Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 31 de maio de 2019

No caminho



Ainda sobre o pobre candidato que se apresentou a mim, tenho que frisar que é um daqueles intelectuais de bagagem, que sabem o que estão a dizer, que correram mundo até ter pés firmes no universo da ciência. Mas, não somente pelo meu namoro com O poeta prosseguir, como pelo fato de que o candidato é apressado, eu nunca o namoraria.
Essas pessoas que só são felizes casadas me assustam.
Desde sempre eu disse: ‘eu gosto de namoros’.
Mas, eu também não ficaria com ele por causa daquela deselegância que desmente o lugar acadêmico que ele ocupa; por um jeito Jeca, caricato de tão sem modos, sem a menor etiqueta...Isso enfeiece qualquer um.
Ele veio sem que eu o chamasse: me achou, veio no faro de minhas ideias expressas em alguns escritos...Encantamento reforçado por minha aparência, que ele conferiu em todos os lugares possíveis – do Lattes aos perfis de redes sociais.
 Já comigo, o percurso inverso: o encarar frente a frente foi de um desencanto pavoroso, que só minha boa educação pôde amortizar.
Juro que lembrei de “A bela e a fera” – ora, quem vê cara, não vê coração”, mas eu preciso mais do que um coração de um cara para encetar algum interesse.
Lembrei de outra situação mega esquisita em que o meu par, tendo esperado por mais de uma década para ficarmos juntos, ao ficar comigo, me chamava de “amor”, num enojamento chato e artificial, que me deixava sem jeito.
Sei que retomei esta pauta porque o candidato citado primeiro construiu um amor por mim, totalmente patológico. Não há amor em 15 dias, nem à primeira vista, nem esses troços malucos que as pessoas carentes inventam.
Fui cuidadosa, porque o quadro dele foi sério.
Até o presente momento, mesmo com todos os meus argumentos e impeditivos, o cara continua na batalha. Delirante como Dom Quixote atrás de Dulcineia, lutando contra gigantes inexistentes, quando a donzela não tem nenhum interesse na causa.
Eu fico igualmente sem jeito quando alguma situação social me faz confrontar com alguma pessoa que já não está entre meus afetos. Nesta semana, isso ocorreu duas vezes.
Num primeiro caso, não houve ruptura na amizade, mas distância. A moça aprontou muitas comigo, foi extremamente falsa, ingrata e arrogante...Um dia ela me viu por cima da situação. Catou meios de se aproximar. Fiz um favor. Daí em diante, é uma perseguição por retomar a amizade comigo...
E, de repente, olha a situação social nos colocando em meio a pessoas que não fazem ideia da história dos bastidores e que incentivam nosso contato! Saia justa, driblada pela boa educação e as pressas da vida moderna.
Eu não conseguiria ser amiga dela. Não conseguiria lhe fazer uma visita ou aceitar uma visita dela. Ali, o abraço me custa caro, a saudação é um martírio. Não há ódio, mas há um repúdio interior que eu não sei barrar, é involuntário.
No segundo caso, um ser humano que me detesta, que fez o que pôde para desmanchar minhas amizades, cruzou meu caminho por meios virtuais.
A personalidade de víbora, na aparência é a cara da paz e da simplicidade. O veneno ela distribui por critérios de falta de simpatia, como ocorreu comigo.  Mas, em todas as desavenças coletivas, lá estava o dedo dela. Obviamente, poucas pessoas viram. Quem viu, me alertou, porque uma amiga ficou de mal de mim, sem me dizer o motivo, sem me oferecer chance de defesa porque, afinal, quem fez a discórdia tinha crédito.
Isso sobreviveu até que o tempo foi dando pistas da verdade.
No meu coração ficou aquela decepção de mágoa: como é que a pessoa perde seu tempo apenas para tirar de mim meus amigos?
Não falo mal dela para ninguém: cada um precisa tirar suas próprias conclusões. Além disso, ela sabe se fingir de vítima, capitaliza muito bem suas poucas dores (todas advinda de invejas injustas, porque ela só olha a grama dos vizinhos, ao invés de molhar a dela, já verdejante), faz dramas com estados de saúde pretensamente fragilizados. Ela sabe que eu sei. E sei muito bem quem ela é.
Enfim, ela fez outra armação para me atingir, para dar a entender que eu era a causadora da retirada dela daquele ambiente virtual. Deus me livre de cruzar com esta pessoa novamente. Fico completamente sem jeito, sem saber corresponder à falsidade adequadamente.
É o que eu também acho válido para qualquer situação, sejam páginas, blogs, sites ou casa dos outros: se você não gosta, não vá.
Se for convidado e não gostar, não vá.
O mundo funciona melhor quando deixamos os outros em paz.


