Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 30 de março de 2012

Em cena: carros, pneus e homens...


Gastei a tarde desta sexta-feira pesquisando preços de pneus,andando aqui e ali, quase sem acreditar nos preços absurdos que encontrava pelo caminho. Mais uma vez, a constatação: realmente, a loja especializada vende bem mais caro que os supermercados. Isso vale para itens de informática, também: as lojas especializadas triplicam os preços. Por causa disso é frequente a gente receber aqueles e-mails terroristas acusando os supermercados de vender pneus fora da validade ou à beira de expirar este prazo: mentira de primeira. E tanto é assim que os pneus marcam a semana e o ano (e não o mês e o ano de fabricação) e eu peguei justamente uns feitos na 4ª e na 8ª semanas deste ano,a um preço menor que o anteriormente encontrado nas lojas. Mas não estou aqui para falar de pneus, mas de indignação. Eis os fatos:
Na quarta loja a que fui, pedi para o meu primo ir lá ver a quanto estava. Logo que íamos estacionar o carro, vi uma moça chorando na porta daquela grande loja.
Era um choro silencioso e perplexo.
Ela estava grávida e na loja só haviam homens.
Deduzi que ela foi procurar o sujeito lá na loja e ouviu algum despropósito.
Mulheres grávidas são sempre traídas, o que só vem a piorar no período do resguardo. Então, este é mais um clássico nos relacionamentos.
Não fiquei olhando para ela. Na verdade me identifiquei com aquela dor e não olhei por isso: odeio ter que dar explicações sobre o meu choro.
Entendo os gestos de solidariedade, o desejo de ajudar, mas quem chora não está a fim de dar explicações.
Eu me identifiquei porque pensei no dia em que, saindo de Aracaju, eu quis ficar em paz em minha poltrona e me desmanchar em lágrimas - lágrimas de ódio e de amor contrariado - e aí me apareceu uma conhecida que eu nunca soube de onde me conheceu e eu tive que engolir as emoções e cozinhar meu choro até finalmente estar sozinha em casa, cinco horas depois.
Pensei em nem ir até à moça.
Mas também pensei em todas as vezes em que eu quis fazer o bem a alguém, mas desisti porque não era da minha conta, porque eu poderia ser mal interpretada e porque a omissão tem os seus confortos e todos os confortos nunca me valeram.
Fiz o possível para desviar o olhar e dei graças a Deus por estar com meu primo. Sendo ele homem, nunca iria perceber que aquilo era choro e sofrimento. Meu primo é o homem-rímel: desaparece ao menor sinal de lágrimas.
Ela virou o rosto para o nada e começou a tirar a aliança que eu não havia notado antes.
Então, saí do carro, abri a bolsa e dei um lenço a ela, trocando duas palavras educadas de boa-tarde.
Lá dentro os homens começaram a prestar atenção a isso e eu só queria imaginar qual deles era o cafajeste-monstro responsável pela tristeza de uma moça jovem, grávida e fragilizada.
Ela agradeceu e foi embora.
Sempre imagino as histórias dos outros.
Sempre imagino as dores das mulheres e me solidarizo.
Pensei em Odete Semedo: "A água da lágrima da tua mágoa".
Pensei em nós outras, as que se fecharam por dentro e fogem ao menor sinal de paixão: sabemos que os homens que se sabem amados usam cada mulher como enfeite do ego, adorno de vaidade. Preferimos o desapego, o vazio das coisas ou o esvaziamento do que poderia ser grandioso.
Há homens que não permitem ser amados.São maioria.
Os dois caminhos são terríveis: sofrem as que amam demais - passar por humilhações, então é mais um clássico efeito colateral; e sofrem as que não amam (não sonham, são hirtas e secas, fogem do amor e da dor e não acreditam que esses dois estados se dissociem).
Não há caminhos do meio. Caminho do meio é invenção literária das mais nonsenses de que se pode ter notícias...
Não podemos internamente reagir como homens porque não somos homens e nossas estruturas são diferentes, mas podemos revidar e comprazer com a vingança.
Para mim, vingança é sinônimo de Justiça: bateu, levou.
Podemos relevar alguma coisa a nosso critério, mas no julgamento mais apurado, convém devolver o agravamento na altura da ofensa.
Antes de dormir assisti "À prova de morte",(Death Proof), de Quentin Tarantino.
Sim, que catarse boa: a vingança estava lá, no final do filme.
As três moças se juntam, invertem a perseguição - importunando seu perseguidor - e quando já não há mais estrada que dê conta daquilo (é uma perseguição de carro em que antes ele aterroriza as moças, bate o carro aparentemente indestrutível dele contra o delas; faz e acontece para que elas morram), elas quebram as costelas dele, batem, batem, batem, batem múltiplas vezes nele, vitoriosas.
Bateu, levou!
Vingança é coisa estratégica: pode ser consolidada no desprezo ao outro, no ignorar, no superar, no estar bem... E se vingança é mesmo um prato que se come frio, eu não sei. Porém, sei que vingança é coisa que merece reflexão e a busca por oportunidades de ser executada.
Se eu fosse aquela moça, minha vingança seria lenta, mas começaria pelo distanciamento emocional e culminaria numa separação de fato e na reorganização da minha vida, de modo a após um tempo, eu ter fortaleza e independência o suficiente para que o cafajeste percebesse que não é mais importante, não é amado...
E então,estar bem, ter outros relacionamentos e tratar com distância aquele ser humano, plantando a semente da culpa - porque, afinal,é preciso que haja a parte pedagógica de fazê-lo aprender com os erros cometidos.
Mas isso tudo é ficção, é coisa hipotética. Ele pode mandar umas flores, procurar ser carinhoso e tudo se resolve... Ou não.

quinta-feira, 29 de março de 2012

Direito ao lazer




Sou fã dos mamíferos – ah, está bem, eu sou suspeita, já que sou um mamífero bípede da espécie humana ( o que não me impede de fazer burradas, de fazer escolhas que nem o mais burro dos animais faria e agir como um quadrúpede).
Tenho especial admiração por gatos e por cachorros porque vejo que eles se divertem, eles têm infância, eles têm senso de humor... Eu nunca me veria com um bicho taciturno, tipo um peixe de aquário; ou bichos mal humorados e entristecidos, fossem tartarugas ou infelizes pássaros de gaiola... Mas sei que há os seres humanos perfeitos para esses animais de estimação.
Meus cachorros fazem cabo de guerra com uma corda: inteligentemente juntam uma dupla de um lado e uma dupla e meia do outro (porque o filhote entra nessa brincadeira) e puxam, cada lado, sua porção de corda, arrastando a brincadeira para um festival de mordidas, de enroscar, de puxar, de correr... E eles têm brinquedos e têm curiosidade pelas coisas, por borboletas e besouros, por objetos, pelas pessoas – ah, eles conhecem as pessoas e sabem quando estão tristes ou alegres.
Também os meus gatos são inteligentes, para brincar e para pedir água ou comida – sabem me chamar, sabem pedir atenção e adoram brincar entre si. Acho que reconhecem o peixe de pelúcia e o distinguem do golfinho; conhecem a textura e a resistência dos brinquedos de plástico. São loucos por brinquedos que fazem barulho, mas se for barulho alto, eles se assustam – parecidos comigo.
Não entendo por que eles mordem tanto as coisas – eles, todos eles. Assim um deles destruiu meus sapatos novos e mesmo meu cachorro mais velho, na infância dele, detonou, roeu e destruiu uma blusa caríssima, minha. E também eles roem os brinquedos e têm ciúmes de alguns brinquedos. Agora não tem mais nada em casa: o último brinquedo foi destruído ontem, mas acho que os bichos mordem e coçam as gengivas com eles – e lá vou comprar mais, amanhã. E tenho um séquito de seguidores que já se prontificaram a ir comigo fazer essas compras que não podem ser em pet shop, obviamente, que só tem brinquedo caro e sem graça. Acho que os meus amigos se aproveitam de minha saída às compras para disfarçarem que compram para os bichos deles também... Sempre compram, mas tem esse povo moralista que fica enchendo o saco, alegando que tratamos melhor aos animais do que às crianças... Bem se vê por que não sou mãe: porque quero ter a escolha e já a tenho, para amar a quem eu quiser e cuidar do que me aprouver. Assim, amo meus bichos. E amaria crianças se as tivesse, o que não me impossibilita de amar outras crianças porque elas não disputam o meu amor pelos bichos, que também precisam ser amados e cuidados.
Mais cachorradas fazem uns seres humanos e, mesmo assim, os amamos.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Millôr Fernandes: Humor e Saudades


