for you
Will you wait for me too?
And they sacrifice their lives
In the land of all closed eyes
I've been saying a billion times, and I'll say it again
So long, my end
The sorry embrace
Don't go that way
I'll wait for you
I'm tired of all your friends
Knocking down your door
Get up in the morning and give it your all
So long my friend and adversary
I'll be waiting for you

Romance ideal


Na verdade, mesmo falando que os opostos se atraem, acho que prefiro os semelhantes, os semelhantes a mim, os parecidos.
Julgo que isso seja a marca maior de uma egolatria não declarada: com que boca cheia dizemos que nos vemos em alguém; com que satisfação constatamos que aquela pessoa “tem tudo a ver conosco”...
Ontem eu dei aquele aperto retórico em C. e fiquei indignada com o teor evasivo da resposta. Mas somos semelhantes. Então ele elabora um discurso lacônico, mas todo ponderado e eficiente, com uma maestria...
E não precisava se estender: como falamos a mesma língua, ele sabe que eu entenderei a linha, as entrelinhas e os intertextos.
Por sermos semelhantes, respondo com o meu silêncio que, aliás, é tréplica. Ele também faz isso comigo. Mas, se faço com ele, o silêncio dos tagarelas é sempre mais agressivo – ele lê que a coisa está feia.
Mas, no fundo são só jogos. Os jogos bobos entre os semelhantes, as tensões de angústias e os argumentos dele, entrelidos, de que eu só posso desejar o que eu não tenho, porque a posse leva ao desinteresse – eu, que nem sou possessiva e cujo ciúme é coisa figurativa e racionalizada.
Ele, pavão convencido, me diz na entre-sonoridade, como disseram os Paralamas em Romance ideal (“Não pedi que ela ficasse,/ela sabe que na volta ainda vou estar aqui”), que tudo pode ficar para depois, um pouquinho depois, que eu aguarde na lista de espera, porque ele já vem me atender.
E eu respondo com meu silêncio.
Ele põe a UFBA de cabeça para baixo: não estou, mesmo estando.
Deixo que ele conviva com o eco – somos semelhantes: sabemos ignorar, magoar, dissimular e deixar para depois, ainda que o depois nunca chegue.
Falei que é necessária disposição para a vida. Mais ainda é necessária a disposição para o amor: não tenho isso, porque não tenho paciência. E haverá amor sem paciência e sem tolerância? E que amor agüentaria estar no aguardo, na fila de espera?
Também sei adiar e fugir: penso em ir a São Paulo – onde também deixei alguém em espera, onde também me deixei em silêncio na hora em que me apertaram por uma decisão ou por clareza nas coisas.
Não estou disposta a.
Por egolatria também quero minha integridade emocional: nem uma vida de choros em aeroportos, nem ser terceiro plano na vida de um workaholic, nem relacionamentos funcionais, nem o descuido com quem me preenche os vazios das carências...
Não parece, mas eu respeito meu ficante – é que não há pactos, não há fidelidade forçada, não há a formalidade vazia e burocracias outras... minha amigas diriam que isso é um P. A., mas é muito mais que o P. para mim: é sobretudo o A. de amigo, nessa sigla-gíria que todo mundo conhece. Não há perdas: é tudo troca, bem justa, bem honesta.
Começo, por isso, a encontrar o problema de minha tese, que nada tem a ver com amores – grande pista!
E eu gosto da minha solidão, porque sempre confundi a solidão e a liberdade – e não serão irmãs?
Perguntado ao oráculo interior, ele me diria: “Mas tu sabes de quem gostas!”. E eu responderia: “Ainda quero ser livre!”. E então viria a réplica: “ Ou isto ou aquilo!”. E que Camões, Petrarca e as Cartas de São Paulo reforçam em tréplica: “É o estar-se preso por vontade!” – confusão nonsense que só os amigos íntimos entendem plenamente, com todas as vírgulas que ultrapassam o imediato reconhecimento literário.
Somos parecidos. Fiquem só com as três primeiras letras: PAR. Imagens, semelhanças e diferenças inegociáveis que não perdem nem mesmo para a novela mais clichê.
Para ele, o romance ideal. Para mim, a música é diferente:

Os Paralamas do Sucesso - Me liga

Eu sei, jogos de amor são para se jogar.
Ah, por favor, não vem me explicar
O que eu já sei, e o que eu não sei.
O nosso jogo não tem regras nem juiz,
Você nào sabe quantos planos eu já fiz
Tudo que eu tinha pra perder eu já perdi
O seu exército invadindo o meu país.
Se você lembrar, se quiser jogar
Me liga, me liga.
Mas sei, que não se pode terminar assim
O jogo segue e nunca chega ao fim
E recomeça a cada instante a cada instante.
Eu não te peço muita coisa, só uma chance.
Pus no meu quarto, seu retrato na estante
Quem sabe um dia eu vou te ter ao meu alcance
Ah, como ia ser bom se você deixasse...


Semelhantes, também, por Paralamas, Beatles, Strokes e um pouco mais que Quentin Tarantino - e o que é pior: temos mesmos e mais insuportáveis defeitos em comum.

