Louquética

Incontinência verbal

quinta-feira, 22 de junho de 2017

A essência de um amor


Não lavei os meus cabelos hoje...Só porque o perfume Dele, do poeta, ficou impregnado numa mecha, na frente. Gosto do cheiro dele...Não é o melhor perfume masculino, nem é dos meus preferidos exatamente, mas é o cheiro dele: amadeirado e cítrico.Decerto, ontem voltei entristecida da casa Dele. Já tinha saído de casa a contragosto, entristecida, porque andei revisando nossa relação, achado que meu amor diminuiu muito.Uma coisa que eu admito é o quanto eu sou difícil: gosto que o homem mantenha minha atenção, meu interesse... Se não me apaixono, a culpa é do homem, que não soube me prender.Ainda gosto do cheiro dele, da pele dele, daquele corpo branquinho e macio e daquelas mãos que conhecem meus caminhos...Porém, o amor mesmo, o gostar, anda a fenecer. E me deu um vazio, uma sensação de luto...Quase eu grito inconscientemente: “Eu estou indo embora! Olha, está acabando, faz alguma coisa! Não me deixa ir! Não deixa meu amor por você passar! Faz alguma coisa!!!” – porque dentro de mim é isso que há.Eu não disse.Ele se esforça tanto para atender aos meus queixumes. Tanto e tanto que me daria vergonha de impor qualquer outra condição.Falei do livro dele. Disse que retomei a escrita. Disse e assim o fiz, por compromisso moral assumido. Na cara, critiquei certas passagens. Ele entendeu. Quando ele me entende, a gente se entende.Tive vontade de pedir um tempo, de dizer para a gente só se ver daqui a um mês...Tive medo de me arrepender, tive medo de que o tempo me mostrasse outra coisa, outra realidade. Vou cuidar dele e cuidar do que ainda resta...Resolvi ficar com o cheiro dele e lavar o cabelo amanhã, porque, afinal, nem está sujo, mas mantenho o hábito, a regularidade da limpeza...Quero aproveitar o aroma dele em mim...Não quero que o amor exale, que seque, que acabe...O tempo é que dirá a duração real, a permanência.

Quero que o cheiro dele fique em mim, por muito tempo.


sexta-feira, 16 de junho de 2017

Estava escrito!


