Louquética

Incontinência verbal

sábado, 29 de janeiro de 2011

Clube das mulheres: a outra versão


Não sei se estamos, necessariamente, enquanto mulheres, copiando comportamentos masculinos, ou se interpretamos mal nossa própria vontade de ser forte e de evitar os sofrimentos ocasionados pelas relações com os homens, mas sei que a vida já não é a mesma no tocante às relações de gênero.
Não está em pauta, aqui, o desejo de igualdade e de equidade de direito entre os gêneros, mas outros fatores. De alguns deles, eu falo de fora, como observadora. Vejo, penso a respeito, discuto.
Outros desses fatores, vejo em mim e em minhas amigas e para alguns deles, minha postura é de espanto.
Ontem a noite foi maravilhosa, com todas as letras: saimos em trio, depois num grupão de mulheres,todo mundo independente, maior de idade, professoras.
De início, registre-se minha felicidade, nesta última sexta-feira antes do fim das férias, coletivamente comemorada, como se fôssemos morrer no dia seguinte. Aí fiz a cabeça da turma para irmos ao The Kings e acertei em cheio: testosterona pura! ô paciência, gostamos de homens.
Gostamos e lá estava cheio deles, de todos os tipos e para todos os gostos. E além disso o ambiente era legal, a gente se divertiu demais.
Gostamos de homens, sim. Aqui o gostar é no sentido genérico, não nos sentimentos. Quanto a esses, os sentimentos pelos homens, já não gostamos da mesma maneira como antes: mudaram as relações, mudaram os jeitos do gostar.
Ainda nos descabalamos por um grande amor, ainda ficamos tontas com um "amor de p%$#, que quando bate, fica", mas já não reagimos aos sentimentos da mesma maneira, isso quando os sentimentos nos alcançam.
Às duas e meia da madruga, fomos ao Jeca, que eu chamo de Bar dos fracassados, porque todas as vezes em que me sentia pisada, humilhada, abandonada, destruída e fracassada, era para lá que eu ia com a minha amiga número 01, ver gente de camisa preta, ver maconheiros e universitários normais, ver socialistas extemporâneos e profetas drogados, ver coisas e coisas. Bem, ia ver isso e tomar coca-cola porque lá não há repertório gastronômico para quem não bebe, como é o meu caso.Também não sou afeita a refrigerantes, mas era a opção possível.
Num cantinho conversávamso sobre os homens ali presentes e sobre os vistos pelo caminho, como marinheiros podem falar sobre mulheres.
Não obstante nossa boca porca e nosso arsenal de palavrões, parecíamos homens, falando do que faríamos na horizontal com X, fazendo deduções sobre as habilidades sexuais de Y, chamando uns de velhos, outros de acabados, lamentando as demandas dos relacionamentos e, pior, as meninas já estavam cheias de álcool a esta altura, o que piora o nível de nossas considerações.
A cana foi tão brava que Cléo, que começou a noite como baiana, já estava com aparência de oriental, com cara de japonesa, porque era tanto álcool ingerido que os olhos dela diminuíram.
Rimos para caramba disso.
Deduzo que os desejos, as ânsias e as carências nossas, de mulheres, são as mesmas experimentadas pelas gerações anteriores. Mas, quem cansa de apanhar, reage. E reage de muitas formas. Assim, a reação geral é seguir uma quadrinha velha conhecida: "A laranja, de madura/Caiu na ponta da vara,/Mulher que chora por homem/Merece tapa na cara". A Lei Maria da Penha aqui, não pega não: não seria o homem a bater na cara dessa mulher que por ele chora, mas sua própria companheira de gênero.
Sabemos o que é uma mulher besta e esse é um papel que nenhuma de nós quer.
Sabemos o que os homens fazem quando se julgam amados: no mínimo, tratarão a apaixonada como adereço da vaidade dele; depois, começam a maltratar, humilhar, abusar de várias formas.
Sabemos que os homens nunca ligarão no dia seguinte.
Sabemos de tudo que os homens são capazes de fazer e , hoje em dia, não demora à gente ouvir uma mulher falar que "a fila anda" ou que "o remédio para UM é OUTRO" - estou nessa, também acho, embora nossas verdades sejam duvidosas.
Viramos o que viramos, mas ainda estamos em processo.
Lembro de mim, quando apaixonada: só me lembro dos sofrimentos, na maior parte do tempo. Aprendi muito!
Não temos válvulas que ligam e desligam a paixão por alguém, mas sabemos correr desse sentimento.
Alguém aí certamente pensa que o Clube das Mulheres se resume àquelas reuniõeszinhas para assistir a insípidos strip-teases masculinos. Digo, porém, que aquilo que um dia chamaram de Clube da Luluzinha, já era, foi substituído pelo verdadeiro Clube das Mulheres - nisso o cinema se antecipou ao criar o filme "O clube das infiéis", não pela infidelidade em si, mas pela quebra das regras - e este clube é a constante troca de experiências entre nós, mulheres, é o apoio que uma dá à outra para enfrentar situações, é a interação e os pedagogos devem lembrar muito bem o que é sócio-interacionismos, né? interagimos com o meio social e isso é um elemento transformador.
Algumas atitudes de frieza , em mim, me espantam. Hoje, por exemplo, não soube o que dizer a ele sobre porque não ficávamos juntos. Não era um ficar, era assumir um namoro, coisa que eu não queria com ele.
Quase não aceito a presença dele em minha casa - não gosto de ficantes, namorados e afins em minha casa, não gosto desta intimidade com outra esfera de minha pertença. Na verdade, dentro de mim eu tinha uma objetividade de homem: sabia o que eu queria. E não queria nada além - daí minha agonia em inventar uma história para que ele fosse embora logo, além de minha falsidade em intensificar minhas necessidades de repouso (se bem que eu cheguei em casa 5 da manhã, dormi apenas até às nove, voltei a me encontrar com a turma meio-dia, saimos de novo e eu só voltei porque havia marcado o encontro), então, tudo reforçou meu cansaço.
Mas, poxa, que coisa desconfortável, que respostas vagas eu dei, que vontade de pôr às claras as coisas, mas, por fim, eu não era assim e estranho muito reconhecer em mim atitudes de minha geração.
Diante disso tudo, com um sono miserável que eu estou agora, só me resta dar de ombros e, como no Cotidiano, de Chico Buarque, dizer que "depois, penso na vida para levar e me calo com a boca de feijão"!

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Pelo amor de Deus!


Você não precisa ser mulher para defender uma mulher oprimida, carente, ou que sofre violência;
Você não precisa ser negro para protestar contra o racismo;
Você não precisa ser gay para lutar contra a discriminação, para combater a homofobia, para protestar frente à violência contra eles.
Você não precisar ser do candomblé para defender o livre culto e as manifestações religiosas.
Eu não luto as guerras que não são minhas, isso no plano pessoal. E também não obrigo meus amigos a se tornarem inimigos de meus inimigos- cada um com suas experiências.
Sócio-politicamente, é bem diferente.
Das brasas que puxo para as minhas sardinhas, no plano político, claro que estão as questões de gêneros (porque sou mulher, mas ainda que eu não fosse, não poderia ignorar as desigualdades entre os gêneros, a violência contra as mulher, as discriminações sociais, as recriminações morais)e as questões que concernem aos negros e índios (claro, sou afro-indígena que, na maior parte do tempo, lembra mais do afro e se diz afro-brasileira).
Mas, fico pasma pelo pensamento cristalizado e obtuso de um certo amigo meu - não, não adiantam títulos: preconceito se relaciona com ignorâncias maiores que aquelas que cercam a escolaridade.
Ah, eu defendo os ateus, também: não acreditar num Deus centralizado ou ver os delírios coletivos que medeiam todas as crenças, não faz de um ateu um ser humano menor. Os que eu conheço, ao contrário, são mais que humanos, porque fazem o bem sem negociar com Deus as recompensas post-mortem, posteriores. São generosos porque querem e acham certo, sem temer castigos divinos e por aí vai.
A gente nunca se lembra que Hitler era crente em Deus, mas Charles Chapplin, não.
E o Deus do meu amigo é o deus hegemônico, é ortodoxo, é fundamentalista - e contra os fundamentos, não há argumentos.
Para o meu amigo, o Deus dele, implacável, é o Deus. O Deus preconizado em outras religiões, é assim, um deus, escrito em minúsculas.
Este Deus não une, tem escolhidos, tem preferências e discrimina muito. Por isso, ele, meu amigo, aprendeu a discriminar os outros.
Para ele, quem é do candomblé, é do demônio, faz macumba, bate o tambor, faz despacho, amarra o nome dos outros na boca do sapo, só faz o mal e está ao lado do mal.
Pior não é pensar isso, pois o pensamento corrente é mais ou menos esse: é não querer saber, não querer conhecer a fundo aquilo que ele critica e, ao contrário, aceitar um ponto de vista trazido pelo europeu, um fundamento colonialista e exploratório, sempre a serviço de ganhos políticos, financeiros, geográficos; sempre para legitimar o mal praticado contra os diferentes.
Sob o pretexto da diferença tivemos a Inquisição, a escravidão,o apartheid, o holocausto e vários atos monstruosos, porque a diferença é tomada como sinônimo de inferioridade.
Ele se acha um filho de Deus e odeia aos que ele julga órfãos!

Se o rei zulu já não pode andar nu
Salve a batina do bispo tutu
Ó deus do céu da áfrica do sul
Do céu azul da áfrica do sul
Tornai vermelho todo sangue azul
Tornai vermelho todo sangue azul
Já que vermelho tem sido
Todo sangue derramado
Todo corpo
Todo irmão, chicoteado,
Senhor da selva africana
Irmã da selva americana
Nossa selva brasileira, de tupã
Senhor irmão do tupi fazei
Com que o chicote seja por fim
Pendurado
Revogai da intolerância a lei
Devolvei do chão a quem do chão
Foi criado
Ô cristo rei
Branco de oxalufã
Cristo rei
Branco de oxalufã
Zelai por nossa
Negra flor pagã
Zelai por nossa
Negra flor pagã
Sabei que o papa
Já pediu perdão
Sabei que o papa
Já pediu perdão
Varrei do mapa toda escravidão!

