Louquética

Incontinência verbal

sábado, 23 de setembro de 2017

Uso desproporcional da força


Resolvi intitular essa postagem como ‘uso desproporcional da força’, devido a um fato ocorrido hoje. Na verdade, o fato a ser relatado foi apenas a culminância de uma tendência que se desenha num grupo de what’s app que eu participo, mas a narrativa da situação particular é porque sei que ela se generaliza.
Um amigo homossexual enviou para mim um vídeo debochado, de brincadeira, onde um ator homossexual pede ao seu suposto companheiro para sair do armário. Até aqui todos eles sabem se tratar de uma brincadeira e todos, igualmente, são pessoas respeitáveis que, por uma dose de humor escrachado, não prescindiram do respeito próprio.
Repassado ao grupo, a patrulha do politicamente correto aviltou, atacou o vídeo, a pretexto de que o ator se prestara “àquilo” e o que era um momento de leveza virou um debate denso, chato, repetitivo e desnecessário haja vista o perfil do grupo e, em particular, o meu próprio.
Há lições que devem ser dadas a quem desconhece as causas, às pessoas verdadeiramente preconceituosas que, ainda assim, não merecem ataques: merecem educação. Merecem, ainda, uma chance de compreender as coisas que lhes são objeto de preconceitos, sob outros ângulos.
Como eu disse, essa foi a culminância de um processo. Faz tempo que não se pode rir de nada – nem de um estereótipo, nem de um inglês deturpado de um bêbado num karaokê. Tudo foi obrigado a se submeter à sisudez do discurso político. E eu fico pensando em quantas minorias eu me encaixo mas, ainda assim, sei discernir quem me ofende e quem simplesmente brinca; sei o que é um estereótipo e as estratégias usadas para diluí-lo.
Vejo nisso o uso desproporcional da força – da força retórica que poderia estar a serviço de uma causa real ou contra um verdadeiro elemento opressor de minorias; da força simbólica para cooptar consciências e se colocar a serviço da conscientização, da educação das relações sociais...
Afora isso, criou-se uma barreira interior em mim, de modo que não me sinto mais integrante do grupo, não me sinto à vontade e não vou permanecer em eterna vigilância para seguir o script para só rir do que é permitido, para ser coagida a concordar com pensamentos ortodoxos, engessados nas bandeiras das causas pessoais.
Depois que a gente cresce, passa a ter escolhas. Eu escolho também aquilo a que me permito me submeter e, sendo assim, não quero me submeter a isso não. Estou fora!


sábado, 16 de setembro de 2017

Em falta


Não é porque as pessoas têm tudo que não lhes falta nada.
Sempre invejei quem teve condições favoráveis a si, tipo uma família amiga, com gente educada, letrada, harmoniosa; ou mesmo quem teve uma família pobre, de pais analfabetos, mas educógena, que valorizasse o estudar e a cultura letrada...Quem nasceu bonito, rico, inteligente...Mas nem assim se tem tudo. Mesmo quando essas coisas existem, em todo ser humano há uma falta.
Tem gente que pensa que essa falta se completa com um filho; outros pensam que a falta se compensa com casamento, com um amor a qualquer custo...ou com dinheiro...
A única coisa que nunca nos faltará é essa falta. Universal.
Tem muitos conhecidos meus (e até ex-amores) preenchendo a vida com seus vícios – em sexo, cocaína, álcool, manias de grandeza e outras drogas.
No momento minha falta também está bem evidente: é que um ex-namorado veio me fazer cobranças afetivas de uma década atrás.
Ele guardou o ódio. Ódio conservado em barril de carvalho, curtido e nunca envelhecido. Jogou na minha cara. Ódio 100% puro, concentrado. E o efeito foi corrosivo, porque nem o amor por outro, responsável por nossa separação real, existe mais. O ódio do ex, sim, existe intacto.
Jogou em minha cara as lágrimas e as dores.
Eu amava aquele a quem chamo de Ex-Grande Amor da Minha Vida. Não foi escolha. Acho que foi a Florbela Espanca quem disse algo como: “Ama-se a quem se ama e não a quem se quer amar.” Ele não entende isso.
Aconteceu com uma aluna minha também: o marido foi embora. Ficou quatro anos em outro Estado. Casou com outra. Ela deduziu que ele seguiu em frente, tudo acabado, vida que segue...Constituiu outro relacionamento. Ele soube. Veio cobrar a conta como quem cobra a anuidade de título de dívida contraída e foi violento.
Em verdade, vos digo que uma briga de palavrões e ofensas trocados fere menos que essa vazante de ódio.
Um xinga, o outro xinga e pronto. Cada um se recolhe com seu desagravo.
Mas esses exercícios de ódio doem mais.
Penso que, de tudo que vivemos, ele só conservou a memória afetiva do sofrimento quando eu me apaixonei por outro. Das incontáveis desfeitas, humilhações, traições que eu sofri, até chegar a este ponto de me apaixonar por outro homem, ele não lembra.
Mesmo quando ele casou com outra e eu inventei de seguir em frente, num novo affair, ele achou que eu pertencia a ele, que traí. Fui fiel e burramente fiel durante o relacionamento da gente e por muito tempo. Traí em outras ocasiões, por puro chumbo trocado.
Geralmente as pessoas não perdoam o fato de não mais as amarmos.
Juro: até Vini, nessa semana, gravou dois áudios para mim, a fim de dizer que estava com saudades.
Não eram saudades como nunca fora amor: é saudades de ser amado e paparicado por mim. Esse povo tem ego sensível. Eu também tenho ego.