O outro, esse ser que a gente gosta enquanto par amoroso, ah, dá um trabalho! É um cercar de delicadezas, um medir de circunstâncias, uns cuidados!!!
Ele me pediu para escrever sobre o livro dele. O problema é que o livro dele é um livro de esforços, uma coisa esmerada, medida e comedida que me pareceu pouco encantadora. Livro bom, mas bom pelo esforço e não pela espontaneidade da escrita. Não é o meu livro preferido dele... Não é como o que eu mais gosto, o terceiro.
Ele sabe coo eu gosto do outro livro. Gosto como fã e como professora. Gosto humanamente.
Tentei escrever e não me rendeu mais que dois parágrafos. Não posso fazer isso com o homem que eu gosto e também para mim, a espontaneidade está ameaçada.
Como recusar a um pedido de confiança desses? Ele nem deve saber que a gente, que escreve cientificamente (aqui não, né, gente? Aqui a escrita é torta, acelerada e sem estribeiras) também precisa de inspiração.
Odeio escrever por obrigação.
Quem faz artigo, trabalho acadêmico, prefácio, resenhas e escritas obrigatórias sabe muito bem porque o negócio empaca. 
No caso de trabalho acadêmico, inclusiva da tese, vai a minha dica para desempacar: escreva espontaneamente. Escreva o seu pensamento. Interprete o que você leu e expresse isso de maneira clara, com suas palavras. Depois, sim, vá catar citações que tenham a ver com o seu ponto de vista.
Não seja trouxa: citação a gente não traz, joga e larga lá. A gente escolhe de acordo nosso pensamento. É como convocar testemunhas de defesa, então, você tem que ler e encontrar quem defenda pontos de vista afinados com os seus.
A testemunha não pode falar sozinha e pronto. Logo, aproveite o que foi dito, retome e só então siga com sua análise.
Está difícil? Divida o tempo. Escreva duas horas por turno, num dia. Sente e tente. O resto do tempo você mata pulga no gato, mexe no smartphone, vê TV, faz fofoca, sai para dançar, reza, fala mal dos outros, toma um sol...
E se foi cobrado em leituras, vai lendo e escrevendo simultaneamente. Fazer fichamento ajuda a fixar as ideias, mas para quem tem pressa na escrita, não dá.
Introdução e conclusão são coisas a fazer por último, para sair tudo bem feito. Nada de repetições vazias: na introdução você faz promessas e na conclusão você mostra que cumpriu. Pronto! Beijos para a ABNT e bola para a frente!
Pois é. Já enrolei há muito tempo. Aí, no Dia dos namorados, vem ele me pedir para escrever sobre o livro dele...um livro complexo em tudo...E minha vontade era dizer: um livro chato! Era dizer, ‘cara, você errou!’. Dividisse o livro em dois, em três...e parasse de invencionice inútil e previsível com aglutinação de palavras...
Mas faz é tempo que o livro está feito.
Quando a gente se conheceu, o livro já estava no penúltimo poema... E ele foi fazendo uns ajustes absurdos, para dar enquadramento formal. Aff! Ficou meio enlatado, porque não é mesmo o caso de dizer ‘óbvio’. Até o lançamento, há muitos meses, ele foi mexendo aqui e ali, tomou uns venenos estruturalistas e fez um livro para poucos. Não por ser hermético, mas por ser um livro de voz baixa.
Não vou dizer mais do que isso por aqui. Acabei de ter a resposta para mim mesma: é um livro de voz baixa, que cochicha para mim coisas inaudíveis, não tem eufonia...
Ele repetiu um clichê: deixou o melhor para o final. Não sei como enrolar para só falar da parte boa do livro. Não sei. Acho que meu desamor vai aparecer e isso não é justo com o esforço, com o esmero, com o capricho...
Deve ser muito difícil para ele ver que talvez o livro mais maduro seja o que veio antes...sei lá...Será que ele percebe? Mas não sei escrever apenas para elogiar. Isso ele não espera de mim...Mas espera uma justa leitura...
Depreendam aí, meus queridos, que o livro dele está no mercado há meses  - quase um ano - e bem prefaciado e bem posfaciado...Vem ele e reclama comigo da insubsistência dos pareceristas em questão.
Uma justa leitura, agora, consubstancia uma saia justa para mim.

Por quanto tempo poderei enrolar? Não sou disso. Está escrito!