(Gilberto Gil - Oração pela libertação da Africa do Sul)

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

As lições do acaso


Há muito que eu me queixava de duvidar das minhas sensações de desconfiança,de ignorar aquele senso que nos acomete de vez em quando, sinalizando que algo está errado, que há uma falsidade no ar, uma coisa a evitar ou algo a fazer...
Comentei com ele sobre o acaso louco de tantas coisas minhas se liquidarem ao mesmo tempo: troquei de cama há poucos dias, porque a anterior, do nada, se quebrou; troquei de computador porque o HD do meu queimou neste domingo; o cupim comeu minha mesa e tenho que comprar outra já (comeu uma perna inteira da mesa, imaginem! fui tomar café e, do nada, ploft!)e meu celular deu um treco oscilante que o deixou em estado terminal. Esta é a minha sequência.
Vi uma certa causalidade (e não Casualidade)em tudo: havia um eixo, sim.
Tudo, aliás, bem parecido com a vez em que eu desconfiei de minha coleguinha estar arquitetando infernos contra mim, mas me dissudi porque tal criatura maravilhosa não faria isso, ora, que heresia a minha! depois eu vi tudo confirmado pelo tempo e pelas testemunhas.
Então, quando voltávamos para a minha casa ontem à noite,logo que o carro parou para eu entrar, esperei que os ciclistas passassem pela porta que eu usaria, nem encostei até que passasem.
Ele, quando eu cheguei, me pediu para mexer no retrovisor: um dos ciclistas havia "levado" o retrovisor.
A partir deste acaso ele foi falando sobre o anterior, de uma desavença no posto de gasolina, horas antes de me ver, e me contou isso bastante irritado.
Aqui em casa, por acaso, ele me falou de um acidente de que eu nunca soube, mas ele disse: "No dia em que eu me acidentei, meu primo que dirigia, e eu tenho certeza, certeza mesmo que foi o meu pai Oxóssi que fez por mim,intercedeu, porque eu não tive nada! num acidente destes, se não fosse ele, eu não estaria aqui".
Ele saiu daqui já bem após as 22 horas.
Com todas as ocupações e os trabalhos que eu andei dando a ele nestes últimos dias, tive até um insight de ligar, mas achei melhor deixar que ele descansasse.
Hoje, ensaiei ligar, mas lembrei que ele tinha que viajar para dar aula e acabei deixando para um pouco depois. E não sei até que ponto isso foi bom, porque só há uns minutos eu soube do acidente que ele sofreu ao sair daqui.
Ainda bem, soube por ele mesmo, porque a mãe dele soube pelos transeuntes, pois ele estava a duas ruas de casa, quando uma mulher, na rua paralela à que ele trafegava, saiu sem olhar para os lados e colidiu com toda a velocidade no carro dele, de que não sobrou muito.
E dele, o saldo de um corte profundo nas costas, omoplata quebrado, tudo quebrado, enfim - o carro rodou três vezes na pista, antes de bater contra o muro.
Se alguém me ligasse para contar, se eu soubesse antes dele deixar o hospital, poxa, teria sido terrível. Dr House é quem diz que pior do que dar uma má notícia , é receber a má notícia. E sem muito egoísmo, eu concordo.
Coincidentemente, três foram os eventos correlacionados até ali.
Também na volta de minha cirurgia, há uma semana, primeiro o pneu furou. Trocamos, seguimos, e um caminhão bateu no fundo do meu carro e do meu ex, que estava comigo, fazendo a gente rodar na pista, também, no meio da BR 101.
Mera coincidência, nenhuma explicação e sérias desconfianças.
Sem ironia, agora posso até cantar: "O acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído". Acho que o acaso dá certas pistas, às vezes, e que sim, de vez em quando temos intuição - obviamente, entre a manobra errada da moça e alguns olhos invejosos e maus, esta primeira é clara e determinante; a segunda é uma proposição intuitiva, mas ora como se relacionam!

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Clube dos cafajestes


Não sei se os cafajestes sabem ser bons poetas ou se os bons poetas são mesmo cafajestes, mas já tenho a minha teoria referendada pela prática.
Eu, que passei um tempo gastando esses meus dois neurônios e arrancando os meus cabelos afro-descendentes para entender Fernando Pessoa e seus versos mais repetidos (claro, depois de "tudo vale a pena se a alma não é pequena", que está em tudo quanto é canto, aplicado a mil coisas sem a menor relação entre si): "O poeta é um fingidor...".
Naquele tempo eu gastava tempo para entender a vivência imaginativa a que ele se referia, perdia tempo para entender o fictício e suas verdades de uma outra natureza, como cabe à verdade ficcional.
Blablablás literários à parte, os poetas sempre me enrolaram.
Lembro de quando eu era menina e o meu tio ficava parodiando uma música de Roberto Carlos que tinha a ver com a menina e o poeta, e o meu tio cantava: "Com a história do poeta, a menina se campou" - era, na verdade, "na história do poeta, a menina acreditou". Eu já deveria saber que um poeta é só história,pura persona, e por trás das articulações dos versos está um cafajeste em potencial.
Pior, dentre todos os poetas, são aqueles que são consagrados, ainda que localmente. Ah, esses vão atirar seus papinhos de sensibilidade, de afetos, de amores, de imagens. Mas, a sensibilidade do poeta está na glande, certamente, e não no coração, como querem nos fazer acreditar.
Minha amiga está lá, no Rio vermelho,no aconchego geriátrico de um poeta cafajeste, a que ela, diante do fetiche do nome do mestre, como diria Pierre Bourdier, se deixou cativar.
E poeta velho, minhas irmãs, é raça atirada: se lança, inventa pretexto, te põe no colo e não demora muito e consegue lhe convencer de que você deve um favor por ele estar ao seu lado (ou do seu lado de dentro, do seu lado de trás, de qualquer ladinho, enfim!)
Mas , o cafajeste de hoje é outro. Homenageio o cafajeste poeta, aliás, o poeta cafajeste de fina armadura: elegante, discreto, homem de uma mulher só e amante de um amor cortês/cortesão e idealizado. Este é bonito e jovem - e burro, burro como uma porta (com maçanetas de arrogância), mas bastante conhecido,poderoso, imponente...
Em nossas raras conversas,raras porque afinal, ele é bem melhor do que a maioria dos seres humanos, como bem cabe aos poetas - se pensam profetas, um escolhido, uma antena do mundo, os mais perceptivoa, os mais sábios, o mais MAIS como pretendem quase todos os poetas - ele falava do seu amor por Ismália, que, no caso, não se chama Ismália coisa nenhuma, roubei a musa de outro poeta.
Esse amores de outdoor, faixas, cartões e muitas flores entregues em público, ou seja, amor ostensivo, nos causam suspeitas, parecem construções de mídia pessoal. Pelo menos para mim.
Mas é: aparentemente eles tinham um amor parecido com os meus mais íntimos amores, a saber, aquele amor de tango argentino, de desesperos, suicídios imaginários e dores existenciais melodramáticas, exceto pelo fato de que eu não costumo colocar meus desesperos como produto de auto-promoção, mas já considero esta hipótese no momento.
Ele me falava da sua fidelidade por ela, da escolha, da vida e blablablá...
Por este tempo, apesar dos discursos dele, conheci a boca do poeta. Ninguém nunca soube disso. Ninguém é ninguém mesmo: nem melhor amiga, nem parente, nem diário.
Eu nunca soube porque ele me beijou - isso ali, há tantos anos atrás, mas eu deveria ter desconfiado que havia um descompasso entre o discurso dele e a ação.
Beijo bom, beijo de escultura de Rodin, com mãos na cintura e surpresa e tudo mais que um comercial qualquer possa ter.
Mas, sonhei alguns dias mais com o beijo e com o amasso, porque o primeiro foi mais importante que o segundo.
Poeta cafajeste, se é que o termo não é uma redundância, sabe fazer a gente sonhar. Sonhei um bocado.
Estava eu num lugar super-mega-máxi-plus distante, uns meses depois, e dei de cara com ele - eu e um bocado de gente que nunca soube dessa história. Ele mal me cumprimentou, mas em poucas brechas do discurso tangenciado, vi que ele esperava que eu ameaçasse cometer suicídio e bater panelas no prédio ou na casa dele para implorar que ele ficasse comigo.
Poeta é bichinho convencido, hein?
De meu lado, desconfio que ele estava procurando um pretextinho para detonar uma crise no relacionamento dele, a fim de obter umas férias da namorada obsessivo-compulsiva que ele tinha na época (e com a qual ele continua até hoje, para a minha surpresa!).
O tempo passou, ele ficou ainda mais famosinho, articulado, se achando e, infelizmente, continuou lindo ( e burro!).
Fomos nos encontrando nos eventos, nos lugares, em reuniões de amigos em que a gente mal passou do "boa-noite'. E depois ele nem falava mais comigo e eu pouco tirava meu traseiro do lugar para me mexer na direção dele e lhe mandar algum aceno.
Inventei de ir à pool-party de umas amigas nem tão amigas assim, num desses dias de sol e, como se tratava de festinha de piscina, fui a caráter, fiz o que tinha que fazer e, na volta, como era perto do shopping e eu estava sem grana, pensei que poderia ir lá, pegar um dinheiro e tomar um café gelado. Estou falando destas férias, deste tempo, tipo, um pouco mais que anteontem!
Lá vou eu. Eu já havia visto o sujeito,o sensível cafajeste, mas resolvi que se ele não falava comigo e se ele era mesmo insignificante para mim, que se danasse e fosse para a "**taqueopariu",aquele lugarzinho especialmente reservado aos meus inimigos.
Só falei da pool-party porque minha saia era condizente com o ambiente e vi que os olhos deles ficaram bem felizes ao reencontrar minhas pernas. Esclareço ainda, ainda, que ele jamais esteve entre elas!
Agora vejam a situação: olha aí onde realmente fica a sensibilidade do poeta!talvez que tivesse saudades de minhas coxas ou expressasse com os instintos as coisas que nunca estiveram no coração, mas...
Eu estava esperando meu café e ele estava esperando que eu passasse por onde inevitavelmente eu falaria com ele. Comigo, eu só pensando "Não me venha falar na malícia de toda mulher", porque nós, mulheres, somos espertas o suficiente para lançar estratégias que nos favoreçam.
E enquanto Seu Lobo não vinha, inventei de olhar para um lugar distante e vi minha velha paixão de Antropologia, meu coleguinha mais gato que deveria, não fosse eu àquela época idiota e fiel, me aquecer nos frios horrorosos da Chapada Diamantina.
Os oito minutos do meu café gelado foram uma eternidade, especialmente, uma eternidade de perguntas retóricas que eu fazia a mim mesma, especialmente no tocante à miseria do estatuto da fidelidade.
Ah, que porcaria!Por que inventaram um troço tão difícil, meu Deus!Coisa mais difícil de cumprir - como é que eu falo para os meus desejos que não está certo olhar para o coleguinha tesudo de Antropologia, pensando mil pornografias instantâneas e que o poeta que ali está, de olho nas minhas coxas, me atrai e "atrai os meus instintos mais sacanas"? e eu, se não tivesse o superego que tenho, ah, eu daria um jeitinho.
O café chegou, inventei uma outra rota que na verdade era a mesma: apenas dei o meu jeito de me meter numa multidão de corredor, de modo a que eu não pudesse cumprimentar, nem receber cumprimentos - velha cara de paisagem, conforme eu aprendi muito bem na escola de Thales.
Há um tempo atrás, um bom cafajeste "desvirginava mocinhas inocentes/e dizia que era crente, mas não sabia rezar" e era interessante olhar as máscaras que eles usavam.
Hoje, claro, tem aqueles que vão fingir que querem coisas sérias, fazer pose de homem másculo, adulto, responsável, com papo-família, mas a maioria já entrega o serviço na primeiraa mordida e nas entrelinhas dizem o que o meu primo, cafajeste-mor, diz: "Eu sempre estive a fim/ e você sabe disso,/eu só quero te comer,/não quero compromisso", o que não tem graça nenhuma na vida real, num momento em que boa parte das mulheres estão à procura de relacionamento sério.
Tella, Conceição, Cléo e eu até temos nossas palavras-chaves, porque se o cara falar em ir para a casa da gente, citar o carro e o emprego de cada uma de nós, está na cara que é cilada...aí é hora de ir ao banheiro e despistar do sujeito.
Mas os bons cafajestes sabem fazer a gente sonhar. Entretanto, eu realmente não conheci piores cafajestes do que os poetas.
Fiquei mesmo supresa por ver a carnalidade do meu querido poeta se manifestar - poxa, para quem louva o sublime, a amada, a mulher inatingível, a sacrossanta pessoa feminina, ficar assim, meio que vulnerável à coisa profana, foi meio sei lá, surpreendente.
Acho que ele é sócio-fundador, sócio remido do Clube dos cafajestes - e os poetas, nós sabemos, vestem palavras lindas apenas para tirar a nossa roupa.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A vida sexual da mulher feia


