Louquética

Incontinência verbal

terça-feira, 19 de julho de 2022

Aqui estamos nós...

 


Blogs são espaços sobreviventes em meio a uma era cada vez mais indisposta à leitura. Foi-se o tempo em que blog era um diário que movimentava a curiosidade alheia e servia para desembaraçar cérebros cheios de ideias e dúvidas. Quanto mais me ocupo, menos tempo sobra para a escrita.

Por aqui, como posso, procuro manter distância e anonimato parcial, porque continuo achando estranho que a gente possa priorizar censuras internas para evitar julgamentos dos conhecidos; ou se dar à tarefa de implorar seguidores.  Acho tudo isso chato e desnecessário e nunca usaria tal régua para medir sucessos. Estou aqui há 12 anos. Sobrevivendo há mais de uma década, porque não busco patrocinadores nem retornos financeiros ou coisas materializáveis.

Acho minha vida engraçada, até quando ela está trágica e, por isso, dou conselhos que ninguém me pede – porque quem não acatar, basta não seguir; quem não gostar, basta não ler. E eu adoro esse desprendimento.

Falando nestes 12 anos de blog, vos digo que o mundo mudou, que o século verdadeiramente só está começando agora – não me refiro a datas, logicamente, mas ao tempo em sua categoria abstrata. Uma pandemia é muita coisa. Uma legião clamando a volta da ditadura, é muita coisa. Todo o retrocesso no conhecimento é muita coisa e, se algo nesse embaraço me surpreendeu, foi a completa ausência de sentido nos termos recorrentemente citados. Por que, ao reclamarmos do ensino escolar, o que houve com as aulas de História, Geografia, Física, Português, Ciências, Biologia, Química? E não falo exclusivamente das deficiências da escola pública: falo do geral, das pessoas com formação e repertório de vivências.

Onde ficou perdida a noção básica entre Capitalismo e Comunismo? De onde saiu a ideia de que o Brasil já foi Comunista, ou que grandes detentores de meios de produção, gente de família quatrocentona, agroexportadores e redes de televisão mundialmente estabelecidas poderiam ser comunistas? De onde saiu a ideia de que o Capitalismo beneficia o pobre e prega o bem comum? Quando a Terra se tornou plana? Como se pode propor intervenção militar no próprio país, mas se defender a Democracia para a Venezuela? Quando foi que a Ciência se tornou menos relevante do que as indicações mendicamentosas dadas por um presidente? Desde quando alguém pode ser considerado conservador porque prega contra a liberdade sexual dos outros? E desde quando se pode ser cristão desejando o extremo mal aos desafetos e fazendo-se apologia à violência, como prediz a BBB (Bancada do Boi, da Bala e da Bíblia) e, aliás, como se pode aliar políticos do agronegócio, políticos da indústria de armas e políticos que defendem valores cristãos? Desde que o país resolveu acreditar nisso. Daí que, para mim, o novo século só começa agora: com suas contradições, misérias e múltiplas faces. Estou assustada com o tempo, com as pessoas, com o nonsense descabido. E com a identificação que as pessoas têm com tudo isso. Não há o que reclamar: são escolhas de uma maioria.

Conservadores não são conservadores: são apenas retrógrados ou reacionários. Têm saudades do passado, assim como todo racista tem saudades da escravidão, porque afinal era a escravidão alheia. Mas, há um sentido de masoquismo coletivo aí, porque o Brasil é pobre. A maioria é pobre. Não se tem classe alta com tanto número de gente que possa representar maioria quantitativa: é o povo que vota conforme a cabeça do algoz; que se identifica com o patrão e que acha que mais vale defender uma pauta moralista do que um prato de comida que chegue a quem não tem.