Louquética

Incontinência verbal

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Ele, ela, elos...




Tenho várias amigas, mas duas em especial, que adoram dar satisfações a seus respectivos pares. Adoram a cobrança sobre onde estão, com quem estão, o que fizeram, etc., e se comprazem nisso sem a menor vergonha. Assumem adorar o grude – gostam de grudar nos outros e que grudem nelas.
O que me parece um sufoco, para elas, significa um fetiche, atenção, prazer...
Não tenho essa natureza. Por sinal, qualquer coisa me sufoca, me afugenta.
Tem uns malucos, onde se incluem muitas mulheres, que defendem a submissão da mulher.
Não pensem que é a submissão política (e o que não é político nas atitudes humanas, né?), é a submissão padrão mesmo, da ‘mulher sábia que edifica o seu lar’, é subserviente, está a serviço do homem, defende o casamento com unhas e dentes mesmo que ele não valha nem o esmalte com que pintam as unhas...Elas acham que a mulher atual “perdeu a essência” e isso não lhes cheira bem.
Quando traídas, culpam ‘a outra’, como se o homem, pobrezinho, não tivesse escolha, não tivesse saída, fosse indefeso nas garras das sedutoras oferecidas, uns coitados que não podem dizer ‘não’.
Elas se ajoelham para o sexo oral, em sinal de submissão, mas não têm reciprocidade. Casam com esse grande homem que sexualmente não faz nada pela mulher e guarda o melhor do sexo para as amantes.
Mulher sábia engole sapo. Engole outras coisas. Adoece sexualmente e não sabe como isso aconteceu.
Que fique claro que não é por ser mulher que a pessoa defende as mulheres, nem deseja igualdade entre as partes.
Acham que é assim, que na natureza é assim também, que está escrito que é assim que deve ser.
Não é preciso ser feminista, nem ser afetada ou amarga para notar que esse modelo de comportamento machista e patriarcal escraviza as mulheres.
Aquele filme velhíssimo, chamado “Mulheres perfeitas” mostra bem isso: o modelo de mulher perfeita. Perfeita demais para ser normal. O final do filme dá as resposta: o modelo é feito por homens.
Os amigos machistas eu não saberia contar quantos são. O poeta também é e tem ficado pior.
Hão de me perguntar: “mas você está há três anos com um sujeito machista?”. Eu vos direi: ele encobria. Mais ainda: vivo há décadas com os sujeitos machistas de minha família – de minha rua, da escola, da universidade, do planeta. Tenho uma tia especialmente machista e espetacularmente hipócrita, que conta um história ridícula de que saiu virgem do primeiro casamento, porque o marido era doente e mal respirava. Desta tia, lembro que levantei desesperada numa noite, quando eu tinha 11 anos, porque ela gemia e chamava o nome do então namorado e eu, criança, achei que ele estava batendo nela...Até chegar à porta do quarto e perceber que aqueles gritos não eram de dor...
Uma santa que gritava alto, hein?
Esta tia se vangloria da pureza delongada. Machista, defende um modelo de mulher afinado com a vontade dos homens.
Então, meu poeta veio com umas revoltas chatas, a reclamar de minha independência, do meu jeito, de minhas respostas, de minhas atitudes e ainda teve o desplante de sugerir que a mulher domina o homem quando, sexualmente, está por cima dele. Não teria proposição mais ridícula, ainda mais porque eu sou mulher e não tenho como propósito dominar ninguém – no máximo, busco domar meus instintos e dominar meus ímpetos.
Não vejo graça em escravizar, em mandar em alguém.
Outra coisa que me deixou estarrecida foi quando, por duas vezes, O poeta me induziu, pedindo e sugerindo com gestos e posturas, a colocar comida na boca dele – sim, eram sobremesas e era eu quem estava comendo...Mas não sei dizer como isso me espanta.
Duas interpretações possíveis: alimentar alguém é coloca-lo na condição de criança, de filho, a quem se dá a papinha na boca;
Outra interpretação é a de que ele se porta como dependente, como se estivesse inválido, fosse incapaz de se alimentar sozinho. Freud diria do mais óbvio, da fixação na fase oral e seus desdobramentos. Todavia, só em citar isso, me apavoro.
Não gosto de gente que não manda em si mesma. Algo que deveria ser prioridade em nossa cabeça é isso: a vida da gente é nossa.
Você pode ter filho, mãe doente, parentes dependentes, todo tipo de contexto que funcione como meio coercitivo do exercício de sua liberdade e de sua vontade, mas a vida é sua.
Não é por egoísmo mas, por mais que a gente ame alguém, antes de todos, de todo mundo, a gente deve amar à gente. Se declinarmos disso, iremos, depois, culpar os outros por nossos destinos.
Não serei eu a ditar como as pessoas devem ser, mas sei muito bem que modelos eu não vou reproduzir e a que forças não irei ceder.