domingo, 24 de julho de 2011

Vida, doce mistério


Às vezes nos surpreendemos com as mudanças dos nosso amigos: me surpreende que o namoro de Léo tenha dado tão certo quando ele manifestava tanta insegurança, incerteza e apego à relação fracassada com a ex. Hoje ele está bem diferente, mais confiante, mais disposto à vida.
Engraçado isso: a vida pede disposição.
Sempre que Cazuza cantava o Blues da piedade, dizendo: " Agora eu vou cantar para os miseráveis,que vagam pelo mundo derrotados/Para essas sementes mal plantadas que já nascem com cara de abortadas..." eu pensava nas pessoas indispostas para a vida.
Pessoalmente eu acho a vida um sacrifício. Tanto é assim que eu não tenho o menor interesse numa outra vida, nem em Eternidade.
Mas eu sei que a vida é sacrifício e o que eu posso fazer é desafiar essa "predestinação ".
Então sabemos que haverá sacrifício, sofrimento, perdas e angústias. Não há como evitar que aconteçam, mas há como diminuir sua duração.
É imprescindível ter disposição para a vida.
Então Léo era só angústia.
E era dependente de M. Muito dependente emocionalmente.
Meu raríssimo amigo, minha jóia singular (porque ser bonito, inteligente, solidário, companheiro, sensível, interessante e criativo, tudo isso de uma só vez, não é para qualquer homem) não tinha lá muita noção de seus predicados.
Conversamos rapidamente num dia desses e eu vi o meu amigo feliz. Acho que eu nunca tinha visto este meu amigo feliz. Nunca. Nem quando a gente se conheceu numa festa lá no Rio Vermelho, nos idos do ano 2000.
talvez nem ele achasse a felicidade possível. Eis agora a felicidade e o humano medo de que ela dure pouco, como se felicidade fosse um presente e não o pagamento por seus próprios esforços em largar a borda da piscina e atravessá-la sem medo de se afogar ou apesar do risco de se cansar, de se afogar.
Também hoje meu ficante me ligou e me disse que passou no vestibular.
Pronto, depois desta minha "deixa" meus amigos vão começar a me dar indiretas! Mas ele tem 24 anos, viveu uns tempos na Suíça e voltou todo largado da vida... e ficou assim uns dois anos.
Ele achava esquisito que eu gostasse de estudar. Falava sempre disso - e eu, insensível, não entendia que aquilo era uma fase.
Recentemente ele disse que iria aproveitar o seu conhecimento de francês para alguma coisa: fiquei feliz por isso, pela aprovação dele no vestibular da UEFS.
Imagino a cara dele nas aulas de Teoria da Literatura, que ele deve achar um porre!
imagino o que ele vai fazer para tocar as transcrições fonéticas e sonho com o dia em que poderemos discutir mais do que música pop e rock and roll.
Não gosto de pensar a vida tal como Eduardo e Mônica: "Ela fazia medicina e falava alemão / e ele ainda nas aulinhas de inglês./Ela gostava do Bandeira e do Bahaus, Van Gogh, dos Mutantes,de Caetano e Rimbaud./ E o Eduardo gostava de novela e jogava futebol com seu avô."
E eu nem sei porque escrevi "ficante". Deve ser por causa da indecibilidade (ou isto ou aquilo)ou por que os meus amigos ficam me apertando para assumir que eu não sou tão só quanto eu digo.
Sou sozinha e sou solteira. É que tenho carne e coração e uns relacionamentos pendentes e imprecisos.
Sou impaciente, ou sei lá o que que eu sou, mas não namoro ele não: é complicado e interessante. Acho que justamente porque é interessante subsiste de alguma forma, mas não estou muito disposta.
Ele também vai mudar.
Gosto disso: pedras que rolam.
Acho excitante o fim de um ciclo e o começo de outro.
E aqui estou eu, também finalizando um ciclo - feliz, feliz, bem feliz por virar páginas e iniciar uma nova etapa...

sábado, 23 de julho de 2011

A força da imaginação, II


Estou longe de casa - sem o menor referencial imaginativo, pois esta terra é ruim de homem e ainda mais de heterossexuais e pior ainda de heterossexuais com iniciativa.
A ginecocracia me enlouquece: não aguento ver tanta mulher, trabalhar com tanta mulher, dar aula a tanta mulher, conviver com tanta mulher...
Em pouco tempo fico farta da ginecocracia, perco o pouco juízo e sanidade que me resta... que falta faz a testosterona alheia!
Lá vou eu, ao reino da imaginação, porque pelo menos ver a imagem me faz lembrar em como é na realidade - só imaginação mesmo, porque também não há privacidade nem clima para qualquer ação paliativa.... ah, que falta faz estar em casa.

A força da imaginação, I


Há coisas impossíveis e coisa improváveis.
Há coisas que não fazem o menor sentido e coisas em que não dá para acreditar.
Há coisas que nem são um terço do que parecem ser e há coisas que nos surpreendem, excedendo a nossa expectativa.
E dentre essas coisas estão aquelas outras que só podem caber no reino da fantasia...

Back to black


Eu nem acredito que a Amy Winehouse morreu. Duvido, ando pelos portais online, seriamente acreditando que é tudo marketing, vírus, invencionices...até porque as declarações são todas receiosas, do tipo: "Sky News e Press Association noticiaram a morte da cantora Amy Winehouse, neste sábado".
Todo mundo tem angústias. Umas menos explicáveis que as outras, mas é sempre curioso pensar na angústia daqueles que supostamente têm tudo - fama, juventude, riqueza, amores, fãs, liberdade, amigos, inteligência...
Eu achava o Kurt Cobain um idiota - já foi tarde! se achava tão especial que julgou que era a vida que não merecia ele.
Outra coisa é Jim Morrison: este, sim, poderia ter demorado um pouco mais sobre a face da terra...
Inventamos que Elvys não morreu,apenas foi enterrado.
Achamos que as pessoas famosas que morrem, na verdade não morrem: assumem outra identidade, em outro lugar, em outras circunstâncias...
Deixam a vida para entrar no rol das lendas urbanas.
Ou esperamos a volta de alguns mortos, porque muitos de nós também sonham em voltar.
Se Amy morreu ou não, minha vida não muda por causa disso. Eu gostava de algumas músicas que ela cantava e achava divertido que as bebedeiras dela fossem parte do show. Toda platéia esperava por isso: ver a Amy se entupindo de vodka, toda magra, toda horrorosa, com 15 anos a mais na cara do que na Certidão de Nascimento.
Bom, back to black, como disse a própria

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Na torcida


Estar longe de casa me deixa louca, principalmente porque se há algum tempo livre é uma excelente oportunidade de dormir – e eu não gosto de desperdiçar as oportunidades. Mas, me dá uma saudade de tudo!
Sei é que tenho cerca de 74 e-mails do Hotmail para responder; parabenizações em atraso, recados do Orkut para ver e responder, telefonemas para dar e, quando enfim chegar domingo e eu puder estar em minha casa, vou entristecer porque sei que na outra semana tudo recomeça.
Mas, graças a Deus, recomeça para terminar em definitivo.
Fico automática quando estou aqui: não vejo sequer o noticiário - Não só porque não quero, mas porque tenho que optar entre ver TV e aproveitar o tempo curtíssimo para as coisas cotidianas.
Não me sinto em casa em nenhuma casa que não seja a minha, eis a repetida verdade.
Como vou começar a dar as devidas respostas aos que me enviaram mensagens, então, mesmo extemporaneamente, lá vai a quem em perguntou se eu não torço pela seleção brasileira: Não, geralmente eu torço pela seleção que tenha os caras mais bonitos – portanto, deduzam minha predileção pelo Roque Santa Cruz, que não tem aquela beleza artificial plastificada, mas consegue ser lindo com tudo que tem e do jeito que é.
Declaro para os devidos fins que em dia de jogo da seleção brasileira contra o Paraguai, fico na torcida pelos adversários.
Torço pelos argentinos lindos, pelos uruguaios lindos e isso justifica minha atenção pelo futebol. Pelo menos diversão para os olhos e malícias para as mentes criativas o futebol consegue dar: este é o jogo.
Por outro lado, eu torço mesmo é para o tempo passar e eu poder, finalmente, invadir a grande área de minha casa. Aí, sim: Descanso 10 X 0 Trabalho.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Das políticas