Estando à toa na vida, deambulando pelo aeroporto que mudou de nome - sabe, né, o Homem amava tanto aquele filho, que a Independência da Bahia foi para as cucuias e, adeus 2 de julho! remexa-se a memória histórica - quando resolvi dar um tempo pela livraria.
Conheço muito bem livraria e biblioteca para saber que as coisas são catalogadas pelos títulos e não pelas fichas catalográficas em si e, como eu tinha um bom tempo até o horário do meu vôo, fiquei ali, apenas me desviando das prateleiras pretensamente espiritualistas e de auto-ajuda.
Lá para as tantas, eu vi: A vida sexual da mulher feia.
Ôpa, será indireta para mim? será que é bom?
Nem abri o livro. Parei, olhei e pensei: seja lá como for, sabem que a mulher feia tem vida sexual.
Se você parar para pensar na machista teoria do violino - segundo a qual, com mulher feia o homem deve agir como o violinista, virando a cara e passando a vara - estas pérolas da cultura patriarcal brasileira que, eu que não vejo igualdade entre os gêneros, fico ouvindo e memorizando,dizem muito. Cada preconceito sempre diz muito.
Mas o fato é esse: a mulher feia tem sexualidade e tem vida sexual. Caso contrário, as mulheres fora do padrão de beleza não teriam filhos, nem casamentos, enfim.
Que nós mulheres somos condoídas e invejosas, não há como contestar, mas reparo que quem destrói a beleza da mulher é o homem.
É ele quem passa a chamar a mulher de tribufu, de Dona Onça, de termos depreciativos. No geral, casam-se com as gatas. Após um tempo, as gatas viram onças feias e irritadas.
Claro, há as que se auto-desprezam.
Há quem realmente largue mão de si própria e aí, é aquela velha receita que eu já falei aqui: a miserável da mulher quer dormir com camiseta de campanha de Deputado, com uma calcinha de elásticos corroídos e uma touca na cabeça que, na verdade, um dia foi uma perna de meia-calça, e ainda quer que o companheiro ache que ela está sexy.
Mas, voltando à vida sexual da mulher feia, livro que eu nunca li, me meti atrás da sinopse e vi que era ficção. Por sinal, a protagonista tem um nome miserável, parecido com o meu nome real, Jucianara. Eu me mataria se eu fosse Juci, sabe? ia piorar tudo, mas se a gente já foi condenada a um nome esquisito, o Destino está traçado. Eu, que não acredito em destino, me viro, tá? mas e quem acredita?
Ela amortiza o nome que lhe deram, preferindo ser chamada Ju, como eu, por preferir Mara.
Mas o livro parece bom, traz até a feiúra como um estado de espírito, não é só uma constatação de uma cara lá não muito atraente.
Eu sou a favor de qualquer coisa, qualquer intervenção que a pessoa queira para mudar para melhor.
Penso sempre em quem foi caçoado na escola, na adolescência, quem recebeu apelidos e um dia pode fazer uma plástica e se livrar de algo que foi causa de traumas, de dor.
Eu só sou medrosa - e lisa - mas não tenho nada contra plásticas, lipoaspirações, transplante de cérebro, tudo vale a pena.
É muito bom se olhar no espelho e gostar do que se está vendo - eu queria era lembrar quem foi o filósofo que disse que "quem não desejar ter com loucos, evite os espelhos", mas que algum filósofo disse, disse.
O livro é de autoria de Cláudia Tajes, autora descrita como uma morena linda, quarentona e poderosa. Vou ler, com certeza, quando o tempo permitir...ou se o próximo vôo que eu for tomar demorar muito.
Mas, se a pessoa está se sentindo um trapo, que use os meios de que dispuser para estar melhor.
E se a pessoa já está se achando, que melhore ainda mais: acho lindo quem se ama, quem gosta de se ver sempre melhor, quem faz da cara um cartão de visita e grita em seu silêncio: sou vaidosa, sou vaidoso, gosto de mim, gosto de me sentir lindo, linda!
Fico é feliz pelas mulheres intelectuais de hoje em dia não serem aqueles seres anódinos de camiseta básica e calça jeans, de roupa de Mercado de arte e chinelão de couro, com medo de parecerem fúteis.
Por isso deixo, também, a música da banda brasileira Copacabana Club como referência, porque quem quer deve mudar, mudar porque quer mesmo.

Just do it
just do it do it do it cause you want it
just do it do it do it cause you like it
do it do it do it cause you feel it
not because you saw it
you can do a song
cook your food
clean your house
you can use a thong
be so rude
kiss my mouth
you can pierce your nose
sew your clothes
dance alone
you can make some friends
form a band
or sing along
just do it cause you want it
not because you saw it
just do it cause you want it
not because you saw it, not because you saw it, yeah!
just change it change it change it cause you want it
just change it change it change it cause you like it
change it change it change it cause you feel it
not because you saw it
you can change your hair
change your house
change your life
you can change you sex
change your friends
change your wife
you can change your shoes
change your pants
change your style
you can change your face
change your boobs
change your smile
just change it cause you want it
not because you saw it
just change it cause you want it
Not because you saw, not because you saw it.

P.S.: Da vida sexual do homem feio ninguém fala, porque basta ele ser heterossexual para já estar em vantagem, nesse mundo de tão poucos exemplares da espécie, né? é sucesso!

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

É de babaixá ou de balacobaca?


Pára tudo que agora nós vamos mudar os rumos da Filosofia Ocidental: acabo de me filiar a uma comunidade do orkut que se chama "É de babaixá ou de balacobaca?"
Mera coincidência para mim que venho, há pelo menos duas encarnações, tentando entender a sensibilidade de Ivete Sangalo ao cantar a outra pérola, chamada balaquebaque (Ó: "todo dia, toda hora!")
E esse negócio de balacobaco e de suas variantes, aqui na Bahia é coisa de louco, tem em toda composição. Numa das mais lindas composições, dessas de deixar Dorival Caymmi no chinelo, aparecem os versos: "Balacobaco, mexeu, balacobaco: gostoso até embaixo".
Veja o que é a verdadeira música baiana: Fica o Caetano Veloso perdendo tempo para cantar: "Existirmos, a que será que se destina?", enquanto os verdadeiros representantes da música baiana se ocupam de questões mais substanciais, verdadeiros enigmas e versos indecifráveis para quem não se apropriou das sutilezas dos encaixes linguísticos luso-banto-sudaneses, como por exemplo: "Zumzumzumzumzum-baba", ou como bem diz a própria comunidade: "Dandalunda maibanda coquê", entenderam? nem eu!
No momento, estamos mobilizando todos os esforços intelectuais possíveis para descobrir o que é o Titerê que o Chiclete com Banana andou cantando.
Mas, eu bem disse há um tempo, nem todo cantor baiano faz música baiana.
Logo, não vai ser Caetano Veloso, nem Gal Costa, nem Jau Peri, nem Lazzo, nem Maria Bethânia, nem Mariene de Castro que chegarão aos requisitos mínimos para realmente merecerem o título de cantores de música baiana.
Respondam-me os sábio e os PhD: o que se pode depreender dos versos do Cometa Mambebe que dizem: "No cometa da guitarra baiana, ou nas cores da cauda do pavão/ Zanzibar, tuaregues e pantufas,/Andaluzes de Gandhi, coração"?
É muita sensibilidade, minha gente, no galope de Olinda para a Bahia!
Essa, pelo menos, é parte que ensaia um nonsense musical. A quebradeira geral , como bem canta a música baiana, "desce mais embaixo" e "esfrega a xana no asfalto" e ainda bota a mão na cabeça que vai começar o "Rebolation" e chega ao ponto em que finalmente "desce com a mão no tabaco".
Não é um tipo de música que esteja ao alcance dos ouvidos elitizados e preconceituosos, certo?
Para se penetrar no âmago da música baiana é preciso se entregar, se despir dos preconceitos, "enfiar a uva no céu de sua boca e aí chupar toda", sabe? sem falsa moral.
É observar o quanto se podem re-significar fábulas e contos e considerar a narrativa musical: "Chapeuzinho, onde você vai? diga aí menina, que eu vou atrás?(...)vou te comer! vou te comer! vou te comer!", porque tudo nessa vida é antropofagia mesmo.
Mas, enquanto um verão se vai e outro carnaval está por começar, eu quero mesmo saber: Gente, "é de babaixá ou de balacobaca?"

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A vida com tarja preta


Mas, a vida com tarja preta, é isso aí.
E só deveria ser para quem precisa. Para quem precisa mesmo! não por moda ou por medo da vida!

A vida sem tarja preta, parte II


A vida sem tarja preta pode ser só um questionamento àquilo que se pode ver.

A vida sem tarja preta


A vida sem tarja preta, seria assim, como um nu sem censura, mas com coragem e consistência.

Pecado Original


Todo dia, toda noite
Toda hora, toda madrugada
Momento e manhã
Todo mundo, todos os segundos do minuto
Vivem a eternidade da maçã
Tempo da serpente nossa irmã
Sonho de ter uma vida sã
Quando a gente volta
O rosto para o céu
E diz olhos nos olhos da imensidão:
Eu não sou cachorro não!
A gente não sabe o lugar certo
De colocar o desejo
Todo beijo, todo medo
Todo corpo em movimento
Está cheio de inferno e céu
Todo santo, todo canto
Todo pranto, todo manto
Está cheio de inferno e céu
O que fazer com o que DEUS nos deu?
O que foi que nos aconteceu?
Quando a gente volta
O rosto para o céu
E diz olhos nos olhos da imensidão:
Eu não sou cachorro não!
A gente não sabe o lugar certo
De colocar o desejo
Todo homem, todo lobisomem
Sabe a imensidão da fome
Que tem de viver
Todo homem sabe que essa fome
É mesmo grande
Até maior que o medo de morrer
Mas a gente nunca sabe mesmo
Que que quer uma mulher
(Caetano Veloso - Pecado Original).
Interessante que no mito, Orpheu encanta com a música - encanta até Caronte, Cérbero e o próprio Hades.
Deveríamos aprender muito com este mito, especialmente pelas duas mensagens principais: a que diz respeito a ninguém poder enganar a morte (porque Orpheu desce ao Hades para reaver Eurídice, que estava morta) e a que diz que os mortais têm muito medo da felicidade porque ela é um direito apenas dos deuses (Eurídice e Orpheu eram muitos felizes).
Poderíamos, sim, colocar uma terceira lição, àquela que se refere à nossa confiança, porque era condição imposta por Hades que Orpheu não olhasse para trás a fim de verificar se Eurídice estaria mesmo lhe seguindo até à saída para o mundo dos vivos. E daí é que sempre olhamos para trás.
Incorporamos o mito à vida contemporânea, às nossas neuroses, aos nossos complexos.
Como este meu medo de que a felicidade passe rápido, ou que seja sumariamente destruída, ou ainda, como esta mania de achar que toda felicidade é suspeita.
De Orpheu fica em mim o sentido encantador/encantatório da música.
Adoro música.
Hoje me senti feliz porque Cléo se lembrou que eu gosto dos Strokes - e tinha tanto tempo que a gente não conversava sobre nada que lembrasse música. Havia tempo, até, que a gente não se falava mesmo.
E ele, quando escreveu para mim, ante meus queixumes de saudade, citou justamente os versos iniciais do Pecado Original de Caetano Veloso:" Todo dia, toda noite, toda hora, toda madrugada/momento e manhã...", como se soubesse há séculos como eu gosto desta música, como se impusesse os significados, menos por imposição do que por explicação ao que eu argumentava.
Talvez o caminho todo da versificação da música seja apenas para chegar ao ponto em que se afirma ao tempo em que se pergunta: "Mas a gente nunca sabe mesmo/Que que quer uma mulher". Ah, claro que sabe!