domingo, 23 de dezembro de 2018



Parece um padrão, de tão repetitivo que é. Predomina mais entre as mulheres que entre os homens e todos nós conhecemos alguns casos bem próximos: as pessoas vivem o máximo possível de luxúrias, se deleitam sem pudores no sexo, se largam no álcool, nas drogas, nas badalações, nas atitudes ilícitas, nas irresponsabilidades desenfreadas e nas mais altas inconsequências e, de repente, um dia, alegam que ouviram um chamado de Deus. Pronto: vão limpar a ficha numa religião qualquer, mas nas protestantes sobretudo. O passo seguinte é condenar nos outros tudo aquilo que elas já fizeram.
A seguir, se tornam fiscais do sexo alheio, controladores da liberdade, das ações e das atitudes e, em boa parte do tempo, vão cometer tudo que cometiam antes, porém escondidas sob o véu da hipocrisia. Só encerram a carreira de mundanidades quando estão velhas, fora de circulação.
Oram como os grandes fariseus: gritando, se exibindo, colocando Deus antes de tudo, em suas palavras mas nunca nas atitudes reais.
Em minha rua tem dessas pessoas.
Em minha família tem dessas pessoas.
Elas estão por toda parte.
As que fazem trânsito religioso são ainda piores: condenam amanhã as atitudes da religião que as abrigavam hoje. Tornam-se detentoras de verdades absolutas, monetarizam seus arrependimentos e as ressacas espirituais que carregam porque, depois de muita peregrinação entre segmentos espirituais e em pecados paralelos (ah, elas acreditam em Pecados), colocam culpa nos outros, são supostamente bastante íntimas de Deus, senão por fé, por medo do Inferno.
Acreditam no jejum, que fazem alardeando, como se fosse uma greve de fome em favor da humanidade - certamente por pensarem que Deus ganha muito se elas declinam da gula, do que ganharia se, ao invés de passar fome para se exibir para os outros, dessem comida a quem realmente tem fome. Desse tipo aí, tem na minha rua, na família, entre os meus amigos...
Estou falando nisso porque estou no meio do período mais hipócrita do ano, onde essas coisas se repetem.
Para alguns, tudo isso é necessário: os rituais fazem com que eles creiam mais em si mesmos. Uma fé ostensiva, para os outros verem, podem convencê-los de que tudo aquilo é verdade: precisam do rito, dos símbolos e das testemunhas.
Mas, também conheço poucas mas verdadeiras pessoas religiosas. É que elas são discretas: não estampam fé em camiseta, nem em adesivos de carro, não esfregam na cara dos outros a oração feita em favor deles, nem fazem caridade para aparecer em coluna social.
Desses não há em minha rua.
Desses não há em minha família. Mas, asseguro que existem.
São respeitáveis, amorosos, caridosos, tudo naturalmente. Acho que Deus deve morar neles, até porque não se tornaram o que são por arrependimento, por hipocrisia, por dor, para limpar a ficha, por medo do Inferno...Por isso são poucos. Mas, é gente em que boto fé!

sábado, 22 de dezembro de 2018

Quem convidas para a tua mesa?



