Louquética

Incontinência verbal

domingo, 7 de maio de 2023

Que tal um samba?



Fiz aniversário em 12 de abril. Não foi ruim. Foi um dia bem especial, com uma noite maravilhosa. Completei minha comemoração no domingo anterior, dia 30 de abril, quando fui ao show de Chico Buarque, na Concha Acústica do Teatro Castro Alves, em Salvador.

Eu nunca havia ido a um show dele. Não paguei caro no ingresso, mas tive muitas despesas para estar em Salvador, já que moro a 115km de distância da capital baiana. Valeu tudo, todo tempo e todo dinheiro investidos. Show incrível, com uma banda soberanamente profissional e a presença marcante de Mônica Salmaso – ela, sozinha, já é uma orquestra de serafins.

Depois deste show, a que fui sozinha e saí com 5 novos amigos e uma amiga em particular, dei graças a Deus por aquele público ser daquela forma, com um perfil educado e amistoso. Decerto, fui advertida sobre isso, mas coloquei na conta de preconceitos e estereótipos. Não, não era. Era um público diferenciado mesmo. Parece que, de fato, não há como ser fã de Chico Buarque e ter certas práticas...Não era caso de classe social, não. Era caso de perfil cultural. Embora se localizassem bolsominions na plateia – revelados pelos palavrões proferidos diante da execução de “Que tal um samba?”, nos versos:

"Depois de tanta mutreta
Depois de tanta cascata
Depois de tanta derrota
Depois de tanta demência

E uma dor filha da puta, que tal?”

Diante do que, me perguntei o que um ser sofredor deste tipo fazia ali, num show de um homem lúcido de Esquerda e com uma plateia com aversão aos dogmas da Extrema Direita (gente de Esquerda que acredita em ciência, defende vacinas, não compactua com discriminações de gênero, etnia, religiosidade, etc). E chamo de ser sofredor porque é um ser humano deslocado, que luta contra a realidade e possivelmente lute consigo mesmo para conciliar o gosto musical e a discordância ideológica. Sofredor, também, porque entre as palavras, opiniões e conclusões de Chico Buarque e um cantor sertanejo de mídia contemporânea, há imensa discrepância e, sinto muito, mas há uma profunda diferença cognitiva, de modo que eu nunca deixaria de dar crédito a Chico Buarque, para dar àquele lá, cujo nome estou me esforçando por lembrar...Ah, Gustavo Lima (eu ai dizer que era Luan Santana, porque também não sei nome de ninguém e acho todos eles iguais).

Voltando ao caso: não tive vontade de ir a show mais algum durante a semana e muito menos ontem, quando teve show de Vanessa da Mata. Gosto dela, mas ainda estou saboreando o show de Chico. Ainda estou com aquele sabor remanescente de um prato saborosamente experimentado.

E, juntando as partes desta nossa prosa, queria também dizer que mudei muito e pude perceber isso no decurso do meu mês de aniversário. Não foi somente envelhecer, foi ver a vida com os filtros dos olhos adultos – mais maduros e também mais cansados; mais seguros, mas levemente embaçados, abrindo, fechando, pestanejando como cabe ao vivos, meus olhos vivos.