Pois é, olhando esta imagem eu só penso no quanto realmente estão errados aqueles que acham que a história se repete.
Ora, quem te viu, quem te vê.
E não duvidem de Heráclito, porque o devir é muito mais poderoso do que o Destino, (este em que creio tão menos quanto em cartomantes...Destino...).
Não é mentira que os homens repetem atitudes, receitas, palavras, erros...
Quando recebi o e-mail que continha esta imagem, enviado por uma aluna minha, achei incrível. Realmente, uma imagem histórica: Lula e Fernando Henrique Cardoso panfletando juntos.
Um dia já tiveram ideologias parecidas. Um dia, talvez tiveram o mesmo ideal de nação.
Depois envelhecem. Envelhecem seus ideais. Amadurecem como políticos. Apodrecem com a experiência.
Pensei no casamento dos outros: um dia já foram assim - os mesmos planos, os mesmos sonhos, os mesmos pensamentos... depois tudo vira rotina e sufocamento. Coitados!
E eu, que não sonhei com os sonhos dos outros?
Um dia L. estava insinuando (ou era perguntando?) se eu estava apaixonada por ele. Sim, eu estava. Eu estava apaixonada ao longo de todas aquelas horas e me apaixono facilmente por quem me oferece um orgasmo, segurança e uma conversa criativa - "Sou um animal sentimental/me apego facilmente/ao que deperta o meu desejo..."
L. não entendia disso, do amor verdadeiro-instantâneo-temporário. Era tudo verdade. Sempre foi verdade no circuito do momento. E neste momento, passo por aquela crise de focalização: estou focalizada na tese, não penso em nada, não sinto falta dele nem de nenhum outro homem. Na verdade, sinto: sinto muito por estar assim.
Mas eu sou atenciosa, presente, carinhosa, dedicada e companheira com toda a sinceridade - sou tão sincera que vivo me expondo.
Amor e política devem ter tudo a ver mesmo: numa hora a gente panfleta juntos, numa outra, vira oposição; numa hora temos uma base aliada, numa outra a bancada da oposição manda e desmanda; numa hora tudo é democrático, noutra, é só ditadura...
Já ouvi tantas promessas de campanhas dos meus candidatos a namorados!
Já ouvi a plataforma de governo de tantos candidatos...e se vencem o pleito, não cumprem suas promessas.
Seguem as negociatas, as propinas, os exílios, as assembléias para discutir problemas, as comissões parlamentares para apurar infidelidades (partidárias ou não), sessões plenárias inúteis que confirmam que dois monólogos não formam um diálogo e, não muito raro, acontecem um impeachment.

domingo, 17 de julho de 2011

Problemas no amor?


Esse realismo é mesmo fantástico!
Se você quer a pessoa amada de volta, não precisa mais se iludir com falsas promessas e propostas pouco confiáveis.
Esqueça já as plataformas de trabalho das cartomantes, espíritas e videntes: procure esse aí, que traz a pessoa amada aos seus pés (amarrada, amordaçada e imobilizada).
A base da pancada é infalível para trazer a pessoa amada de volta: faça já o seu trabalho de base. Trabalhos rápidos e garantidos: tenha fé!

Quem tem problemas...


É, tem gente com muito mais problema do que eu, hein?
Como é que a pessoa consegue fazer tanto malabarismo com pronomes? "me torna-se..."
E eu aqui, procurando problemas...
(Imagem colada do Kibeloko, o blog que eu adoro!)

Procurando problemas


Eis uma rara ocasião em que não ter um problema é o maior problema: estou em crise com a minha tese porque não acho que meu problema esteja devidamente delimitado.
Para quem já passou pelo mestrado, fácil é concluir que a responsabilidade moral com aquilo sobre o que se escreve aumenta conforme o grau a que se destina. Deste modo, vejo que fiquei navegando nos mares das generalidades e isso me incomoda muito. Agora o meu problema está em repensar meu problema de pesquisa. E aí, qual é o problema?
Interessante é que a problematica é clara, ainda mais porque focaliza a literatura do final do século XX e seu entorno que bate, justamente nas figurações da nacionalidade.
Minhas hipóteses, também, estão na cara. Nenhum problema com elas - poxa, preciso de um bom problema!
Sem nenhuma lamentação, fiquei ontem à noite em casa, conversando com papéis.
Depois, falei com Tati e ela me perguntou: "Mara, qual é a sua tese?" e eu respondi, sem hesitar. E o veredito? eu não tenho problema.
Em qualquer artigo ou ensaio a primeira coisa a ser deixada clara é o objetivo. E se algum esnobe pseudo-intelectual me disser que isso é primário, sinto muito, isso se chama clareza. Do contrário as coisas flutuam, ficam na superficialidade e você não tem noção sequer de onde quer chegar.
O meu problema em refazer o problema passa, antes, por estabelecer claramente as diferenças que existem dentro dos velhos problemas evocados pela literatura de diferentes gerações, em contextos diferentes, conforme as obras que eu escolhi.
Se tem uma coisa difícil de dizer é o óbvio, sem ser óbvio. Na cabeça de quem propõe a pesquisa e a desenvolve, tudo é claro, tudo está ali. Difícil, porém, é fazer com que quem lê ou ouve o que daquilo deriva entenda, localize - e talvez esse seja o ponto crucial, quando a gente despersonifica a pesquisa.
A tese é minha, mas não é somente para mim.
No raio de comunicabilidade de qualquer pesquisa, tem que ter a esfera da recepção.
Há sessões de defesa pública não apenas por um ato burocrático, mas para tornar público os resultados de uma pesquisa. Então, não posso bancar a autista, me apropriar do que é meu até certo ponto, mas que não foi feito para o meu umbigo.
Mas, então, pergunto a mim mesma a melhor forma de comunicar meu problema. Resposta: "Não sei!".
Ligo para a Central de Auxílio Intelectual João Neto Company Research, em Muritiba, e a ele as coisas parecem claras, restando-me apenas a formulação do que já enunciei.
Continuo com problemas, porque estou sem problema na pesquisa - princípio da contradição, não parece?
Quando estou nesse patamar, juro: me desligo da vida e vivo somente para a pesquisa.
Sei lá o que me dá, mas me concentro de um modo bastante esquisito, porque além de só pensar nisso, não tenho vida pessoal nesse momento. Acho que a cidade pode explodir que eu fico aqui, parada, pensando que não há problemas em terminar os capítulos, em fazer as coisas textuais em si, mas que preciso de um bom problema que justifique que aquelas coisas de que trato sejam efetivamente uma tese.
Não penso na festa, nem em namoros, nem nas faltas, nem nas ausências.
Não quero saber do problema de ninguém - a não ser que alguém queira, no sentido da pesquisa, criar problemas para mim.
Falar sobre o problema, escrever sobre o problema pode clarear meus caminhos, por isso estou aqui escrevendo sobre o problema.
Tércia me advertiu: "Quando a máquina parar (referência aos meus dois neurônios), faça alguma outra coisa, mesmo que seja um trabalho doméstico ou uma futilidade. Saia do clima, do entorno, distraia a mente e volte a criar depois." Excelente conselho.
Para quem odeia estudar, eu diria: leia em pequenas doses, mesmo que sejam 20 minutos de manhã e mais vinte à noite.
Quer ler 600 páginas mas não consegue passar das 10 primeiras? parcele já suas 600 páginas em 10 vezes de sessenta ou em 20 de trinta, sem juros. Bem fácil: leia 15 páginas num turno e mais 15 em outro, divida como lhe aprouver, mas reserve um tempo para isso.
E quando a gente estuda, ferra tudo: o telefone toca, os amigos chamam, coisas mais prazerosas e convidativas nos aparecem... em meu caso, desligo tudo. Se eu puder, me tranco em casa, por isso que me desligo dos fatores externos. Entretanto, se a gente ficar nessa por muito tempo, piora mesmo.
Falando nisso tudo, cada um com os seus problemas não é? deixa eu ir procurar os meus.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Causas e casas


