Louquética

Incontinência verbal

segunda-feira, 22 de maio de 2017

No fundo do fim...


Sejamos honestos: quem está bem, não fica tentando provar que está bem. Esse esforço todo está associado ao fim de um relacionamento, quando se quer dar a impressão de ter superado o trauma da separação. Nada pior que isso.
Pessoas normais, ainda que preservem seu orgulho e não queiram dar o braço a torcer, processam os acontecimentos, esperam passar...E até lá, se é certo que não fiquem exibido lágrimas e lamentos em redes sociais ou entre os amigos em comum com o ex-par, procuram ser discretas e ficar em paz. Se a paz vem com Rivotril, psicanálise, religião ou cerveja, não importa. Quem está bem não precisa provar que está bem.
Fazer turnê nos lugares outrora visitados com o ex-par também não é uma boa solução. Fica muito clara a mágoa, a dor de cotovelo, o lamento interior.
Geralmente, não sofre mais quem mais amou: sofre o mais orgulhoso, que camuflava sentimentos ou que se sentia acima deles.
Deixando a vida dos outros de lado, porque, afinal, comentei por não supor que as coisas com dada moça estivessem nesse ponto...Mas estão, digo agora de mim mesma: a primeira coisa que vai embora junto com os meus sentimentos, é a atenção (e o consequente interesse). É assim com trabalho, amores, amigos e até lugares que eu frequento. Acabou um item, acabam os demais...Fico sem querer saber. Não quero conta, não dou atenção.
Vinícius e Marcelo talvez nem percebam...ou percebam, porque não são mais importantes para mi, não recebem e-mails, mensagens, fotos...desde que deixaram de ser amados por mim. Eles, claro, sentem no ego a falta do paparico.
Gosto muito do Outro, do poeta. Ele tem minha atenção, minhas palavras, minha admiração... E só acho engraçado é gente desimportante viver em busca de stalkear minha vida (o crush, meu ex-cunhado, meu ex-ficante e uma ex-colega de trabalho do tempo em que eu era militar)...Foi nessa que GP se machucou e finalmente me deixou em paz...Mas o outro e meu ex-cunhado vivem de olho em qualquer coisa que eu faça...procuram minhas visualizações e meus status em Facebook. Nada mais desesperador do que ser o centro das atenções de gente doentia que não nos interessa. Pelo menos, muito olham e pouco falam.
É muito desagradável ter que ser grossa para afastar esse povo que não capta o sentido de um ‘não’. Tipo gente que não aceita o término de uma relação.
O que se pode fazer diante de quem não ama, não quer, não gosta e não está disposto a ficar conosco, é deixar a pessoa em paz. Esse povo desequilibrado, não: quer castigar, se vingar e punir quem ousou não mais amá-lo; quem ousou não estar interessado...Pior: geralmente querem a gente de qualquer jeito, com ou sem nossa vontade; com ou sem nosso sentimento.
Vou dizer outra coisa: a felicidade pode ser alegre e completa sem fazer estardalhaço. Nosso relacionamento amoroso pode ser maravilhoso no silêncio discreto da intimidade. Um relacionamento realmente a dois – sem flashes e sem exibição...quietinho e feliz.
Sigamos o conselho de Carlos Drummond de Andrade (do livro Amor natural - São Paulo: Companhia das Letras, 2013)

O QUE SE PASSA NA CAMA

(O que se passa na cama
é segredo de quem ama.)
É segredo de quem ama
não conhecer pela rama
gozo que seja profundo,
elaborado na terra
e tão fora deste mundo
que o corpo, encontrando o corpo
e por ele navegando,
atinge a paz de outro horto,
noutro mundo: paz de morto,
nirvana, sono do pênis.
Ai, cama, canção de cuna,
dorme, menina, nanana,
dorme a onça suçuarana,
dorme a cândida vagina,
dorme a última sirena
ou a penúltima... O pênis
dorme, puma, americana
fera exausta. Dorme, fulva
grinalda de tua vulva.
E silenciem os que amam,
entre lençol e cortina
ainda úmidos de sêmen,
estes segredos de cama.


sábado, 13 de maio de 2017

Ver, ouvir, falar...


Para quem não vivencia conflitos e crises de identidade sexual, as coisas são bastante simples: há homens e há mulheres; desde que sejam heterossexuais, apreciam sexualmente e se relacionam com o sexo oposto.
Isso não exclui a pluralidade dos gêneros, mas frisa que, antes de tudo, é preciso reconhecer o que é um ser heterossexual.
Essa nota introdutória se deve ao fato de meu amigo se finge de heterossexual até para si mesmo, sempre dizendo que as relações sexuais dele com os homens é apenas para matar a curiosidade - uma curiosidade que não passa há oito, doze anos. Se isso acontecesse sem o sofrimento constante dele, ficaríamos aqui apenas a julgar 'a dor e a delícia de ser o que é', criticando a santa hipocrisia que tranca esse povo no armário blindado. Mas ele sofre muito! Às vezes se dá conta, porque deseja um homem e tem medo de ir procurar e acabar se expondo...Teme o desgosto dos pais e o peso social da verdade da sexualidade dele...E se mete com mulheres, namora mulheres, envolve as mulheres e enrosca as moças nas tramas sociais, na família dele, nos retratos, como adereço de pretensa macheza...
Se um dia elas descobrirem, vai doer muito.
Já dói: a última delas atribuiu a si o fracasso do namoro, pois que ele não a achava sexy, desejável...Ela pediu a reconsideração do término, se propôs a coisas que agridem a si mesma, a essas coisas que nós, mulheres, fazemos, para tentar prender o homem pelo sexo. Ele, até então, enrolou e fugiu, porque sabe que ela quer casar.
Ele me disse que casaria com  qualquer outra. Eu pensei na infelicidade de ambos a vida paralela dele; com o tédio de sustentar a máscara, com a auto-vigilância constante...É muito trabalho.
A crise de identidade sexual costuma ser acompanhada de crises existenciais, mas ele tem bebidas alcoólicas, que ele traz das viagens ao exterior e da região onde ele trabalha. Anestesia os problemas.
O problema nunca foi fazer um comunicado à família e à sociedade em geral para dizer: "Prezados Senhores: declaro para os devidos fins que sou homossexual", como algo externo, para assumir e evitar pressuposições. O caso é ter vergonha de si mesmo e ainda arrastar outras pessoas para o mesmo fosso.
Pode-se ser discreto e resguardar a intimidade. Porém, se fingir de heterossexual e iludir uma mulher é trazer uma pessoa para seu próprio inferno.
Setecentas mil vezes ele me diz que não é gay...Depois, envia fotos pornográficas de homens e assume o desejo por aqueles corpos...Vive de fantasias virtuais e aguarda o convite dos ficantes socialmente confiáveis para, então, viver plenamente a sexualidade dele.
Fácil não é. Mas, pelo menos a pessoa precisa colaborar consigo mesma, encontrar um ponto de equilíbrio...Olha, o cara já tem 40 anos!
Burlar a tia fofoqueira, preservar o coração da mãe e do pai de uma decepção, porque se quer respeitar os raciocínios conservadores e retrógrados comuns a dadas gerações, tudo isso é inteligível, compreensível... Todavia, a certa altura da vida, é preciso ter independência para viver o que e como se deseja.
O confortável caminho da mentira tem um preço muito alto e eu sinto muito por ele.
Lógico que numa sociedade machista, patriarcal, que ofende e violenta homossexuais, poucos são os que se arvoram a pagar o preço da liberdade social e do 'desenforcamento' psíquico...