A liberdade é uma casa de muitas portas. Muitas vezes, a gente diz: “Livre-se disso!”, como se fosse apenas um ato de jogar fora, se esquivar de uma situação, deixar uma pessoa, um hábito, um vício, um lugar...
Livrar-se de algo é, realmente, ficar livre daquilo, consolidar a própria liberdade. Por isso, reitero aqui uma afirmação de tempos atrás: exerça sua liberdade de não querer, seja lá o que for.
Exerça a sua liberdade plenamente, analisando, antes de tudo, que necessidade você tem de manter ou de se manter preso a seja lá o que for.
A gente muda. Muda a nossa percepção. Até o amor muda e muda de forma tão premente, que acaba – em alguns casos, acaba mal. Mas, na maioria dos casos, vale a pena.
Se o amor se tornou algo pesado e chato, é que já não é amor. Bem assim a amizade e o contato com certos parentes.
Uma coisa é o cerimonial, o ritual, a burocracia dos contatos...outra coisa é você ter que suportar o convívio. Este último é sempre alternativo. Mesmo que a pessoa more perto de você ou trabalhe em sua repartição – desgastante, eu sei, ignorar a pessoa ou não dar bola à presença dela, mas não é necessário prolongar esse convívio. Não leve quem te desagrada para a sua casa, para o seu dia...
Há amizades unilaterais: você gosta do amigo. Ele pensa que gosta de você e, entretanto, tem posturas autoritárias, nunca é concessivo ou, simplesmente, é uma pessoa chata e egoísta, que adora ser servida e que se acostumou a decidir tudo por todo mundo. Às vezes, esses tiranos são bem enturmados, por situações prévias, de infância, de outras coisas – e é claro que mesmo os amigos mais malas têm qualidades que nos atraem para o rol das amizades e que a gente põe na balança...Outros, não: a gente gosta deles apesar das falhas. Mas, por ser amizade unilateral, uma hora a gente se pergunta se precisa mesmo se submeter àquilo, aturar aquela pessoa chata, ruim...Há os egoístas máster, que colocam a gente na lista dos programas, mas o comando é deles, só se ouve no carro o que eles determinam, só se faz o roteiro de lazer e viagens que ele quer...Não é uma coisa suportável. Pergunte-se se você precisa disso.
Agora é período natalino. Época de eclosão da hipocrisia. Alguns sapos, a gente engole, por conta da boa educação  - programas ruins, trocas de presentes com gente odiável, contenção de mágoas em eventos sociais, correspondência aos falsos votos de gente que, sabidamente, torce pelo nosso mal e pelo nosso insucesso...Eis-no abraçando gente escrota. E o que eu digo? Relaxa, que isso passa. São sapos que a gente engole, às vezes, para favorecer as aparências, a harmonia social, para agradar nossa tia boazinha. Lembre-se sempre de manter distância, não se expor ao veneno...
Outra dica valiosa: não caia na tentação de ostentar sucessos, ganhos, conquistas... Não vale a pena esfregar na cara dos outros. Uma hora a notícia chega sozinha aos ouvidos que precisam saber.
É a coisa mais clichê que se pode dizer ou esperar, mas “O tempo é o senhor das verdades”. O tempo é um grande mestre que sabe mexer as peças do tabuleiro, revirar lugares, confirmar suspeitas, desfazer equívocos e ilusões...
Ter fair play ajuda também. O ajuste de contas pode ser nosso, conosco, introspectivamente...Ou pode ser externo, mas, se você não está tão bem quanto gostaria, assuma sua parte nas causas da situação atual. Perdeu a a partida, mude a estratégia ou saia do jogo.
Não adianta sonhar: para algo mudar, você precisa contribuir.
Antes de qualquer coisa, livre-se do que não lhe serve mais ou de quem você não quer mais ser serviçal.
A gente sempre deve saber a hora de deixar a mesa, seja por estar satisfeito ou por perceber a insatisfação. Cuida, também, de escolher direito quem convidas para a tua mesa: não é preciso partilhar presenças incômodas, que tornam o momento indigesto.