Louquética

Incontinência verbal

segunda-feira, 15 de agosto de 2022

O amor bateu à porta

 


Pensamos muito nos amores impossíveis, mas o que dizermos dos amores viáveis? Talvez, o que esteja ao nosso alcance nos pareça, previamente, entediante. Para outras pessoas, não: é conveniente. A pessoa certa. A pessoa certa nem sempre é a pessoa amada, mas a soma das conveniências – em alguns casos, é o interesse puro; em outros, é o fim da busca pela ‘sorte de um amor tranquilo’. Demorei a entender isso no meu ex, o Poeta. Não entendi quando ele me disse que casar era como ter uma religião: alguns precisam. Demorei a ver que o Poeta casou, na primeira vez, aos 17 anos. Meu Deus do Céu: como pode um garoto de 17 anos se casar? E casou uma segunda vez, já aos 26 anos...No fim deste casamento, cinco dias após completar 33 anos, ele me conheceu ao vivo (depois de me mandar um convite pelo Facebook, respondido três meses depois), numa noite de dezembro. Então, quando a gente se separou, depois do começo da pandemia – é, a pandemia é um marco histórico e um divisor de águas –, ele não queria, de fato, se separar e eu não entendia aquilo, já que ele claramente estava num outro relacionamento. Sofri um bocado. Passou o tempo, ele passou em importância afetiva para mim – importância histórica ele sempre terá. Foi um homem com quem amadureci sexualmente, com quem muito conversei, ri, aprendi, ensinei, me consolei de coisas que ele jamais soube que aconteceram e, por fim, vez por outra a gente se viu e também deixou de ser ver. Essas pequenas distâncias modificaram muito o modo como ele me tratava, porque trouxe a admiração, inclusive admiração física por mim, que antes era básica, como se eu fizesse parte da decoração da sala...E não sei o que houve para ele manifestar um apreço diferente. Talvez seja apenas aquela vaidade de perceber que há outros conhecidos dele declarada e assumidamente querendo me namorar (escondi o namoro com o Homem de Capricórnio), mas, enfim, como novela mexicana, ele veio à minha rua, já bem tarde, sob a chuva de ontem à noite, depois de não ser atendido ao telefone. Temendo bater à minha porta àquela hora e ser rechaçado por mim e por meus parentes vizinhos, insistiu no telefone e eu o atendi, saindo de carro ao encontro dele (ele, em frente à garagem, praticamente), para manter a privacidade. Ele não me disse nada que fizesse sentido. Alisou meus cabelos, me beijou o rosto enquanto eu dirigia sem entender do que se tratava.

Ele inventou que estava passando perto de minha casa, porque tinha ido à inauguração de uma casa de poker secretamente localizada a 200 metros de minha casa...ele já sem palavras, sem congruência, sem nexo argumentativo. Depois de um silêncio de saudades cúmplices, ele disse que queria dormir comigo, na minha casa, na minha cama. Claro, não atendi à ousadia descabida, mas ficamos em intimidades silenciosas até o decurso de um temporal interno em nós e o externo, na chuva incessante. Muito tempo!

Levei-o de volta à casa dele – foi muito diferente esse estar perto. Quando cheguei em casa, vi que ele avisou que me bloquearia no WhatsApp, por motivos de segurança, porque ele está casado com outra, mas que não queria deixar de falar comigo...Por mim, sem problemas. Eu não poderia responder a isso, já que estava bloqueada.

Concluí que, talvez, ele tivesse vindo atrás de mim apenas para se despedir de vez, como quem se reservasse um último desejo, antes de sepultar verdadeiramente um sentimento. Gente mais acessível, mais descomplicada, ele teria, se quisesse. E posso dizer que até ao pronunciar meu nome, ele não o fez da mesma forma. Na minha cabeça, era questão de despedida, de última vez, de nunca mais.

De manhã, lá estava eu desbloqueada. Achei bonita essa declaração indireta de amor, porque eu entendi ali um amor ágape, outra linguagem, outra coisa. Perdoei, por dentro, o ser humano confuso que experimentava saudades de mim, que reconhecia a alegria que tínhamos quando perto; entendi que eu não teria a dar a ele algo que ele queria muito. Não era questão idiota de bloquear e de desbloquear, era um homem em busca da paz do amor tranquilo, da segurança de um lar e de um esteio, que digladiava com os outros prazeres que eu lhe outorgava e que o tempo estava tirando dele. Acho que ele passou a entender que não poderia combinar duas pessoas com duas coisas que lhe eram vitais, mas como prescindir delas?