Não sou dessas pessoas bobamente otimistas que dizem que há males que vêm para o bem. Pelo contrário, há coisas boas que deságuam em tragédias e fazem com que, contraditoriamente,as coisas boas venham para o mal.
No caso mais simples, é como se de repente você estivesse bem, obtivesse pequenas conquistas e visse que despertou a inveja furiosa de alguém.
Mas, também, não sou muito de ficar parada reclamando. Reclamo e me mexo, reafirmando que "Os incomodados são os que MUDAM".
Sei, também, me retirar quando a festa começa a ficar ruim: não me apego a nada, especialmente a empregos, lugares e situações. Se algo me prende é, de fato, a minha casa.
Agora, que pelo jeito precisarei pensar e seriamente planejar uma ausência prolongada de minha casa - tudo bem, ainda tenho bastante tempo - encaro tudo como um misto de sonho e pesadelo.
Lembrei do que eu disse, em Campinas, a Allan, quando ele me perguntou se eu morava sozinha e por que. Eu, então, disse, sem a menor filosofia: "Todo bicho tem que ter a sua toca".
Eu não ligo para aquela solidão mais geral, de não ter a quem recorrer, nem um ombro para o meu consolo, nem um chá num momento de febre. Eu ligo, sim, para minha casa. Esta é a minha casa e dela faz parte o meu idoso, mas jovial e saudável, cachorro Bruno.
Sim, eu já namorei um sujeito chamado Bruno, ano passado. Mas resolvi fazer a ressalva para que não pensem que estou fazendo trocadilhos. Sinto saudades do meu cachorro onde quer que eu vá e tenho medo de não aproveitar a presença dele em minha vida.
Uma amiga minha, que muito me ajudou no começo de minha carreira profissional, Landa, dizia que estar longe de casa - ela que arrastou a família nuclear toda consigo onde foi - era uma perda. Nós ganhávamos dinheiro, embora nem tanto, mas perdíamos muito.
E ela falava da irmã, também minha amiga: "Certa está M., que vive com o que basta, mas está ali, ao lado do que realmente vale, que são os meus pais. Mara, um dia eles morrem. E eu? eu não vou ter aproveitado a vida ao lado deles, eu não vou ter aproveitado a existência deles, eu vou ter perdido demais."
A geopolítica de nossa carreira já tinha ido longe demais e a dela e a minha ainda iriam nos pregar boas peças - ela, trabalhando a 16 horas de casa; eu, a 10 horas de minha toca.
O bom é que o tempo passa e a gente passa a ter mais escolhas.
O que para muitos é uma oportunidade tem também o seu lado de sacrifícios e perdas.
Também estou há dois dias tentando falar com Jean-Paul, que foi justamente vender a alma ao mesmo capeta para o qual minha citada amiga e eu já vendemos (sorte foi que pagamos a hipoteca). E o Capeta lá pede Dedicação Exclusiva.
Como as contas falam mais alto nesses momentos - e imagino a dor que ele deve sentir por estar longe do filho para ganhar o pão e construir a porcaria da carreira no nível superior - faz-se a negociata. E esses lugares sempre nos levam mais do que simplesmente a alma.
Penso, contudo, que todos nós temos capacidade de adaptação.
Penso, ainda, que chega um ponto em que somos um pouquinho mais orgulhosos e sabemos fazer exclusões - e assim foi, no ano passado, quando eu me inscrevi num concurso, poderia resolver a pendência da inscrição (simplesmente um cabeçalho), mas vi que eu nunca seria feliz ali, naquela cidade, no verdadeiro "vale da sombra da morte", porque é confinada num vale entre despenhadeiros, porque eu abomino aqueles entorno - previamente, um ano antes, escrevi sobre ela, para que não pareça indireta para terceiros.
Recentemente também recusei uma oferta: não quero ir para lugares que definitivamente eu não gosto. Já me basta o sacrifício de viver durante alguns dias fora de minha toca ( o que realmente me toca).
Aí ando tão ocupada quanto antes, sem a menor condição de dar atenção aos desesperos pessoais dos meus amigos bons e daqueles outros, os oportunistas e egoístas, que funcionalmente me procuram.
Prezados amigos: no momento encontro-me fora de área e temporariamente desligada. Após o sinal, deixem as suas mensagens.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

