Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 29 de março de 2013

Sete chaves


Nesta sexta-feira da Paixão em que o povo baiano se junta para encher a pança de vatapá, beber, pegar um sol e depois lembrar de Cristo, acordei às seis e meia da manhã. De hipocrisia eu não morro: odeio acordar cedo. Digo lá como os posts do Facebook, que ‘É melhor acordar arrependido a ter que acordar cedo’. E acordei cedo porque a péssima companhia que aqui estava acordou cedo e com fogo noku no espírito para sair por aí para tomar café, porque tinha que ser um cardápio específico. Sei lá, aquele cara parece mulher grávida!
Além de lastimar o fato de ter acordado cedo e do dia ter tido um sol instável (e, portanto traiçoeiro das minhas intenções de bronzeamento seja lá onde for), às nove e meia da manhã minha tia me ligou, avisando que viria me visitar e ficar aqui em casa. Oh, shit!!!Eu ia tomar sol lendo os meus livros obrigatórios, relaxada, sem ver um cristão hoje, exceto quando eu fosse ali comprar ração de gato. Comecei uma operação de escamoteamento, ocultação e disfarce de meu acervo pessoal: é um tal de entocar material de sexshop, minhas pornografias particulares, fotos, diários, bilhetes e souvenires de todo tipo porque minha tia escrutina minha casa.
Nunca me esqueço do dia em que a larguei por aqui, na maior confiança, achando que eu nada tinha a esconder, já que na época eu era tão livre, independente e solteira quanto hoje... E ao voltar, eis a minha tia a me inquirir sobre umas fotos minhas com Dexter. Essas mesmas fotos que em 2007 foram rasgadas, queimadas e cujos negativos (sim, eram de filme) foram carbonizados pelo meu ex-namorado, o Energúmeno, o Pitbull Problemático, que teve ciúme do meu passado.
Digo ainda que comprei um metro de tecido branco e grosso, coloquei as fotos dentro, dobradas, tudo disfarçado e posto com as roupas de cama que deixo no guarda-roupa, peça dentro da peça, discreto e bem-escondido... E estes dois predadores (minha tia e meu ex) vasculharam minha casa e encontraram.
As fotos foram tiradas pela Minha Amiga Mais Que Irmã, quando eu e ele estávamos acordando. Eu amava as fotos! Ainda penso no tamanho do desrespeito à minha privacidade: o que é que minha tia tem a ver com isso? Advém daí meu pavor com fotos em computadores: se reveladas e escondidas, as fotos são capturadas por este povo, imagine se eu tivesse algo do tipo no computador? Bem, não tenho!
Concluí que para lidar com a minha tia, enquanto não tenho cofres, a saída é esta, é esconder tudo e disfarçar.
Tenho um bando de objetos com fundos falsos. Ninguém nunca desconfiou porque tenho tantos porta-joias, se não tenho joias: o fundo destes objetos vem com uma espuma escura, tem forros e coberturas onde eu guardo, por exemplo, uma certa lembrança engraçada, da minha primeira vez com o Ex-Grande Amor da Minha Vida, além de outras lembranças do dia em que eu fiz uma coisa que eu não vou contar aqui... E até um objeto esquecido por FJ, em meu quarto, está devidamente guardado num outro fundo falso. Não há nada demais nessas coisas, mas é minha vida e ela eu só divido com quem eu quero. Decidi jamais dividir com ninguém. É meu!
E enquanto a minha tia não chega, aproveito para escrever aqui – detalhe: minha família não sabe que eu escrevo nada em lugar algum; o povo que trabalhou comigo no quartel, também nunca soube que escrevo; aliás, tem muita coisa que meus amigos ignoram sobre mim... Todo mundo tem segredos!

terça-feira, 26 de março de 2013

Para quem precisa!


Eu, pelo menos, posso falar que tenho fantasias; posso admitir que se encho o blog de imagens de corpos de homens, é porque muito os aprecio... E é brincando, vivendo e me divertindo que me constituo mulher e ser desejante, com direito a malícias e imaginações criativas. Deixo a imagem para minha amiga Rosália, que precisa!

Livros: uma paixão!