domingo, 16 de janeiro de 2011

Da necessidade da ficção


Discutíamos na segunda parte da disciplina Teoria da Narrativa, não apenas o estatuto do romance moderno, mas, a partir daí a condição da própria ficção.
Na última aula eu falava justamente disso com a nossa professora: temos um momento tecnológico que nos joga à cara não somente a repetida avalanche de informações, mas a necessidade de mobilizar atenção para reter algo acerca daquilo que nos pula à cara.
Nos canais de informação temos a headline,a manchete, continuamente exposta. Logo abaixo duas tarjas móveis com síntese de notícias menores, enquanto ao canto ficam os indicadores econômicos, com os índices Dow Jones , Ibovespa, Dólar turismo,Dólar Comercial, data e horário.
Uma das principais diferenças entre Informação e Conhecimento é, exatamente, o processo de ambos. Informação é composta por dados. É excedendo a mera constatação e memorização e se apropriando do dado para realizar processos mentais que transformamos a informação em algo significativo em profundidade, ou seja, conhecimento.
Isso serve, por exemplo, para que a gente pense melhor a respeito de tão alarmantes números de gravidezes na adolescência, quando teoricamente todo mundo tem acesso à informação acerca de métodos anticoncepcionais. Tem-se a informação, não o conhecimento, para exemplificarmos superficialmente.
Ocorre que fatores relacionados às técnicas e aos meios de comunicação são costumeiramente arrolados pelos teóricos da literatura e da filosofia para pensar seus efeitos sobre as produções ficcionais.
Silviano Santiago e Theodor Adorno traçam um longo caminho teórico para avaliar o estatuto do narrador do romance, intercalando as suas questões com as outras decorrentes do desenvolvimento técnico e das comunicações.
Essa não é uma discussão rasa, passa pela análise do narrador épico, quando se tinha uma lição, um ensinamento sob a história narrada, passa pela ascensão da burguesia, avança para o desencanto da Modernidade e chega ao tempos atuais e suas configurações sociais,culturais e identitárias.
Ao retomar Walter Benjamin, em seu capítulo que trata da obra de Nicolai Leskov, contido no livro Magia e técnica, arte e política, Silviano Santiago localiza a formulação de três estágios ou tipos de narrador ao longo da história, tendo, pois, por primeiro estágio uma prevalência, por parte do narrador, de intercâmbios de experiências; sucedido pelo segundo estágio, em que o narrador já não se comunica com o leitor e, finalmente, o terceiro estágio, depreciado por Benjamin por tratar-se de um narrador-jornalista, isto é,por descrever algo próximo do que encontramos na constituição da reportagem.
Nosso tempo vive gritando pelo realismo: acredita nos documentários, no jornalismo-verdade e em ilusões deste tipo, que passam a idéia de fidelidade, de verdade.
Época de voyeurs, é a nossa.
Época de exibicionistas, também, porque não há um sem outro e Andy Worhol não errou ao prever que num futuro todo mundo teria pelo menos quinze minutos de fama, mas deixou de ver e de prever quantos se engalfinhariam bigbrotheranamente por este direito profetizado, gerando a concorrência para aparecer.
Por outro lado, quem acertou totalmente foi Bakthin, que previu que o romance sempre encontraria formas de se reinventar. Dito e feito: nossos contemporâneos que tanto querem coisas reais, vida real, HDTV, isto é televisão com imagens de alta definição (High Definition), quer o making of de tudo, quer a vida como ela é, esse mesmo ser convive com ou ele mesmo é, daqueles que se derretem com a saga Crepúsculo e com outras historinhas fantasiosas, de bruxinhos, de vampirinhos, de encantamentos, ou de animações, de desenhos animados.
Resumindo: temos necessidade de ficção, temos necessidade de fantasia.
A velha receita de todas as novelas é tão conhecida quanto é repetida. Ainda assim, nada diminui seu sucesso.
Todo mundo se finge de ausente ou off-line no MSN, tem perfis fake espalhados por aí, tem uma Second Life não assumida quando acessa a internet e todo dia ficcionaliza a si mesmo ou vende fantasias.
Os realities shows nada têm de reais, é sempre editado, tem aparato técnico de câmeras, luzes, narração, sonoplastia, trilha sonora, casal protagonista, antagonistas e, claro, um narrador - Bem, ele pode ser Brito Júnior ou Pedro Bial, mas o telespectador é que pensa que é onipresente,onipotente, onisciente, que sabe tudo,que vê tudo, que acompanha tudo...

sábado, 15 de janeiro de 2011

A pesquisa e os seus paradoxos


Tem absurdos que parecem ainda mais absurdos porque desafiam o óbvio. É tipo saber que os chapéus do Panamá são feitos no Equador e que nem todo cantor baiano faz música baiana, sabe? é esquisito, mas é verdade.
Agora, imaginem a dimensão disso se aplicado às questões identitárias e das figurações da nacionalidade. Focalizem agora essas mesmas questões no redemoinho de coisas presentes na minha pesquisa: tenho que dar conta dos portugueses DE Portugal e dos portugueses de Angola, por exemplo. E não são portugueses EM, são portugueses DE.
Aí entra o dilema central de As naus: os retornados.
Esses retornados são os portugueses que retornaram de Angola. Maravilha, né? Acontece que há retornados que nunca estiveram lá e aí entram aqueles paradoxos que parecem música de Falcão (tipo o que ele faz ao propor O retorno do regresso e o que o senso comum chama de A volta dos que não foram).
Para dar sentido a isso tem que contextualizar e amarrar os três tempos deste romance citado: O tempo da narrativa; o tempo histórico, ou seja, o tempo de referência; o tempo da escrita e da publicação e que meu outro professor aconselha a colocar o tempo de minha leitura como um quarto tempo, porque há teorias que eu uso e que pertecem ao meu tempo imediato e que não podem passar à margem de um explicação que seja capaz de atar tantos tempos.
Só dentro do tempo da narrativa há, no mínimo, dois tempos: o tempo das Descobertas e o tempo das Guerras de Descolonização da África.
Faço Literatura Comparada, então, resolvidos esses tempos, terei os tempos de Terra Papagalli para tratar. E nessa, quem fica sem tempo sou eu.
Aqui em casa, acumulam-se os ensaios por corrigir, as provas de duas turmas, mil e-mails de gente que eu oriento em Seminário de Pesquisa e os meus amados e desesperados orientandos de TCC.
Dizem que eu estou de férias.
Eu preciso muito me lembrar disso. Mas do jeito que fico preocupada, estudando, escrevendo e me lastimando nos post que componho aqui, também eles, os meus alunos, ficam na culinária: sentem a batata assando e, por conseguinte, me sobra a tarefa de descascar abacaxis.
Negócio mais esquisito é ser professor enquanto se é aluno, viu? mas todo mundo passa por isso. Desde o Mestrado minha vida era assim, dupla: eu era aluna e era professora.
Sei o desespero de estar dos dois lados e queria desligar um e outro no momento adequado, por isso, talvez, que eu seja indisposta por qualquer atividade profissional que me bata à porta quando eu estou na Casa dos Professores ou na minha casa: só sou funcionária da UNEB na UNEB, salvo tarefas extras pré-determinadas.
Se não levo a minha casa para o trabalho, também não quero trazer o trabalho para a minha casa.
Vejam quanta confusão nisso tudo e eu ainda tenho que ficar atenta ao antigo império português e todo o reordenamento pós-colonial, para assentar esses fatores dentro da pesquisa e, pior, dar sentido àquilo que já é, por si, confuso.
E ainda tem gente que fica questionando como é que a gente enlouquece. Ah, adivinha?!
Mas, para encerramos este assunto, acompanhemos a sensibilidade poética das palavras sábias do pensador cearense Falcão,na música O desgosto que a tua mãe me deu, que compõe o enigmático CD chamado O dinheiro não é tudo, mas é cem por cento:
Eu acho melhor escapar fedendo
Do que morrer cheiroso
Pois já dizia, a minha tia Que nasceu morta
Que a coisa pior da traição
São os comentários
Porque, de fato, ficam as fofocas
E os boatos
E dá uma dor igual
A que dá no parto das lagartixas,
Camaleões
Paca, tatu, cotia não
Calango cego e etecetera

Créu!


Tati e eu conversávamos há pouco sobre a nossa vida profissional após nossas respectivas defesas. No caso dela, a defesa já será daqui a dois meses.
Em meu caso, tenho nada confortáveis quatro semestres pela frente.
Em princípio falamos desta ilusão de construir uma página por dia: claro que dá, nos dias em que você não tem mais nada para fazer e quando o seu repertório argumentativo está forte. Mas, dias há em que a gente trava, e outros em que largamos tudo e vamos à bagaceira (que pode ser danceteria, shopping, festa, sorveteria, praia, casa da vizinha ou frente às nossas roupas para lavar).
Aí, cinicamente, a gente pensa na ralação intelectual que é justificar o lugar conquistada no mestrado e no doutorado, encarar uma banca que faz geralmente uma leitura duvidosa do que foi escrito, se encher de livros, revisar, escrever, fazer desleituras, fazer leituras, entrar em pane e finalmente obter o título.
Daí vem alguém e diz que "Para dançar créu tem que ter disposição; Para dançar créu tem que ter habilidade, pois essa dança não é mole não, eu venho te lembrar que são cinco velocidades" e, com tal genialidade fatura dinheiro, poder e fama.
É justo um negócio desse?
Não, amigos, "é créu nelas", em Tati e em mim, pelo jeito.
Por falar em justiça, eu que também danço o créu em toda semana de Letras a que vou, estava vendo como é o próprio contexto universal das coisas que nos parece injusto, porque há uma impunidade que raramente se quebra.
As pessoas nefastas, um bando de gente ruim sempre se dá bem, sai impune das injúrias espalhadas, sai ileso das feridas que causa e até mesmo dos crimes realmente praticados.
Vez por outra, em pequenos índices, comemoramos uma máscara que cai aqui, uns olhos que se abrem acolá, os delitos publicamente flagrados, mas é tão pouquinho.
Dizem que aquilo que a gente lança no universo, de alguma forma, retorna para nós: não sei não, acho que isso é coisa para consolar.
Mas, vamos , então, comemorar a exceção: uma dívida acabou de ser paga a mim. Dívida cabeluda, com juros acumulados, com uma moratória de muitos meses. Posso dizer, a pessoa me pagou direitinho, na mesma moeda, acrescida de juros e mora, tudo o que me devia.
Evento raro, mas, paciência: valeu a espera.Para quem crer e para quem créu

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Quem sabe...