Vai ser muito difícil dizer que eu gostava do Millôr Fernandes quando, na verdade, eu continuarei eternamente gostando do Millôr Fernandes, presentificando na vida e no verbo este grande escritor que morreu hoje.
Vivo num país que ainda julga que o choro é nobre e o o riso é baixo. Em tempos difíceis, foi a catarse do riso quem nos sustentou de pé ante as vicissitudes. E o Millôr, que eu conheci quando peguei o livro Trinta anos de mim mesmo ( meu primeiro flerte para compor pesquisa de pós-graduação, logicamente desestimulada pela seriedade alegada pela academia)abria muito os olhos dos brasileiros frente as misérias do cotidianos, à Ditadura, à política em geral...
Eu quis muito ter este livro, mas não se vendia em lugar algum: eu peguei emprestado na biblioteca do quartel em que eu trabalhava quando eu era militar. E o fato é mais curioso ainda: alguém doou uma série de livros para o quartel.
Dentre os livros, estava tudo contra a Ditadura e um bando de livros marxistas; e os de humor, então, eram O Livro Vermelho dos Pensamentos de Millôr, da editora Nórdica e o Trinta anos de mim mesmo. Tudo isso foi parar no quartel em que eu trabalhava.
Devolvi o livro que peguei, apesar de saber que ele seria mais útil a mim do que aos bolores, traças e fungos do almoxarifado do quartel, que se pretendia biblioteca.
Antes de devolver, escrevi um artigo que nunca publiquei sobre Trinta anos de mim mesmo - está ali na gaveta, não é mentira. Dividi esta paixão com Joaquim, meu amigo, que muito se divertiu com tudo.
O tempo passou.
Saí do quartel.
Joaquim me disse que existia um Ciquenta anos de mim mesmo, de Millôr Fernandes.
Não dei bola: eu gostava dos Trinta.
Um dia, há quatro anos, meu ex- Pitbull Problemático ( que, aliás, hoje me disse que voltaria à ativa para mordero calcanhar de J.P., por ter sido indelicado com um amigo nosso em comum, que ele tanto gosta, o Mr. John - trouxe-me o livro.
O Pitbull Problemático me deu o livro porque a biblioteca do quartel foi desativada e eles queriam " se livrar" dos livros.
Ele sabia de minha paixão pelo livro, aquele livro: ganhei o livro e uns tantos outros da década de 1940 e 1960, desde peças teatrais até outros livros de humor, como uns de Chico Anísio e títulos que eu nem sei enumerar. Melhor assim: meu país não sabe distinguir entre antiguidade e velharia, para a minha sorte!
Acho linda a primeira página: MILLÔR FERNANDES - Livre como um táxi.
Reproduzo abaixo as Frases Sem Dor, que estão neste mesmo livro:
"Um lar sem mulher é como um oásis sem deserto."
"Faça como nós,que jamais nos curvamos ante os poderosos. Nos ajoelhamos".
"Literatos populares são literatos impopulares entre os literatos".
"Pela maneira como certos sujeitos tocam de ouvido vê-se logo que eles são surdos de nascença".
"um banqueiro pode escrever falsa literatura. Mas vá um escritor falsificar um cheque."
E adoro, sobretudo, a Enciclopédia Britânica Brasileira quando se arvora a fazer biografias:
"Kant:
Nascido em 1724 e morto em 1804, Emmanuel Kant conseguiu nesse período viver 80 anos, tendo pois, aproveitado a vida. Aos 20 anos ele era muito jovem, aos 40 um quarentão, e assim por diante, e ficou famoso como exemplo de introspecção antes mesmo que Freud houvesse inventado esse processo de cada um de nós olhar para dentro de si mesmo..."

E o poema preferido de Joaquim, chamado Joãzinho o monstro:
Joãozinho de automóvel
Corre a 90 no cais.
Dona Marta ia passando.
Agora não passa mais.


E para finalizar, ainda do Trinta anos de mim mesmo, "Só sei que nada sei", poesia com auto-crítica:
Há os que não sabem antropologia
e os que ignoram trigonometria.
Mas só de mim ninguém pode falar nada.
Minha ignorância
não é
especializada.

Requiescat In Pace, mestre Millôr! que os anjos o recebam com os mesmos sorrisos que aqui você deixou.

terça-feira, 27 de março de 2012

A diferença dos iguais



Estou com a estranha sensação de que os livros que leio dizem a mesma coisa. Acho que é porque ao tratarem do mesmo tema recorrem às mesmas argumentações e fontes; por outro lado, eu comecei as coisas de cabeça para baixo. Assim, depois de ler a História do Riso e do Escárnio, de Georges Minois, tudo só parece repetição dele. E eu caí na besteira de me encher de livros sobre ironia e sobre humor, temendo bancas ranzinzas que só notam aquilo que deixou de ser lido e não o que aparece; assim como costumam fazer a respeito do que foi escrito. Parece ser mais importante aquilo que deixamos de lado, mas, enfim, estou de volta à tese.
Gostei de todos os livros que comprei, apesar de parecer que eles dizem a mesma coisa... Temia que eu fosse fazer a mesma coisa,isto é, uma repetição, embora num outro prisma. A sorte é que o meu objeto é outro e, excepcionalmente e graças ao meu orientador, minha tese é mesmo inédita.
Nem apostei nisso: achei eu faria uma discussão repetitiva, desde antes, quando eu estava focalizando as figurações da nacionalidade. Um orientador inteligente faz toda a diferença: ele dá nome às coisas que eu estou a inferir; ele guia mesmo o caminho... E quando eu proponho alguma coisa que ele reconhecidamente não domina, ele permite que eu ande sozinha, que eu tenha independência. Mas há coisas que eu não sei fazer: não tenho a sistemática que ele quer, ao me pedir um sumário de intenções de escrita. Juro: minha compulsão é mesmo e tautologicamente compulsiva. Deste modo, vou escrevendo. Aí as coisas vão aparecendo. Depois de um tempo eu me distancio e olho o que é aquilo. E a escrita toma forma, mostra suas margens e desdobramentos... E assim se faz capítulo e sub-capítulo.
Assunto, temas, eu sei sim, o que fazer e sigo o plano de vôo da pesquisa. Mas se eu não me deixar solta das amarras metodológicas, não crio nada, não escrevo nada.
Deixa eu colocar esse assunto de lado porque, na verdade, eu ando é assanhadinha porque passei a noite de ontem lendo os livros que dizem a mesma coisa e, depois, prazerosamente, voltei a Georges Minois.
Não tenho a cara de pau de dizer que já li todas as 633 páginas do livro dele – são 633 excetuando-se as referências e demais anexos – entretanto, vou fazê-lo logo, logo. Até porque ao consultar outras fontes constatei que ele é o melhor dos teóricos sobre o riso. Dizendo na melhor das linguagens: o cara é phoda! O livro dele é a bíblia do riso e do humor, abarca mesmo os temas e faz uma revisão que pega todos os bambambãs e passa a limpo os acertos, as falhas e os equívocos.
Então, seguindo adiante, pela primeira vez na História da República soube de algo surpreendente no que se refere à atitude de um psiquiatra: mais uma amiga que está em sofrimento psíquico resolveu ir atrás da solução que qualquer ser humano do nosso tempo procuraria: medicamentalizar o sofrimento.
Não falo de qualquer pessoa, mas de S., uma amiga que sabe muito bem o que é o bem-estar maléfico.
Lá foi ela, atrás da salvação dos problemas, conversar com o psiquiatra. Ele, todavia, pegou o receituário na frente dela e disse que não iria prescrever nada, que ela passasse seu luto emocional como as pessoas comuns, filhas de Deus, sempre passaram: enfrentando a experiência.
Ela fez cara de espanto, alegou que não dormia. Ele disse: “Eu posso passar qualquer remédio para você. Você vai dormir. Quando, porém, você acordar, os problemas estarão te esperando.”
Que surpreendente ética. Certamente ele perdeu as comissões das empresas farmacêuticas, mas ganhou muitos pontos conosco. Até mesmo com ela, que viu na atitude dele, apesar de inicialmente se sentir contrariada, um ato que transmitiu segurança na capacidade dela de resolver os próprios problemas. Olha, o cara é psiquiatra: cabe a ele aplicar fármacos como tratamentos. E ele declinou disso porque infelicidade e sofrimento é parte da vida e não se cura com remédio.
Minhas outras amigas já são dependentes, não tem jeito.
Já as acompanhei desde os primeiros tempos, quando as pupilas delas ficavam dilatadas e elas ficavam lentas, me fazendo duvidar que estivessem acordadas, apesar de estarem de pé. Quase todas foram parar nesse ponto por causa de algum vínculo quebrado em que havia dependência emocional, frustrações, lutos afetivos e sentimentos de menosprezo. Já tem tempo e nunca irão mudar, porque camuflam os efeitos colaterais dos processos existenciais que nem sempre é o que queríamos.
Nunca vão se curar porque anestesiam os sintomas, mas não atingem as causas. E os problemas emocionais não podem ser delegados a terceiros: ou a gente enfrenta, ou eles estarão ali, à espreita, aguardando uma brecha para detonar crises. Seja como for, louvo este psiquiatra ético e humano que não se deixou devorar pela moda da prescrição indiscriminada de psicoativos, em tempos de crescente rivotrilização da vida.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Reza



