Em uma conversa
vaga, falei com o meu ex-ente-amado justamente sobre amor. Perguntei a ele sobre a
consciência de que “o amor que sentimos é problema nosso” lhe veio desde
quando, ao que ele respondeu que desde
muito cedo.
Achei incrível isso.
O que sentimos é
nosso, está em nós e o outro ser ao qual vertemos nossos sentimentos é só um outro ser, tal como nós. Ele não tem
responsabilidade sobre o que a gente sente, ainda que invista nisso, que tente
despertar interesse ou atue para a sedução. O sentimento da gente é da gente. O que você sente é problema seu!
A gente, de fato,
não escolhe conscientemente a quem amar. Não amamos as pessoas de qualidades
admiráveis, nem as mais bonitas ou as mais inteligentes...nem sequer as que nos
fazem bem, que fazem de tudo por nós ou àquelas que, de fato, mereceriam um
amor intenso, imenso e sublime.
A outra parte que me surpreendeu foi que ele me disse que as pessoas (obviamente, falava de si) comunicam um ‘eu te amo’ achando que estão oferecendo a oitava maravilha do mundo, entregando um tesouro nas mãos do outro. E aí eu discordo.
Acredito que, sim, se a pessoa ama, sabe o tamanho do que sente e tenta articular a aceitação do ser amado. É como dizer: “Eu te amo. Eis aqui a minha vida. Gostaria que você fizesse parte dela e me permitisse amar você bem de perto. Por favor, aceite, pois é verdadeiro e eu te darei o melhor de mim”.
A experiência de ser
amado é enriquecedora, mesmo quando a gente não corresponde a quem nos ama – na
aritmética da vida real, é bem improvável haver correspondência.
Até quando somos
crianças e lemos o amor com que nos cuidam, crescemos seguros. O fato de nos
sabermos amados nos ensina muito e, principalmente, nos ajuda a identificar e
reconhecer o que é o amor, apesar de traços particulares da forma de cada um
amar.
Muitas vezes amamos
e não sabemos. Um dia a gente descobre. O oposto também: a gente acha que ama,
até descobrir que aquilo era outra coisa.
Ser amado é uma dádiva,
isto é, desde que quem nos ame não nos faça cobranças, nem chantagens
emocionais, nem jogos idiotas de responsabilidades e culpas.
A persistência
cansativa não resolve um amor não-correspondido. Dói em quem ama ser rejeitado.
Fazemos cálculos morais e gritamos para nós que o outro ‘não sabe o que perdeu”
ou que ‘quem perdeu foi ele (ou ela).
Forçar a barra,
procurar receitas para chamar a atenção não converte indiferença em amor. Mas,
há quem queira o outro a qualquer preço. Isso indica covardia. É a incapacidade
de lidar com a rejeição e com a
autonomia do outro, que pode querer ou não, do mesmo modo que a gente já
declinou de boas propostas de amor e já distribuiu ‘nãos’ ao longo da vida.
Em situações em que
o outro ignora, não responde nem corresponde, quão baixo se pode descer ao se
colocar à eterna espera e à disposição deste ser? É por isso que é preciso
coragem, para sobreviver à dor da falta. E é preciso deixar a pessoa em paz e,
pacientemente, esperar o amor passar – nessas fragilidades, quem ama pode ser
manipulado, humilhado, explorado, abusado, a depender do que construiu ao redor
daquilo que sente por alguém (não somente o ser amado pode se converter em um
tirano, como cartomantes e trabalhadores das artes supostamente mágicas podem
levar seu dinheiro embora em três dias).
À parte as mazelas,
amor é isso mesmo: ambiguidades.
Ser amado é um
aprendizado, se a gente tem respeito por quem nos ama.
Nesta altura de
minha vida, a cota dos amores já se esgotou. Não procuro, não quero e se
aparecer eu digo que não estou. Brincadeiras minhas, porque gosto da leveza de
não amar ninguém, exceto os amores ágape de base amistosa.
Aprendi quando amei,
aprendi quando fui amada. Já atravessei meu vale de sombras e, com uma vela na
mão, senti medo, solidão, tristeza, mas cheguei ao outro lado sem tropeçar e
sem me deixar tomar pela escuridão. Aliás, agora que estou aqui, vou aproveitar
a paisagem.