Há umas músicas que simplesmente odeio porque passam a integrar um imaginário comercial chato, tal como acontece com as músicas de natal e com as pequenas variantes dos parabéns para você.
Outras viram hinos chatos - e aí, meu irmão, coitado dos que eu amo, como Milton Nascimento, por exemplo, que teve seu Coração de estudante associado ao velório de Tancredo Neves; e depois foi a Canção da América que virou hino da Morte de Ayrton Senna, só para exemplificar por cima - e boa parte é aquela incômoda exumação comercial dos cantores falecidos ainda jovens, tipo Cazuza e Renato Russo. E de forçoso, me causa a maior irritação.
Aí hoje eu parei de implicar e finalmente escutei e ouvi (entendem isso?)Gonzaguinha cantar a frase inteira: "Viver e não ter a vergonha de ser feliz..." - tá aí uma música que está em todo anúncio, em toda barca apelativa dos consumos - e eu amo Gonzaguinha, mas nem dei ouvidos a esta música, de tão chatamente executada por qualquer motivo.
Mas, ontem, eu senti uma imensa vergonha de estar feliz.
Atualmente, com o mundo pegando fogo, com os infernos pessoais que todo mundo tem, com as enrascadas em que alguns amigos meus se metem, enfim, por panoramas totalmente generalizados em que está todo mundo supostamente deprimido, toda felicidade parece uma ofensa, uma desconsideração com a tristeza alheia.
Ah, fiquei com vergonha!
Minha felicidade não foi causada pelas lágrimas de ninguém, não foi surrupiada, não foi furtiva, não foi herdada, foi uma conquista indireta e um presente que ele (!) me deu. Ainda assim, parece tão leviano estar feliz.
Toda tristeza é legítima, mesmo daqueles que não têm motivos reais para estarem tristes, mas você se sentir feliz é quase um pecado ou um crime.
Também, minha felicidade às vezes é tão baratinha, coisa de liquidação, paga com qualquer centavo, com qualquer gesto, com qualquer palavra.
Em certos tempos, não: a felicidade tende a ser o que está bem além do alcance de minhas mãos, aquilo que eu não teria como pagar, algo que ninguém me daria, algo impossível de ter, algo que não está nas prateleiras, algo que não tem receita para se fazer ou para se conquistar.
Todo desejo muda.
Se você deseja e tem, passa a ter outros desejos num tempo posterior; os meus desejos duram muito, quer dizer, boa parte deles.
E de vez em quando você tem medo de ter o que deseja ou se sente despreparado para ser feliz - mudamos nossas formas de ser feliz, nem sempre sabemos o que nos deixaria felizes e até esse aprendizado é bonito, é bom.
Mas dá muita vergonha ser feliz.
Claro que quem gosta da gente de verdade, não tem inveja: pega carona na nossa felicidade e eu não canso de dizer que amigos de verdades confundem nossas conquistas com as suas próprias.
Invejosos há, e esses sofrem mais: apesar de todo mundo ter medo do olho gordo, da inveja, o que a gente mais teme é encarar o invejoso como aquele ser que ele de fato é - alguém que acha que merece tudo o que você tem; ou que você sempre teve o que seria do merecimento dele; ou que você subtraiu a ele alguma coisa qualquer e, mais que isso, tememos as armas de que os invejosos se valem para despedaçar o que temos e que eles não poderão ter.
Mas, falar em felicidade parece uma arrogância do outro mundo!
Assim como a tristeza vem e nem sempre diz de suas origens, de vez em quando o sentimento de felicidade é gratuito.
Hoje eu acordei e fui fazer uns exames para as burocracias da vida. Para isso, eu precisava estar em jejum...
Além de ficar sem meu café da manhã, tomei um corte no dedo indicador, para medir a glicemia, e, caramba! como doeu!
Aí fiquei sem energia e meio vagarosa durante o resto da manhã e da tarde - com a casa por arrumar, com o texto por ser escrito (sim, escrevo em média uma página da tese por dia), com vontade de ficar enroscada no sofá como um gato de pensionato. Mas, veja, com uma manhã destas, quem consegue ser feliz?
Teimosamente, eu continuo feliz e me sentindo anormal por isso.Eu que digo, todo dia, neuroticamente, que toda felicidade é suspeita.
É típico do neurótico se preparar para o que vem depois da felicidade, temendo preços e consequências...mas, de vez em quando eu apenas páro e agradeço, só me resta agradecer.
Talvez o Barão Vermelho tenha acertado ao dizer que, "A felicidade é um estado imaginário".

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Carta aos suicidas


A minha alma partiu-se como um vaso vazio.
Caiu pela escada excessivamente abaixo.
Caiu das mãos da criada descuidada.
Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça
no vaso.

Asneira? Impossível? Sei lá!
Tenho mais sensações do que tinha quando me
sentia eu.
Sou um espalhamento de cacos sobre um
capacho por sacudir.

Fiz barulho na queda como um vaso que se partia.
Os deuses que há debruçam-se do parapeito da
escada.
E fitam os cacos que a criada deles fez de mim.

Não se zanguem com ela.
São tolerantes com ela.
O que era eu um vaso vazio?

Olham os cacos absurdamente conscientes,
Mas concientes de si mesmos, não conscientes
deles.
Olham e sorriem.
Sorriem tolerantes à criada involuntária.

Alastra a grande escadaria atapetada de estrelas.
Um caco brilha, virado do exterior lustroso,
entre os astros.
A minha obra? A minha alma principal? A
minha vida?
Um caco.
E os deuses olham-o especialmente, pois não
sabem por que ficou ali.

(APONTAMENTO, poema de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa).

Escolhi este poema para os meus amigos suicidas, para os meus dois amigos suicidas, ela e ele.
Ela, minha aluna mais brilhante de todos os tempos, de todas as eras. Por isso mesmo, a vida sempre lhe pareceu pouco.
Ele, inteligentíssimo, meu amigo do coração, aquele que tira o dia para ficar comigo, conversando tolices, enganando um pouquinho a vida.
Ela, que tomou mil comprimidos, que articulou a própria morte, meticulosamente.
Ele que, que passou do indeciso punhal na garganta para as incertezas dos bromodiazepínicos, que, para ele é uma morte.
Ela, que sempre viveu tudo o que escreveu.
Que ganhou prêmios nacionais de cinema, enquanto graduanda de Letras.
Que desbancou os concorrentes de Comunicação e ficou trabalhando lá na ilha de edição daquele canal, sempre tentando aceitar a vida.
Ela, que não tem ninguém, nem mãe, nem família. E lhe restou o namorado para quem ela se achou um peso.
Ele, simplesmente brilhante, intolerante com a mediocridade. Era lógico que ele não aceitaria uma vida medíocre.
Ele, tão bom poeta.
Ele que hoje em dia tenta segurar nas mãos simbólicas para não sucumbir.
Continuo achando que os suicidas amam a vida, por isso mesmo não lhes servem qualquer vida.
Agradeço muito a Deus pelos métodos de você terem falhado, porque minha vida não seria a mesma sem vocês aqui.
Se eu fosse contar todos os meus amigos suicidas, teria pelo menos quatro, sendo três mulheres e um homem.
Destes, apenas uma teve sequelas, porque se jogou do alto de uma casa de andares: ficou na Fisioterapia para recuperar os movimentos, vive de tarja-preta, mas está vivendo, vive vivendo, não vegetando, se é que a redundãncia aqui expressa pode ser bem entendida.
Sei que se o corpo vive, a alma se parte, vira caco, mil cacos...
Também é meio incômodo admitir que eu estou feliz, mas estou: estou feliz por vocês estarem vivos, por estarem comigo mesmo em face das distâncias e estou feliz porque alguém está me fazendo feliz neste momento.
E é um momento.
Como tudo que é bom, como todo sonho bom, eu quero que dure.
Eu quero que dure a nossa amizade, também.
Mas o que é bom passa.
O que é ruim, também.
E nós também passaremos. Não tenham pressa, aproveitem a viagem!

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

"Da força da grana que ergue e destrói coisas belas"


Você pode escolher a sua relação com o dinheiro - ser mercenário, ser econômico, ser generoso, ser materialista, ser hipócrita, ser dono do dinheiro, fazer do dinheiro o seu dono, mas, cá entre nós, sugerir que todo rico é má pessoa e que as pessoas ricas comentem mais suicídios é, no mínimo, culpar a janela pela paisagem.
Já debatemos isso: geralmente, num país de gente rica, as pessoas já obtiveram suas conquistas materiais. Daí, às vezes projetam suas vidas na conquista de outros valores e de outras demandas, das coisas que não estão à venda - e pode ser um amor, subjetividades emocionais e existenciais e coisas afins.
Se dinheiro não traz felicidade, também ele não pode ser o responsável pela infelicidade de ninguém.
Acredito que quem faz boas escolhas na sua relação com o dinheiro, certamente usa o dinheiro para a sua satisfação e para a sua felicidade - podendo compartilhar, de várias formas, destes outros ganhos com quem bem queira.
Eu observo na sociedade soteropolitana que as pessoas verdadeiramente ricas, os grandes empresários da música, por exemplo, e alguns artistas nacionalmente conhecidos, não têm ostensividade com a sua riqueza.
A gente vê nossa amiguinha e nosso amiguinho que, com sua renda mediana, comprou sua peça H. Stern ou sua BMW, em estimadas 48 ou 60 parcelas, desfilando suas posses por aí. Entretanto, nunca vi festival de guarda-costa, nem divulgação das posses, de forma ostensiva, nem de um Bel do Chiclete, nem de jogadores do futebol baiano, nem de Ivete Sangalo, nem dos grandes proprietários de estabelecimentos super lucrativos em Salvador.
São Paulo concentra renda e tem gente rica, verdadeiramente rica, daquelas pessoas que mal têm idéia do inventários de seus próprios bens, que compram sem pensar em números e que, em face de um desejo, preparam o cheque ou preparam o jatinho e mandam trazer o que desejam, e que, no entanto, não escandalizam para ostentar riqueza. E quem, por ventura faz isso, logo é apontado como emergente.
Mas a gente vai ao Rio de Janeiro e a política dos ricos é totalmente outra: quando eu vi que era Nicole Kidman quem estava de garota-propaganda para um novo shopping no Rio, meu queixo caiu: estava clara a conversa estabelecida com os ricos.
Não me assustou a grandiosidade da propaganda, em trazer uma estrela internacional para divulgar o novo shopping, mas aquela diferença estupenda que os ricos do Rio têm: uma assunção ostensiva da riqueza.
A mesma receita já havia sido usada no eixo Rio-São Paulo, com Kate Moss e Sarah Jessica Parker, para o Shopping Cidade Jardins, ao que me parece, mas, nada que possa repetir a produção nababesca desta última empreitada.
Até naquela já nem tão grandiosa Confeitaria Colombo você vê uns remanescentes de ricos, com aqueles cabelos azul-grisalho e certa pose...Anda-se mais um pouco - aliás, pobre nem anda lá nessas outras avendidas e bairros, e aí você dá de cara com uns ricos mais exibidos pelos outros bairros, ou simplesmente na Vieira Souto, em visão panorâmica.
Há uns dias atrás eu estava em Campinas, andando perto do Parque, e pela primeira vez na vida eu vi uma Ferrari, verdadeira, original, vermelhinha, fofa. Caramba, além do carro ser lindo, aquele, sim, pode se gabar de ir de 0 a 100km em menos de 0,3 segundos.
Olha que eu mal entendo de carros, mas posso afirmar que o bendito é lindo! deslumbrante!ah, se meu dinheiro desse!
Aí penso nos monstruosos seres que apenas ganham dinheiro e não conseguem usar o que ganham para serem mais felizes.
Para que porcaria querem ter dinheiro?
Se eu tivesse uma boa grana, é claro que eu usaria meu dinheiro para minha satisfação pessoal, fosse lá com o que fosse. E nem sou compradora compulsiva, mas, se eu estivesse triste, usaria meu dinheiro em possibilidades de diluir minha tristeza - Conforme fosse a causa da tristeza, compraria remédios, iria a bons médicos, presentearia um amigo ou a mim mesma, faria uma viagem, iria a algum lugar divertido, enfim, usaria o dinheiro para me fazer feliz.
E se não houvesse nada que o dinheiro pudesse fazer por mim, certamente eu iria ver o que ele poderia fazer por alguém que eu amo.
Que eu não sei poupar, é óbvio: caso contrário eu não entraria em caixas, nem faria capitalizações, mas eu nunca fui e nunca seria mesquinha com dinheiro, mão-de-vaca.
Ter uma vida desregrada não me interessa, porque como bons neuróticos temos que pensar no amanhã e nas surpresas que a vida reserva, nas necessidades, urgências e emergências...mas, excetuando-se estas coisas, para quê ganhar dinheiro se na hora de satisfazer um desejo qualquer a pessoa pondera demais ou declina do que deseja porque prefere entocar a grana? nem faz sentido se você não tiver um plano para a sua grana.
Há duas situação em que Zeca Baleiro mais expressa as aporias do dinheiro: uma é no Vapor Barato, quando diz "Eu não preciso de muito dinheiro, graças a Deus!", que eu tomo para mim, porque eu quero o que me basta e se um dia vier algo a mais, aposto que saberei o que fazer; outra é quando ele canta Babylon:

Baby!
I'm so alone
Vamos pra Babylon!
Viver a pão-de-ló
E Möet Chandon
Vamos pra Babylon!
Vamos pra Babylon!...
Gozar!
Sem se preocupar com amanhã
Vamos pra Babylon
Baby! Baby! Babylon!...
Comprar o que houver
Au revoir ralé

Finesse s'il vous plait
Mon dieu je t'aime glamour
Manhattan by night
Passear de iate
Nos mares do pacífico sul...
Baby!
I'm alive like
A Rolling Stone
Vamos pra Babylon
Vida é um souvenir
Made in Hong Kong
Vamos pra Babylon!
Vamos pra Babylon!...
Vem ser feliz
Ao lado deste bon vivant
Vamos pra Babylon
Baby! Baby! Babylon!...
De tudo provar
Champanhe, caviar
Scotch, escargot, Ray-Ban
Bye, bye miserê
Kaya now to me
O céu seja aqui
Minha religião é o prazer...
Não tenho dinheiro
Pra pagar a minha yoga
Não tenho dinheiro
Pra bancar a minha droga
Eu não tenho renda
Pra descolar a merenda
Cansei de ser duro
Vou botar minh'alma à venda...
Eu não tenho grana
Pra sair com o meu broto
Eu não compro roupa
Por isso que eu ando roto
Nada vem de graça
Nem o pão, nem a cachaça
Quero ser o caçador
Ando cansado de ser caça...
Ai, morena! Viver é bom
Esquece as penas
Vem morar comigo
Em Babylon...

E aconteceu de Zeca Baleiro e eu pertencemos à mesma religião, para encurtar a conversa.
Não é à toa que as pessoas apostam nas loterias, nos jogos, nos Bigbrothers, em tudo quanto há de possibilidade de levantar um bom capital. Quem quer ser um milionário? Quem quer dinheiro? todo mundo! o resto é só a hipocrisia nossa de cada dia.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Abasteçam (se) já!


Apostem: essa imagem aí não é a logomarca da Esso, mas, tá aí um posto que eu recomendo, viu, gente? (se)abasteçam num desses, a qualquer hora, e tirem o mau humor da cara, revitalizem seus pensamentos, gozem da vida, gozem de sua própria existência e deixem a dos outros para que os Outros cuidem.

Filhos da Pátria?


"A atual conjuntura do capitalismo global está sendo marcada pelo surgimento de novos nacionalismo que privilegiam os elos de descendência e raça e, como corolário, os direitos às raízes. Especialmente pesquisadores que adotam uma perspectiva transnacional de migrações examinaram os projetos de reconstrução de Estado-nação de antigas colônias e documentaram os processos de incorporação de seus emigrantes dispersos pelo mundo na formulação de nações desterritorializadas (Glick Schiller, Basch e Szawnton-Blanc, 1992; Basch, Glick Schiller e Szatons Blanck, 1994). Também em resposta à reestruturação do capital global e à emergência de blocos econômicos regionais, antigas metrópoles imperiais européias - que exportam ou que em tempos idos exportavam proporções significativas de emigrantes - começam a redesenhar a pertença à nação pós-colonial, por meio da concessão de direitos de nacionalidade a esses emigrantes e/ou descendentes, diretos esses por vezes baseados em princípios de jus sanguini."
Este trecho é do início do texto de Bela Feldman-Bianco, chamado Entre a "fortaleza" da Europa e os laços afetivos da "irmandade" luso-brasileira: um drama familiar em um só ato, extraído do livro Trânsitos Coloniais,publicado em 2007, pela UNICAMP.
Está em pauta um pano para manga que orienta minha tese de doutorado e que, por minhas tendências já decretadas e assumidas, será um ponto difícil de conciliar.
Fiz um curso de História da Arte, em 2005, e me espantei pela ojeriza e hostilidade dos meus colegas em relação à nossa professora, que era portuguesa e estava no Brasil apenas por motivos profissionais.
Acho esquisito que até os dias atuais a gente não tenha se livrado do Pecado Original - dívida que tantas gerações nunca conseguiram pagar.
Assim também comparo esse evento: nossa professora teria que pagar por aquilo que seus antepassados e patrícios haviam causado ao nosso país? acaso ela estava em alguma daquelas naus?
Convém localizar direito quem perpetua verdadeiramente as práticas colonialistas.
E depois, não fizemos um pacto pelo vencedor, uma vez que tratamos como inferiores todos os povos dizimados e violentados pelos europeus, em geral, e pelos portugueses, em especial? pense aí o que o se cristalizou como pensamento sobre índios, ameríndios e negros, por exemplo.
Não somos nós que achamos interessante se travestir com as máscaras do vencedor?
No texto de Bela Feldman-Bianco muitas discussões importantes para o entendimento do mundo pós-colonial são arroladas, centrando-se nos incidentes diplomáticos referentes ao sem-número de brasileiros retidos/detidos/deportados nos aeroportos de Portugal, majoritariamente na década de 1990 (o ano de 1993 seria o mais marcante).
Entram nesse rol de discussões a política discriminatória de Cavaco Silva e as declarações de Leonardo Batista, na época Embaixador de Portugal, que, em entrevista ao Estadão, chamou os brasileiros em questão de "vagabundos" e "mulatinhas de minissaia".
Focalizando essa crise, a autora irá demonstrar os recíprocos desconhecimentos entre Brasil e Portugal, apesar dos desdobramentos desta crise serem favoráveis, para sua extinção, à exaltação da falaciosa ancestralidade compartilhada e à retomada do aforismo de Fernando Pessoa, de que "A Pátria é minha Língua":
"[d]o retângulo da Europa passamos para algo totalmente diferente. Agora Portugal é todo território da língua portuguesa. Os brasileiros poderão chamar-lhe Brasil e os moçambicanos poderão chamar-lhe Moçambique. É uma pátria estendida a todos os homens, aquilo que Fernando Pessoa julgou ser a sua Pátria: a língua portuguesa. Agora, essa é a pátria de todos nós" [Agostinho Silva, in Mendanha, 1994-pp.30-31 APUD FELDMAN-BIANCO, 2007, p.430]
Encaremos o caldeirão dos problemas, especialmente o meu e o da minha tese: quando os portugueses vieram ao Brasil e desapropriaram nossas terras, colocando-se no papel de colonizadores - que, na cabeça de muitos portugueses equivale a dizer que seus patrícios foram nossos salvadores - daqui não apenas extraíram tudo, em termos de potencial econômico e de potencial humano, como também deixaram marcas profundas das políticas da própria colonialidade do poder.
A forma como se deu esse processo deixou heranças sociais de extrema problemática e incontornáveis empecilhos ao desenvolvimento nacional, mas, eles vieram para cá e isso foi apenas um dos desdobramentos deste contato.
Há, embutida aí uma dívida social gravíssima e está na teoria da maioria dos autores que estudam a pós-colonialidade: a riqueza européia se fez a partir de suas políticas colonialistas e imperialistas, da pilhagem das riquezas locais, isto é, dos locais de exploração, a saber, as Colônias. Isso possibilitou à Europa ser quem ela é hoje - ou seja, o desenvolvimento dos países colonizadores se fez a partir da exploração de suas colônias. Entretanto, hoje em dia,os ex-colonizados, quando tentam ingressar num desses países, são vistos como os irmãos bastardos, assim como o crítico desenvolvimento sócio-econômico dessas mesmas ex-colônias são tratados como um problema dos países em si, de sua incapacidade de se resolver,de resolver seus problemas internos enfim.
O buraco da questão vai bem mais fundo, mas aqui estou, tendenciosa, escrevendo o que eu realmente penso, para ver se extravaso o suficiente para que minha tese não seja personificada na exata pessoa que sou, que não passa à margem de um processo histórico de que meus antepassados foram testemunhas e cuja repercussão recaí para minha geração.
Texto científico tem suas exigências...
Aqui é uma síntese rápida, superficial, mas que dá uma idéia de onde vão meus pensamentos e minhas inclinações - que, por sinal, são manifestamente contrários à reforma ortográfica e a essas medidas que buscam resolver conflitos maiores a partir de ações teatralizadas, para dar uma idéia de uma unidade, de uma irmandade que não há.
Tenho ainda muitas questões a resolver com Camões e com Pessoa, muitas páginas a rever e a ler, mas tenho medo de que a memória dos dias recém-passados deixe de estar clara na fundamentação das pontes de compreensão da re-invenção da memória, que é outro eixo da minha pesquisa. Mas, tenho aí outros "mares nunca d'antes navegados" para dar conta.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Verdades nuas