Deus me proteja da sua inveja
Deus me defenda da sua macumba
Deus me salve da sua praga
Deus me ajude da sua raiva
Deus me imunize do seu veneno
Deus me poupe do seu fim

Deus me acompanhe
Deus me ampare
Deus me levante
Deus me dê força

Deus me perdoe por querer
Que Deus me livre e guarde de você

(Rita Lee - Reza)

Harém de tudo


Estive fora do ar, atolada em trabalho. De novo, para mim, nada melhor do que chegar em casa.
Sempre que demoro fora de casa, entendo melhor o significado real de “minha casa é meu reino”, mas isso não quer dizer que tenha sido ruim estar fora.
Rio de algumas continuidades e de coisa fúteis e bobas lá pelas terras longínquas por onde andei, como o fato de eu constatar o desgaste do sofá da sala do Bigbrother local. Tá, não tem nada demais, mas é que não se justifica e parecem unhas de gatos, apesar de não haver gatos por lá...
Também acho engraçado – e tem aqui uma assumida dor-de-cotovelo que se relaciona com a minha condição de mulher e não da pessoa em lide, em si, já que ele pouco me interessa, aliás, como homem ele significa tanto quanto um pedaço de isopor, é meu amigo e eu nunca olhei para ele com outras intenções mesmo – a força da palavra poética, aqui ironicamente tratada por mim.
Nunca escondi que tomei algumas boladas nas costas por cair em papo de poeta. Acho que eles formam a casta dos cafajestes disfarçados de artistas sensíveis e as mulheres que se enrolam com um deles nunca saem ilesas.
Acho que me assustei foi com o tamanho do harém.
Não obstante, até moças desavisadas e recém-chegadas foram experimentar in loco a palavra poética – o que me deixou constrangida na condição de testemunha. Aqui, eis o problema da Modernidade: não a superação, mas o convívio entre o velho e o novo. Aí, acumulam-se as de ontem e as de hoje, na mesma e velha disputa para ver quem será a “única”, apesar daquela que se pensa única tentar oficializar seu monopólio colocando frágeis símbolos no dedo anular de ambos.
De todo modo, elas convivem: fica o dito pelo não dito. E elas são muitas: isso não vai acabar bem.
Quem acha que finalmente eu esboço uma nítida inveja, acertou: se fosse uma mulher a protagonizar tamanha rede de relacionamentos e sustentar um harém masculino (deve haver um nome próprio para isso), o mundo desabaria. Depois, sempre me queixei de que saí de lá com uma lamentável conduta ilibada, quando eu queria é deixar meu nome inscrito no rol dos escândalos e lascar no meio esse meu superego.
O outro lado das coisas é solidariedade feminina: elas se machucam. Começam se divertindo, mas se machucam... e tenho pena das mais fracas porque elas sofrem mais e têm mais esperanças de vencer a luta que, na verdade, já está perdida por todas, até por quem pretensamente já venceu. O caso é que não muda. Nada muda. Mulher é mulher, cafajeste é cafajeste. E quando um encontra o outro, pimba!

terça-feira, 20 de março de 2012

Tudo nonsense


Hoje o dia foi bem nonsense e por isso o post será bem nonsense, quase um mosaico.
Fui à dentista.
Excepcionalmente uma dentista: sexo feminino, como nunca antes. Namorei três dentre os quatro dentistas com que já fiz tratamento. Acho que eles me deixaram de boca aberta em muita coisa. Mas, mera coincidência: não escolhia os dentistas pelo sexo.
Dei risada durante metade da profilaxia, porque ela me entupiu com uns aparelhos e produtos que me davam cócegas na mucosa, na gengiva, na língua... E acho que o meu sorriso só se desmanchou na hora de pagar a conta astronômica, que me fez ver estrelas. Ai, doeu!
Saí de lá já um pouco após as onze horas.
Olhei nos olhos dele, depois de ter hesitado tanto em aceitar o almoço, e o que vi foram pelo menos uns três divórcios ou coisa parecida. Só pensei em complicações, em um bando de ex, em um bando de filhos... De modo que achei que o passado dele era bem maior que o meu e que isso já determinaria uma desvantagem para mim.
Todo mundo tem passado, já disse mil vezes... Mas, vá lá, o dele poderia interferir para além de uma pensão judicial.
Coitado! Olhava para a minha cara na maior animação, cheio de esperanças... E minha cabeça ali, complicando, complicando... Nem era a minha cabeça: é que eu gosto de outra pessoa, que está longe, e nem sei como me deixei convencer a ir ao almoço. Talvez porque as melhores escolhas que a gente faz são mediadas por um leque de alternativas, de opções... aí pensei como minhas amigas e resolvi ir ver mais de perto a situação. Mas já fui com idéias pré-concebidas.
Sei lá se há divórcios mesmo... Sei que há um passado grande, maior que o meu, e um bando de complicações à espreita.
Pensei em quem deseja a morte, mas não viaja de avião porque tem medo de morrer. Achei que nonsense mesmo é isso.
Voltei e pensei em mim mesma, que tenho medo de viver demais, enquanto também não quero definhar e preferia morrer sem perceber que morri e isso é um troço genérico e generalizado: mil pessoas dizem que preferiam morrer enquanto dormem.
Desisti de uns planos malucos que não tinham nada a ver com a morte.
Não eram planos tão malucos, mas era obra e graça de desespero. E meus desesperos não são questão devida ou morte, são coisas de minha pressa em resolver as coisas.
Odeio coisas que só se resolvem aos quarenta e quatro do segundo tempo: se eu pudesse resolveria tudo o quanto antes; faria o que houvesse para fazer; tomaria as iniciativas e faria os preparativos fosse lá do que fosse.
Descobri que me magoei por causa de uma pessoa ruim, daquelas que se deve amar à distância: é que tenho pena dela. Olha, tenho pena de verdade, compaixão absoluta... Mas está ali alguém que sabe magoar o outro. E como eu também não tenho medidas na hora de devolver os estragos das feridas, acabo batendo bem mais forte do que o meu ferimento e sendo desproporcional ao devolver a ofensa que teoricamente teria que ser apenas à altura do agravamento. Ela é uma mulher sozinha. Bem sozinha. E quando ela descobrir isso será muito tarde.
Pelo menos os outros sabem que são sós – disfarçam, procuram filhos, amigos, festas, igrejas, mas sabem que são sós. E os que não sabem, o que será deles?
Conversei em pensamento com Lacan. Mas, que coisa, ele anda me perturbando: “ O melhor destino de uma mulher é ser mulher de um homem”... Está aí a única coisa em que costumo ser procrastinadora: questões psíquico-sentimentais. Ah, decisões que eu não queria tomar nunca...
Fui lá, tomei a bênção.
Gosto de passar por ali.
Vi uns quatro homens bonitos hoje, verdadeiramente bonitos. Depois, pensei em Thales, que é o homem mais bonito desta cidade... Sempre me pergunto: “onde estão os homens?”
Depois da bênção, rezei para que Lacan me deixasse em paz – ora, pois, que perturbação! – porque amanhã viajo cedo, “a estrada é longa, o caminho é deserto e o Lobo Mau pode estar por perto!” e se brinco com essa parlenda, penso no Lobo Mau, E., pai do meu ex-flerte... Mais um pouco e eu seria Juliet Binoche em Perdas e Danos...
Descasquei uns abacaxis e dei uns chiliques em cima de uma pessoa folgada. Será que estou de mau humor ou acabou o meu tão pequeno estoque de paciência? Pensei no quanto eu gosto da criatividade da minha amiga que subescreve o seu blog como Pensamentos Histéricos: poxa, diz tudo, tudo! Um título desse e nãos e precisa dizer mais nada... Bom, pelo jeito nem Freud nem Lacan me largam até que eu pague as dívidas acumuladas que tenho com os dois.

segunda-feira, 19 de março de 2012

No nada



Ah, sim, a santa curiosidade pelo "nonada", que quer dizer isso mesmo: No nada.
E para não ser injusta, deixo transcritas as primeiras linhas da narrativa de Guimarães Rosa, do único livro dele que vale a pena (reitero: odeio os contos, todos, todos!),pelo menos para mim, Grande Sertão: Veredas.