À sombra do Pai


Uma vez, quando eu tinha uns 07 anos, foi logo após a morte de minha avó paterna, ouvi o meu Pai dizendo, em referência a mim: “E eu tenho esta cruz para carregar...”.
A cruz é o sacrifício e o calvário, mas é também o peso. E o peso ( e não a leveza) é o que nos mantém com os pés no chão, presos à realidade, com senso de realidade.
Ilmara comentava comigo, numa certa vez, em contestação à minha decisão de não ter filhos: “Eles me dão senso de existência. Eu não viveria sem eles, eu não existiria sem eles. Antes, se você me chamasse para ir para o meio do mar, sem qualquer certeza de sair de lá viva, eu iria”.
Eu não quis o peso deliberado de sustentar outras existências e de ser responsável por elas: sei que a existência, mais do que um calvário, é já um peso. Nem todos suportam carregar o peso e nem todos têm a alternativa de se dar à leveza, tipo eu, que posso ir para onde eu quiser, que não deixarei órfãos caso eu morra antes do que espero, que vivo a minha vida para mim.
Numa sessão de análise completei o raciocínio da cruz para carregar: eram as minhas lembranças de quando a minha avó se exasperava, gritando pela casa, que se o meu Pai ia para o pecado do adultério com a minha posterior madrasta, que retirasse o crucifixo do pescoço, que não levasse Nosso Senhor consigo para o pecado. No simbólico, vi que o meu Pai me carregava junto (a cruz) para o pecado.
Na verdade, logo percebi que a minha avó tinha medo de que o marido de minha madrasta flagrasse os adúlteros e agisse com a violência típica e legalmente compreensível dos traídos. E vivi esta apreensão por muito tempo, até que o marido de minha madrasta morreu e aquela relação saiu da clandestinidade que o deixava suscetível a ser morto.
Não obstante, demorei muito a matar meu Pai no simbólico. E aquela velha paredinha, aqueles tijolinhos ínfimos, restantes do muro a derrubar dentro de mim continuam, mesmo que quase insignificante.
Meu Pai passou o sábado atrás de mim.
Como eu estivesse na estrada, preferi não atender ao telefone, até porque o sinal iria cair mesmo...
Finalmente ele me encontrou e falou comigo como se eu fosse a maior especialistas em dramas existenciais de todo o planeta.
Ele se queixou de que não conseguia ter alegrias, que ficava contemplando a vida como se não vivesse, que não tinha reações às coisas que outrora o deixavam feliz, falou de tantas coisas, de tal maneira que parecia uma pessoa de carne e osso.
O caso é que eu, de fato, diagnostiquei a crise e concordei que ele procurasse um psicanalista – embora eu saiba que a relação será infrutífera...mas, vai que eu me surpreenda?
Então, me vi na cara do meu Pai.
Se há uma coisa que eu não tenho é esta imbecil curiosidade genética acerca de “como seria a cara de um filho” e daí que me ver na cara do meu Pai foi bem esquisito.
Mas me vi nisso que eu sei e que ele admite: nossa relação com a morte.
Para ele é um pouco mais difícil, porque o meu avô sempre deixou claro que só vale a pena existir enquanto somos jovens. E ele (meu avô) morreu bastante jovem, já se sentindo velho e dizendo, lá nas palavras do Dr. Domingos, o meu avô outrora todo poderoso dono das Minas Gerais, a morrer sem posses: “É preferível ser um jovem pobre a ser rico e velho!”.
Daí que meu Pai se relaciona mal com os sinais do tempo: com o coração, que ele estranha tanto, com algumas varizes e dores na perna, com a corrida matinal e com o futebol que já começaram a ser abolidos... e sente como se aquele corpo não fosse o dele. E olha que ele entrou nos sessenta anos agora!
Às vezes multiplica as preocupações estendendo-as a mim, na insistência para que eu faça um exame de glaucoma, que acompanhe minha pressão... e pouco acredita que estes exames, em meu caso, apontem normalidade.
A diferença nesta nossa relação com a morte está no fato de que penso nela desde cedo e já vi a morte de alguns parentes próximos, de modo a saber, sem a menor preocupação ou pavor, que vou morrer de aneurisma, como minha tia e meu primo.
Manoela conversava sobre isso lá no Rio, dizendo que ela já perdeu dois irmãos, todos de aneurisma...a vez dela chegaria e isso nos coloca muito a par da presença da morte. Embora não haja data certa, entrar nos trinta anos indica esta proximidade - os irmão dela, entre os 33 e os 36 anos. A partir daí, qualquer hora é hora, se o cronograma atávico da morte se cumprir à risca.
Mas nós naturalizamos isso. Temos pena dos colegas que nos vêem discutindo isso e, covardemente, tentam mudar o assunto.
Para meu Pai, ela, a morte, se afigura nos sinais biológicos da degradação dos anos: aquele coração, que já não é o dele; aquelas pernas...onde foram parar as dele? E um estranhamento monstruoso com este corpo que não é mais aquele com o qual ele conviveu tanto tempo e que respondia tão bem aos seus propósitos.
Não quero morrer de acidente de carro e se há um medo, em relação à morte, é o de definhar: de ficar em coma, de não ter como me comunicar...faço pactos absurdos com os meus amigos e parentes e desde os 16 anos, quando votei pela primeira vez e tive que refazer minha carteira de identidade justamente para votar, me declarei doadora de tudo.
Quando eu morrer, levem tudo e aproveitem que é liquidação: sou doadora de órgãos.
Como não morri ainda e não sou mal humorada, até lá, espero que alguns homens interessantes também destinem certos órgãos de meu interesse para o meu deleite em vida. E como a ideia aqui é da reciprocidade, também me doarei plenamente.
Nos meus pactos absurdos, eu que sou a favor da eutanásia, já disse: gente, não delonguem o meu sofrimento, nem cansem as máquinas! Ao menor descuido dos médicos facilitem a minha morte porque existir é um pouco mais do que respirar com a ajuda de aparelhos.
Para quê tanto medo de "andar pelo vale da sombra da morte"?
Sei que o meu pai sofre. Hoje, quando já matei o meu pai no simbólico, percebo-o além do homem de valores questionáveis, senão da ausência total de valores, mas que sofre e estranha a si mesmo, não se reconhece neste que ele está se tornando.
Eu nunca tive medo real da morte,acho que o meu pai também não tem em certos aspectos: tenho medo de sofrimentos mas estes a existência já me deu demais.
Por isso sou teimosa, procuro ser feliz e não discuto isso agora por estar infeliz, não. Pelo contrário, estou num bom momento – tanto que falo do Pai tranquilamente.
E da vida, fico como Caetano: " Eu digo que ela é gostosa!", apesar de tantas vezes ter os seus amargores e suas amarguras - tempero do meu jeito sempre que posso.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Outros sabores


Nosso amor é uma vereda onde a lua se derrama.
Somos lenha e labareda, uma paixão em plena chama.
Sei que a vida tá brabeira, tanto amor na corda bamba,
Que a aleria é passageira, frágil como porcelana
É, as vezes tudo é lindo, às vezes tudo engana...mas
Basta um beijo teu e eu...
Ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai.
É, às vezes tudo é lindo, às vezes tudo engana.....mas
Basta um beijo teu e eu...
Ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai .
Pudera! Você é o grande amor da minha vida.
Pudera! Você é o grande amor da minha vida.
Baile, fiesta ou domingueira, saca a banda, vem me chama
Pra essa salsa brasileira, meio Rio, meio Havana.
Dança,roda e serpenteia ou me leva então pra cama
Ao som do Guantanamera, Noches de Copacabana.
É, às vezes tudo é lindo, às vezes tudo engana...mas
Basta um beijo teu e eu...
Ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai.
É as vezes tudo é lindo ás vezes tudo engana...mas
Basta um beijo teu e eu...
Ai, ai, ai, ai, ai, ai, ai.

(Ai, ai, ai, ai, ai - Ivan Lins)