quarta-feira, 14 de junho de 2017

O Mal que se fez e o bem que se deixou de fazer


Assim na vida como nos Evangelhos sérios, responde-se 'pelo mal que se fez e pelo bem que se deixou de fazer'. Deveríamos nunca nos esquecer disso, seja para o que for. É horrível a omissão, ainda que nos seja cômoda, a pretexto de 'não metermos a colher' e de não 'trocar nossa paz pela guerra dos outros'.
O conceito de 'se meter' se distancia muito do comodismo da omissão, diga-se de passagem.
Recentemente, perdi completamente o vínculo com essas máximas do pensamento comum. No caso, foi em defesa dos animais: tive vergonha de sair da academia com as sobras das melancias consumidas naquela manhã, com vistas a dá-las como alimento aos cavalos que ficavam ali próximo. Segui direto. Depois, voltei: qual era mais importante, afinal? a minha vergonha ou o bem-estar dos bichos? Nem deixei o pensamento se completar. Voltei e fiz o que tinha que ser feito.
Depois temi que os transeuntes pensassem que eu queria aparecer. Então, uns dias depois, tirei de minhas próprias compras umas frutas para outro cavalo, que estava numa rua sem movimento...Quando me virei, um tremendo gato estava me olhando, admirado. E eu nem fiz o favor aos bichos na intenção de tal recompensa.
Essas bobagens eu posso falar, porque nem houve a intenção de obter 'pontos no céu', nem fazer marketing pessoal. A gente nunca deve divulgar o Bem que faz. O melhor é não deixar de fazer. É não ser o vizinho escroto que corta as árvores do passeio, apenas para não fornecer sombra aos carros estacionados. Perder, ele não perde. Mas, como nada ganha, prefere evitar que o bem chegue gratuitamente a quem ele sequer conhece. Isso, sim, é egoísmo.
A pessoa não é egoísta porque sai sozinha, nem porque não quer ter filhos e, tampouco, porque antes de convidar aos outros, determina a si mesma que vai fazer isso ou aquilo com ou sem a companhia dos convidados. Ser independente é diferente de ser egoísta.
Ficar em cima do muro só traz o conforto aparente. Não imagino com que cara tranquila uma pessoa persegue à outra, ou traça calúnias, ou dá falsos testemunhos... Assim na vida como na política, porque eu não comento o caos que o Brasil atravessa, mas acho tudo uma extensão do que somos no social: um rebanho de gente egoísta, querendo se dar bem, seja como for, mentindo para defender os aliados, fazendo conchavos e alianças suspeitas, ignorando a verdade...
Aqui, desde que um político odiado, como nossa ex-presidente, se dê mal, o que vier está bom... O ódio funciona melhor que a coerência, no caso.
As pessoas não sabem como é difícil pedir. A gente deveria ter o mínimo de respeito pelo pedinte, que abdica de sua dignidade, que se submete às caras fechadas e às desconfianças, quando pede um dinheiro, uma comida, um favor... Mas e os bichos, que nem sabem como pedir nem podem expressar do que necessitam?
Também defendo que a gente deve saciar primeiro e perguntar depois. Quem tem fome tem pressa e, antes ser um otário que perdeu um real para um drogado ou um alcoólatra, a ser um coração metálico, que fez questão de um real por duvidar da fome, da necessidade e da idoneidade de um necessitado.
Dentre os amigos próximos, quantas vezes a gente pode dar um pouco, mas não damos nada, à espera de que ele peça?
Faz muito tempo que não sou assim, mas já fui.
Tudo que escrevo aqui, como parte da defesa de uma ideia, também o faço no meu círculo íntimo, inclusive com meu poeta amado. A esta altura, já posso dizer que nos conhecemos reciprocamente o bastante em muitos aspectos.
O Bem que a gente pode fazer não deve ser moeda de troca com o plano sagrado. Dê de graça. Dê sem esperar o retorno. Quantos ateus bons eu conheci, tipo o Oscar Niemeyer, o famoso arquiteto que tantas vezes doou apartamentos aos perseguidos políticos durante a Ditadura;assim como meu amigo Zacarias, que tinha, sim, muito dinheiro e muita piedade de quem não tinha e dava, sim, comida e meios de transporte a quem precisava. E nem era para ganhar a simpatia de Deus.
E tantos bons religiosos, gente de fé verdadeira, por obrigação moral e por respeito às causas cristãs e à consciência própria, faz a caridade e divide o pão!
Já outros amigos meus e ex-amigas, com emprego estável, casa e carro próprios, é incapaz de dar um real de pão a um necessitado, alegando que não têm, que o salário não dá, que os boletos estão atrasados...Como se não pudessem tirar um real, um real do salário que têm, para aliviar a fome de outrem?
Quantos outros não fazem o Bem sequer ao parente próximo, alegando que não têm a obrigação? Ora, é justamente sem a menor obrigação que a gente deve dar a um necessitado. Espontaneidade e verdade interior, né?
Essas mesmas pessoas gostam de pedir a Deus. Gostam de ganhar favores. Mas o egoísmo verdadeiro está nelas que , quase sempre, são também sovinas - e se derem algo, será como quem atende ao pedido de socorro de alguém que grita muito, e a quem, antes de socorrer, cabe calar, porque o barulho da necessidade incomoda. Faça o bem em silêncio!
Dizem que "O Bem que se faz, anula o Mal que se fez"...mas nem precisa a troca, basta a vontade, a consciência.