Tenho pelos meus livros um amor só comparável ao que as mães têm pelos seus filhos. Por favor, não peça que lhe dê meu filho! Nem emprestado, nem para passar pouco tempo longe de mim. Livros são tão pessoais quanto escovas de dente. O cuidado que tenho pelos meus, tenho pelos livros dos outros: quem eventualmente deixou livro em minha casa, pode voltar; ele estará aqui, são e salvo.
É um constrangimento quando alguém visita minha estante e pede um livro emprestado. Não sei me separar deles. Até FJ me pediu um, implorou, fez promessas e quando estava indo embora constatou que eu o repus na estante.
Recentemente recebi um livro pelos correios, mandado por meu amigo Ósman: O cânone Ocidental, de Harold Bloom, livro que cito, que conheço, mas que não tinha senão em xérox, já que não se acha em qualquer esquina para comprar. E viro aquela menina da Felicidade clandestina de Clarice Lispector, sou uma mulher com seu amante, folheio, pego, leio, revejo, reconheço, escrutino...
Em meus livros, acho uma honra colocar meu nome. Gosto de riscar os meus livros com resenhas paralelas, com conversas entre o conteúdo e a minha compreensão. Não gosto da coisinha anódina do livro sem qualquer impressão do seu dono.
Não sei como se compram livros usados sem uma assinatura, sem o registro de posse, porque é um prazer assinar meu livro, a pertença do tesouro que me cabe. Meus livros são personalizados, personificados, até porque encontra-se muito de mim neles, desde uma marca acidental de batom até tickets, anotações, fitas, tudo dentro do livro ou no livro, porque gosto de grifar, de pontuar, de conversar com o livro.
Se não escuto direito o que ele me diz, tento ouvir de novo aquela voz e interpretá-la. É assim com teoria e com ficção: se não entendo é porque não ouvi e se não me fiz presente no livro, ele não se faz presente em mim – falha de comunicação a lamentar porque nossa relação só dá certo quando a gente se encontra num espaço de interação e trocas.
Agora ando mega-ocupada. Não sou dessas pessoas frescas que se fazem de popstar da escrita e argumentam que quando estão felizes não escrevem, pois a escrita é fruto da dor. Ora, que povo fresco e cínico!Dá asco lembrar do meu amigo e poeta chegadíssimo, ao telefone, com outro ser da espécie, a dizer que "Ah, eu tinha o que dizer; o poema estava em mim, estava para sair, passei a noite inteira acordado, mas a Inspiração não veio!". Essas coisas aí, só o Rivotril explica, porque eu não entendo não.
Aliás, vou deixar de ser cínica e admitir:eu sei muito bem o que é isso. Pior é que estudando descobri que casos como estes são analisados na teoria da literatura contemporânea. E posso assegurar que tais frescuras extravasam o plano da construção da persona poética e estão com pés fincados na construção da imagem do escritor. Parece redundância, mas a separação entre o autor e o escritor são assuntos estudados hoje em dia e apenas revelam que há um conjunto de procedimentos adotados para edificar a figura do escritor, inclusive a preocupação com o pós-mortem, com a imagem que ficará, com os passos para o cânone.
E eu, que sou de carne, osso e ectoplasma, 'meu rei',escrevo quando tenho tempo. Assunto eu tenho todo dia, mesmo que sejam os mesmos. Se algo não entra aqui é por causa da censura, de todas as censuras: desde a que se refere ao politicamente correto e que me impede de chamar de escroto quem é escroto ( seja ele negro, judeu, pobre, gordo, gay, viciado, suburbano, iletrado, ignorante, etc.); até as censuras de ordem moral sexual que me impedem de falar que eu muito lamento este período chato em que não posso usar meus arsenal de sexshop com ninguém, já que tudo anda na mais chata normalidade... E falando nisso, às vezes, quando fico entendiada com as coisas e estou num shopping, num lugar comercial, e minhas amigas me ligam interpelando como estou, se vou demorar, se vou ficar por lá, procuro um cantinho discreto para falar e costumo responder: "Não. Não vou ficar aqui. Melhor ir para casa me masturbar e dormir!". Mas uma coisa dessas nunca viria para uma postagem deste blog, por questões de vigilância e censura.
Se não houvesse censura em mim, eu seria menos tímida também: estou com o telefone de R. há dias - obtido após eu ter cedido a meio mundo de chantagens acadêmicas do meu primo, que me fez fazer dois artigos para ele , quer dizer, começar o artigo, arrumando a bagunça teórica e a formatação; - e não tenho o pretexto certo para ligar. Eu poderia dizer: "Oi, R. Liguei porque eu quis.Porque eu quis ligar. Porque eu quis você por perto!"
Se, hipoteticamente, eu não fosse tímida e não houvesse a censura interior eu ligaria na lata e diria o que quero. E o que quero, não vou dizer, mas dá para imaginar com uma boa dose de possibilidade de acerto. Aposto que ele não quer nada diferente do que eu quero... Mas tem aí o componente do respeito e não apenas das formalidades sociais: não quero ser desrespeitada, nem mal interpretada. A linguagem direta funcionou muito bem com FJ porque a gente já se conhecia muito bem. Bom, lá vai a confissão: eu sinto uma falta imensa de FJ. Todos os dias, penso nele. Todos os dias penso em como foi bom cada dia com ele e torço para que um dia ele volte a morar aqui. Com ele eu podia brincar e assumir que tenho mais fantasias do que barracão de escola de samba.
Se é verdade que tive namorados e rolos com certas esquisitices, não nego que as minhas relações mais duráveis foram com gente conservadora, ortodoxa e repressora. E daí, ficam as fantasias à espera de quem permite e se permite.
Bem, mas esta postagem começou em livros e veio parar aqui, de modo que sou eu que tenho que retornar aos livros porque preciso voltar a estudar.
Faço pausas mesmo, quando posso.
Fiz também minha pausa do sábado e aproveitei ao máximo o show da 80 na pista, que foi ótimo. Fui sozinha, me diverti sozinha, voltei sozinha, dormi sozinha e tudo foi bom! Minhas amigas estavam indispostas para a noite, outras enrolaram e uma estada doente. Como eu queria ir, fui. Não tenho medo de Bicho-papão de boate, muito menos de Bicho-Papão de casa noturna feirense. Eu que sou o Bicho-papão: tenho três livros para devorar agora e eles me esperam na sala. Lá vou eu, torcendo para a gente se entender!