Coisas bem gostosas


Tive bons sonhos e isso me ajudou a ter um bom dia, talvez mais otimista, porque quando a gente começa a se sentir feliz de graça é porque está enxergando graça na vida.
Aí fiquei feliz por uma grande realização. Eu disse grande, não grandiosa, porque , afinal, não tem nada de extraordinário nisso: finalmente eu consegui fazer um risoto.
Não foi um arroz empapado, sem graça, foi um grande risoto, com especiarias boas, com a escolha do parmesão adequado, com o cuidado do creme de leite certo e com a escolha minuciosa de tudo.
Além disso, falei com o meu amigo Júlio e conversei com os meus próprios preconceitos internalizados e, para arrematar o efeito do bom sonho, a pessoa dos meus sonhos escreveu para mim.
E como há dias iluminados, estou feliz com todos os meus poros, com todos os meus sentidos, comigo mesma.
Fiquei como Zeca Baleiro em Telegrama. E como os meus dois ex-namorados estivessem no MSN, fui cortês, cordial e amiga, de forma que fiquei bem comigo mesma - sei que pode parecer a eles que a naturalidade em minhas respostas fosse típica da indiferença total, mas não era não. Há dias de reconciliar, no sentido de seguir em frente e não ficar machucando os calos dos passado, porque se há marcas de hematomas, a verdade é que devemos ver que acabou e tratar das cicatrizes.
Mas, voltando ao meu risoto, da maneira mais exibicionista do mundo, se eu pudesse teria chamado os meus amigos aqui em casa, porque se há algo em que sou convencida é nos pratos que sei fazer.
Esse eu não sabia. Por saber que eu não sabia, nunca havia feito até hoje.
Tudo partiu d euma inveja gastronômica:fui numa destas quinta-feiras jantar com Tella no Rizzo do Ville Gourmet.
O risoto de parmesão chegava a ser erótico e imoral, de tão gostoso.
Pensei: eu nunca faria um desses.
A conta foi astronômica - não fosse assim e eu teria ido lá, como um viciado qualquer.
Não gosto de comer a comida que eu faço e também não é todo dia que quero cozinhar, por isso almoço fora.
Esse não gostar de comer é que quando eu cozinho eu gosto de partilhar - deve fazer parte do meu exibicionismo culinário, porque sei que faço o melhor pudim de leite e o melhor feijão deste nosso Continente. Daí que o elogio deve vir de sobremesa.
Mas hoje eu estava a fim de um risoto daquele e aí pus o bloco na rua, o arroz na panela a cozinhar e parti para a internet em busca de receitas.
Não vi nada de acordo com o que eu procurava, mas vi o que deveria fazer para que ele saísse bom. Apostei e venci: comi a panela inteira de risoto, feliz da vida, desafiando os efeitos calóricos do prazer gastronômico.
E uma coisa eu aprendi com uma amiga minha que admirava minha louça:comida precisa de enfeite, porque a beleza, além do cheiro, aumenta o apetite.
Essa amiga dizia que minha louça parecia de casa de boneca e que jamais deixaria de usar aquelas guarnições, se fosse ela, porque comer no prato certo, com a louça bonita torna tudo mais gostoso.
De fato, hoje eu penso que minha louça parece lá daquele chá da Alice no País das maravilhas, na versão da Disney. E com ela eu tomei muito chá e um certo café da tarde, que era servido às 17 horas, por mim, quando trabalhávamos num mesmo lugar e ganhávamos uma nota preta que gastávamos inconsequentemente em coisas supérfluas, sem pensar no amanhã.
Será que tem disso, de riso e de risoto? onde uma coisa gerou a outra? deixa para lá.

Zeca Baleiro - Telegrama

Eu tava triste,tristinho!
Mais sem graça
Que a top-model magrela
Na passarela.
Eu tava só,
Sozinho!
Mais solitário
Que um paulistano,
Que um canastrão
Na hora que cai o pano.
Tava mais bobo
Que banda de rock,
Que um palhaço
Do circo Vostok...
Mas ontem
Eu recebi um Telegrama:
Era você de Aracaju
Ou do Alabama,
Dizendo,
Nêgo, sinta-se feliz
Porque no mundo
Tem alguém que diz:
Que muito te ama!
Que tanto te ama!
Que muito muito te ama,
que tanto te ama!...
Por isso hoje eu acordei
Com uma vontade danada
De mandar flores ao delegado,
De bater na porta do vizinho
E desejar bom dia,
De beijar o português
Da padaria...
Mama, Oh Mama! Oh Mama!
Quero ser seu,
Quero ser seu,
Quero ser seu,
Quero ser seu papa!...
Eu tava triste,tristinho!
Mais sem graça
Que a top-model magrela
Na passarela.
Eu tava só,
Sozinho!
Mais solitário
Que um paulistano
Que um vilão
De filme mexicano
Tava mais bobo
Que banda de rock,
E um palhaço
Do circo Vostok...
Mas ontem
Eu recebi um Telegrama
Era você de Aracaju
Ou do Alabama,
Dizendo:
Nego, sinta-se feliz
Porque no mundo
Tem alguém que diz:
Que muito te ama!
Que tanto te ama!
Que muito te ama!
Que tanto, tanto te ama!...
Por isso hoje eu acordei
Com uma vontade danada
De mandar flores ao delegado,
De bater na porta do vizinho
E desejar bom dia,
De beijar o português
Da padaria...
Me dê a mão, vamos sair
Prá ver o sol!
Mama! Oh Mama! Oh Mama!
Quero ser seu,
Quero ser seu,
Quero ser seu,
Quero ser seu papa!...

domingo, 10 de julho de 2011

Assim falou Belchior


Eu sei que dizer isso é ir contra a corrente das opiniões convenientes em sentido político, mas não é qualquer Zé Mané que é cantor, não, gente boa! e aí, para quem quer promover a inclusão, favor não me incluir entre os chamados ecléticos - a orgia brega musical supostamente em favor dos menos favorecidos pela escolaridade e pelos ganhos materiais.
Eu não espero que um Belchior vá ter o mesmo espaço na mídia que têm os grandes nomes da música atual, como Restart, Fiuk, Calcinha Preta. Nem se compara!
Mas, pensando em quanto eu gosto do Belchior, faz muito tempo que eu fico tomando de empréstimo as palavras dele, porque "Eu não estou interessada em nenhuma teoria, em nenhuma fantasia, nem em romances astrais"...não sou da auto-ajuda, não sou esotérica e não acredito em cartomantes: tenho a mais honesta orfandade espiritual que alguém pode ter.
E de mim, também: "longe o profeta do terror", porque eu não estou nem aí para o fim do mundo. O fim está próximo? pois, que seja próspero!
E assim como Belchior, "Meu delírio é a experiência com coisas reais": tem alucinógeno pior do que a realidade? tem horas em que a gente vê cada coisa que chega a questionar se vê mesmo aquilo ali ou se está delirando.
E das imagens da vida urbana, olhe que o cara, o Belchior, já se espantava com o Rio e com São Paulo na década de 70. Que diríamos de hoje? "Um preto pobre,um estudante, uma mulher sozinha,Blue jeans e motocicletas, Pessoas cinzas normais, /Garotas dentro da noite,
Revólver: cheira cachorro! /Os humilhados do parque /Com os seus jornais..."
Será que assim como falou um certo humorista há uns anos, "Ainda somos os mesmos e vivemos/como Belchior?".
O que é mesmo estarrecedor são essas "pessoas cinzas normais": as pestes das pessoas normais são cinzentas como o cimento, não têm cor, não são nada, se confundem com a paisagem arquitetônica da cidade. Eu é que não quero ser cinza, não quero ser normal. E não quero ser cinza porque não quero ser cremada: deixe que os vermes se alimentem, me deixem barro, me deixem voltar à terra - eis quem vai me comer, porque por enquanto quem anda me comendo, quem anda me dando uns pegas é o tempo. E eu já disse antes: como sou heterossexual, deixem o chão me comer, porque ele é substantivo masculino. E heterossexual que se preza gosta do sexo oposto até debaixo d'água...ou melhor, da terra!
E a solidão das pessoas nessas capitais é mais que óbvia - e já não falo disso porque passei meu mestrado escrevendo sobre. Basta!