Eu não disse nada sobe nada, em momento algum. “Esse silêncio todo me atordoa/atordoado, eu permaneço atento” – digo eu, citando Chico Buarque.

Amar não é tudo. Pobres de nós, que achamos que um amor correspondido é garantia de felicidade. Não, não é. Até dói mais quando a pessoa que a gente ama também nos ama, mas há uma série de coisas em que a gente não se ajusta; e quando a pessoa com quem a gente se ajusta em uma série de coisas não é alvo de nossos sentimentos? sei que o bicho que mordeu o Poeta vive me mordendo.

O Homem de Capricórnio instaurou uma crise em mim e eu edifiquei uma boa distância emocional. Não deixei de gostar dele, só achei que precisava ficar sozinha, que a paz é estar sozinha e sair do campo de guerras que eu já não suporto, porque tenho poucas armas contra a infantilidade e contra defeitos inegociáveis - falo de vinganças que ele sempre me faz; de interromper minha fala; de nem ouvir argumentos; de desejar que eu esteja à disposição dele e prescinda de minha vida particular, etc.

Disse Drummond que "O amor bate na porta/o amor bate na aorta/fui abrir e me constipei." Pois, me descreveu até na crise de rinite.

Será que existe amor equilibrado? Ou será que tudo é negociação, jogo de perdão, ajuste infinito? Saio dos amores sem respostas, entro com muitas perguntas...


segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Colapso cognitivo e Efeito Dunning -Kruger

 



Hoje li uma pequena manchete, sem adentar ao conteúdo, que me deixou bastante pensativa. Era algo assim: o conservador quer conservar o quê? E lembrei de um ser humano que achava que ser conservador era regredir às leis morais do tempo de nossos avós. Acho engraçado, só isso.

Outra grande descoberta, daquelas que não guardam qualquer novidade, foi que me chamou a atenção ter ouvido e lido sobre o efeito Dunning-Krugger, de que eu jamais tinha ouvido falar antes. Foi citado numa palestra de Fabiano Moulin (se minha memória estiver certa), para a Casa do Saber, e refere-se à falsa sensação de sabedoria, à confiança cognitiva que a gente pode traduzir por arrogância e que eu ouso chamar de “seachismo”, seja porque quero dizer que o termo se reporta a quem “se acha”, seja porque, na minha cabeça, faz inferência a ‘sea’, mar, em inglês – e, portanto, a pessoa se encontra num mar de sofismas; seja porque até parece com ‘search’ do verbo pesquisar, em inglês. Mas, vamos trocar em miúdos, objetivamente: o efeito Dunning-Kruegger recebe este nome a partir dos pesquisadores que têm os sobrenomes citados; e trata do sujeito que leu qualquer coisa e acredita que esgotou o tema e sabe suficientemente o que mais ninguém sabe como ele.

Com muita sorte, ele perceberá a própria ignorância e a parcialidade de seu saber. A partir daí, consciente das próprias limitações, irá buscar saber verdadeiramente. Acontece, entretanto, que vejo as pessoas assistirem vídeos no Youtube e consultarem a Wikipedia, a fim de dominarem assuntos. A estratégia se apoia, ainda, na memorização de jargões e termos técnicos, com o intuito de passar credibilidade. Aí, eu penso que não somente essas pessoas medianamente formadas se valem disso, mas que um número indistinto de profissionais seguem pelos mesmos caminhos: o mecânico que diz que há uma ruptura na rebimboca da parafuseta, que implica na desaceleração da ventoinha e, portanto, o serviço de troca do adesivo do óleo vai te custar R$ 900,00; àquele seu coach quântico, ou o orientador tethahealing quântico; ou a cartomante quântica e, mesmo, o bispo presbiteriano quântico da neurociência dos santos dos últimos dias vão jogar um monte de palavras que causem a impressão de sabedoria a si e lhe esfregue à cara a sua ignorância na causa. Sabe com o que isso se parece? Parece aquele povo que decora versículo de bíblia e os encaixa deturpados, adaptados aos interesses próprios; parece aquele povo que decora número de leis, artigos e portarias e lança no meio das conversas para parecer que sabem tudo.

Onde a Filosofia não erra, é ao demonstrar que é preciso estudar e ler muito para saber um pouco. Feliz de quem sabe que só sabe um pouco. Por outro lado, coitado dos que pensam que sabem bem pouco, apenas porque estão diante de ‘sabidos’ que são apenas espertos. Mas, voltemos ao básico: a pessoa se dizia conservadora e não sabia o que era para conservar...é cada uma!