NONADA. TIROS QUE O SENHOR ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvores no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Daí, vieram me chamar.Causa dum bezerro: um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser – se viu –; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebitado de beiços, esse figurava rindo feito pessoa. Cara de gente, cara de cão: determinaram – era o demo. Povo prascóvio. Mataram. Dono dele nem sei quem for. Vieram emprestar minhas armas, cedi. Não tenho abusões. O senhor ri certas risadas... Olhe: quando é tiro de verdade, primeiro a cachorrada pega a latir,instantaneamente – depois, então, se vai ver se deu mortos. O senhor tolere, isto é o sertão.

O cachorro e o lobo: travessias de Antônio


" Eis-me de regresso a essa terra de filósofos e loucos, a começar pelo meu pai, que disso tudo tem um pouco.
E se aqui estou é por causa dele mesmo. Ou melhor, dos seus oitenta anos. Foi uma festa de arromba, me disseram. No dia seguinte!
Um presente de grego, pensei, sem saber se ria ou chorava. Sim, só fiquei sabendo quando tudo já havia acabado e todos já estavam pegando o caminho de volta. E aí uma boa alma deu por falta de uma rês que fazia muito se desgarrara do rebanho. E fez o que seu coração mandava e suas pernas ainda podiam agüentar: correu. Como se algum filósofo lhe tivesse soprado ao pé do ouvido que não é a fé que remove montanhas, mas o complexo de culpa."
(TORRES, Antônio. O cachorro e o lobo. Rio de Janeiro: Record, 1997, p. 07)

Minha paixão por Antônio é caso velho e mal-resolvido.
Não por mim, que o amo declarada e assumidamente, mas pela madrasta má que nos separou: minha ex-orientadora que me fez me desfazer de tão prazerosa companhia. Mas eu não largo Antônio Torres, não. No meu possível, cá está ele em meu caminho. E eu pus dois de seus livros na pauta da minha disciplina a ser ministrada na Especialização.
No coração, em primeiro lugar está Essa Terra; depois, O cachorro e o lobo e, após este, Meu querido canibal. Meus três preferidos – mas a obra é vasta e o autor é versátil.
Reclamo muito de O cachorro e o lobo: dura pouco, dura o tempo da visita que o “cachorro” faz ao “lobo”, seu pai – e isso não deve ser contado por número de páginas, mas pelo fluxo temporal que o narrador imprime. Com isso, as 207 páginas nem chegam a ser cinqüenta, subjetivamente sentidas.
Antônio Torres é um dos raros escritores que alcançaram reconhecimento e guardaram a modéstia, a empatia com o público, uma certa gratidão, talvez, porque o homem é muito receptivo, educado, simples – ah, ele é uma paixão mesmo!
Essa Terra é um romance mais dolorido, assim eu acho. Li com a dor dos personagens, porque os inegáveis traços autobiográficos e a astúcia do autor conferem um efeito de verdade que dói na gente. Amo essa ficção perigosa, enganosa, que convence o leitor “da dor que deveras sente”, ainda mais porque o espaço narrativo é familiar ou é familiarizado, melhor dizendo. E eu, que nunca andei no Junco (atual Sátiro Dias) leio com a maior verdade, também – e eis uma coisa em que eu acredito: um leitor que põe verdade na maneira como lê, revoluciona sua leitura, traz verdade à ficção ou acrescenta à ficção.
Para quem não gosta deve ser tão chato quanto me parecem os contos de Guimarães Rosa: nada com nada, ou como diria ele, nonada.

"Tente entender tudo mais sobre o sexo!"


Ontem Guarajuba estava anormal.
Não faltou o sol, nem o ambiente bonito, tranqüilo e organizado de sempre, mas o mar estava com uma maré alta perturbadora e não houve negociação entre os meus interesses e os da natureza: o fato é que eu fui apenas duas vezes à água, em curtíssimas durações, com mergulhos tímidos e um desconforto absurdo diante do mais forte – e o mais forte, neste caso, eram as ondas.
Não entendo direito porque a gente pensa diferente de acordo com o ambiente.
Nunca me convenceu essa história de “sair para espairecer”, porque a mente da gente é a mesma, onde quer que a gente a leve; e a tristeza; e todos os movimentos afetivos que regem a nossa vida. Mas ontem eu vi que não, que na praia se pensa diferente, talvez com tranqüilidade, talvez seja por causa do confronto silencioso com a grandeza do mar – grande, lindo, tenebroso e, neste tocante, que se seja relembrado o meu pavor de águas profundas e a minha incapacidade de desejar passear em cruzeiros e similares.
Não fui à praia para pensar na vida. Aliás, penso na vida nos momentos mais inoportunos: antes de dormir, por exemplo. A depender, isso costuma me tirar o sono.
Também ao acordar, planejo mentalmente o meu dia e, quando nas segundas-feiras, planejo a semana inteira e adoro ter isso como pretexto para ficar enrolando na cama, enrolando para levantar, adiando o acordar propriamente dito. Amo o meu sono. Mexa com tudo meu, mas não mexa com o meu sono – até porque, nunca pude evitar xingar mentalmente qualquer um que me acorde.
Senti falta de uma determinada amiga minha na praia. Parei para pensar no que ela insinuou sobre o marido dela, me fazendo entender que ele reservava o melhor sexo e as maiores possibilidades de prazer para a amante dele.
E quem não é assim? Seja homem ou seja mulher, os amantes existem para possibilitar viver o que não é possível na relação “oficial”. Melhoram, inclusive, a relação oficial porque a culpa fica numa extremidade e a excitação pelo segredo mantido e o perigo constante ficam na outra, equilibrando a balança duvidosa dos cálculos morais.
Gosto da minha amiga demais, mas ela está negociando o inegociável, já que morre de ciúmes e entra em disputa com a amante. E a amante, coitada, se pensava namorada e, como todas as amantes, sonhava em galgar o posto de esposa, sair da clandestinidade – descuidando que, uma vez esposa, trocaria de lugar, mas não de situação (sempre haverá outra amante) e, claro, os homens nunca se separam, mesmo que se ocupem em maldizer do casamento, do sexo esporádico com a esposa, dos filhos que o prendem e de outras historinhas clássicas que nem a mais imbecil das amantes pode acreditar (mas acreditam por conveniência).
Minha amiga está murcha há um tempo, com cara de que morreu e esqueceu-se de enterrar. Um cadáver ambulante, emocionalmente em decomposição: eis a minha amiga. Mas mulher entra na disputa, não larga o osso, espera passar, espera tudo mudar, espera promessas radiosas do marido e se contenta com a calmaria imediata ao flagrante. Depois tudo volta ao normal.
Falávamos dessas coisas antes de ela casar e pensávamos de forma semelhante: os desejos não cabem num casamento. Logo, sempre haverá traição, se é que o nome cabe, pois ou se trai uma pessoa ou se trai os próprios desejos.
Isso é no pano racional das coisas. Emocionalmente o bicho pega.
Ela caiu no labirinto do “ “o que é que ela tem que eu não tenho”. A resposta é clássica: nada. Não se mede qualidades e vantagens das amantes, mas o poder inovador da diferença, a mão embelezadora da diferença... E aí eu me lembrei de um fragmento de um poema que eu suponho ter sido do T.S. Elliot ( e se não for, é que minha memória é curta e confusa, mas que se registre minha intenção de reconhecer a paternidade do verso) em que se diz que "o atual só é atual por um tempo". Traduzindo: tudo sofre a ação do tempo. Não demora até que o tempo torne as coisas passado – para o Bem e para o Mal. Somos seres de tempo e do tempo e não estamos acima dele. Também amantes se tornam tédio. E maridos. O caso é que mulher é educada para sublimar os desejos.
O maior e o melhor tempero do sexo é o desejo. Talvez por isso seja conveniente não ceder, porque sexo com desejo sempre ultrapassa as fronteiras da carne – sendo carne, é físico e é etéreo. Mas, deixo essa conversa por aqui, porque sei que ela vai ler e me ligar para conversar e eu vou aproveitar para dizer das coisas e dos homens da praia, ontem – e ela vai lembrar que é um ser desejante, também. E para que ela "tente entender tudo mais sobre o sexo", fica a Pérola Negra do Luiz Melodia - um dos melhores shows a que já fomos juntas - e solteiras.