Belchior - Alucinação

Mas, eu não estou interessado
Em nenhuma teoria,
Em nenhuma fantasia,
Nem no algo mais.
Nem em tinta pro meu rosto,
Ou oba oba, ou melodia,
Para acompanhar bocejos,
Sonhos matinais...
Eu não estou interessado
Em nenhuma teoria,
Nem nessas coisas do Oriente,
Romances astrais.
A minha alucinação
É suportar o dia-a-dia
E meu delírio
É a experiência
Com coisas reais...
Um preto, um pobre,
Um estudante,
Uma mulher sozinha;
Blue jeans e motocicletas,
Pessoas cinzas normais,
Garotas dentro da noite,
Revólver: cheira cachorro!
Os humilhados do parque
Com os seus jornais...
Carneiros, mesa, trabalho
Meu corpo que cai
Do oitavo andar
E a solidão das pessoas
Nssas capitais.
A violência da noite,
O movimento do tráfego,
Um rapaz delicado e alegre
Que canta e requebra
É demais!
Cravos, espinhas no rosto,baby
Rock, Hot Dog
"Play it cool, Baby"
Doces jovens coloridos,
Dois Policiais
Cumprindo o seu duro dever
E defendendo o seu amor
E nossas vidas;
Cumprindo o seu duro dever
E defendendo o seu amor
E nossa vida...
Mas eu não estou interessado
Em nenhuma teoria,
Em nenhuma fantasia,
Nem no algo mais.
Longe o profeta do terror
Que a laranja mecânica anuncia.
Amar e mudar as coisas
Me interessa mais
Amar e mudar as coisas
Amar e mudar as coisas
Me interessa mais...

De volta


A greve acabou e o trabalho me pegou em cheio nestes dias, em que tenho um intensivão pela frente, pelo menos para duas semanas deste mês.
Aí meus queixumes pessoais se repetem, já que é tão difícil fazer com que entendam minha necessidade de solidão quando volto para casa – mas se eu já moro sozinha, não seria, então, o bastante para notarem que eu gosto de ficar só?
Daquela solidão deletéria e destruidora eu não gosto. Também não sou misantropa: mas sou forçada ao convívio coletivo no trabalho e isso não quer dizer que eu não goste de meus colegas e da companhia deles, mas quer dizer que ali é o meu trabalho, aquela casa que alugamos para nossa estada é circunstância do trabalho e, portanto, a minha casa é esta de onde agora escrevo.
Quando eu estava em Sergipe também arquei com os custos de uma morada apenas para mim: definitivamente, eu não tenho o menor saco para morar com ninguém. Só imagino como seria se eu tivesse casado (casamento é a queda da privacidade, da individualidade Enfim, para mim, seria como viver em família de novo, sem vida própria e sob o jugo de um pater famílias), eu aposto que eu passaria a ficar mais tempo fora.
Tenho uma viagem longa para fazer e sigo adiando, deixando para depois, edificando pretextos, postergando...mas como parte do doutorado, sei que uma hora terei que ir. Mais uma vez o que me prende é a minha casa. Pode ser em São Paulo ou New York, se eu for demorar num lugar, sofro por não voltar para a minha casa e procuro constituir uma outra casa. Convívio coletivo, pensões, repúblicas, casa dos outros, Deus me livre!
Hoje estou aqui em casa e numa hora qualquer desligarei todos os meus telefones: preciso ler, preciso dormir (é que resolvi sair um pouquinho ontem à noite e aí voltei 3 da manhã para casa), preciso não ter que me explicar, preciso não argumentar, preciso não me preocupar em mostrar que eu me preocupo com alguns e que eu não estou nem aí para as ciladas de outros. Bem, minha vida anda me dando trabalho o suficiente, ultimamente.
Ainda assim, melhor do que ficar como as minhas amigas que parecem que tomam chá alucinógeno para agüentar o convívio coletivo forçado ou voluntário, para suportar suas crianças gritalhonas, seus maridos insípidos, seus sonhos que ficaram do lado de fora da casa e da vida, as coisas que elas julgavam encantadoras, mas que eram enfadonhas, os ouros de tolo, como diria Raul Seixas.
Não gosto dos ladrões do tempo: prefiro perder tempo a permitir que me roubem o tempo. E a estrada rouba o meu tempo. Aliás, sempre detestei viagens longas, odeio demoras, sou impaciente profissional. Da próxima vez em que perguntarem minha profissão eu vou dizer: Professora Impaciente.
Ah, saudades do meu sofá, do aconchego do meu edredom, do vaso de cerâmica semi-quebrado onde eu deixo umas flores...
Saudades do cheiro de minha casa e do meu quarto, saudades dos meus quadros, dos meus livros, dos meus perfumes, dos meus sapatos e do bicho de pelúcia encardido que eu gosto de abraçar para dormir.
Saudades dos ruídos, dos defeitos da minha rua, das cores, dos sons , dos sabores, dos hábitos, de acordar só e em paz, sem ninguém a me forçar um bom-dia ou um cumprimento qualquer; sem ninguém de quem esconder minha olheira e meu cabelo assanhado;sem ninguém a observar que meu travesseiro é alto e que eu durmo esparramada. Eis a paz! estar em casa é estar em paz (até que o telefone toque).
Para quem não lida comigo, isso é bastante contraditório. Para quem me conhece e ainda não consegue entender que eu gosto de ficar sozinha, que Deus me dê a paciência necessária que eu ainda não tenho.

Uma parte de mim é todo mundo
outra parte é ninguém.
Fundo sem fundo.

Uma parte de mim é multidão,
outra parte, estranheza e solidão.

Uma parte de mim pesa, pondera,
outra parte delira.

Uma parte de mim almoça e janta.
outra parte se espanta.

Uma parte de mim é permanente,
outra parte se sabe derrepente.

Uma parte de mim é só vertigem,
outra parte é linguagem.

Traduzir uma parte noutra parte
que é uma questão de vida ou morte.

Será Arte?

(Traduzir-Se. Ferreira Gular)

terça-feira, 5 de julho de 2011

Tem a ver...


