Louquética

Incontinência verbal

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Inúmeras apostas


Minha amiga se queixa da vida, que é a mesma há 30 anos.
Ora, é lógico: ela fez o que para mudar?
Fez um curso? fez concurso? mudou de cidade? de hábitos? de vícios? Criou condições para mudanças? Não. Apenas apostou que um homem iria aparecer, com ou sem cavalo branco, e mudar tudo.
Delegou a terceiros; terceirizou os setores mais importantes da própria vida... Todos os setores, aliás.
Meu ex-ficante preferiu casar: apostou no casamento como solução para tudo. Bem, ele não é o único: as pessoas apostam muito nisso.
Algumas apostas nos são involuntárias, apesar disso ser raro.
Ah, eu não terminei meu namoro. Nem vou terminar. Resolvi deixar o medo de lado e o que tiver que vir, que venha!
Gosto dele mais do que eu pensava.
Gosto das descobertas de cada dia, das esperas, das negociações, do amor escandaloso em sensações...Gosto dele física e espiritualmente e gosto a tal ponto de me envolver com a obra dele e escrever sobre ela. Aí está: admiro muito ele. Quanto mais leio, mais admiro. E dou um baita valor a quem me conquista por meios assim, quando lhe bastava me conquistar por aquela beleza que me suborna ou pelo sexo.
As coisas repetitivas me entediam, mas ele tem mais que isso, estar com ele não é um tédio...ele acha meios de me surpreender.
Mas o que eu queria dizer com essas coisas vagas é que meu coração está feliz...Batendo como nunca mais.
Também ando feliz pela vida espiritual, pelo caminho que escolhi, pelos felizes passos numa direção conscientemente tomada.
Posso dizer que hoje, aliás, desde sábado, parece que é natal em minha vida, porque me reconciliei com muita gente, gratuitamente, não que fôssemos inimigos, mas éramos 'ressabiados' uns com os outros e, de repente, nos encontramos e eu fiquei feliz em dar minhas mãos a ais pessoas; também ganhei presentes e ajudas; curti companhias maravilhosas, amigos ótimos e ainda ganhei os melhores abraços dele - com aquela ansiedade gostosa que salta a cada beijo; com a intensidade do abraço e com a delicia das palavras e dos afagos. Claro, eu sei: não se namora um deus impunemente. Apronto-me para disputas e vinganças o Olimpo...Invejas, óbvio!
Mas minha vida continua minha. Com planos, sempre.

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

O velho jogo


Li o texto dela e senti tanta dor. Senti dor por ela, tão nova, que nem deveria saber o que é decepção mas já expressa seu pavor por notar que as pessoas não se unem, não se casam por amor, mas por adequação e fatores que primam pelo ajustamento, lucro, interesse ou negócio.
Não era para ela saber disso ainda. As pessoas precisam de ilusões que as façam viver num mundo melhor que só existe nas melhores ilusões.
Não era para ela saber que as pessoas se casam por medo de morrerem sozinhas; ou porque quererem pôr na gaiola o pássaro mais bonito que encontraram, mediante certidões e algemas sociais.
Tão nova, e já sabe o que é traição!
Tão nova, e já viu que o amor nem sempre vence...
Isso é coisa para bem depois dos 29.
Eu também queria saber se ela percebe o quanto todos sofrem na roda das hipocrisias.
Uma coisa é você saber que os parceiros infiéis são pouco mais de noventa por cento.
Outra coisa é saber as artimanhas, a vida dupla, o cara que está sempre com você até às 22h30min e finge ir dormir porque no dia seguinte trabalha; mas que todos sabemos que vai ao encontro de outras, que arrasa na internet, está nos bate-papos, no Tinder, no What's app, sempre com um chip a mais para tocar essa vida dupla, num trabalho minucioso para parecer fiel.
Eu já odiei esses aí, tão hipócritas e fingidos. Hoje eu vejo que sofrem sem perceber, porque vivem na mentira, precisam esconder tudo, viver no sobressalto, temer, interpretar, se esconder...Se camuflar e camuflar seus desejos.
Como pode alguém achar que o Outro só deseja a si? E quem a gente pensa que é, para ter ciúme de alguém, como se a pessoa só pudesse desejar a gente? E por que temer tanto perder o Outro e ter nos seres desejados verdadeiros rivais, já que o verdadeiro rival é o desejo?
Ela, assim como eu, preferiu a sinceridade.
Vai ficar sozinha por longo tempo, como eu fiquei...Como devo voltar a ficar em breve, porque fiz outras escolhas e outras descobertas e meu relacionamento com o poeta já está ficando enfadonho para mim. E não vou assumir namoro nenhum, porque nunca assumo mesmo. Gosto dele, mas tem uma chateação, um script, um roteiro nos nossos encontros que, se não fosse por eu gostar tanto de sexo, já teria virado a mesa.
Odeio previsibilidade do tipo a que me refiro.
Consequência, metodologia, roteiro e planejamento, é bom e eu pratico...Mas, essa coisa encenada, chata, como receita de bolo, ai, isso me mata!
Mas, voltando ao caso, coitada da moça. Era cedo demais para ver o mundo sem máscaras.
Em tempo, eu também gostaria de pedir desculpas a  mim mesma, a V., ao planeta, porque se ele não me queria, tudo bem, o erro foi dele ao me procurar, ao propor e depois cair fora. Entretanto, se passei a gostar dele por algo que ele acionou e despertou, errei muito ao querer que ele me correspondesse.
Oh, gente, deixe em paz quem você ama, caso essa pessoa não ame você,
O melhor que tal pessoa pode lhe dar é a sinceridade. Se não nos ama, não adianta forçar a barra, fazer de tudo, correr atrás...Isso é receita para a infelicidade. Eu responsabilizei muito V. pelo que eu sentia  por ele, e isso foi errado. É como querer obrigar alguém a se converter à nossa Religião, a ser torcedor de nosso time; a integrar nosso partido...Forçar, cobrar, exigir...E sentimentos não agem na razão direta da própria razão objetiva. Isso seria corroborar as mais duras decepções que minha jovem amiga teve.