domingo, 12 de maio de 2019

Alianças




Se Hoje me perguntassem o que eu acho que deva ser um amor próspero ou feliz, eu diria que um bom amor tem que sobrevive a ele.
Amor leva tempo e, em alguns casos, leva à ideia da perda de tempo. Corrigi isso numa amiga, hoje. Ela se declarou curada de recaídas por um homem por quem ela literalmente enlouqueceu (sim, Rivotril, clínica e demais tratamentos). Até gravidez ela forjou (um clássico do desespero) e lançou mão de todos os recursos disponíveis para prendê-lo a si. A julgar pelos recursos, já era a sanidade indo embora (e não critico por mal: ao meu tempo também fiz meus esforços para manter um relacionamento. Por sorte, percebi que aquilo não poderia ser amor, de forma alguma).
Disse eu à amiga, que não haveria porque se arrepender, pois que naquele momento ela estava como estava. Parabéns pela superação saudável.
Todos os dias há quem faça isso. De ambos os lados. Aquele que não quer manter a relação torna-se refém das armadilhas para adiar o fim. Do contrário, por que razão cartomantes, magos e similares  perderiam tempo com o clássico: “Trago a pessoa amada em três dias”?
O que eu digo é o contrário: pense em você, na sua agonia, na angústia e no seu desprazer em ser forçada ou forçado a permanecer com que você não quer estar!
Temos ego, sim. Ele, diante de uma ameaça de término, se ofende. 
Classicamente, nosso ego diz ao ser amado: “Quem você pensa que é, para poder viver sem mim? Como você pode não querer viver com uma pessoa maravilhosa como eu?”. Em alguns casos, o ego vira violência – se não dá em morte, dá em difamação, perseguição, mágoa e pragas.
Então, um amor próspero é também aquele que acaba bem. Não é indolor: separações doem, mesmo quando a iniciativa é nossa – é um outro caminho e os perigos normais junto aos imprevisíveis.
Geralmente, quem ama tem pressa e isso não é nada bom.
Para amar e para desamar, tudo é processual.
Particularmente, crio um certo enfado quando o amor acaba. Fujo um pouco, invento compromisso, viagens imaginárias...procuro criar o processamento para o bom entendedor. Antes, bastava pedir um tempo e o outro sacava que era o tiro de advertência. É como dar notícia ruim com eufemismo, aos poucos...
Até que o outro nos diga: ‘você mudou’ e entenda que você mudou para  muito longe, já anda emocionalmente distante.
Tem quem deixe para ser feliz nos intervalos – mantém casamento, namoro e é bastante feliz sempre que está sozinho ou sozinha... até tiram a aliança, em sinal de alforria. Há quem tire ao dormir, para ter a liberdade enquanto sonham.
Parâmetro bom: se essa ausência causou saudades...ou se deu alívio.
Muitas amigas minhas cataram na internet seus respectivos maridos. Por que queriam ter maridos a qualquer preço...Depois de obtido o troféu matrimonial, declararam o quanto era bom ser solteira.
Isso não ocorre por mal: querem companheiros, alguém com que contar, um esteio...mas, às vezes só conseguem o marido.
Hoje se apresentou a mim um candidato. Bastante apressado, deixou bem claro que ama estar casado, tanto que casou por duas vezes e que me achou bonita e inteligente, bem adequada aos sonhos dele.
Desesperou-se sobremaneira quando apresentei meus impeditivos, não somente porque namoro O poeta, como por meu pavor por casamento. E ainda disse isso tal a personagem de Chicó, no Auto da compadecida:
“- Casamento? Casamento é muito bom. Já fui a muitos. Adoro festas!”. Eu disse mesmo.
E eu sou a favor do casamento dos outros. Muito a favor.
A minha amiga louca para casar pela segunda vez oficialmente; e pela terceira, extraoficialmente, diz que não quer morrer sozinha. Penso em avisar que quem cuida da gente na velhice são enfermeiros e cuidadores profissionais e, ao morrer, estaremos sós, mesmo que morramos acompanhados. Não há essa garantia. Está aí algo que o amor não dá: garantias. Se acabar, só outro.


sexta-feira, 3 de maio de 2019

Cuide da sua vida!