Vou começar pela informação que deixei de dar no post anterior: eu nunca fiz cursinho pré-vestibular. É verdade. Verdade nua!
Eu ia à Biblioteca Municipal de Feira de Santana estudar para me preparar. E foi lá que eu, consultando livros de História, especialmente um, de José Jobson Arruda, construi minha base mínima para fazer o vestibular. Mas a escrita nunca foi uma dificuldade para mim, nem representou um empecilho e, por conta disso, minha redação levou uma excelente nota e minha aprovação veio na primeira tentativa.
E por falar na Biblioteca, foi lá que nessa época eu conheci meus amigos Renée, Héber,Du e o meu namorado com quem fiquei uns 04 anos. Ler nunca foi um sacrifício, estudar também não e eu acredito que seja um dos esteios de minha vida até hoje.
As fórmulas a gente aprende porque passa a trabalhar em cursinhos ou porque convive com quem trabalha em cursinhos.
No caso da "gramaticidade", aí, sim, as próprias gramáticas tendem a ceder siglas e associações, porque afinal, a lógica da gramática é esquisita, tortuosa e inexata. Por conta dessas coisas, não ignoro que alguém cometa lapsos como dizer PARTICIPADORES ao invés de PARTICIPANTES e haja aquele rolo todo entre dizer medicação e medicamento.
A lógica dos verbos regulares é uma, a dos verbos irregulares é outra e daí você nem percebe os circuitos e labirintos embutidos numa sentença como EU FUI ( será no sentido de IR ou no sentido de SER?), por exemplo. Mas, eu digo de novo: Ainda acho que quem tem POBREMA tem dois PROBLEMAS.
Bem, mas eis a minha nota explicativa, que eu complemento também respondendo que é claro que daria dicas a uma amiga que estivesse desleixada ou engordando, não de modo depreciativo, mas para que ela se cuidasse. Isso é bem diferente de meter o holofote na gordurinha de alguém para fazer ridículos.
Tem uma pessoa ex-chegada que faz isso. Mas, hoje eu compreendo que se trata de uma pessoa infeliz, daquelas que desaprenderam o que é se sentir bem, o que é experimentar momentos felizes e se torna bem clara a necessidade de espalhar o mal-estar entre os outros.
E assim digo que fui conversar com o Capeta ontem de manhã.
Eu dormi mega-pouco, porque depois do presente que "ele" (não o capeta, né? o meu affair) me deu, fiquei foi numa excitação nervosa chata, que meus olhos pesavam de sono, mas nada de conseguir dormir, flutuando e divagando feliz. Paguei o preço da felicidade agitada de manhã, porque nem dormi 03 horas completas.
No trabalho eu aprendi que o inferno não depende da presença do diabo, tal como afirmou Lobão. Então, estar cara-a-cara com o Capeta não me diria muito em termos de me despertar o temor.
Se o Capeta não é tão feio quanto pintam, pelo menos ele é desolador, mas levei na esportiva, como sempre faço. Nesses últimos tempos aprendi realmente a apostar nos riscos e lá fui eu.
Soube, na ante-sala do Capeta, que minha inimiga pensa muito em mim. Ela comentou sobre minha formação, numa dor-de-cotovelo que, no caso, foi um reconhecimento de minhas conquistas. Comentei com quem me dizia deste episódio, que, vindo dela, que é e sempre foi inteligente, esforçada e trabalhadora, não era ofensivo, era só um casinho de dor-de-cotovelo que mais afagava meu ego.
Os que são meus inimigos sabem que eu sou uma inimiga ética e os que são meus amigos sabem que eu preciso tanto dos meus inimigos! Vivo cada dia por eles, talvez somente para irritá-los, mas são minha pulsão de vida quando as coisas vão mal e eu digo a mim mesma: "Vou sair logo dessa, para não deixar meu inimigo feliz por minha derrota". Também eles sabem que eu não escondo as minhas derrotas, como não escondo o desconforto de ir ao encontro do Capeta, nem de fazer ou receber propostas dele, porque nunca negociamos barato.
O Capeta tem lá suas armadilhas e eu tenho cá minhas artimanhas e antídotos. Foi uma boa conversa! e quando eu percebi que eu já não tinha nada a dizer, não disse. Medi a situação e o contexto e encerrei o assunto.
Juntei duas noites sem dormir: a primeira, por farra; a segunda, por felicidade. Meu domingo foi de um esforço incrível para me manter em pé, com a casa fervendo de visitas e telefonemas o tempo inteiro, tarde e noite.
Hoje de manhã o povo me ligou para me dizer que viu minha entrevista - que deverá ser repetida no noticiário do meio-dia e talvez no da noite - juro que não assisti, nem quero assistir, acho um mico total. Dizem os que viram que eu tive uma naturalidade e espontaneidade boas, mas não vejo, sou auto-crítica demais.
Os meus melhores inimigos também sabem disso: sou auto-crítica e, em contrapartida, se meu inimigo tiver razão, tiver talento, for inteligente ou for bonito, eu reconheço. Mas, então, não estou a fim de me julgar hoje. O que, por si, já é um julgamento porque eu sei que eu olharia tudo que faltou e não o que estava ali presente. Não sei porque mas sou como um virginiano nesse quesito.
Tenho mais com o que me preocupar porque terei outro encontro com o Capeta, no mês que vem. Este, sim, será barra pesada. Se ele desmarcar, também será frustrante, mas acho que ele gostou de me ver, apesar de estar lendo em meu pensamento :"Nenhum mal te sucederá nem praga alguma chegará à tua tenda. Porque aos Seus anjos dará ordem a teu respeito para te guardarem em todos os teus caminhos". Ah, eu nunca iria ao encontro do Capeta sem ter bons guarda-costas e esta é outra Verdade nua.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Múltiplas escolhas


A vida é feita de escolhas: as que a gente mesmo faz e arca com o lucro ou com o prejuízo, as que fazem e que nos afetam e aquelas que a gente pensa que não faz, deixando, de fato, de fazê-las, mas pagando o preço da omissão e da negligência pela não-escolha.
Difícil é escolher certo. Sempre tive problemas com isso.E é algo que está em minhas brincadeiras, quando eu digo; "meu amigo, resolve aí minha vida por mim, que eu volto mais tarde, viu?" - como aqueles pára-choques de caminhão que dizem: "Fui ali ser feliz e já volto!".
Para, de novo, patinarmos no óbvio - porque além de eu não ser candidata ao quesito originalidade, adoro o recorrer ao óbvio como adoro o acaso - vou dizer que escolher algo é declinar da outra opção. Às vezes é assim. Às vezes, não: a gente tem as múltiplas escolhas. E há as múltiplas escolhas somatórias e aquelas em que uma sentença errada elimina a certa e umas outras em que se você erra uma das opções, mesmo acertando muitas outras da mesma questão,zera todo o quesito.
Parece prova de vestibular? ah, é isso mesmo: bem óbvio.
Chega um tempo que você ganha os macetes, estrategicamente, como aqueles recursos de memorização de cursinho (decora-se a musiquinha, a sigla, sei lá) e decora-se a palavra-chave, tipo: em qualquer questão de Literatura em que haja o nome de Castro Alves, a alternativa certa será aquela que trouxer a palavra Condoreirismo (e aí, se tu não sabes o que é um condor, não precisa ficar com dor, nem com dó de si mesmo, porque afinal isso acontece!).
Lembro como foi que eu aprendi a conjugar verbos cavernosos, como o verbo MEDIAR, que flexionado nas primeira e segunda pessoas do presente,no modo indicativo fica de maneira horrorosa como Eu MEDEIO, Ele MEDEIA, contrariando as pronúncias que vemos por aí.
Conjuga-se tal como se conjuga o verbo ODIAR: odeio,odeia,enfim...E para isso, a fórmula: MÁRIO.
Sim, você não leu errado: Mário: M de Mediar e assim vai até o O de Odiar.
Nas coisas objetivas da vida - e aí a gente chama de prova objetiva essas de marcar X, em que o conhecimento pode vigorar bem menos que a sorte - pode ser assim e você achar que é um cara phodão, experiente, que sabe todas as fórmulas da vida.
Pode ser que suas escolhas não sejam certas, mas produto de sorte.
Aí entra o amor. Tia Rita Lee canta: "sexo é escolha, amor é sorte".
Aprendo que amor é risco, aposta, loteria...leva a melhor quem tem mais sorte. E se você tiver um mínimo conhecimento, vai te ajudar, mas não determina sucesso sempre.
Para mim, que sou professora, é dose entender...ora, deixa eu largar o cinismo: eu não só não entendo como realmente detesto quem não gosta de ler e quem não gosta de estudar. Falei disso hoje, no café da manhã, com minha amiga - ah, sim, pausa para explicar que eu até agora nem considero que dormi e amanhã de manhã tenho que negociar com o Capeta e, por isso, eis que troquei os embalos deste sábado à noite por uma festa ontem à noite, como sempre, do cover dos Beatles, na Groove, mas foi lá uma festa insossa.
Não entendemos como alguém possa declinar de estudar, de ler,não dá.
Mas quem disse que a gente está certa? são valores para nós, mas a vida acontece com ou sem literaturas,com ou sem estudo, a vida continua e a humanidade não acaba por isso.
Mas, entenda que você sempre tem escolha.
Falar mal dos outros não vai te tornar uma pessoa melhor, bem como dizer que alguém é gordo não te torna magro e fazer esses bullings de adultos, catando estados de peitos, pernas, celulites e afins apenas váo deslocar olhares, não vão melhorar a sua vida. Isso também é uma escolha.
Você pode criticar quem está gordo ou olhar para si e resolver entrar em forma.
Sou humana, também olho, também falo mal. Mas eu me vigio de modo a não afetar o bem-estar dos outros e, afinal, não tem gorduras nem celulites que sejam mais importantes do que minha vida própria, para ser redundante e clara.
Temos escolhas: entre espalhar o mal, o mal-estar, a fofoca e o menosprezo ou simplesmente cuidar de nossas vidas, deixando o outro em paz...há múltiplas escolhas aí, porque você pode criticar ou reparar e comentar de modo a que o outro tome providências.
Quando nossa vida está uma droga, muitas vezes o único responsável é a nossa escolha, somos nós. O velho caso que citei num outro post: você repara no monstro ou na paisagem?
Não vivo sem música, sou elétrica, sou neurótica, sou histérica, mas não sou de mal com a vida: nem me lembro quando acordei mal humorada, soltando pragas ao vento.Agora, eu sei reclamar e reclamo para caramba!
Nas minhas escolhas, depois dos hábitos comuns do acordar, vou diretinho à VH1 colocar a TV nos videoclipes, cantar ou só ouvir e ir tomar meu café. Mas aí são as minhas escolhas - eu nunca escolheria acordar com uma valsa, nem com a música de bom gosto, erudita, instrumental, requintada.
Não vou acordar com Ivete Sangalo, né? aí pelo amor de Deus! nem com "Foge Mulher Maravilha, foge Superman", que eu não sei quem canta e que todo mestre-do-bom-gosto" vai fazer de conta que nem sabe do que se trata...também não é minha praia (não faz parte de minha playlist). Mas acordo em paz e faço barulho no banho, no meu banho demorado...depois do café e do banho, aí, sim, que venham as coisas externas(das quais, as que me tiram o humor).
Mas eu já nem sei onde este post vai me levar porque eu tive uma alegria imensa há poucos minutos, felicidade gostosa, gratuita, obra de uma escolha dele.
Mesmo tendo um encontro com o Capeta amanhã de manhã, estou feliz , fiquei feliz...nem sei quanto vai durar, mas ganhei um presente dos sonhos, tão de surpresa que nem sei quando é que meu coração vai voltar a bater no compasso certo...disritmia é um preço baixo para a felicidade, não é? façam as suas escolhas, façam as suas apostas.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Adjunto abdominal


Graças a Deus que eu tenho o amparo da Psicanálise para os meus momentos de SACANÁlise, para me inteirar de que estou em um momento de reconstrução, experimentação e escolhas, que eu traduzo para o popular como"período de degustação".
Eu até iria passar por cima do assunto, mas o safado, todo apelativo, nem lembro a pretexto de que, foi até onde eu estava, levantou a blusa e me mostrou o abdômen.
Despudoradamente, me mostrou o abdômen e eu só lembro de um umbigo rosado e lindo e de alguns sinais, tipo sardas, espalhadinhos nas extremidades laterais...e eu, hipnotizada, dizendo sei lá que gracinhas...isso porque ele estava com fome e me viu chegar com a sacolinha de pão , que eu guardo na recepção, porque em meu horário de saída a padaria já fechou.
Ele foi lá, roubou um dos meus pães na recepção - eu com a cabeça na carne, ele estraçalhando o pão...ele, um pão também!
Lembro de Ariane rindo de mim ou comigo, sei lá, e me dizendo que o abdômem dele não era de exercícios de musculação, era de judô. Ele é um homem de bem (de bem mais de 1,80 e muito bom!).
Lembrei de um quase ato falho que rolou entre minha amiga e eu, numa dessas conversas sobre gramática e homem e daí que eu falei que sei lá o quê era o "Adjunto abdominal", ao invés de dizer adjunto adnominal...veja o que há em minha cabeça!
Bem, mas se me falta um pretexto para eu postar foto de homem neste blog, agora eu tenho todo motivo do mundo para fazê-lo. Então, vai um Roque Santa Cruz, a melhor iguaria feita no Paraguai...olha aí o tamanho do...bem, do tórax, parecidinho com o do protagonista desta história...(é, eu só vi o tórax).