sábado, 9 de janeiro de 2016

Coração: antecedentes


Uma das primeiras coisas que ele me perguntou foi se eu já havia amado.
Eu respondi que sim. por duas vezes.
Eu deveria ter visto que se ele me perguntava, era porque sabia que amor mesmo é coisa rara. Ora, na minha idade, se eu nunca houvesse amado, seria uma anomalia.
Expliquei meio horrorizada o que foi o Ex-Grande Amor da Minha Vida, enquanto o carro subia o viaduto da Avenida João Durval, no sentido da casa dele...Isso foi bem simbólico para mim...Conduzir o homem, inverter os papeis e, enfim, conduzir...
Eu pergunto a mim mesma, hoje: "E Marcelo? E ele, o meu Ex-Grande Amor"? Por que ele ainda se importa comigo? por que liga para minha casa, acompanha a minha vida e aceita as migalhas que dou?
Não escondi isso do meu namorado atual. Eu sequer sabia que a gente ia namorar. Falei que a gente se viu há mais de um ano, por sexo, não por amor - por que ele, o atual, me perguntou se bateu algo diferente, se havia resquícios de amor... Não. Não tem. Eu até fugi os telefonemas, por duas semanas, a pretexto de viagens de fim de ano em lugar fora do planeta. Eu fui, de fato à Praia do Forte, mas inventei que me soquei na Reserva da Sapiranga e o sinal do telefone era quase inexistente. Tudo mentira. Ignorei. Desliguei o telefone de propósito...
Anteontem ele conseguiu falar comigo. Fui educada e alegre, quado tinha planejado escancarar que estava namorando e que nosso lance acabou de vez...Mas tive pena dele, da vida chata e formal dele. E concluí que ele estava longe, que nunca mais a gente vai se ver e que a distância resolveria muitas coisas, bastando mudar de telefone ou nunca atender.
Sou cheia de angústias. Na verdade, não queria namorar, queria apenas viver o romance de agora como um intervalo no tédio.
Quando eu penso: Tudo de novo! Gostar, querer, sentir ciúmes, sentir falta, construir histórias, terminar, entristecer, lidar com a perda, recomeçar...
E o desencanto? O desencanto é a coisa mais triste no amor.
Não há mais novidades, os defeitos pululam em nossa face, a ausência do outro traz alívio, quando deveria trazer saudades...
Até me decidir a entrar na dança, tive que ser honesta e riscar outras possibilidades (ah, Phillip!!!a fruta mais doce do jardim do paraíso...fruta que deixei no galho, à mercê de outrem)...E tive que encerrar a sinfonia inacabada com V.
E eu já não posso ser cínica e negar que amei V. Muito! A ilusão mais verdadeiramente destruidora que correu meus sentimentos e minha vida...Bem como diz o personagem Joaquim, do poema em prosa do João Cabral de Melo Neto, nos "Três mal amados"...

"O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.
O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.
O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.
O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.
Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.
O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.
O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.
O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.
O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.
O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.
O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.

João Cabral de Melo Neto João Cabral de Melo Neto - Obra Completa. - grifos meus)