Tente passar pelo que estou passando
Tente apagar este teu novo engano
Tente me amar pois estou de amando
Baby, te amo, nem sei se te amo

Tente usar a roupa que eu estou usando
Tente esquecer em que ano estamos
Arranje algum sangue, escreva num pano
Pérola Negra, te amo, te amo

Rasgue a camisa, enxugue meu pranto
Como prova de amor mostre teu novo canto
Escreva num quadro em palavras gigantes
Pérola Negra, te amo, te amo

Tente entender tudo mais sobre o sexo
Peça meu livro querendo eu te empresto
Se inteire da coisa sem haver engano

sexta-feira, 16 de março de 2012

Fachada e interior

Idem!


Rapaz, que situação! Daquela vez, balancei. Uma vampira. Certa grandeza em tanto oferecimento de carne – me tome, me destrua. Ardor de viver? Mulher/chama? Assustava todo mundo, quem receberia tanto presente? A gente adivinhava um excesso qualquer naquela mulher, ela sobrava e era demais. Maluca? Neurótica? Sabe uma dessas para as quais só importa mesmo a vida amorosa/erótica? Temperamental, possessiva, ciumenta, isso me deu um susto. Tive de fazer força para sair logo de baixo. Com certa dor no coração – necessitada, também, de proteção, é engraçado. Tinha uma espécie de infantilidade, como a Marilyn Monroe era infantil, aquele tipo de coisa. Fútil e desamparada. Procurei ser bem objetivo – vejo você é na cama, eu disse a ela, logo no começo.
(Quando chego perto de você, eu sinto um frio, mas é um frio gostoso. Nem que seja só uma vez, quero apertar você em meus braços).
Afinal, não era mais criança, e passada por outras mãos. Eu não era louco de desarrumar minha vida. Mas ficou uma nostalgia, sabe?

(COUTINHO, Sônia. Uma certa felicidade. Rio de Janeiro: Rocco, 1994, pp. 65 – Trecho do conto Essas tardes de maio)

Assim falou... (Sônia Coutinho)


Não sei direito onde as coisas se encontram, ou onde se justapõem umas sobre as outras, mas sei que algumas coisas me levaram a pensar em Sônia Coutinho, tanto em Atire em Sofia quanto no livro de contos Uma certa felicidade.
Acho que a culpa é do dia de ontem: de novo, uma das minhas amigas da turma do "deixa disso" resolveu me ligar para dizer o quanto eu sou dura, intransigente, inflexível e o quanto eu levei longe demais o meu afastamento de uma ex-amiga.
Eu até tomaria a iniciativa do reatamento dos laços caso eu estivesse errada na perspectiva do evento que desencadeou o fim da nossa amizade; ou se fosse lá uma boa amizade, eu recolheria o meu orgulho, guardaria embaixo do tapete e reataria tudo. Um orgulho ferido é um preço baixo para uma amizade desejável. Mas não é o caso, eu não tenho interesse e eu já estava mesmo cansada de tudo.
Além disso, pouco me dou a sustentar as mentiras sociais necessárias ao prosseguimento da amizade: iria ser um troço falso da minha parte. Quebrou, não tem conserto que dê jeito... Então alguma coisa ali me lembrou as personagens de Sônia Coutinho.
Também ontem um garoto de programa escreveu para mim,oferecendo os serviços dele. Como ele obteve todos os meus e-mails? porque aliás, apenas os amigos íntimos têm os referidos e-mails, bem separados para assuntos acadêmicos e profissionais e para os assuntos aleatórios - inclusive para os chatíssimos e-mails de correntes inúteis e outras ameaças espirituais.
Mas, vejam só: o garoto de programa escreve como mulher. Tem repertório, tem argumento, acentua corretamente, tem coesão, tem tudo que geralmente os homens não têm ao escrever, porque homens economizam em palavras, em acentos, em gramática, e dizem que isso é objetividade.
Desconfio que ele seja criação de minhas amigas ou de algum ex-namorado querendo me pregar peças. Aliás, para corroborar a mentira, diz ele que só atende mulheres, o que é impossível neste ramo. Nem por isso deixei de achar engraçado e astucioso.
É sempre engraçado receber propostas de possíveis profissionais especializados do ramo erótico... Ou podem ser apenas as dores-de-cotovelo daquele que se julgava o máximo por ter sido o primeiro, mas que descobriu que ser o primeiro num sentido não é ser o melhor em outro e, pelo menos para mim, contam as experiências verdadeiramente significativas - o que não foi e não se aplicariaa ele, definitivamente.
Sofro toda vez que tenho que ser grossa para convencer o idiota que eu não tenho interesse por ele - quem me interessa está muito longe agora, por sinal -, que eu não quero nada, que eu não tenho saudades de nada e, assim, tenho que partir para as palavras mais ofensivas, isso quando eu já cansei do esconde-esconde, de mudar de caminho e de sumir do MSN para driblar as coincidências que ele providencia.
Da última vez em que ele cruzou o meu caminho, há dois dias, disse com todas as letras as coisas que eu realmente penso e sinto com relação ao Ex-Grande Amor da Minha Vida - esta, sim, uma experiência significativa, de valor emocional inconteste.
Diz a Sônia Coutinho:

"Foi ele que me ensinou a fazer amor. E isto era bom. E isto era verdadeiro. Nenhuma sensação iguala ao que se segue ao ato físico – o torpor, quase um nirvana. Relaxados, depois do orgasmo, nos olhávamos com gratidão pelo prazer que havíamos dado um ao outro. Alguns minutos depois, acendendo um cigarro, ele me fazia sempre o mesmo pedido: conta,conta toda nossa história outra vez.
Na penumbra, entre os cansados odores do amor, eu fechava os olhos e começava de novo a lembrar, como o mágico abre a sua caixinha e faz mil ofertas às crianças – água virando de verde em azul, os lenços coloridos que se multiplicam, tudo em atmosfera onírica de caleidoscópio."
(COUTINHO, Sônia. Uma certa felicidade. Rio de Janeiro: Rocco, 1994, pp. 9-10 – trecho do conto Uma certa felicidade.)

quarta-feira, 14 de março de 2012

Um exemplo


Na imagem eis um exemplo do que eu acho que não ultrapassa a beleza gráfica, simétrica e plástica: não consigo achar este ser humano bonito ou lindo verdadeiramente - mas quem sou eu para negar os atributos deste corpão bem definido? entretanto, falta alguma coisa aí (meu primo diria que falta é masculinidade no cara...sei lá, "sem sal"...).