Tomei um susto dolorido com a morte de Júlio Ávila, do blog Eu existo – eu estou vivo.
Ocorreu em 14 de outubro do ano passado. Graças a Deus, eu soube há poucos dias – isso por que estranhei o tempo de ausência da escrita dele no blog.
Como ele atravessasse uma depressão verdadeira, até dei por respondida a ausência que, nem por isso, deixava de me incomodar. Sei que por intuição ou por bom anjo guardião protetor, só fui ver a vida dele no Facebook na semana passada.
Faço aniversário em 12 de abril. Ele era do dia 11 de abril. Éramos arianos, críticos, fãs de Fernando Pessoa, de Bukowski e do Radiohead, se é que alguém pode entender a complexidade das coisas que justificam isso.
Foi por causa de Creep que ele me encontrou. Ou por causa da epígrafe aqui do blog, quem sabe... Sei que aprendi muito com ele, especialmente pela generosidade que ele tinha em entender nossas diferenças culturais.
Um dia, no Messenger, após um argumento mal criado meu, que insinuava o lugar dele de ‘colonizador’, mui sabiamente ele me esfregou elegantemente à cara: “Mara, não estamos no tempo da colonização”. Ele era português, morador da Ilha Terceira (Biscoitos)...
 Em 2010, eu ia a Portugal, por conta de meu doutorado, que sendo aqui na UFBA (segundo o atual ministro da Educação, Universidade Federal da Balbúrdia), tinha convênio para bolsa-sanduíche no Porto. Era a oportunidade de ver meu amigo presencialmente. Depois, pelas perseguições internas que sofri na UFBA, acima de tudo, injustas, encurtei meu doutorado e acabei a tese três meses antes do previsto.
Acho que a gente se conhecia há pelo menos nove anos. E se fez diferença dividir um café ou partilhar um abraço, amizade e companheirismo foram uma constante. Ele era uma pessoa de verdade.
Li as últimas postagens dele, falando da depressão e vi o vídeo postado por ele, com um narrador mostrando modos de se fazer um nó de carrasco, próprio para suicídio, para enforcamentos.
Vi as mensagens de despedida dos familiares no Facebook e, confesso, fiquei tão mal, que senti asfixia, Por vários dias fiquei como que asmática, reaprendendo a respirar.
Hoje, finalmente, voltei à página dele no Facebook. Li tudo quanto eu pude para poder entender, saber e aceitar.
Fiquei surpresa com o carinho e presença da família dele. Não imaginava serem tantos os irmãos, nem tão presentes e amorosos os pais. Vê-se que a solidão é, também, uma ilha interna.
Nunca fui de julgamentos sobre o viver ou querer deixar de viver de ninguém. Viver nunca foi fácil: é desafio; é o que nos diz a Odisseia, ao nos mostrar a vida como jornada e como batalha. Mas, reitero, devemos ser teimosos – se a felicidade não é deste mundo, a gente a traz para cá, pelo menos para dentro de nós.
Alguns amigos meus driblaram seus impulsos suicidas casando e tendo filhos, de modo a se desviarem de suas próprias existências e focalizar outras. Acho um bom recurso.
Outros preferem um vício, qualquer desvio do peso de existir está valendo. Há os raros que são mais nobres e vivem para os outros, em trabalhos voluntários, em causas coletivas... E sempre me perguntam sobre isso de encarar a vida sem umas doses de nada, quanto e como acho coragem.
Como espírita sei da transitoriedade de tudo, mas isso não diminui a dor - entre quem crê e quem não crê; entre reencarnacionistas ou materialistas; entre católicos e protestantes; ateus ou budistas, tanto faz: dor é dor. Mudam apenas o escudo e a máscara.
Também aprendi com um amigo meu, Osmando, que a Terra tem muita coisa boa. Ele me mostrou que os espíritos têm saudades das coisas daqui. Assim também nós apreciamos coisas que há aqui – sim, mais próximos estamos de um estereótipo de Inferno que de um Paraíso (dois extremos, aliás, que não existem para o espírita – e se é difícil viver sem Deus, para muitos é bem pior viver sem a crença punitiva em um Demônio que lhes bote freio aos impulsos mais primitivos e baixos).
Bom, mas, enfim, escrevo isto aqui como se pudesse ser lido por Júlio, como despedida para ele – decerto, sei que minhas orações chegarão.
Acho que nunca eu declarei aqui com tamanha seriedade aquilo que vou repetir agora: cuide de sua vida!