sexta-feira, 22 de março de 2013

Leis da atração fora da lei


Minha colega estava assanhadíssima por um certo homem. Assanhada é pouco: desde o primeiro dia em que ela punha olhos nele, comentava conosco, insinuava coisas, procurava parcerias nas opiniões sobre ele ...
Aí vieram as amarras morais: ela é casada. Ele também. Depois de hoje nós duas não o veríamos com a mesma frequência, pois acabou a necessidade do encontro de teor estritamente formativo.
Ela comprou um picolé de brigadeiro para ele. Não sabia o que fazer. Uma mulher interessada em um homem, sem saber o que fazer, sem ter mais pretextos profissionais para vê-lo, sem saber como chegar, como dizer, como pegar o que se deseja... Ela me chamou para ir junto, entregou o picolé e eu disse a ele: “Entenda como quiser, embora o recado não seja meu”.
Ela disse mil obscenidades sobre o que queria ao presenteá-lo com um picolé. Disse para mim, para nós, as amigas...E até cogitou se a perda de peso dele teria implicado na perda do tamanho do pênis. Falou misérias de teor sexual que deixariam a mais desinibida das mulheres envergonhada.
Ela fica conversando dos incômodos dos desejos, que não quer trair, mas deseja trair; que o marido não merece, mas que ela precisa; que ela não vai trair; que “Ai, meu Deus!” e todos nós sabemos que ela quer sexo com aquele homem, mas teme o que os outros vão dizer.
Não sou hipócrita e digo que trair os desejos é trair a si mesmo, com o adicional da hipocrisia. Digo que ressaca moral não compensa nenhum prazer: trai quem pode, quem aguenta. E quem não quer trair, se mantém solteiro (a).
Voltamos todos à sala. Ela apreensiva. Ele sem-graça. Passou o tempo. Acabou o que fazer ali. Ficamos na antessala. Sai gente, entra gente, tudo a se esvaziar...E finalmente ele vem até nós socializar telefones e e-mails dele. Ele sai.
Ela diz: “Ganhei minha tarde!”.
Ela sai atrás de mim, em busca de apoio, cogita se ele vai ligar primeiro que ela, diz mil coisas, exultante e feliz! Penso: “mas se este desejo já se instalou; se ele habita os pensamentos dela, já não está tudo moralmente esclarecido?”. E penso, ainda mais feliz: “Ah, infinito delírio chamado desejo!”

No muro!


Acordar cedo não só me cansa como, também, me destrói. Não bastasse isso, nesta noite de quinta para sexta comecei a sonhar que havia três homens perto de mim e que um deles me torturava.
A tortura consistia nuns apertos, como massagens, que um deles dava em meu baixo ventre. E aquilo doía demais, doía e eu reclamava, mas ele insistia e dizia que eu merecia sentir aquela dor, devido à minha indisciplina. Os demais homens eram amigáveis, pediam para o torturador parar, mas quando eu estava para me libertar, acordei. E o que era o meu sonho? Cólica. A tortura era uma cólica da vida real me apertando o baixo ventre, me torturando , me matando...Que carrasco de uma mulher pode ser tão feroz quanto uma cólica verdadeiramente dolorosa? E passei o dia de hoje tendo acesso de cólicas, numa indisposição imensa.
Da indisciplina, sei que é metáfora para meu consumo desenfreado de cafeína, porque é o que me dá vontade de consumir: café, chocolate, cappuccino, gelado, quente, puro, enlatado, feito em casa, com canela, café com chocolate, tudo é possível, mas só quero cafeína...
Pelo menos a dor veio hoje: amanhã quero ir à festa. Se eu estivesse saudável e endinheirada era capaz de eu pegar a festa do dia, que é uma Feijoada Dançante na Santa Mônica, e estaria no show da 80 na pista à noite. Mas não posso e não dá.
Acordar cedo é uma tortura. Graças a Deus esta fase pesada acabou hoje. O que tenho a fazer, agora, é onze da manha, mas não deixo de observar que o restinho do muro que tenho que derrubar é muito trabalhoso.

domingo, 17 de março de 2013

Mantra


Ah, meu Deus! Amanhã é segunda-feira...