Sem resposta


Dizem que as religiões não dão respostas: evitam perguntas.
Seja qual for a religião, mesmo se ela se auto-intitular filosofia ou tiver nomes congêneres, não estou aqui para negar isso.
Na vida da gente, também, há aquelas perguntas que a gente evita, há outras para as quais nenhum de nós está preparado e muitas destas perguntas realmente abalam nossas bases.
Ele teve a coragem de me perguntar: "Como você vê a sua vida daqui a quinze anos?".
Se minha analista me disse que aquilo lá que eu fiz, não se faz a um homem, agora posso dizer que esta pergunta, bem, isso não se pode fazer a mim.
Foi um balbucio esquisito, impreciso, procedido de um silêncio que dava para ouvir o cricrilar dos grilos, e eu toda embaraçada.
O que se pode dizer?
Eu ia dizer que eu nunca pensei a minha vida a tão longo prazo? putz, não sei pensar a longo prazo. As únicas duas coisas a longo prazo que fiz nesta vida, para desafiar minha paciência e minhas visões apocalípticas da vida foi financiar parte do valor do carro em 48 prestações e assinar um título de capitalização, para 60 meses, porque, afinal, eu não sei poupar.
Foi um rebuliço em minha Caixa de Pandora, esta pergunta: eu odeio idéias eternizantes, idéias de eternidade, longos prazos, coisas indefinidas, enfim...não penso minha vida senão até o relativamente próximo.
Sendo absolutamente sincera, eu sequer imaginei viver os próximos 15 anos.
Ao contrário, daqui a 15 anos eu espero que Deus seja generoso e que eu nem exista mais: pensei nos meus ossinhos - ossinhos fashion, tá? - organizadinhos, embaixo da terra, à espera do destino final deles, cremados ou removidos para o devido lugar.
Pensar a vida daqui a 15 anos é pensar em tudo o que eu não terei, especialmente a vitalidade.
Um dos meus planos do ano passado era entrar numa cademia e continuar nela.
Assim o fiz e me sinto bem melhor agora, gosto do resultado discreto, embora eu ache uma tortura a rotina de pesos e exercícios. Fico, portanto, com o resultado como motivo para incorporar a academia à minha vida.
Daqui a 15 anos eu terei mil impedimentos. Possivelmente estarei com os pés na menopausa, bem pertinho dela.
Daí advém uma série de coisas ruins que me fazem temer estar viva nos próximos 15 anos.
Eu só não queria uma morte lenta e dolorosa, mas eu até sou conformadinha com a minha finitude - coisa que o miserável do meu primo me ensinou desde cedo, num dia em que comemos galinhas e ele questionou porque eu estava com medo de fantasmas, ali, na casa de minha tia, e porque ninguém tinha medo da alma da galinha assombrar a gente.
Nem sei quando foi que eu comi galinhas deste tempo para cá!
Mas esta pergunta descabida sobre como eu imagino minha vida daqui a 15 anos, sem dúvida, era um poço sem fundo.
Eu poderia ser estratégica e dizer que eu me imaginaria ao lado dele, na casa da gente, blablablá, e garantir a minha parte.
Se eu fosse levar a sério e na sinceridade a pergunta, eu diria que daqui a 15 anos, caso estivéssemos juntos, eu estaria chorando porque ele teria um caso com outra mulher; eu lamentaria que ele precisasse de comprimidos azuis para transar comigo; eu e ele estaríamos preocupados com check-up de nossa saúde, num infinito de comprimidos e restrições alimentares...
Ou após 15 anos eu estaria preocupada em perder o mínimo possível no nossos processo de divórcio.
Eu, talvez, após 15 anos com ele, entenderia melhor a esposa daquele famoso professor da Federal da Paraíba, com aqueles pulsos renovadamente cortados e marcados pelas tentativas de suicídio ante a impotência para suportar tantas traições dele - vish, este professor já pegou DUAS pessoas conhecidas minha, uma das quais, minha amiga...que nariz de sucesso!
Mas é que eu não sei ser otimista.
Vai que eu dissesse que daqui a 15 anos "eu queria te fazer tão feliz quanto você me fez agora!".
Vai que todos os meus prognósticos se mostrassem errados e eu estivesse tão feliz que nem pensasse na morte?
Vai que eu tivesse " a sorte de um amor tranquilo" e fizesse tudo que eu não fiz até então porque ele me fez mudar, por que ele me fez perder a cabeça e eu, incorporando o Jack Nicholson, em "Melhor é impossível", pudesse parafraseá-lo e dizer: "Você me faz uma mulher melhor"?
O futuro me dá uns arrepios de pavor na espinha que me assustam muito.
Futuro é uma construção e a construção imagética de 15 anos após o dia de hoje só pode me deixar embaraçada.
Juro que eu não lembro o que foi que eu respondi, mas com certeza, aderi à corrente filosófica do Leão da Montanha: "Saída pela direita!",e peguei minha tangente.
Tenho com ele o mesmo problema que eu tinha com Thales: se eu não respondo adequadamente, a pergunta volta.
Não adianta postergar, não adianta apertar o "pause", porque a pergunta virá e virá mais temperada e sonsa, porque eles são astuciosos e sabem quando eu estou evitando a pergunta, temendo a resposta.
Foi muito doloroso responder todo aquele primeiro questionário sobre amor,casamento e filhos - que eu respondi com uma infinita diplomacia, bem bonitinho, bem educadinho, bem corretinho, mas sem dispensar umas pinceladas de realidade. Agora, ele quer uma conclusão, ele quer juntar premissas e concluir, deduzir, sei lá, acho que ele nem nota que me atingiu em cheio.
Depois vai um idiota qualquer achar que a melhor resposta é aquela que não se dá. Experimenta!

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Onde vivem os monstros


Pergunta básica que rege as regras da localização de Onde vivem os monstros: você olha o monstro ou a paisagem?
Fazemos isso com o tempo passado, não é? é que a dor é coisa viva, não situamos a dor no passado, reavivamos feridas, vivemos traumas, exumamos frustrações, remexemos os ossos de cada decepção. Uns fazem isso por aprendizado, como bichos amestrados que precisam aprender as coisas para ganhar o prêmio e evitar a punição; outros são masoquistas mesmo e, ainda, uns terceiros o fazem porque adoram parecer vítimas.
Sempre me intrigou quando Ivan Lins Cantava "Lembra de mim" e dizia: "se existe um pouco de prazer em sofrer..." e acho que há, sim, um certo prazer na dor. Não que isso não seja contraditório, uma vez que fugimos das dores, aparentemente. Mas retornamos a ela através das lembranças - e aí, vale o dito popular, "é sofrer duas vezes".
Bom seria se deixássemos o passado no passado, porque, claro, já passou.
Mas tem a memória.
Assim é que 2011 não é 2011 isoladamente, mas inserido num conjunto de eventos passados a que se somarão as experiências do ano corrente. Esse é o nosso calendário burocrático e todo mundo fala disso, embora com aquela ponta de relativo desgosto por saber que o simbólico impera e aí a identidade coletiva diz que o ano novo é novo.
Não protesto mais, não quero ser uma voz isolada: junto-me aos outros, vou á rua, olho os fogos, comemoro e aposto que o novo virá, mesmo que seja para repetir o "sempre" com discretas diferenças.
Antes eu não fazia listas de coisas a fazer e a deixar de fazer num ano novo. Há um ano ou dois eu faço, por causa de Cléo.
Acabei criando o hábito, e não me arrependo. Olhei, avaliei e comemorei tudo o que eu cumpri. Bem, a parede, a quarta parede, continua lá. Eu ia retirá-la agora, que só tem uma fileirinha besta de tijolos.
Aí um chegado me avisou que só se retira a parede após uns três meses...lento, para tirar os tijolinhos, né? e olha que é coisa besta.
Hoje a minha amiga Beth me falou que quando nossa amizade começou eu era muito fechada, que eu continuo muito fechada, não com ela, que conforme suas próprias palavras, eu "estou descarada", mas com os homens em especial e com as pessoas em geral.
Sabe que eu também acho? eu tenho intimidade com os íntimos. E odeio quem ultrapassa a linha fininha das relações e de seus compartimentos. Isso me leva ao outro assunto: o medo da intimidade.
Não é que eu tema a intimidade, eu temo o convívio.
Tanto faz se você fica na casa dos outros dois dias por semana ou se ficam em suas casa 08 dias por mês: a gente tende a se sentir invadido. Por isso não posso casar.
Onde ficaria minha privacidade?
E onde eu iria pôr esta minha necessidade de estar só? não quero solidão ampla, geral e irrestrita não, eu quero aquele tempo meu, meu direito a escutar músicas dos Raimundos e cantar com eles todos os palavrões; quero estar no MSN sem ter que responder com quem falo, sem ninguém me chamando para dormir, esses troços todos.
Lembrei que Allan quebrou todos os pontos insuportáveis deste quesito, perguntando: "Você está onde?"; "Você está com quem?"; "Você está fazendo o quê?"; "Você está com alguém?"
Todo dia eu coloco na balança o prazer de dormir entre abraços e tomar café da manhã juntos VERSUS a minha costumeira rotina de dormir esparramada na beira da cama,acordar e ligar a tv na VH1 e ir tomar café cantando, acabar o café e me jogar no banheiro, para tomar banho cantando besteiras, pensando besteiras e atirando palavrões ao vento porque justo nesta hora o telefone toca e eu saio ensaboada para atender.
Olho para a paisagem bem mais do que olharia para o monstro.
O monstro já está em mim, mando ele dormir, deixo quieto.
Falo com meu outro amigo, Léo, sobre a leviandade dos meus sentimentos e o constante contrabando afetivo que realizo ultimamente. Ele diz que anda nesse barco também. Concluo que ele não ama mesmo a moça, tal como eu não amo ninguém - ninguém/nenhum homem, sabe?
Deduzimos que isso não é leviandade moral, a gente pensa que ama, que gosta, que se apaixona, que se descabela, mas aí as nossas próprias atitudes desmentem nossas falsas convicções.
Nós estranhamos isso: Léo e eu não nos reconhecemos. Acho que nos tornamos infantes, como quem se desculpa dizendo: "Não foi isso que eu quis dizer". Será que passamos tempo demais olhando a paisagem? ou será que convivemos demais com o monstro?
Se você já cresceu e não tem medo de dormir no escuro,converse com seu monstro e aproveite todas as paisagens que 2011 lhe trouxer.
P.S.: Assistam ao filme Onde vivem os monstros, se tiverem tempo ocioso suficiente para isso e se não subestimarem o cinema de animação.