Louquética

Incontinência verbal

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Mais do que palavras


O Ex-Grande Amor da Minha Vida sempre me dizia que eu escrevia com verdade. Era assim: eu escrevia de uma maneira crível, espontânea e não havia nada de mais naquela escrita, a não ser a sinceridade mesmo.
Claro que as palavras traem, claro que se pode manuseá-las artesanalmente, de modo a transmitir verdade ao que é apenas figuração. Mas acho que ele sentia que a verdade vinha da força de fazer o possível para me presentificar naquilo que eu dizia, já que eu não estava ali cara a cara com ele, e a escrita é sempre risco: a gente pode ser mal interpretado sem ter a chance de esmiuçar e esclarecer o que, de fato, quis dizer.
Não havia nada de mais em minhas palavras: só sinceridade.
A pessoa que eu ainda gosto há um bom tempo, outra pessoa que não a acima referida, não tem palavras. Fico boba com isso: antes ele falava, oralmente mesmo, porque precisava chamar minha atenção, se mostrar diferente, mostrar conteúdo, se destacar dos outros, das outras carinhas bonitinhas...Hoje, ele nem é sequer monossilábico.
Passei a pensar no que a minha analista me dizia, há anos: que eu costumava encurralar os homens através das palavras.
Logicamente eu sei a diferença entre um cara que me deixa no vácuo, falando sozinha; e outro, que não encontra a palavra certa, que acha que eu traço um raciocínio denso muito difícil de ser adequadamente rebatido. Não, não é a dificuldade de construir o argumento: é o risco de ser observado em suas preferências ou lapsos gramaticais, é o meu antecedente de professora que o faz se sentir vulnerável às correções típicas de um texto...E nisso nós diferimos muito: gosto a espontaneidade. Não sacrifico a naturalidade da comunicação de um texto porque tenho que ser atenta aos pronomes, às ordens, às palavras certas. Deixo isso para os textos científicos, onde bem cabe.
No fundo, dá uma certa tristeza por meu interlocutor se intimidar: tantas palavras e ele não escolhe nenhuma.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Ser igual aos outros


As mulheres ainda querem a forma mágica de agradar sexualmente os homens. Os tão falados 50 tons de cinza, em livro ou filme, pelo estardalhaço e público maciços, são provas disso.
A presença lacerante das mulheres em sexshop, a recorrente presença do tema nas revistas femininas e o crescente interesse por cursos de strip-tease e estripulias sexuais em geral, ratificam a afirmação.
Minha amiga se deixou seduzir por um velhinho a pretexto do perfil do homem-experimente sexualmente - como se não houvessem mulherengos e cafajestes de todas as idades. Ela acha que ele é o máximo e que sendo uns 15 anos mais velho que ela (ele, mais para sessenta do que para os alegados cinquenta), ela é coroa e ele, um homem experiente e nada mais. E a verdade é que ela é uma moça na idade e na aparência.
Pulando o caso clássico de que o velhinho gosta de auto-afirmação e tem a cama mais frequentada que a estátua do Cristo Redentor, para o que se vale do charme irresistível que só o dinheiro dá a quem não tem cara atraente, corpo atraente, bagagem cultural ou bens simbólicos como intelectualidade, sensualidade ou sei lá mais o quê, ele entende tudo de mulher, segundo a minha amiga.
Essa declaração genérica, por fim, foi decantada no seguinte: ele fala. Ela odeia homem calado. Ele fala. Ele fala palavrões chulos, baixos e clássicos como nos filmes pornográficos. Ela disse amar se sentir vulgar, tomar o papel atribuído à puta.
Paro e penso no nível de repressão de nossa sagrada sociedade brasileira: para gozar, só sendo puta. Para gozar, só se sentindo puta. Para sexo, é preciso que a mulher se fantasie imaginariamente de puta, que o homem a chame de puta, que proceda ao clichê: tapa na bunda, puxar o cabelo, se fazer de super comedor, serial fucker, que é melhor para os dois.
Isso seria liberdade, se fosse escolha. Porém é imposição de um modelo de comportamento. Até o sexo é enlatado, é cultura de massa, entretenimento adulto padronizado. E só pode ser assim.
Todos têm que gostar do mesmo. Aberração é sexo com carinho: uma caretice. Qualquer coisa que não siga esse script, poderá parecer romance, normalidade, mesmice, papai-mamãe, repressão...Tem que ser assim. Só pode ser assim.
Recentemente desencanei de dois relacionamentos, um por começar e outro que poderia ser retomado: em ambos os casos, os caras lindos, educados e inteligentes tinham fixação pelo universo virtual. de uma forma voyeur, de uma forma também platônica...E eu comecei a achar tudo doentio e apesar de gostar de fotos, não tenho saco para entrar nessa coisas paranoica de troca de imagens, gravação de áudio, telefonemas eróticos...Eu queria alguém de carne, osso e ectoplasma, tipo gente de verdade, que age, respira, beija, reclama...E não esses neuróticos da longa espera, que adiam o prazer e que pensam que imaginar é melhor que viver presencialmente.
Fantasia é ótimo.
Imaginação, quem não tem, está lascado.
Mas e a concreticidade das coisas? pele, carne, contato?
E então é isso: o sexo bom para a minha amiga é o do palavrão padrão; para os meus pretendentes, é o imaginativo, virtual...Não faço parte desse mundo...
Se o cara quer dizer palavrão, que fique à vontade; se quiser ouvir, sou mais de dizer no trânsito e na intimidade nunca soa natural...Entro no jogo, faço, se assim ele quer, porque sou uma mulher igual às outras que apesar de não ler livro clichê, não ver e não me interessar por 50 tons de cinza, também quer agradar sexualmente ao parceiro...Mas não em detrimento da minha vontade, nem por achar que sendo quem eu sou, eu não possa usufruir dos prazeres, que precise me refugiar no palavrão e na máscara das putas.