As meninas


Tem coisas que só há na Bahia. Não falo aqui de tudo de bom que há nas paisagens, no potencial turístico, na recepção inteligente às diferenças culturais que, na verdade, é parte estratégica da sobrevivência do seu povo – amarrado à injusta fama de se derramar em preguiça e que, inteligentemente se aproveitou disso para oferecer descanso (e festas) aos turistas que subestimam a capacidade criativa e intelectual desse povo. Falo da estranheza que o povo baiano tem acerca do ser feminino, do hábito tacanho de antecipar a sexualidade das meninas, de tratar meninas como mulheres e de responsabilizar essas meninas pelo mau destino da exploração sexual precoce, seja nas tais ‘casas de família’ onde vão trabalhar as meninas da roça, na função doméstica; seja na exploração urbana-padrão, de natureza similar.
Não vou falar de ficção. Vou dar nome aos bois: Sheyla, aos onze anos, já estava marcada pelos maus tratos dentro de casa, das surras, da mãe, do pai e por esta época, do padrasto.
Um dia ela conheceu um homem de mais de quarenta anos. Ele a acolheu, cuidou das feridas do corpo e das chagas psíquicas. Ela viveu com ele até uns cinco ou quatro anos atrás, quando ele morreu. Morreu de velho, bem velho. Viver com ele é ser mulher dele, ter filhos com ele e ser esposa.
Ninguém aqui acha isso estranho. Nem ela, nem o namorado dela, que é meu amigo. Ninguém por aqui vê que o finado explorou sexualmente uma criança de onze anos. Antes, consideram que ele a acolheu, a retirou dos maus tratos dos pais cruéis, fez o favor, foi bom. Aqui é assim e isso muito me espanta.
Ela já tem pouco mais de quarenta anos e olha para trás com gratidão pelo finado, como tendo sido favorecida por ele.
Ela se espanta quando eu digo que ele foi monstruoso, pois frente às coisas ruins que ela passava e de que ele fora testemunha, não perdoou a criança: procurou no sexo com ela a compensação pelo “bem” que ele estava lhe fazendo. Isso jamais seria, para mim, um gesto de piedade, de solidariedade... E hoje eu tenho muito mais piedade dela, que não sabe que foi vítima de quem lhe apareceu como salvador. Porém entendo que a percepção do contrário deve ser dolorosa e, por isso, convém evitar.
Os homens, quando em aparente compaixão pelas mazelas das mulheres que são meninas, não têm piedade: pedem seu pagamento em sexo; convertem meninas em amantes; não dispensam aquelas que são esquizofrênicas, nem as que são pobres, nem as drogadas, nem as violentadas, nem as carentes... E posso afirmar isso por constatar as duas gravidezes da ‘doidinha’ que mora perto do salão que eu frequento.
Minhas constatações devem parecer estranhas porque aqui no Brasil – e não somente e na Bahia – as mulheres são responsabilizadas pela violência que sofrem; são responsabilizadas quando são estupradas, pois dizem que elas provocam os homens, que andam de roupa curta e se insinuam. E por aqui, toda menina é vista como mulher, queiram ou não queiram os estatutos e os códigos legais.
Tive pena de Sheyla e ainda tenho. Esta é uma daquelas páginas que eu desejaria ser pura ficção, com nomes trocados, com situações e lugares apenas imaginados, mas não é: “A Bahia tem um jeito!”.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Os próximos estranhos


Está lá na minha página do Facebook que eu procuro pela 'tampa da minha panela' e mais recentemente, pela "outra metade da minha laranja" ironicamente desejando que venha espremida e com vodka. Essas expressões "tampa da panela" e 'metade da laranja' se referem ao par, ao amor, aos namorados.
Dos poucos homens morenos que gosto, Jakob Dylan é o topo da lista. Durante um tempo grande eu achava que ele era mesmo o homem mais bonito do mundo...Mudam os tempos, mudam os homens, mudam nossas percepções, mas a admiração estética não muda. Na vida real, uma tampa dessas para a minha panela iria enfeitar a cozinha da minha vida!
Nessas buscas, que na verdade são esperas - não ando atrás de um namorado, não busco ninguém, mas espero que pinte, que apareça, é claro. Isso quer dizer que quem quer companhia deve se expor às situações que propiciem os encontros. E eu, que já gosto de sair, especialment ena snoites de sábado, sempre espero que pinte. Mas, lembrei de Bauman, que diz que:
Na clássica definição de Richard Sennett, uma cidade é “um assentamento humano em que estranhos têm chance de se encontrar.”
Isso significa que estranhos têm chances de se encontrar em sua condição de estranhos, saindo como estranhos do encontro casual que termina de maneira tão abrupta quanto começou. Os estranhos se encontram numa maneira adequada a estranhos; um encontro de estranhos é diferente de um encontro de parentes, amigos ou conhecidos – parece, por comparação, um “desencontro”. (BAUMAN,2001, p. 111)