Música, barulho e som



O ser humano é um animal barulhento. Para se comprovar isto, basta ver o quanto nos esforçamos para manter “um minuto de silêncio” quando requerido em momentos solenes e fúnebres. Mas, também é isso: o silêncio é fúnebre. Se passar da medida ele passa a não representar paz, mas “o silêncio frio das coisas mortas” como bem disse o poeta amigo meu.
Não imagino a vida sem música.
O humor determina o tipo de música que eu gosto de ouvir, mas às vezes ouço a música triste sem estar triste porque ela começa, então, a significar mais do que o ritmo que apresenta.
Gosto de sexo com música também. Deve ser uma esquisitice minha, mas talvez eu viva os meus romances como quem executa uma dança ou talvez eu não tenha que gastar meus dois neurônios procurando justificativas para minhas preferências.
Contudo, receber um amigo em casa e ligar a televisão é o cúmulo da desatenção – quebra-se o silêncio sem se preencher nada. É como se ali houvesse uma escapatória àquela presença crua. Por isso minha amiga e eu não entendemos a aflição de uma terceira amiga ao constatar que estávamos conversando com a televisão desligada.
Suponho que seja para preencher os momentos de silêncio.
Ouço de tudo que posso e nos dias de extremo bom humor, me demoro no banho, escolho o CD adequado e fico sob a água, cantando e aproveitando o momento.
Ouço músicas esquisitas, com letras nonsense,com escrachos, paródias, por isso quando as minhas visitas se delongam em minha casa começam a me dar aflições, porque elas nunca entenderiam porque estou ouvindo Raimundos, com aquelas letras carregadas de palavrões, ou porque gosto de ouvir tanta bobagem com ritmo alegre, com ironia e com um humor duvidoso.
É um negócio esquisito isso tudo, porque me dá a maior coceira mental estar num carro em que toca música sertaneja, ou um arrocha ou uma música brega bem brega mesmo. Mexe comigo e eu quero descer do carro e pedir pelo amor de Deus para parar o som. Imagino que o povo do axé deva sentir o mesmo ao estar em minha casa.
Das brigas que eu já tive, boa parte foi por desentendimento de repertório musical. E coisa que eu odeio é gente que no natal coloca música natalina no carro; no carnaval, coloca música carnavalesca, no São João, coloca música junina e assim segue com uma trilha sonora temática chata do cacete! Pior do que isso é ter que ouvir Chiclete com Banana – ah, meu Pai Celestial, como é que se ouve aquilo? E o pior é não poder declarar que não gosto, porque não dá para lutar contra ma unanimidade.
Algumas músicas instrumentais me deixam nervosa porque passam a sensação de velório. Tem até um CD não sei de quem que se chama Música calma para pessoas nervosas.Ah, deve ser do Ira!, que por sinal eu gosto. Não me acho nervosa, mas sou hiperativa, agitada, impaciente, meio afoita no sentido de resolver o que houver para resolver, fazer o que há para fazer – o que reflete muito na minha escrita acadêmica, principalmente.
Também gosto de silêncio.
Uma coisa eu me perturba em São Paulo – e mesmo quando durmo no apartamento de Ilmara, em Salvador – é o barulho urbano constante. Tem sempre um carro na rua, vários carros, várias freadas bruscas, várias sirenes, várias vozes...
Sei que as pessoas acabam incorporando os barulhos da cidade à rotina, à “normalidade” do dia-a-dia. Não consigo. As berrarias da fé da igreja que fica no fundo de minha casa me incomodam, sempre.
Nos dias de Micareta, sofro com o som dentro de minha casa, por isso opto por ficar na festa, mesmo sob chuva – ah, tá bom que o Barracão de Engenharia e o de Educação Física me prendem na folia, não vou ser hipócrita – mas o meu sono segue sendo sensível a quaisquer decibéis, até o som de uma formiga desmaiando me acorda...
Mas música é “barulhinho bom”, como diria Marisa Monte.
Enquanto escrevo a televisão está ligada no Canal Brasil, e está passando Clipe Brasil e, por incrível que pareça, passou o Djavan cantando Lambada de Serpente, na versão atualizada, de 2011, com arranjos incríveis.
Acho linda a música; “lambada de serpente/ a traição me enfeitiçou./Quem tem amor ausente/ já viveu a minha dor.”
E Djavan é lindo sem sequer chegar a ser bonito: como isso é interessante, parecendo antagônico sem ser.
Quantos de nós não consegue reconhecer a beleza dos bonitos porque eles não têm sensualidade, nem empatia, nem simpatia, nem coisa alguma além de uma beleza gráfica, simétrica, plástica.
Nem poupamos expressões para estes: sem sal; sem graça, ou como diria Helena Parente Cunha ( acho que é em As doze cores do vermelho) “Com cara de caixa de papelão”.
Sabemos muito bem o que é uma pessoa gostosa. E ainda mais o que é uma pessoa linda – é como se houvesse, de repente, gente para o deleite contemplativo dos olhos e gente para contemplar e degustar. As pessoas realmente bonitas, lindas, gostosas, elas têm sabor – e o sabor excede a própria carne, são gostosas de ver, de ouvir, de imaginar... Ah, sei lá mais o quê para expressar isso.
E antes que alguém que não conheça a música do Djavan pense errado e comece a achar que se trata de uma lambada à là Beto Barbosa, em que o dançarino se contorce como uma cobra, aproveito para advertir que não é nada disso, é uma linda música lenta...

terça-feira, 13 de março de 2012

Adaptações


Bom, com a diversidade sexual, melhor ter banheiros que a comportem. Neste caso, nem dá para saber o que colocar como terceira opção, porque fica tipo pauta de reunião de Departamento: O que ocorrer; ou como consta no Manual dos Indecisos: Outros. Sei que o Kibeloco achou este fantástico exemplar de adaptação num interior baiano um pouco mais interiorano do que a cidade em que moro, provando que Paulo Afonso está antenada com as demandas contemporâneas de comportamento. Parabéns!

Assim falou...(Milan Kundera)


"Os caçadores de mulheres podem facilmente ser divididos em duas categorias. Uns procuram em todas elas sua própria ideia de mulher, como lhes aparece em sonho, subjetiva e sempre a mesma. Outros são levados pelo desejo de tomar posse da infinita diversidade do mundo feminino objetivo.
A obsessão dos primeiros é uma obsessão lírica: procuram a si próprios nas mulheres, procuram o seu ideal e são sempre e continuamente frustrados, porque, como sabemos, é impossível encontrar o que é ideal. Como a frustração que os leva de mulher em mulher dá à inconstância deles uma espécie de desculpa melodramática, muitas mulheres sentimentais acham comovente essa poligamia convicta.
A outra obsessão é uma obsessão épica, e as mulheres não vêem nisso nada de comovente: como o homem não projeta nelas um ideal subjetivo, tudo lhe interessa e nada pode decepcioná-lo. Essa incapacidade para a decepção tem qualquer coisa de escandaloso. Aos olhos do mundo, a obsessão do épico não pode ser perdoada (porque não é resgatada pela decepção).
Como o sedutor lírico persegue o mesmo tipo de mulher, nem notamos que mudou de amantes; seus amigos estão sempre provocando mal-entendidos, pois não percebem a troca de companheiras e chamam todas pelo mesmo nome."
(KUNDERA, Milan. A insustentável leveza do ser. Rio de Janeiro: Record, 1983, p. 202)

P.S.: Mais uma vez declarando que A insustentável leveza do ser é o livro da minha vida...

segunda-feira, 12 de março de 2012

No meio do caminho


Meus amigos estão fazendo tatuagens tardias; outros deles estão formando bandas de rock; alguns, saindo do armário (e dane-se a mamãe!), uns tanto se divorciando... E eu não estou aqui para criticá-los. Antes tarde do que mais tarde ainda. O problema agora é comigo, que estou sendo forçada a fazer minhas reavaliações.
Ele, aquele que só volta a Feira de Santana em 2013, achou por bem colocar os pontos nos “is” – e em homenagem aos meus amigos da Lingüística, vou até estilizar: colocar os acentos gráficos nas semivogais – e, como infelizmente os homens inteligentes fazem observações inteligentes, veio questionar o futuro de nós dois. Não assim, como pareceria cabível, mas batendo forte contra o meu calcanhar de Aquiles, ou seja, minha decisão de não ser mãe.
Concluiu que eu acho que ser mãe é condenar alguém a viver, é jogar uma pessoa na vida e que, portanto, a vida para mim é um castigo.
Acertou em cheio, tanto quanto o meu amigo Chuck o fez, há um tempo.
Nunca escondi que acho a vida “dose para leão”. Acho a vida um fardo, um castigo... E tanto é assim que eu faço tudo para ser feliz, só para contrariar o óbvio.
Tenho medo da Eternidade, tenho medo de reencarnação, tenho medo de demorar a morrer, tenho pavor de qualquer coisa que me delongue no planeta. E se assim penso, não quero fazer isso com mais ninguém, não quero procriar.
Precisaria um motivo maior que a curiosidade genética ou a “vontade de ser como os outros” para eu ter um filho. Só mesmo um amor imenso, intenso, incomensurável para demover a minha convicção, mas o amor à ideia de ter um filho... E eu não tenho esse amor.
Como homem inteligente que ele é, sabe muito bem onde está se metendo... Eu é que já não sei se ele vai seguir em frente.
Em meados dos anos 90 eu estava entrando na universidade; ele estava se casando – e ainda tem isso, porque a ex dele é linda e eu nem chego aos pés da criatura, segundo meu espelho. E como ele discorda, tenho medo de que a visão turva dele seja conseqüência da paixão e que passe com o tempo e lhe venham as comparações.
Eu queria namorar o resto da vida.
A gente se conhece há tanto tempo...
Não queria estar pensando no futuro, seja o futuro que o calendário aponta como junho a agosto deste ano; seja qualquer ideia de futuro. Creio que ele ache que família só é família se houver filho – acho que há a curiosidade genética, que ele quer saber se nossos filhos seriam inteligentes, em que proporção se pareceriam com ele ou comigo...
Não quero casar com ninguém: isso nunca dá certo. O amor se incorpora à rotina, o Outro, tão especial, se torna uma presença indesejável, previsível, castradora... Mas também tenho medo de perder quem me é caro.
Ele é inimigo da ex, como nem suponho que poderia ser: ela o odeia muito e vice-versa. Não quero que isso aconteça com a gente. Não entendo essa transformação do amor em ódio; esse asco em olhar para a cara do outro, a ojeriza, o distanciamento... Casar é uma das piores formas de acabar o amor.
Ele não iria trazer uma cesta de pães após dois anos de união comigo.
A aproximação, com o tempo, iria tirar o brilho do convívio, o prazer da companhia, de compartilhar coisas...
Nem me importo tanto pela leitura cruel que ele fez de mim: conheço os defeitos dele; sei em que pontos ele é conservador...
Mas, enfim, já enrolei o bastante e agora estou contra a parede – só me resta enrolar mais um pouco para ganhar tempo, para vencer a batalha, porque está bom como está, exceto pela distância.
Ah, sei lá... acho que gosto de neuroticamente passar pela casa que era dele, de sonhar com a volta dele, gosto da espera e talvez seja esse o segredo para perdurar a emoção de estar juntos quando o estar juntos é tão ímpar.
Não suporto coisas eternas, mas gosto de boas coisas duráveis... a eternidade é tempo demais, um tempo irritante que não acaba nunca.. é, aliás, a terrível ausência do tempo e das transformações das coisas - não aguento isso, deixo isso para os normais!
Ele sabe que eu gosto de mordidas no pescoço e de sussurros no ouvido - ele sabe tudo, tudo sobre mim! e um dia ele colocou With ou without you, do U2, para tocar e cantou ao meu ouvido:

See the stone set in your eyes
See the thorn twist in your side
I wait for you

Sleight of hand and twist of fate
On a bed of nails she makes me wait
And I wait without you

With or without you
With or without you

Through the storm we reach the shore
You gave it all but I want more
And I'm waiting for you

With or without you
With or without you
I can't live
With or without you

And you give yourself away
And you give yourself away
And you give
And you give
And you give yourself away

My hands are tied, my body bruised
She's got me with
Nothing to win and
Nothing left to lose

And you give yourself away
And you give yourself away
And you give
And you give
And you give yourself away

With or without you
With or without you
I can't live
With or without you



sábado, 10 de março de 2012

Assim caminha a humanidade

Faz parte do show...


Acabou de acontecer: eu estava voltando da padaria quando uma das minhas vizinhas me interceptou, atravessando a rua para vir ao meu encontro antes que eu me distanciasse.
Pensei que ela fosse tratar de coisas de gatos e de cachorros, já que este assunto nos une e cuidamos juntas dos bichos abandonados que as pessoas deixam perto ou diretamente na casa da gente. E como ela é auxiliar de enfermagem e tem irmão veterinário, acaba sendo comum combinar os dias de vacinar todos os nossos bichos ou fazer alguma ação preventiva ou até sentenciar a quarentena dos gatos para evitar que os psicopatas os envenenem.
Nada disso.
Ela apenas me disse:
“- Mara, já estou com vergonha de estar aqui na rua há mais de uma hora. Posso ir para a sua casa dar um tempo? É que estou esperando uma visita indesejada sair da minha casa.”
E assim foi que, como numa comédia mal ensaiada, coloquei-me à esquerda da vizinha, de modo que se alguém espreitasse da casa dela, pelo ângulo traçado, não a veria.
Ela entrou em minha casa ainda se queixando da visita.
Anteviu que a visita demorasse infinitamente, porque o propósito era encontrá-la, coisa que muito a aborreceria.
Sentiu-se envergonhada e confessou que eram parentes dela: os piores parentes do mundo.
Duvidei: este título já pertence à minha família – família, quadrilha, tanto faz o que a coincidência genética uniu, certamente por um gracejo de muito mau gosto.
Demos plantão.
Subi na árvore para ver se o carro saía da casa dela – e os afazeres, sempre lembrados por ela, à mercê da visita maligna.
O tempo passou.
Ela subiu na árvore uma, duas, três vezes e finalmente, como preso que apela ao carcereiro e como preso que comemora a liberdade, ela saiu atrás de mim, pedindo para eu abrir o portão: tinha uma alegria besta de criança de Jardim da Infância em dia de aniversário.
Pensei que se as coisas fossem às claras talvez aquilo tudo fosse resolvido. Mas imagino que a sinceridade custe caro e que todo mundo quer ser amado: antes se queixam a terceiros, fazem maus comentários entre amigos em comum, mas não se propõem a dizer claramente ao outro que não gostam dele, ou que não gostam de seus gestos ou atitudes.
Algumas vezes essa manobra é inútil: comentários sempre vazam e ao sabermos que o que poderia ter sido dito a nós foi dito por trás de nós, em fofocas, extinguimos o afeto, o apreço ou o respeito plea pessoa nefasta que procedeu mal contr anós. É assim que as amizades se perdem. Pelo menos de minha parte, tive a sorte de saber quando isso aconteceu comigo - soube da pior forma, mas a tempo de deixar de fazer papel de otária,achando que aquela lá era minha amiga.
Se noto que alguém parece realizar um sacrifício para me dar bom-dia, se me cumprimentar é um dissabor ou se não respondem aos meus e-mails ou cumprimentos, encerro o assunto: nunca mais na vida eu falo com tal pessoa. Pelo menos não tomo a iniciativa de fazê-lo, exceto, claro por força de ocasiões sociais, porque eu nunca deixaria uma mão à espera de um aperto. Coisa que eu acho feia e indigna é isso de não retribuir a um cumprimento.
Dizia a minha finada avó: “Quem tem vergonha não faz vergonha”. E eu aprendi a não deixar ninguém constrangido por coisas desse tipo – mas fazer cara de paisagem e ignorar, desde que a pessoa antipatize comigo, ah, é uma constante.
Acho engraçado viver como Cazuza: “Digo alô a um inimigo/ encontro um abrigo no peito do meu traidor... faz parte do meu show”... A vida social é um espetáculo, mas não é todo dia que a gente representa bem.
Olha, falando na mesma música, lembrei de “Invento desculpas, provoco uma briga, digo que não estou...”. Então a gente coloca os outros na geladeira, no “vamos dar um tempo”, que é a ante-sala do término e se isso não for representar e se não for, também, um atestado de cansaço, eu não sei então o que é.
O ser humano é mesmo intolerante: cansa do outro. E os outros cansam de nós, também... Cada um que se toque.
E como uma coisa leva à outra, pois é, tem gente que nem percebe que não precisa formalizar o término para constatar que as coisas chegaram ao fim... Termina-se de fato antes de se terminar de direito e mesmo assim algumas almas iludidas não se tocam do que está ocorrendo: uma negligência aqui, um desdém ali, um pouco caso a seguir e a sempre-e-eterna cara-de-pau para dizer que não tem nada demais acontecendo e blábláblá repetitions e um sempre-e-eterno otário à espera do tempo...

terça-feira, 6 de março de 2012

Muy amigo (V)


Ser amigo é segurar e defender o que está em risco, nos momentos vulneráveis e nas horas improváveis.

Muy Amigo (IV)


Lição 04: Ser amigo é se colocar por trás dos acontecimentos apenas para ajudar em silêncio.

Muy amigo (III)



Lição 03: Ser amigo é jogar no mesmo time... e dar aquela mãozinha nas horas mais difíceis

Muy amigo (II)


Lição 02: Ser amigo é dar aquele cascudo corretivo na hora certa e superar as diferenças.

Muy amigo (I)


Lição 01: Ser amigo é conhecer o sonho do outro amigo e o que se passa pela cabeça dele

Para Pedro e outros amigos


Muitas vezes, Pedro, você fala
Sempre a se queixar da solidão
Quem te fez com ferro, fez com fogo, Pedro
É pena que você não sabe não

Vai pro seu trabalho todo dia
Sem saber se é bom ou se é ruim
Quando quer chorar vai ao banheiro
Pedro as coisas não são bem assim

Toda vez que eu sinto o paraíso
Ou me queimo torto no inferno
Eu penso em você meu pobre amigo
Que só usa sempre o mesmo terno

Pedro, onde você vai eu também vou
Mas tudo acaba onde começou

Tente me ensinar das tuas coisas
Que a vida é séria, e a guerra é dura
Mas se não puder, cale essa boca, Pedro
E deixa eu viver minha loucura

Lembro, Pedro, aqueles velhos dias
Quando os dois pensavam sobre o mundo
Hoje eu te chamo de careta, Pedro
E você me chama vagabundo

Pedro, onde você vai eu também vou
Mas tudo acaba onde começou

Todos os caminhos são iguais
O que leva à glória ou à perdição
Há tantos caminhos tantas portas
Mas somente um tem coração

E eu não tenho nada a te dizer
Mas não me critique como eu sou
Cada um de nós é um universo, Pedro
Onde você vai eu também vou

