Louquética

Incontinência verbal

quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Procedência duvidosa


Minha amiga vive buscando grandes amores no Tinder. Recentemente, um grande amor de único encontro levou o celular dela e nunca mais apareceu. 
Semana passada, outro grande amor caiu na besteira de citar o próprio nome completo; jogamos no Google, e lá estavam os registros de processo enquadrado na Lei Maria da Penha; e outro, por um indiciamento por roubo de carro e estelionato.
Não sou conservadora, acho que quem quer amor e quem quer sexo tem que buscar mesmo. Há lugares mais propícios e outros em que a gente já sabe o tipo de gente que irá encontrar, lá, onde a exceção é raridade.
Um dos maiores erros é crer que só a gente mente. Ora, se você, que é essa pessoa espetacular, ímpar e exemplar, mente e faz armações, imagine as demais pessoas?
Acontece, porém, que minha amiga que mente muito – finge que trabalha, finge profissões que ela nem sabe de que se trata; finge que é pobre (breve adendo: eu apoio isso. A prosperidade não deve estar estampada na cara, no carro, na casa. Elegância, sim. Ostentação, jamais. Exibir o poder financeiro ou capital só atrai exploradores, invejas, parentes interesseiros. Antes contar misérias a ter que suportar aqueles que invejam nossas poupanças e nossos hábitos de só comprar à vista)...E os caras vão logo fingindo que querem coisa séria, propõem mudar o sobrenome dela, chamam-na de ‘meu amor’, forjam que são homens de família e, para tanto, metem uma foto com a mãe, com os filhos; se propõem a ir à Igreja...
Aí ela quer fugir deste amor estelionatário, que, por sinal, tem um sexo ruim e foi pouco agraciado pela natureza no tocante ao órgão sexual, mas que diz ‘ meu amor’ tão bonitinho, que ela se deixa ficar em conversas virtuais eternas.
Porém, ele sabe onde ela mora e ameaça ir lá, caso ela desista dele.
Acho isso uma regra de ouro: nunca levar qualquer affaire, peguete, ficante, caso ou rolo à própria casa.
Até no filme “Entrevista com o vampiro”, há uma cena em que Tom Cruiser reclama com Kristen Dunster, por ela ter deixado um cadáver na sala: “nunca traga vítimas para casa!”. À parte gracejos, não interessa se você é homem ou mulher; se é convencido ou se se acha acima do bem e do mal: não há sexo que valha tanto risco. Imagine: meter desconhecidos em casa, sob o risco não apenas de roubo, mas de que a pessoa volte sem ser convidada; que devasse sua intimidade. E o mundo está cheio de loucos e de gente grudenta.
Tem gente que nós não queremos contato nunca mais. Mas, e se a pessoa forçar a coincidência, passando por nosso caminho? Já passei por isso com dois perseguidores diferentes – gente que me viu em rede social, copiou lugares que eu frequento e, posteriormente, se colocou em meu caminho.
Com o poeta foi assim, mas por meios saudáveis: ele me viu numa foto, com um amigo em comum (escritor). Veio atrás. Esperou três meses até que eu aceitasse o convite. Aceitei o convite, a conversa e, um dia, o encontro. Encontrei e não larguei mais, há quase quatro anos.
Houve um tempo em que um amigo apresentava ao outro; as pessoas se encontravam, sem Tinder, sem Glinder, sem Badoo, sem Par perfeito... – esses meios acabaram comportando apenas pessoas casadas em busca de aventuras; paraíso das mentiras e dos golpes, de fotos com efeitos num cardápio humano de sabores previsíveis e preços lamentáveis. Amores de procedência duvidosa, amores falsificados para dores de cabeça verdadeiras.
Voltando à amiga, ela quis ocultar do analista, por vergonha, que prossegue saindo com desconhecidos e criando amores eternos de três dias. Eu aconselhei que não o fizesse.
Se ela mentir para o analista, o problema continuará. E se ela reconhece que há problema, precisa resolver. Se não causasse angústia, estaria tudo bem. Mas, ela sofre.
Encontrar namoros não está fácil mesmo, para ninguém. Ser bonito ajuda, atrai, mas não determina que você vai descolar ninguém.
Quem não foi favorecido pela beleza, precisa colocar em foco outros atrativos – charme, inteligência, elegância, bom humor...
Não é porque não se é bonito, que não se vai usar um bom perfume, roupas bonitas, cuidar de si...desleixo não atrai. Simplicidade é diferente de desleixo, tanto quanto humildade é diferente de pobreza.

