Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Vale somente o que está escrito



Lá se vão as livrarias brasileiras, fechando, pedindo concordata, abrindo falência.
Já dei aula de Leitura e produção de texto, assim como de Literatura Contemporânea: duas grandes experiências para que quer saber quem é quem no mundo das Letras. Minha conclusão contraria o politicamente correto: defendem por aí, que as pessoas leem mais hoje em dia; que os recursos digitais multiplicam as leituras, que as pessoas leem por meio de textos, imagens, sons, tudo que compõe o hipertexto...
Dizem, também, que as pessoas leem tanto, que qualquer cidadezinha tem sua Feira Bienal do Livro, além dos tantos Festivais de Livros que pipocam no país.
Meu diagnóstico, porém, é este: as pessoas não leem quase nada fora do universo da autoajuda. Leem muito mal e a fórceps os conteúdos acadêmicos. Escrevem tão mal quanto mal leem.
E o que fazem, afinal, nas Feiras Bienais do Livro e seu congêneres? Ora, tiram selfies.
Mesmo fenômeno que acompanhou as grandes frases de Clarice Lispector jamais ditas ou escritas por elas: devido ao lugar privilegiado do universo letrado, do peso desse capital simbólico que é deter a cultura formal, parecer que lê é fundamental.
Há muitos autores e muitos livros, sim: sustentados no esforço individual de patrocinar a produção, nuns casos; na egolatria autoral, em outros...Tem bons autores e bons livros, na disputa plena por um espaço. Entretanto, o espaço literário é uma área negociável em que nem sempre os qualificativos verdadeiros vencem as viabilidades financeiras.
Livro também dá lucro. Não obstante, não é um objeto cultural barato
Amo livros.
Nunca deixei de comprar livros, mesmo na maior das crises.
Hoje, leio menos do que eu gostaria, do que deveria, porque preciso focalizar nos livros diretamente relacionados ao meu trabalho e às disciplinas que ministro; e nos livros de minha formação espírita. Mas, em paralelo, vou lendo uns livros que me devo.
Minha meta é ler o livro de Isabela Figueredo, chamado “A gorda”, que é um romance português contemporâneo
Também me devo uns livros de António Lobo Antunes, como “Memória de elefante” e “Da natureza dos deuses”.
No momento estou lendo “Os sofrimentos do jovem Wether”, de Goethe; e já comprei uma edição linda e completa de Memórias do Cárcere, de Graciliano Ramos.
Ler é preciso. Juro que me diverte, que aprendo...sempre aprendo...
Entendo, porém, que as pessoas, em sua maioria, pensam que ler é chato, principalmente porque requer concentração, esforço de compreensão...E o povo brasileiro não é muito chegado a esforço algum (lembram? Lei do Menor Esforço. Logo, querem emagrecer sem exercícios e sem sacrifícios; ter bônus sem ônus; se formar sem estudar, etc.).
Mas do fechamento de tantas filiais de livrarias, eu queria mesmo dizer que sinto muito, que adoro os ambientes de livrarias e adoraria ainda mais se não houvesse um vendedor grudado em mim, tirando minha liberdade e que, em sua maioria, eles pudessem saber classificar os livros que vendem...
Livros e café: mistura boa que consola e cura; parte importante de um lazer gostoso, tanto quanto a música.  E houve um tempo em que eram livros e CDs...
Não há PDF que substitua o livro físico, aquela relação que Clarice Lispector descreve em “Felicidade Clandestina”: o livro é um amante, é um amor, um companheiro...Os que não nos agradam, a gente larga; os que nos prendem, nos acompanham.


terça-feira, 13 de novembro de 2018

A outra parte do jogo



Todo inferno, para mim, são as angústias. Ninguém está livre delas. Elas sempre nos espreitam, embora haja tanta gente querendo dopá-las com cerveja.
Eis-me de novo à Psicanálise.
Não deixei o consultório por me achar acima das angústias: é que elas mudam de cara, de casa psíquica...
Por mais que estejamos felizes, plenos, em paz...são meras tréguas de validade indefinida.
Às vezes a gente desvia das próprias angústias, para ajudar os outros e para isso fomos feitos.
Hoje em dia lido melhor com as angústias dos outros, apesar de eu nunca ter sido indiferente. Já me envolvi com as angústias alheias, em demasia, por uma empatia não com a causa, mas com os sintomas.
Da velha casa, de que tanto me queixei neste blog, das ruínas, dos escombros, não ficou nada. Tudo resolvido. Quando a psicanálise du tudo que podia dar, veio a vida real e me trouxe uma parte desconhecida de minha família materna, como a peça final do quebra-cabeças que nunca me distraiu.
Tudo certo.
Tudo em paz.
Até as pazes com Deus, finalmente, veio: entendi que tudo foi o que deveria ter sido. Sem sortes, sem privilégios, sem preferências...tudo justo.
Minha causa na psicanálise agora é outra, toda minha. Como seres relativizados e relacionais, encontrarei minha família, de novo, nas estradas da minha questão atual.
Sei é que adoro ser sozinha.
Sei que preciso estar sozinha.
Queria apenas ter o direito a isso.
Acho que se eu fosse criada pela família de minha mãe, teria sido muito infeliz, porque tirariam minha liberdade.
A família paterna, negligente, me deixava livre. Pude estudar. Poderia ter me drogado, por exemplo...Mas, pude estudar, como poderia qualquer outra coisa, já que os perversos olhos punitivos de minha madrasta eram também de extrema negligência.
Se a gente bem soubesse que a liberdade vale qualquer preço, não se prenderia à toa.
Eu me arrependo profundamente das poucas vezes em que forcei uma barra, em que inventei romances para preencher vazios, em que me enrosquei com gente que não tinha nada a ver comigo, gente repulsiva e disponível, que me distraía das angústias reais ou que, descaradamente, aceitava o pacto e gostava de ser usada.
Pelo menos, nunca fui de maltratar ninguém. Porém, meus desafetos são claros.
De quem não gosto, não gosto.
Causa-me o maior mal-estar com um dos casos do passado, hoje amigo ou gente de meu convívio, vem recordar detalhes de noites perfeitas, de filmes, músicas, cheiros e gostos de momentos fugazes e errados para a minha consciência...
Também tenho vergonha do segundo homem que quase amei: depois de textos caudalosamente escritos, visceralmente escritos numa sinceridade absoluta, acabado o interesse, jamais gastei mais que meia dúzia de palavras com ele.
Há que se dizer, fiz por onde: ele saiu de meu pensamento e a atenção é proporcional ao interesse. Não me interessa mais. Nenhum deles. Acho que, como passado, os que não viraram meus amigos, sobreviveram em meu interesse por conta de revanches vingativas...passou. Não me interessam mesmo.
Sigo com o Poeta, que às vezes quer mudar o ritmo do jogo, que pensa que dá as cartas...ora, não sabe ele: quem corta sou eu!