Pedro, onde você vai eu também vou
Mas tudo acaba onde começou

Ofereço a música Meu amigo Pedro, de Raul Seixas, ao meu amigo Pedro e a alguns outros.
Acho que com o tempo eu passei a me deixar tomar pela compostura. Eu queria mesmo era dizer a vocês, meus amigos: "Oh, cambada de filhos da puta, por que vocês vivem complicando a porra da vida, que já é tão complicada?"...
Porque tem certos amigos com quem eu tenho intimidade para isso e com os quais a conversa só pode ser nesse nível!
Poxa, é um queixume infinito: "Ah, estou sem namorado (a)"; "Ah, estou sem emprego"; "Ah, não tenho isso e não tenho aquilo; e não sou como eu queria ser e blablablá o amor de minha mãe"... E quando finalmente têm tudo, do emprego ao namorado, passando por um acerto de contas com o passado na família, ainda acham jeito de reclamar das soluções.
Tenho dois amigos que se odeiam. Para esclarecer, vou fazer a recontagem dos meus amigos heterossexuais: tirando o Leonardo eu tenho mais três amigos heterossexuais. São dois, dentre estes, que se odeiam. E quando eles se encontram aqui em casa eu me sinto na Faixa de Gaza.
Eles têm um ódio estrondoso: batem portas, batem a tampa do vaso sanitário,batem a porta da geladeira, batem papo para segurar a tensão,com os olhos brilhando no fulgor do ódio recíproco - controlado pelo pacto da religião de um; e por um exercício de polidez do outro - mas, hoje foi um pouco demais, porque eu tive que ouvir mais uma vez, em separado o que um pensa do outro:
- "Hipócrita. Medíocre. Pendante. Insuportável. Antipático".
Por incrível que pareça eles têm isso em comum: usam exatamente os mesmo adjetivos para descrever um ao outro.
Fico pensando que, diante disso, devo concluir que tenho dois amigos hipócritas, medíocres, pendantes, insuportáveis e antipáticos, que pelo jeito eu amo muito.
E que ningem pense que eu convido os dois para a mesma mesa: a coincidência, a velha coincidência... E aí, depois que um vê o outro aqui em casa, nenhum dos dois recua, para não dar o braço a torcer
Mais coisa em comum: os dois são poetas, da mesma escola... talvez esteja aí o verdadeiro problema.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Leis de Murphy em tempos duros


Estar cheia de coisas que me ocupam - ainda mais em alta temporada de Trabalho de Conclusão de Curso - é o primeiro motivo para eu escrever menos no blog.
Quando finalmente acaba a temporada de depósito de TCC no Colegiado, abre a temporada de leitura de TCC alheios, isto é, é hora de meus amigos de outras universidade começarem a me cooptar para compor bancas.
Não dá outra: 83 páginas para que eu leia em 48 horas, porque a defesa já é na terça de manhã, e blablablá antecedência (ninguém pensa na minha antecedência!). Depois, mais dois TCC de outros Departamentos.
Aprendi e passei adiante: neste semestre joguei até o meu primo em campo, já que o miserável é habilitado e pós-graduado; e não poupei um outro amigo, de uma universidade na fronteira da casa do karalho com o fim do mundo: vai compor banca comigo.
Assim é que a gente se desgasta!
E minha querida amiga, cara-de-pau, põe a banca às oito da manhã e implora para que eu chegue às sete e meia da madrugada. Putz, muy amiga! se fosse íntima, saberia que eu não existo antes das nove da manhã.
Não faço uma dessas com ninguém: se é meu convidado para avaliar qualquer coisa, preservo o seu sono, seu descanso.
E eu, abobalhada, coloco meu xis na opção: LI E ESTOU DE ACORDO, embora seja mentira.
E falando nisso tudo, lembrei de umas elaborações da Lei de Murphy, contidas num e-mail que eu recebi há uns três mil anos atrás. Cá estão:

1. Se alguma coisa pode dar errado, dará. E mais: dará errado da pior maneira, no pior momento e de modo que cause o maior dano possível.
2. Um atalho é sempre a distância mais longa entre dois pontos.
3. Nada é tão fácil quanto parece, nem tão difícil quanto a explicação do manual.
4. Tudo leva mais tempo do que todo o tempo que você tem disponível.
5. Se há possibilidade de várias coisas darem errado, todas darão - ou a que causar mais prejuízo.
6. Se você perceber que uma coisa pode dar errada de 4 maneiras e conseguir driblá-las, uma quinta surgirá do nada.
7. Seja qual for o resultado, haverá sempre alguém para:
a) interpretá-lo mal. b) falsificá-lo. c) dizer que já o tinha previsto em
seu último relatório.
8. Quando um trabalho é mal feito, qualquer tentativa de melhorá-lo piora.
9. Acontecimentos infelizes sempre ocorrem em série.
10. Toda vez que se menciona alguma coisa: se é bom, acaba; se é ruim,acontece.
11. A Natureza está sempre a favor da falha.
12. Qualquer esforço para se agarrar um objeto em queda provocará mais destruição do que se deixássemos o objeto cair naturalmente.
13. Se você tem alguma coisa há muito tempo, pode jogar fora. Se você jogar fora alguma coisa que tem há muito tempo, vai precisar dela logo, logo.
14. Você sempre encontra aquilo que não está procurando.
15. Toda solução cria novos problemas
16. Os assuntos mais simples são aqueles dos quais você não entende nada.
17. Inteligência tem limite. Burrice não.
18. Oitenta por cento do exame final que você prestará, será baseado na
única aula que você perdeu, baseada no único livro que você não leu.
19. Caras legais são feios. Caras bonitos não são legais. Caras bonitos e legais são gays.
20. Toda partícula que voa sempre encontra um olho
21. Na guerra, o inimigo ataca em duas ocasiões: quando ele está preparado, e quando você não está.
22. Tudo que começa bem, termina mal. Tudo que começa mal, termina pior.
23. Amigos vêm e vão, inimigos se acumulam.
24. Uma pessoa saudável é aquela que não foi suficientemente examinada.
25. A fila do lado sempre anda mais rápido.
26. Confiança é aquele sentimento que você tem antes de compreender a situação.

E mais uma vez sou forçada a declarar que qualquer semelhança não é só coincidência.
Enquanto a vida passa e eu me atolo nos afazeres, preparo as minhas orelhas para o encontro com o meu orientador: ah, elas serão puxadas porque não fiz a lição de casa. Um dia eu descubro como ganhar tempo depois que já se está sem tempo.

sexta-feira, 2 de março de 2012

Velha e louca: outra!


Eu gosto da Mallu Magalhães e agora, então, ela está linda, cresceu pessoal e profissionalmente. Vi o clipe de Velha e louca e, óbvio, me identifiquei com o título.
Qualquer coincidência é total semelhança!
Eis a garotinha sem graça que se mostrou lindíssima com o passar dos anos. Sempre é tempo de mudar, desde que se queira.

Velha e Louca
(Mallu Magalhães)

Pode falar que eu não ligo,
Agora, amigo,
Eu tô em outra,
Eu tô ficando velha,
Eu tô ficando louca.

Pode avisar qu'eu não vou,
Oh oh oh...
Eu tô na estrada,
Eu nunca sei da hora,
Eu nunca sei de nada.

Nem vem tirar
Meu riso frouxo com algum conselho
Que hoje eu passei batom vermelho,
Eu tenho tido a alegria como dom
Em cada canto eu vejo o lado bom.

Pode falar qu'eu nem ligo,
Agora eu sigo
O meu nariz,
Respiro fundo e canto
Mesmo que um tanto rouca.

Pode falar, não importa
O que eu tenho de torta,
Eu tenho de feliz,
Eu vou cambaleando
De perna bamba e solta.

Nem vem tirar
Meu riso frouxo com algum conselho
Que hoje eu passei batom vermelho,
Eu tenho tido a alegria como dom
Em cada canto eu vejo o lado bom.

Problemas e Pobremas


A gente com tanto problema sério para resolver e um bando de doidos e burocratas querendo resolver diferenças culturais com acordo ortográfico...Olha aí, meu povo, a quantas anda o domínio da norma culta... Ah, tá, é divertido mesmo!

Faróis baixos, pára-choque duro...


"Viajo porque preciso, volto porque te amo" já não é filosofia de pára-choque de caminhão... se tem gente que sai para comprar cigarros e só reaparece depois de quatorze anos - quando reaparece - não seria eu que iria perder a oportunidade de pescar esta pérola que o kibeloco postou na série "pracas do Brasil" (que é uma série que prioriza imagens curiosas, esdrúxulas e erros de Português dignos de servir de base à defesa dos cursos de Licenciatura em Letras, atualmente em franco processo de extinção).