Louquética

Incontinência verbal

terça-feira, 22 de outubro de 2024

Não insista

 


Não que a amiga seja, de fato, amiga, mas assim vou tratar sobre ela em respeito ao tempo que a conheço: me surpreendeu que tenha partido dela o pedido de separação e que, finalmente ela descobriu quem era aquele marido.

Disseram os mais próximos que ela já sabia há algum tempo e que apenas esperou consolidar suas certezas. Pois bem, ela pediu o divórcio e aqui vem umas coisas que interessam a todos nós: o marido não quer sair da casa e começou um jogo de gato e rato,  inexplicável.

Não vou perder tempo relatando o óbvio: o ódio, as provocações, as armadilhas jurídicas, os cinismos, tudo partindo dele, no caso.  A parte, contudo, que nos interessa é a que toca na dignidade.

Gente, quem ama sofre. Sofre como um viciado, sempre dependente, sempre pagando qualquer preço por um pouquinho, só mais um pouquinho daquilo que lhe traz tanta satisfação e sem o qual a sensação é de morte. Entende-se.

Porém, uma vez que o ser amado leva ao seu conhecimento, claramente, com todas as letras e palavras, que NÃO LHE QUER MAIS, como insistir num convívio?

Será preciso dizer que se você manda mensagem para alguém e esse alguém não lhe responde (ou leva dias até isso), essa pessoa está lhe comunicando, através do silêncio, que não quer conversa com você? A atenção é proporcional ao interesse.

O que mais um ser humano precisa fazer para o outro entender que não deseja mais o relacionamento?

Sempre achei feio quem foge e não assume os términos, mas acho ainda mais preocupante quem ouve a comunicação de término e insiste em ficar ali, ao lado de quem não pode ir embora, por ser a dona da casa.

O Cara é interesseiro, apesar de ter dinheiro e ganhos pessoais, mas antes de tudo, ele tem uma total falta de dignidade. E isso é coisa para olhar e aprender a não reproduzir por aí.

Um mal-entendido, uma briga temporária, valem um diálogo e valem a tentativa de não ruptura. Todavia, o pedido de separação, a declaração verbal de que não mais se quer a relação, deveriam ser suficientes para evitar o litígio e cada um seguir seu rumo.

A todo momento a gente ouve a mídia comunicar os feminicídios e reproduzir os boletins de ocorrência onde consta ‘que não aceitava o fim do relacionamento’. E não aceitar o fim é forçar quem não lhe quer a querer a estar com você, porque só o seu querer importa. Que gosto terá um relacionamento forçado?

Delongar o mal-estar do convívio, ver-se em situações íntimas do lar, dividindo espaços com quem não lhe quer, valerá mesmo a pena?

Quem tem juízo, se toca da realidade. Coloca a viola no saco e vai tocar em outra freguesia.

O ciclo da humilhação está ali, a dignidade já foi pisoteada, o vale-tudo não valerá de nada.

 


quarta-feira, 16 de outubro de 2024

ANIVERSÁRIO DO BLOG




Nem preciso dizer que ainda não me sobra tempo suficiente para colocar as pautas em dia, sobretudo a de comemoração dos 15 anos deste blog.

Sim, eu não faço propagandas, eu não divulgo entre amigos, eu não procuro seguidores: venham os que quiserem, voluntariamente.

Amigos, por aqui, iriam inibir minha escrita. Minha censura seria grande, a necessidade de substituir nomes, lugares e espaços de coisas narradas seria terrível.

Estamos em 2024 e já nem existem blogs -  se muito, o povo do humor e dos memes, lá do “Ah, negão!”, o blog do Joe – este, sim, eu sigo, porque tem comentaristas que são verdadeiros personagens; e gente de carne, osso, ectoplasma e CPF válido, com boas ideias e com os quais anonimamente eu aprendo, eu simpatizo. Porém, são poucos os blogs sobreviventes (eu não poderia deixar de citar o Paulo Tamburro) e uns poucos mais, gatos pingados que não migraram para praças do YouTube ou, simplesmente, largaram o barco.

E por aqui tivemos muitas fases ao longo destes 15 anos. Fase de rebeldia, de revolta política, de exasperos culturais, etc. Mas, deixarei isso para a futura comemoração que, espero eu, aconteça em fins de novembro. A ver!

 

 


Maestros do caos


 


Parabéns para quem descobriu que a Terra é redonda e que o tempo não retrocede. A Terra. O tempo. Porque há pessoas de pensamento quadrado e há gerações que retrocedem no tempo, em termos de mentalidade e comportamento, rejeitam avanços em leis, direitos, costumes. Acham que ‘antigamente tudo era melhor”. Concordo com elas, afinal, para um torturador e um ditador, nada melhor do que um tempo em que se podia torturar e matar tranquilamente, sem ser incomodado por leis e denúncias ou ameaças de punição – sossega, no Brasil ninguém nunca foi punido por isso.

Era tão bom antes, sem gente correndo atrás de direitos trabalhistas! Hoje em dia, para sorte de quem tem saudades da escravidão, pelo menos há o sub-proletariado que se convenceu de que é patrão de si mesmo, que faz seus horários...