A minha pele de ébano é
A minha alma nua,
Espalhando a luz do sol,
Espelhando a luz da lua.
Tem a plumagem da noite,
E a liberdade da rua
Minha pele é linguagem
E a leitura é toda sua.
Será que você não viu?
Não entendeu o meu toque?
No coração da América eu sou o jazz, sou o rock.
Eu sou parte de você, mesmo que você me negue:
Na beleza do afoxé, ou no balanço no reggae.
Eu sou o sol da Jamaica,
Sou a cor da Bahia.
Eu sou você, sou você e você não sabia.
Liberdade, Curuzu, Harlem, Palmares, Soweto, Malê.
Nosso céu é todo blue e o mundo é um grande gueto.
Apesar de tanto não,
Tanta dor que nos invade, somos nós a alegria da cidade
Apesar de tanto não,Tanta marginalidade,
Somos nós a alegria da cidade
(Margareth Menezes - Alegria da Cidade)

É que esse negócio de falar de pele me remeteu logo a esta música de Margareth Menezes - e faço minha velha advertência sobre o fato de que nem todo baiano faz música baiana, nos conhecidos termos midiáticos que isso significa.
Mas também vou ao outro extremo da conversa, quando ele, C., olhou a minha pele como se eu fosse um animal exótico.
Isso costuma me ofender profundamente - tanto quanto me ofende ser chamada e tratada como a mulata-clara no Rio de Janeiro, que alguns têm a petulância de ainda dizer em minha cara: "Tipo-exportação": comentário de homens e mulheres, brancos e também afrodescendentes como eu.
Mas eu não me ofendi com ele. Entendi. Entendi o entorno cultural e o deslumbramento daquela hora em que ele reparou na minha pele e na minha constituição inteira.
Leitura em braille.
Aí a música foi outra, não porque eu sempre escolho uma trilha sonora para as coisas, mas porque ele mesmo falou da Tigresa, de Caetano Veloso

Uma tigresa de unhas negras
e íris cor de mel.
Uma mulher, uma beleza,
Que me aconteceu.
Esfregando a pele de ouro marrom
Do seu corpo contra o meu,
Me falou que o mal é bom e o bem cruel.
Enquanto os pelos dessa Deusa
tremem ao vento ateu,
ela me conta, sem certeza,
tudo o que viveu:
Que gostava de política em mil
Novecentos e sessenta e seis
E hoje dança no Frenetic Dancin Days.
Ela me conta que era atriz
E trabalhou no Hair,
Com alguns homens foi feliz,
Com outros foi mulher.
Que tem muito ódio no coração,
Que tem dado muito amor,
Espalhado muito prazer e muita dor.
Mas ela ao mesmo tempo diz
Que tudo vai mudar,
Porque ela vai ser o que quis
Inventando um lugar
Onde a gente e a natureza feliz,
Vivam sempre em comunhão
E a tigresa possa mais do que o leão.
As garras da felina
Me marcaram o coração,
Mas as besteiras de menina
Que ela disse, não.
E eu corri pra o violão num lamento
E a manhã nasceu azul.
Como é bom poder tocar um instrumento.

Na minha pele


Eu tirei esta foto em Guarajuba, em março do ano passado.
A esta altura a dermatologista já havia me dito bem claramente, com o seu melhor humor: “Praia? Você na praia? Só se for de burca!”
Eu, que não consigo renunciar ao sol, vou à praia, teimosa que sou, coloco meu protetor fator 60 e volto para casa feliz com a marquinha de biquíne.
Penso que os deuses protegem a pele dos afrodescendentes (dos quais, eu e minha pele) como compensação pelo sofrimento e torturas sofridas na pele dos meus antepassados. Tudo ilusão!
No dia seguinte, meus braços se enchem de manchas brancas, meu colo fica vermelho e meu rosto é uma profusão de manchas escuras...
Há uns lugares comuns que, sinceramente, me fazem rir. Um deles é a expressão “uma coisa de pele” que as pessoas falam quando querem dizer que tiveram uma sintonia corporal, uma atração física fora do comum por alguém. Se alguém me diz que entre nós rolou “uma coisa de pele”, penso logo em micoses. E se eu puder, ah, eu rio!
Mais pesadamente dizem “sentir na própria pele”, outro grande clichê que me deixa meio à beira do riso. Ouvi muito isso dos poetas que me iludiram. Mas aí vai: estou aqui com quatro curativos por conta de coisas que senti na pele literalmente, ao retirar quatro sinais na dermatologista, hoje de manhã.
Eu não quis desperdiçar a oportunidade de brincar com ela e aproveitei para dizer, após minhas piores interjeições (ais e uis saem como um uivo, mas mentalmente creio que digo palavrões assombrosos): “Deixo uma parte de mim nesta clínica!”. E ela, rindo, inventou de me mostrar o maior dos meus sinais, já retirado.
Está aí uma curiosidade que eu não tenho: não gosto de ver cortes, feridas, cartilagens, ossaturas, cadáveres e afins. Minha experiência no IML foi horrível, em termos existenciais: fiquei imaginando a vida pregressa de todos os três cadáveres de que assisti à autópsia e sai com um peso horrível na alma.
Há pouco mais de quinze dias, saímos em turma para Salvador, para fazer não sei o quê lá no Shopping Salvador. Respondo por mim que fui passear, procurar livros, me empanturrar de café gelado e lembrar que ali eu passeei com o energúmeno 01, em 2009 – não sem motivos eu participo ativamente da comunidade do Orkut cujo nome é “Eu já amei um idiota”. Por questões de honestidade, eu deveria admitir que ao amar um idiota, mais idiota fui eu... e parece que a idiotice perdurou até hoje.
Os meus outros três companheiros de aventura foram ver aquela exposição chamada “O corpo humano”, pagaram para isso e já tinham ido lá três dias antes, sem êxito, porque chegaram perto do horário limite.
Ah, eu bati o pé que não entraria. Não fui e não iria... Olhar cadáveres e partes do corpo conservadas num sistema cujo nome é algo perto de plastificação... Grande coisa!
Eles saíram com uma conversa esquisita de que não comeriam galinha, que eu nem falasse em galinha. Mas só recentemente admitiram o mal-estar de ver cadáveres.
Então, não gosto disso e não trabalho para o CSI Miami.
Mas, voltando ao assunto, minha questão de pele era, para mim, interessante, porque eu me queixava de que tudo em mim ficava roxo, mediante qualquer pancada. Se cruzo as pernas, ao descruzar ficam marcas vermelhas da própria pressão de uma perna sobre a outra; tudo dói intensamente em mim, tenho a pele fina ( nada resistente ao sol, morro de frio com facilidade) e com facilidade minhas extremidades congelam e à menor pancada, é uma dor estridente.
Então, coitada da dermatologista, que está há mais de um ano me ajudando a “salvar minha pele”: somente agora ela pode dar nome aos bois e claramente diagnosticar meu dermografismo. Sim, é o que parece: a pele é tão sensível que você pode escrever sobre ela com qualquer material, com a ponta das unhas, com qualquer objeto que não tenha tinta, porque aí já seria pichação – kkk!!.
Agora eu sei o quê e por quê sinto em minha própria pele. Tem um fundo emocional nesse negócio, também – não vão pensar que eu sou como a neurótica interpretada pela Natalie Portman no Cisne Negro: é outra coisa, é da predisposição emocional o que eu falo.
Eu gosto tanto do sol, de praia principalmente – e ando com uma bruta saudade de um bom dia de verão quente como deve ser.
E enquanto não vem o sol, fico aqui, hibernando na escrita, antes que minha orientadora me arranque o couro.