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Engolindo sapos


Enquanto Aristófanes escreveu "As rãs", eu engulo os sapos!
Poxa, quantos sapos a gente engole na vida social!
É comer na mesma mesa que o inimigo; é não assumir opiniões para se livrar de cerceamentos; é conter a vontade de esbofetear uns filhos da puta...Inteligência emocional é ter controle de si, conter seus impulsos e dominar os instintos mais primitivos que norteiam nossas reações...Porém, uma boa burrice emocional, que permita dar boas patadas e coices em quem merece e em quem desafia nossa paciência, ah, trazem tanto alívio.
Eu fico meio sem jeito por ter amigos em comum com certos inimigos. Cria uma situação chata para todas as partes e, conforme me disse minha amiga Ilmara, faço parte dos 'inimigos éticos' e, portanto, não incomodo nem avilto aos meus inimigos. Numa situação social, eu nunca seria mal educada com nenhum deles. Talvez, menos por eles do que por mim mesma: acho feio e teria vergonha de causar constrangimento, de ser grosseira. E ainda tem mais: certos amigos em comum com meus inimigos, os têm em mais alto apreço e julgam que eles são gente boa, sofrida, deprimida, uns coitados profissionalmente bem qualificados...Não ficaria bem que eu lhes expusesse as mediocridades tantas, as baixezas...Ora, quando eu penso: a pessoa perder seu tempo para plantar as sementes da discórdia, só para ver uma amizade se acabar, uma briga começar, um inferno se acender...E as tantas mediocridades intra-familiares dessas pessoas, que pintam as irmãs como vilãs, as mães como megeras egoístas, os primos como algozes, os pais com uma neutralidade e omissão dignos de quem é marionete?!
Não falo disso me excluindo. Já contei aqui que, certa vez, ao pronunciar o nome de uma das filhas de minha madrasta, as lágrimas desceram como cachoeira, num choro inconsciente e não assumido, em que eu perguntava o que eram aquelas lágrimas, sem reconhecê-las como choro quando, nunca antes nem depois, chorei numa sessão de psicanálise. Quando ali mesmo eu dei a entender á analista que eu gostaria muito de ter ficcionalizado minha história (o que pareceu a ela muito provável; para depois, me lascar num choro motivado pela fato de que essa mesma filha de minha madrasta ter falado ao meu pai (que retransmitiu a mim), que tudo que ela estava passando era pelo que me fez no passado, na infância. Eu, cá, torcendo para eu ter exagerado, torcendo para ser mentira minha porque eu não queria acreditar que tudo foi verdade.
Mas nunca me vali disso para me promover como coitadinha.
Dramas vão bem a quem gosta de comover o outro num carisma interesseiro de quem quer amor e atenção. Nisso eu sou mais ríspida. E muito amável, também. Quem eu amo, quem tem minha amizade, em para tudo e para muito.
Andei me arrependendo de ter dado uns trinta vezes a segunda chance a uma má amiga. Eu gosto dela. Às vezes tem isso: a gente gosta da pessoa mas sabe bem quem ela é;não suporta os defeitos e, no meu caso, o defeito era que ela me desrespeitava.
A gente perdoa uma vez, achando que é circunstancial, é o momento, é um episódio.
Depois, tudo se repete.
Minha amizade deveria ter acabado desde meu aniversário de 2013. Tinha outros 364 dias para a então amiga ser escrota comigo. Mas, como fez de novo com mais um amigo em comum, ela mobilizou a mim, aniversariante, fez com que eu desviasse de outras propostas em prol da oferecida por ela e, no fim da noite, eu acabei sozinha e triste num bar cheio de gente alegre, ouvindo da parte dela que 'não combinou nada comigo'. Ora, eu fiquei em casa até às 23 horas, declinei das outras amigas, que só podiam estar no happy hour, levei bolo e champagne ao bar, para ouvir isso de alguém por quem tive estima e consideração.
Muita coisa similar se repetiu, como a intolerância nas viagens em comum; os convites feitos por conveniência econômica, ou seja, para custear a viagem dela, por interesses dela, sem flexibilização para satisfazer às necessidades de nós outras que a acompanhávamos...Ah, tantos relatos...
No fim, nem interessa tanto cada episódio, mas o meu conselho: não alimente relações desrespeitosas.
Se alguém pega seu sofrimento e faz uso dele para lhe humilhar, você estará melhor sem essa pessoa;
Se alguém só te convida para qualquer coisa quando descartadas outras opções, não vá, não dê lucro nem consolo a ela;
Se já contabilizou muito desrespeito, muito bolo e negligência, não hesite, esqueça.
Manter distância ajuda muito.
Meu Facebook está cada vez mais cheio de gente filha e neta de minha madrasta. Sei que o tempo é outro, as pessoas são outras, mas ainda é constrangedor para mim. É esquisito. É um sapo a engolir.
Que assunto teríamos? Que interessa a mim sobre quem eu quero mais é esquecer? sempre digo que um passo importante para esquecer alguém é parar de acompanhar a vida da pessoa, ir ignorando, deixando para lá, desviando o pensamento...
Para quê eu iria querer contato ou acompanhamento da vida virtual desse povo?
Recentemente, vi uma foto de uma das filhas de minha madrasta, com ela ao lado, em que a constavam elogios à criação e fortaleza moral dadas por minha madrasta. Vi porque me apareceu nas atualizações. Engoli mais um sapo, porque eu não queria nem conta com esse povo, nem ver a cara ou saber do rumo...Aí chovem convites a que eu não posso recusar a fim de não confirmar os piores juízos que a madrasta espalha sobre mim.
Engulo o sapo. Se eu fosse rã, saltava e pronto!