E é nessas horas que eu muito lamento os exercícios de leitura, apesar de soar cabotino, arrogante, uma vez que dizem por aí que esse negócio de leitura é hábito burguês - melhor não ler, para não ofender aos mais sensíveis.
Estamos nos tempos dos desencontros e da incapacidade de assumir sentimentos. Todos! Não se pode odiar nada nem ninguém em paz porque odiar é feio; não se pode ter rancor, porque rancor é palavra forte, sentimento baixo; não se pode sequer discordar da maioria, sob o risco de linchamento! E se o amor, sublime amor, parece tão sublime, está difícil de as pessoas se abrirem a ele sem lhes restar a sensação de estarem sendo anacrônicas, otárias ou dominadas.
Há os dias em que me importo menos com essas coisas e talvez esses momentos sejam quando a vida está mais alegre, quando tenho outras coisas a fazer e quando, admitidamente,me distraio com os sujeitos que creio serem apenas para causar distrações. Não vai aqui nenhuma conotação sexual, porque gosto de companhias alegres - vão dizer que P.A. e HDM, mas não são, não...Quer dizer, não necessariamente.
Bem, mas voltando a Bauman,é estranho os estranhos se portarem sempre como estranhos e os desencontros são simples efeitos das distâncias que criamos e colocamos na vida, a fim de evitar a exposição exagerada às coisas incertas - segurança pessoal, eu diria.
A cidade em que moro é um assentamento de estranhos. Hoje até encontrei alguém que me olhou com cumplicidade num contexto social em que ele, bem mais novo que eu, me dizia:"Estamos neste lugar, com muitas pessoas diferentes de nós. Mas nos somos iguais um ao outro!" E como eu tenho ego, ah, deixa vir!Eu falo com estranhos!

terça-feira, 12 de março de 2013

Pares parecidos


Estou convencida de que não poderia ter escolhido uma metáfora melhor para tratar de uma questão neurótica minha a não ser a imagem de um muro. Decerto, do muro só restaram poucos tijolinhos. E para quem não é frequentador de consultório de psicanálise, vale dizer que ser neurótico é ser normal - ou seja, o normal não existe da maneira como a gente pensa, no sentido de supostamente se referir a pessoas que não têm nenhum problema psicanalítico, que estão isentos das conformações psíquicas. Estes, não existem.
Mas, dizia eu que a metáfora é adequada porque estou me sentindo um pedreiro: todo santo dia desta semana tenho acordado às seis horas da manhã para cumprir o que me cabe da parte de retirar os escombros e poucos tijolinhos do meu muro particular.
Não apenas odeio acordar cedo como também não funciono bem: meu raciocínio fica entrecortado, minha atenção se dilui em bocejos de sono, tudo fica lento e difícil e o sono me acompanha o dia inteiro. Nem preciso dizer da minha indisposição - indisposição que me impede o exercicio físico que gosto e preciso;o corpo mole se mantém sempre numa preguiça cansada. Contudo, se entro lá às oito da manhã, saio meio-dia e quinze, almoço perto e venho para casa, o serviço doméstico me espera e eu o cumpro.
Não consegui estudar porque após a segunda página do livro, o sono me domina.
Mas, vou fazer um aparte para contar que o meu amigo que não queria ser apenas amigo me ligou hoje à tarde para dizer das boas novidades dele, que eu muito comemoro: a Universidade Federal ligou para ele, comunicando que o convocaria para este próximo semestre, que começa em abril. Fiquei feliz, comemorei, conversei, pulei na alegria cúmplice de quem se felicita pelo outro.
Não bastasse isso, ele aproveitou para me contar que uma aluna dele, da outra universidade, ao término da aula de sexta, correu atrás dele no estacionamento com um bilhete em que se declarava e, não bastasse isso, disse na cara dele que nas últimas semanas tinha se arrumado um pouco mais só para tentar chamar-lhe a atenção - até aí, beleza: sorte no amor também.
Depois de uns segundo ele disse: "Você precisa ver: ela é toda você! só muda que é mais 'cheinha'!".
Não sei o que pensar disso, apesar de saber o que penso da observação dele: é que também meus namorados são todos em série, todos iguais, com duas exceções somente.Afinal, foi ela quem o procurou, donde não há porque considerá-lo um serial lover...
Recuperado o bem-estar da amizade, melhor cuidar para não estragar as coisas. Mas fica aí a interessante ocorrência da semelhança dado pelo acaso...

