Para
mim, a pessoa que não se cuida, que se dá ao desleixo, falta a si mesma. Não
entendo o quanto possa faltar de amor por si, a ponto de a pessoa declinar da
higiene pessoal, da aparência, dos cuidados que a gente tem até por uma planta –
regando, retirando folhas mortas. E eu só estou falando do exterior.
Nunca
me preocupei adequadamente com aqueles imbecis que dizem que ‘a gente se arruma
para o outro’, porque estes devem pensar que o cuidado pessoal é futilidade. Geralmente,
os invejosos, despeitados, preconceituosos e condoídos formam esse time. Para
mim, aquele ditado que repetirei a seguir se aplica a tudo na vida: “Se não
tens um palácio, enfeita a tua tenda”. Organização e limpeza são lindas e benvindas,
na casa, na vida, no corpo. O resto é preguiça e acomodação a coisas que as
pessoas nem sabem se pensam mesmo ou se foram coagidas a concordar.
Tanto
faz a idade, o gênero, a classe social, o nível de escolaridade, fica bem em
qualquer pessoa se cuidar. Agradecer a si, amando a si, reconhecendo o corpo
que tem da forma que ele é, já não é a fórmula batida da autoestima. Mesmo
porque, autoestima é outra coisa muito superior às balelas da autoajuda – ela diz
respeito a um conjunto de coisas, à saúde mental, às nossas escolhas por nosso
bem-estar, aos vícios de que nos desviamos, a convívios tóxicos de que nos
desviamos...E neste último caso, a família pode se enquadrar. Não conheço
veneno mais potente para derrubar moralmente uma pessoa do que um convívio
tóxico.
É
preciso escapar. Se não dá para fechar a porta ao parente manipulador, àqueles
que se aproximam de nós para se aproveitar ou para tentar nos diminuir – quem disse
que irmãos não fazem isso? Quem disse que pai e mãe não fazem isso? Quem disse
que esposa, esposo, cunhado, não fazem isso? – podemos limitar o alcance dessas
pessoas, podemos tomar consciência de onde vem o ataque.
Um
dos benefícios da pandemia foi servir de pretexto para afastar esse tipo de
gente. Mas, claro, muitos forçam o contato. Uma das peças fundamentais do
cuidar de si é a manutenção da privacidade. Sim, você precisa ter segredos –
mesmo que não haja razões para esconder nada, por que você precisa compartilhar
ganhos, perdas, felicidades ou dores com gente que não tem apreço por você ou,
se tem apreço, não tem respeito? Há coisas somente nossas. Inclusive vitórias.
O que dá para partilhar socialmente é a superfície do bolo.
Lembro
da posição de despeito que uma ex-amiga minha tinha contra TODAS as pessoas que
adquiriam bens móveis e imóveis, pagando à vista: parecia uma ofensa pessoal,
que alguém pudesse poupar para comprar, declinar de prestações, parcelamentos e
outras emoções dos financiamentos. E se lhe parecer exagero, ela, que era avarenta,
julgava avarentos os que conseguiam pagar à vista, como se aquilo fosse coisa
depreciativa. Muito particularmente, louvo à capacidade de organização
financeira, de cuidado, da protagonista da compra. Poupar é igual a regime: não
é fácil, mas depois que você se adapta e vai vendo resultados, vai cobrindo e
cumprindo a meta, e, finalmente, incorpora como parte constitutiva de seu
cotidiano. Penso que quem assim procede, teme muito o dia de amanhã – sabe-se
lá o que dará da economia? Sabe-se lá que intempérie de qualquer espécie pode
assolar a nossa vida? Eu nunca me imaginei encarando uma pandemia, por
exemplo...E olha aí, a gente nessa...Nunca imaginei que funcionários públicos
pudessem ficar sem salário por conta de situações orçamentárias de Estados e municípios...mas,
fui vendo acontecer com os outros.
Outro
fato que a gente capta mal é a vida dos outros: ali são exemplos em que se mirar,
para o bem e para o mal. Essa fragilidade remonta a uma velha quadrinha popular
muito famosa por aqui, que diz: “Quando vir alguém chorando, não sorria, tenha
dó, porque o Mal deste mundo não ficou para um só”, essa velha lição de
empatia, serve de espelho para a gente saber que todos nós somos frágeis e
suscetíveis.
Olhando
também para a vida dos outros, a gente vê o desleixo, a falta de cuidado dos
que têm intimidade entre si. Pavoroso a pessoa se permitir ser flagrada no
dia-a-dia, como casal principalmente, sem zelo, sem cuidado...já não bastam as
partilhas inevitáveis da cara inchada ao acordar, os desalinhos, cheiros,
fluidos, tantas outras coisas, que tiram o brilho discreto da privacidade. Por
mais que as pessoas saibam das secreções e excreções biológicas, humanas, cabe
se preservar minimamente. Odeio, até com amigos, pautas escatológicas ou
comentários a respeito...sim, eu me apavoro.
Quando
me dizem que certa pessoa está ‘toda largada’, eu penso que a pessoa parou de
se amar, que está largada à própria sorte...
NOTA: Citação sobre ex-amiga,
cabe um esclarecimento. É que, por exemplo, tem as pessoas que deixam de ser
amigas porque não há o afeto, o apreço, a confiança, porque o convívio se
mostrou tóxico, com frequentes desrespeitos, que resvalam para humilhações ou
conflitos reiterados. Amigos não devem desrespeitar a dor do outro amigo. Amigo precisa fazer concessões. Se assim é, não há motivos para manter. Mas, há também,
em meu caso particular, pessoas que eram amigas há anos, num contexto
específico e que fazem parte de um tempo. Não gosto do convívio, não quero
contato, apesar de nutrir carinho por elas, lhes desejar o Bem. E é algo que
pode acontecer com gente da família, de cuja distância depende o bom andamento
da relação.