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Negócios do prazer



Preciso fazer um relato de verdadeira utilidade pública: aprendi que quando a gente vai à sexshop com mais amigas, descobre coisas fantásticas.
Sexshops são ambientes femininos. Já vi até muitas atendentes protestantes evangélicas trabalhando e frequentando, descrevendo objetos, acessórios e produtos, entendendo outra lógica para a “mulher sábia” que “edifica o seu lar”... E longe de condenar, saúdo orgulhosamente esta compreensão de que ao ser humano é dado o direito ao prazer sexual – cansativa esta ideia de que sexo é coisa do demônio. Aliás, Demônio com poder de criação e superpoderes análogos aos de Deus é uma compreensão que a mais rasa das lógicas quebra, por não fazer sentido algum. Outrossim, respeito e fé não brigam com o sexo. Pecado é se privar de ser feliz sexualmente, achando que há punições divinas para isso.
Mas, fiquei surpresa pelas alternativas, pelas formas como as mulheres tentam aliar segurança e sexo bom, escolhendo preservativos com sabor, com texturas finas (e igualmente seguras); nas lingeries escolhidas, nos objetos e acessórios comestíveis e, para a minha surpresa, há, sim anestésicos para relações anais – uns com teor lubrificante e anestesia parcial, tipo o Santo Sensible Prata; outros altamente anestésicos, como o 50 Tons que, de quebra, a vendedora recomendou não usar jamais sem preservativo, porque anestesiaria o pênis do “par”. E por falar em par, dei muita risada com um produto, cujo nome eu lembro, embora não me lembre a marca: Volumão. Muito engraçado o nome. E se torna ainda mais engraçado porque ainda há homens que se ofendem quando o tamanho pequeno ‘do volume’ é citado. Muito particularmente, eu acho que jamais, homem algum neste planeta Terra, sabe que tem o pênis pequeno. Nenhum. Não há fita métrica, espelho, foto, declaração ou constatação científica que os façam saber.
Sem essa de gigantes preguiçosos versus pequenos trabalhadores; de varinhas mágicas curtas com alto poder de encantar, ou do clássico (absurdo e mentiroso) “na horizontal todos se entendem”. Não mesmo! Mas, não vamos contar isso para não aumentar o movimento nos consultórios de psicólogos, psiquiatras, psicanalistas e astrólogos (sim, no desespero vale tudo!).
Tem de tudo em sexshop: bonecas realistas (imitação de ser humano da pele aos cabelos, passando pela anatomia total e altura) na casa dos 13 mil reais; líquidos vibradores que pulsam, esquentam, esfriam, estimulantes para todas as partes do corpo, língua sintética, alimentos para modificar o sabor do esperma, lubrificantes de todas as cores, tipos e princípios ativos, desodorantes para reentrâncias que a gente nem lembra que tem, produtos para beijo francês, beijo grego, beijo de esquimó...Enfim, um acervo que inclui livros, filmes, jogos e coisas que eu juro nem saber que poderiam existir. Agora eu sei.
Não jogo pedras nesta indústria que, também, tem muita gente séria, com conhecimento e nome na indústria de alimentos, na química, na anatomia, na biologia, no design (um vibrador, uma boneca inflável e vários objetos dependem de designer)...E fico contente por haver a opção.
Há coisas para curtir a dois (ou mais) e coisas para curtir sozinho/a. Nada melhor que privacidade, né?
Quem não gostar, basta não ir. Eu fui (desta vez, na relatada visita), gostei, comprei e voltarei...com o maior prazer.

terça-feira, 1 de outubro de 2019

As sombras das angústias



Aprendemos a lição de um modo errado: achamos um absurdo que uma pessoa que tenha tudo possa vir a ter angústias, depressão, transtornos psicológicos. Reafirmo que não é porque se tem tudo, que não se sente falta de nada.
Claro, as necessidades causam transtornos também. Fica difícil ser feliz quando há ordem de despejo, telefonema de credores, situações de humilhação, de necessidades materiais...
Às vezes, ter recursos materiais não poupará ninguém das dores da existência, mas já ajuda no suporte e na aquisição da ajuda profissional da psiquiatria, psicanálise, ou do que for.
Seja por uma questão física, quando a pessoa se sente fora dos padrões, se acha feio, gordo, etc., mesmo pelas poucas correspondências afetivas, amores ou vontades contrariadas, sentimentos de luto e tudo o mais que pode afetar um ser humano e fragilizá-lo, seja como for, a gente procura causas e motivos.
Quando a pessoa não tem a causa aparente, queremos tirar a legitimidade da dor daquela pessoa.
Hoje fui eu a sentir isso, quando mostraram o Xexéo, ex-vocalista da Timbalada, vivendo na penúria das ruas, por causa do vício em drogas.
Alguns dirão que Deus deu a ele todas as oportunidades. E deu mesmo. E isso não é antídoto para depressão, vícios, dores, angústias.
Deveríamos, sim partir daí: a pessoa teve tudo – dinheiro, aparência, fama, talento, afeto, fãs – mas há algo além do palpável e acima de imunidades.
A atitude interior conta. Se a pessoa foge, anestesiando a dor com álcool, sexo, drogas, compras ou toda sorte de ilusões, o bloqueio temporário da angústia fica cada vez mais curto.
Gosto de dar trabalho à tristeza. Infeliz de quem não luta e se acomoda.
Também tem quem faça marketing da depressão – nem Ricardo Boechat escapou, pois que até no dia da morte, tendo superado uma depressão real e pesada, capitalizou sua história e estava a serviço de uma empresa de fármacos antidepressivos quando houve o acidente fatal – há quem surfe no modismo do coitado/pobrezinho para ganhar uns afagos no ego; há quem se auto-diagnostique e há quem realmente imagina que qualquer tristeza é depressão.
Ah, sim: fracos como somos, em nossa condição humana, ainda estamos vulneráveis a hormônios, a oscilações neuronais e processos físicos que nos tornam propensos a tudo isso.
A estrada de cura ou de estabilização é bastante pessoal. Todavia, tem um ponto em comum: a pessoa precisa assumir as rédeas da vida e procurar a saída, querer sair do quadro em que se encontra. Precisa, ainda, saber que angústia não tem cura. Angústia é parte da vida, vai, vem, demora, sai, mas sempre volta.
Não há remédio que cure. Mas, há reações saudáveis para o que é inevitável.