Louquética

Incontinência verbal

domingo, 31 de janeiro de 2021

Estratégias

 


A gente se sente meio injustiçado pela vida quando vê certas pessoas sem qualificação ocupar altos cargos ou posições de destaque. Lembram da velha metáfora do jabuti, que diz que “jabuti não sobe em árvores”? “Se ele está lá, alguém o colocou: não mexa nele!”. E não tem um ser humano que não conheça pelo menos um jabuti bem colocado no topo que ele não alcançaria sozinho. Pois, bem, é muito difícil lidar com isso: desarticula nosso fair play, porque a gente saca que houve manobra e deslealdade para favorecer ao incompetente; gera o ataque moral silencioso, porque julgamos que sexo é moeda de troca e esse pode ter sido o preço do patamar alcançado pelo jabuti; acrescentando situações reais e possíveis de parentesco, apadrinhamento e outras formas de trocas. Até aqui sabemos tudo e admitimos ser possível.

Há, contudo, outro fator: o jabuti pode ser um idiota de sorte ou um incompetente estratégico. Sim, pode. Um idiota bem sucedido pode estar ao seu lado em qualquer canto do planeta.

Os leitores de minha geração vão se lembrar de Forest Gump; os do tempo presente hão de questionar como certas pessoas, autoridades inclusive, passam em concursos difíceis tendo a inteligência tão encolhida ou postura crítica abaixo de zero e nenhuma sombra de capacidades ou habilidades específicas. Eu, entretanto, vos digo: adestramento.

Associamos a palavra ao treinamento de animais, mas não a empregamos aqui com subestima. O adestramento mental inclui a memorização, a atenção a palavras chaves, o treinamento reiterado sob forma de simulação e a codificação de fórmulas ou assuntos.

Está errado? De forma alguma. É desleal? Muito menos. Só depende da disciplina, da memória, da capacidade de decorar.

Como um crente sabe os versículos de cada parte da bíblia, o advogado deve saber as leis, em seus artigos e princípios; tal como um aluno de séries medianas pode decorar a Tabela Periódica dos Elementos. Pode traçar cadeias associativas rasas, até mesmo usando paródias lembradas do cursinho. Pode ter sagacidade e treinar redação e respostas abertas.

A chance da pessoa verdadeiramente inteligente é bem menor: ela não apenas leu, mas estudou. Por isso, o conteúdo para ela, ultrapassa a memorização: precisa ter coerência, ser transformador, apresentar coesão, sentido, a tal ponto que até a maneira como a pergunta e as alternativas se apresentam, influenciam na resposta e no resultado, porque a pessoa inteligente interpreta. Por conseguinte, perdem mais porque têm honestidade intelectual e, portanto, mais dúvidas. Todavia, poderiam aprender muito com os jabutis, no que toca à disciplina do aprendizado e dos simulados.

Simular é treinar, antevendo a situação. Assim, quem faz simulados se familiariza com a linguagem das provas e das fundações que as elaboram; treinam, se preparam, têm esperteza para fazer eliminação, estão no jogo para ganhar. Estratégia vence jogo. Estratégia e inteligência, portanto, duas aliadas para toda guerra. Por fim, as situações que perfazem provas e testes são bem distantes das práticas reais, o que ajuda o jabuti a se ajustar a uma rotina de trabalho que não compromete a incompetência dele, coisas que o comportamento repetitivo e burocrático vai dar conta.

Uma pessoa inteligente, porém, sempre terá mais angústias, por viver a dinâmica das coisas, assumindo angústias, fracassos, insuficiências e se reinventando para dar conta das demandas - quem ganha mais afinal?

 


 


As férias da escrita aqui no blog não tiveram a ver com férias propriamente ditas. Ao contrário, me ocupei por demais com outras escritas alheias, em sentido profissional. Mas, eis-me aqui, finalmente desvencilhada do Instagram e cada vez menos presente no Facebook. No primeiro, porque a futilidade é quinhentas vezes maior; no segundo, porque o Facebook se tornou apenas uma ferramenta chata de disseminação de notícias falsas e jogos fúteis e inúteis- vou lá porque tenho bons amigos e ali acho modos de aparecer e mostrar que estou viva, já que respeitamos a situação de pandemia.

Também por isso, não viajei para lugar algum. Não nego meus maus olhos contra os que viajam, dentre os meus amigos. Acho que lazer todo mundo precisa. Descanso, também. Mas, agora não dá. Agora não há abraço que seja possível, se bem que vez ou outra um amigo me faz visita surpresa e eu, louca para abraçar, para ficar farofando os cabelos deles, porque trato todo mundo como trato os meus gatos e, então, se me distraio, estou farofando os cabelinhos de todos. Hábito mesmo.

Passei o ano novo em casa, fui ao shopping, se muito, três vezes, e me senti num filme de terror, fugindo de zumbis, porque o povo vem para cima, cola, se atira. Criei coragem, no sábado passado, e fui comprar short, porque notei que meu guarda-roupa só tem roupas de trabalho. Fui com medo e voltei com pavor e, sob esse clima, resolvi dirigir até às ruas de festa, para ver se o Bar do Fracassados estava aberto. O nome do bar é outro, mas na minha cabeça esse é o nome verdadeiro, a razão social real, porque lá sempre vão os que estão fracassados em algum setor da vida.

Passei meus olhos gulosos lentamente pela janela do carro, doida para estacionar e ir ver quem eu encontraria lá, para um minutinho de conversa vadia...O bar é sombrio, de pouca luz e muita fumaça de maconha, mas estava aberto sim. Ali é abaixo do underground e quem é gay nunca sai de lá desacompanhado.

Por aqui, o povo aglomera e festeja, sem a menor responsabilidade. Guardei meu distanciamento e voltei para casa, observando o caminho cheio de festas ou de carros circulando atrás de farras.

O verão, até aqui, foi de calor e de pouco sol. Para mim, sem praia, sem piscina, sem marquinha de biquíni. Verão bom é verão sem horário de verão.

E sobre vacina, o dia chegará em que serei contemplada. Não resolve a pandemia, mas contribui para reduzir o agravamento

Vi e ri, de gente que desfez da vacina, agora furar a fila para se imunizar da doença em que não acreditam. Ah, esse Brasil vai mal, mas, sigamos: 2021 será o ano da contradição generalizada.