sexta-feira, 8 de março de 2013

Reflexos


Estou feliz.
Na verdade, estou cansada e feliz, legitimamente feliz após um dia de estreias, após assumir a coragem de vencer o muro que tenho para derrubar. E um pouco mais feliz porque coloquei em prática tudo que planejei, do jeito que planejei, na hora me que eu deveria e isso me dá uma sensação gostosa de autonomia, de ser dona de minha vida, de ter controle sobre os meus planos...Talvez as sensações mais simplórias, mas e daí? Não quero engrossar o time desse povo mal resolvido que tem tudo que quer e que precisa e fica inventando angústias para ganhar adeptos.
O que estou fazendo agora é coisa que depende de empenho e de tempo. Estou bem disposta. Cansada, feliz, bem disposta e com bem maior empolgação em viver coisas diferentes.
Acredito que o ser humano tem fases – umas se prolongam mais que outras, na maioria das vezes por opção nossa; em outra parte, por circunstâncias alheias à nossa vontade.
Amanhã é dia de viagem e de trabalho. Na volta eu queria festa. Torço para eu morrer cedo porque se eu envelhecer de verdade, plenamente, vou me tornar o terror do asilo e não vou promover baile da terceira idade e, sim, Rave da velha guarda. Sempre desconfiei que por não gostar de álcool eu acabaria sendo uma velhinha drogada, ávida consumidora de ecstasy. Mas só assim para suportar a velhice, né? Entendo a Cecília Meirelles: chega um dia em que a gente se olha e não se reconhece (No poema Retrato: “Eu não tinha este rosto de hoje/assim calmo, assim triste,/assim magro/nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo./ Eu não tinha estas mãos sem força,/tão paradas e frias e mortas,/Eu não tinha este coração que nem se mostra;/Eu não dei por esta mudança/tão simples, tão certa, tão fácil:/Em que espelho ficou perdida a minha face?”).
E no tocante à idade, se eu pudesse dar um conselho aos homens, eu lhes diria que nenhuma mulher gosta de ouvir que ‘panela velha é que faz comida boa’, pois é uma grosseria ímpar, é um elogio que deprecia. Minha amiga ouviu isso há uma semana, quando saímos juntas em bando e qualquer mulher que não tenha menos que 27 anos é passível de ouvir coisa assim porque o Brasil é machista e patriarcal, ao contrário do que mostram as propagandas oficiais.
Se mulher tem data de validade, homem também tem – e ainda por cima, ficam carecas.
E por falar em homem, os melhores dentre eles fazem a gente se sentir feliz por ser mulher. A estes, que já passaram por minha vida, eu agradeço pelo quanto me fizeram aprender sobre mim mesma...Bom, estou feliz e isso está na cara!

segunda-feira, 4 de março de 2013

"Caetanear o que há de bom"


Acho que Caetano Veloso sempre será um cara ousado, um cantor esplêndido, o único que pode dizer que "A Bossa Nova é foda" e não parecer chulo e vazio. A permanência da genialidade vai atravessar os tempos e não é só palavra deslumbrada de fã. E por me encantar com as músicas dele, lembrei que se em primeiro lugar eu gosto de Vaca Profana, daí por diante eu não saberia classificar o que vem antes e o que vem depois. Deixo, porém, Terra nesta postagem - uma dentre tantas músicas que amo.

Terra
(Caetano Veloso)

Quando eu me encontrava preso
Na cela de uma cadeia
Foi que vi pela primeira vez
As tais fotografias
Em que apareces inteira
Porém lá não estavas nua
E sim coberta de nuvens...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria...

Ninguém supõe a morena
Dentro da estrela azulada
Na vertigem do cinema
Mando um abraço para ti
Pequenina como se eu fosse
O saudoso poeta
E fosses a Paraíba...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?...

Eu estou apaixonado
Por uma menina terra
Signo de elemento terra
Do mar se diz:" terra à vista!"
Terra para o pé firmeza,
Terra para a mão carícia,
Outros astros lhe são guia...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria...

Eu sou um leão de fogo
Sem ti me consumiria
A mim mesmo eternamente
E de nada valeria
Acontecer de eu ser gente
E gente é outra alegria
Diferente das estrelas...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?...

De onde nem tempo, nem espaço
Que a força mande coragem
Para a gente te dar carinho
Durante toda a viagem
Que realizas do nada
Através do qual carregas
O nome da tua carne...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?
Terra! Terra!

Na sacada dos sobrados
Da velha São Salvador
Há lembranças de donzelas
Do tempo do Imperador
Tudo, tudo na Bahia
Faz a gente querer bem
A Bahia tem um jeito...

Terra! Terra!
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?
Terra!

domingo, 3 de março de 2013

Vi, li e venci!


Pois é, às vezes a vida está toda de cabeça para baixo e a gente simplesmente está feliz apesar de todas as faltas. Sou exagerada: algumas coisas estão fora do eixo, já não estão de cabeça para baixo.
A saída noturna da sexta-feira foi uma droga!minhas acompanhantes estavam com cara de cólica ou de velório - vão a uma festa dançante para não dançar...e voltar cedo, né?
Mas quando se sai na sexta, o sábado será em casa. Dito e feito!E por causa disso me reencontrei com os meus livros, na santa paz de Deus até o sono vir. E veio gostoso e pleno. Olha eu levando a vida a sério: estudei direitinho.
É assunto de meu concurso, é livro que já li e esqueci todinho, teorias da literatura contemporânea, sabe? mas li com tanto gosto!!! E hoje eu li de novo, com o prazer adicional de ganhar uma lista que Tati me mandou com referências para cada ponto do concurso. E aí me senti acolhida em meus desesperos porque pedi a ajuda e não esperava tão rápida, eficaz e séria resposta e colaboração. Foi como receber um grande abraço!
Entendi que preciso exercitar mais essa capacidade de escolher não me irritar com as coisas, com as faltas, com as angústias...A única briga que eu tive hoje foi com a minha própria teimosia. E saí vitoriosa:insistências infrutíferas,repetições de atitudes à espera de respostas diferentes, bater a cabeça contra a parede, todas essas coisas idiotas que eu faço por impulso, eu simplesmente controlei, deixei para lá e virei a página. Tenho cá em mim as pequenas excitações das novidades que imagino neste novo semestre de trabalho, as possibilidades de esbarrar de novo em gente interessante como Rodrigo e, aliás, nem brigo com minha solteirice...Se quero alguém para namorar, não me importo tanto com esse período de esperas e escolhas, de acasos...Chato é quando nada acontece, nada muda de modo algum.
Já penso em ficar pela praia na volta do trabalho, no sábado que vem...Quem sabe? Estou me ocupando com minha própria vida, sentindo a minha vida como sendo minha, em plenitude e responsabilidade.Estou feliz pelas decisões que tomei, pelas escolhas conscientes que fiz sabendo que é exatamente aquilo que eu quero.
Bom, me convenci:

Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem ante os deuses quanto
Morre! Tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina.
Circunda-te de rosas, ama, bebe,
E cala. O mais é nada.
(Ricardo Reis - heterônimo de Fernando pessoa)

sábado, 2 de março de 2013

Palavras nuas


Conversei ontem com o meu pai e resolvi remexer os escombros de uma parede quase derrubada. Aliás, chamo de muro.
Resolvi levar a sério como quem acorda e descobre que já cresceu: vou terminar tudo que comecei e resolver tudo que ficou pendente.
Percebi que minha vida tem que ter a minha participação, senão eu viro coadjuvante e fico assistindo antagonistas, figurantes e personagens secudárias decidindo meu destino ou influenciado sobre ele.
Não nego: tenho lá umas estagnações por preguiça; penso que tem lutas cujo prêmio não vale a pena, levo na esportiva e também decidi não me preocupar com certas coisas.
Até o presente momento nada demais aconteceu em minha vida, mas posso dizer que por caminhos imperceptíveis, venho cumprindo todas as promessas que fiz a mim para este ano.
Respeito muito a opinião de quem é importante para mim e talvez por causa de uma outra conversa com FJ, antes dele ir embora, tomei por promessa de honra um conselho que recebi. Gosto dele sei que o conselho é certo, lá vou eu, pagando a dívida moral comigo mesma.
Por razões que eu desconheço,fui remexer outra fonte: Obtive uma confissão forçada do meu ex, mediante vodka e conversa mole, e descobri que o desgraçado leu tudo do meu engavetado livro. Dos dois, o que é pior.
No caso do segundo, escrito entre um aeroporto e outro, num período de amores contrariados e em que eu estava triplamente desequilibrada. Pior do que ler meus livros é saber que o miserável sabe me ler e depreender o que ronda minha ficção.Vou mudar tudo!ou quase tudo do segundo livro. O primeiro, não:tenho um amor absurdo por Todas as mulheres se chamam Maria.Amor não tem preço. Amor não se vende e é por isso que ele está engavetado até que a psicanálise (quando eu voltar a ela)me ajude a resolver o caso.
Conversando com umas amigas sóbrias concluí que todas nós temos medo do ego dos escritores em geral e dos poetas em especial - esta gente que se pensa sensível, especial e superior. Nas nossas experiências foi o perfil predominante...
Quando eu conversava com Rodrigo no sábado passado, antes do flerte, quando eu ainda me pensava 'irmãzinha' por ser a intocável prima do amigo dele, falei disso, das pessoas confundirem o homem e a obra. Daí que eu repeti que os caras que tocam violão pegam milhões de mulheres porque elas acreditam que se eles tocam músicas românticas, são necessariamente românticos. E no caso dos cantores profissionais isso é bem verdadeiro e talvez justifique o harém de Fábio Júnior e os muitos amores de Chico Buarque e os não poucos do Vinícius de Moraes.
Desnudas as palavras ( e também os poetas), não há correspondências entre a embalagem e o conteúdo; entre o livro e a capa; entre a pessoa e os escritos.
O que a gente escreve tem muito da gente, mas não é a gente: ora é o avesso do que somos, ora é o que gostaríamos de ser, ora é o que projetamos sobre a vida de quem conhecemos.
Aí Rodrigo falou da personalidade arrogante do Moacir Gadotti, que é do mundo da teoria da educação; e em nada me surpreendeu: no universo teórico, achar causa e consequências para isso e aquilo, constatar misérias, deficiências, insuficiências, necessidades de mudanças, etc., não quer dizer que aquele teórico pratique o que ele recomenda.
Tem gente com discurso marxista que é, entretanto, grande proprietário (vide o exemplo do finado Oscar Niemeyer que, sendo rico, era marxista. Não obstante deste podemos dizer que pelo menos 'forçou a distribuição de renda' e partilhou seu capital com presos políticos e com a classe pobre em algumas situações). Mas naquela UFBA em que estudei,vi muita gente gabaritada e dona de teorias dos Estudos Culturais que,no plano teórico e discursivo, pregava a igualdade e a justiça social. Na vida real, oprimia os porteiros do Instituto de Letras e a qualquer pedido ou ação de seus empregados domésticos dizia tratar-se de 'uma ousadia falar daquele jeito ao patrão/patroa'. E é daí que eu ironizo e digo que estes querem a igualdade, desde que a igualdade não passe pela cozinha deles.
É normal confundir a obra e o autor; a letra e o cantor, etc.,mas a vida real é quem dá o tom da realidade.
Se ainda falo mal dos poetas - e já não estou sozinha nisso - é porque também a meu tempo confundi o sujeito lírico com o sujeito sem-vergonha que era o autor. Creio que toda mulher faz isso: pensa que aquelas palavras tão minuciosamente escolhidas, que o cuidado com rimas e ritmos, que a preciosidade imposta na textualidade poética reflete o autor. Nada mais improvável. E dizendo isso lanço meus pedidos de desculpas a Chuck, que é poeta e amigo. Ah, sim, amigo pode.
Para demonstrar a sinceridade de meus pedidos de desculpas, também para Chuck deixo aqui uns versos da mais linda poesia musicada* da contemporaneidade:
"Ah, lelek,lek,lek,lek,lek,lek
Ah, lelek, lek, lek,lek,lek,lek
Girando, girando para o lado.
Girando para o outro
No passinho do volante
Quero ver o baile todo!."

*Deus me perdoe!

Só nos resta rir...


Recentemente fui a um lugar neste planeta apenas para perder tempo e dinheiro. Digo isso porque me antecipei em um dia em relação ao compromisso, me cerquei de informações e dicas que me levassem a agilizar a estada na cidade e tudo estava errado, tudo deu errado e de tal experiência só posso dizer que dormi numa pocilga, tão pocilga que o colchão quase me morde. Pocilga mesmo, embora levasse o nome de hotel e tivesse preço de gente grande.
Pocilga é algo tipo chuveiro frio, cotonete usado na mesa de cabeceira, pouca ventilação, serviço de quarto inexistente, fumantes nos corredores, barulhos na madrugada e tudo em ambiente familiar, pretensamente. Coisas próprias daquele Estado aqui pertinho – melhor declarar o nome! Mas não vai dar, hoje estou covarde!
Nada era onde disseram que seria. Acordei sem ter dormido. Encarei o trânsito da “Capital da qualidade de vida no Nordeste” e tudo deu errado.
Não me estressei. Vi que não dava, desisti, dei o tempo até ter como voltar para casa nas seis horas de viagem entre lá e cá.
Mas eu fiquei pensando que às vezes já me deixei convencer que tudo tem uma função na vida, oxalá nas relações de causa e efeito nem sempre haja o acaso, as coisas deveriam ter uma razão de ser. Não tinham: fui lá apenas perder tempo e dinheiro. Salvo, é claro, se Deus resolveu incrementar nos castigos a mim impingidos ou descontar com juros uma imensa parcela de minhas dívidas espirituais e pecados em geral. Penso estupidamente: “Que porra que Foi que eu vim fazer aqui?”.
Mas se não for castigo, pode ser que seja o Divino querendo me dizer: “Nunca mais vá àquele lugar! Nunca mais!”. Às vezes faço promessas que esqueço de cumprir, devido ao tempo. Será que prometi nunca mais voltar lá e, nos lapsos de memória, traí o prometido? Sei é que decidi: mais uma água da qual eu nunca mais beberei. Lá eu não vou nunca mais.
E passando às coisas cotidianas, minha amiga me falou, há pouco: “Descobri que não se pode ficar em casa num fim de semana!” – Opa! Somos duas com a mesma opinião. Comungamos da mesma convicção. Exceto, claro, quando o humor não dá e o dinheiro não colabora, vale a pena sair. Meu problema é não saber sair para ficar paradinha numa cadeira, contemplativamente, vendo a noite passar. Sair só é bom quando posso dançar. Estou me referindo às saídas noturnas, porque também sou feliz em passeios bucólicos, em praias, em recreações deste tipo. Porém, a noite é para dançar.
Já citei a velha avó de Leila, aqui, uma vez: “Cocada que não sai, não vende!” e mesmo repetindo que não se deve ir à festa procurar marido, há uma probabilidade maior de haver encontros e outras situações caso a pessoa saia de casa. A menos quando o acaso resolve intervir e coloca à nossa porta um amigo interessante de nossa amiga que veio nos visitar; quando um gato erra o endereço que está procurando; quando um lindo desconhecido bate à nossa porta. Contudo, as probabilidades de coisas assim acontecerem, são abaixo de zero, na ordem de -0,5% de chances de ocorrer.
Saímos para buscar diversão e se os homens se incluírem na diversão, melhor ainda. Caso contrário, dançamos e conversamos e o melhor é ter o outro dia para os comentários, para almoçar na casa alheia e prolongar o lazer.
Pode ser que nada tenha sentido ou causa pré-definida, apesar de a gente procurar tanto. Alguns falam em graça e esquecem a gratuidade de alguns eventos, a gratuidade da vida, as coisas que acontecem de graça, sem script e sem sequência também e as outras que se tornam o ‘filme que deu origem à série’, permanecem, ou viram trilogia, sei lá... Tem dias em que essa imprecisão toda me encanta (e de novo vem minha implicação contra as cartomantes: Deixem a vida acontecer! Deixem o futuro chegar, não vão lá acordar o coitado, apressar o coitado, puxar o consulente do presente para cima do futuro, antecipando ansiedades. Que povo chato!) – “Vida, doce mistério!”.