É de espantar que as pessoas não olhem para quem rege a orquestra do caos. Os maestros em que se vota ou com os quais se é indulgente.

Especialmente no plano da política, as pessoas votam apenas por simpatia. E eu, cá, pensando nas incontáveis vezes em que votei em gente que eu não gostava, que sequer beneficiaria minha classe trabalhista específica (que governo favoreceria professores?), mas que era o melhor em sentido global! E uns seres humanos com as desculpas mais nonsense, mais distantes da lógica, vota em palhaços que destroem o circo após o espetáculo do enriquecimento pessoal.

Há tantos abismos interiores a se misturar com as crises externas, essas de nosso tempo e de nosso contexto histórico!

De fato, vivemos de fé e de remédios. Há que se rezar por um governante menos monstruoso do que o anterior; há que se rezar para que a Polícia não nos confunda com o ladrão; e que o ladrão não nos confunda com a polícia; que não fraudem nossas contas; que o nosso alimento contenha menos veneno; que a guerra no país vizinho não gere aumentos em nosso itens de consumo; que a indústria não leve a água que nos resta e acabe com o ar de que precisamos...

Não olhamos maestro: odiamos o migrante, o imigrante, o refugiado, o que tem outro gênero, o Outro, que sempre será a causa de nossas misérias.

A partitura do caos é culpa do pobre, do negro, dos LGBTQIA+, do nordestino, do venezuelano, do chinês, só não é culpa do maestro, de nosso político favorito.

E, no fim, rezamos por um remédio que nos faça dormir – porém, sem sonhar, porque aprendemos que sonhos são ilusões e ‘não se pode criar expectativas’; e queremos um remédio para manter a atenção e reter memória; e remédios para emagrecer, sem precisar de esforço físico; e remédios infinitos para não ser triste, para não sentir faltas e nem sequer sentir a si mesmo...qualquer remédio que cure as coisas intrínsecas à vida, anestesiando as dores, as faltas, o ego.

quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Low profile involuntário

 


A vida não dá pausas e os assuntos se acumulam.

Fiquei involuntariamente low profile.

Escrevi textos que não cheguei a publicar. Perdi o timing e acabei engavetando os assuntos, então, bastante interessantes (coisas que vivi, vi e ouvi): os homens idosos que, numa festa, mostravam nudes recebidos e compartilhavam pareceres sobre bundas e relevos de corpos – enquanto suas ainda jovens e bem cuidadas companheiras se distraíam com a banda que tocava; - a amiga que largou preconceitos e resolveu namorar um septuagenário mas, que, critica ofensivamente ao filho deste cara 70+, pelo fato do rapaz namorar uma mulher dez anos mais velha; as minhas questões pessoais e particulares que me fizeram declinar de quem eu gosto, porque, afinal, não adianta ficar por amor, namorar por amor, se o relacionamento me faz mal...enfim, assuntos que se empilharam e agora não vou mais desenvolver em texto.

Não vai dar tempo de falar do quão canalha e escroto era Delfim Neto, aquela cria podre da Ditadura, sempre louco pelo poder, que morreu velho, feliz e impune; nem vai dar tempo de virar a cara de nojo pela morte de Sílvio Santos, um grande comunicador para as massas, que soube espalhar uma fanfic sobre mesmo e fez crer que um dia ele foi pobre, foi camelô e ascendeu social e economicamente (não, meu povo: ele sempre foi rico. Trocou o sobre nome Abravanel por Santos, justamente, para aparentar simplicidade e pobreza - se liga, meu povo), aquele ser humano bajulador de ditadores, de classe rica e que, sabia jogar com os sonhos do pobre, induzindo a compra de inúteis capitalizações e outras falsas oportunidades e que,  igualmente, morreu bilionário e feliz.

Passaram-se dias e Olimpíadas, passaram os absurdos da eleição de São Paulo e a premência de um eleitorado ávido por gritarias e certos tipos que, de mau caráter a mal educado, lhes parece original, genuíno (vimos esse filme 17 ou 22 vezes)... e segue o tempo passando – eu, cá, a afirmar que não vejo tanto problema com os políticos quanto vejo com os eleitores. Penso, todo dia, que Lira não estaria onde está, Geddel Vieira Lima não estaria onde esteve, nem Sérgio Moro estaria onde está se alguém não os pusessem lá. E quem é que os coloca lá, a não ser os eleitores? Então, o problema é a outra banda da fruta.

Vejam o Rio de Janeiro. Será que só há um só perfil de candidatos, sempre? Tirem suas conclusões.

Certa vez tratei sobre isto por aqui, constatando que, hoje em dia, há um maior número de pessoas com formação escolar formal – muito acesso à universidade, a meios de informação e de formação, trocas intelectuais favorecidas e compartilhadas – mas, não houve avanço na formação do pensamento independente e nem mesmo à lógica. Sim, a lógica! Aquela coisinha básica de algo fazer sentido, de causa, consequência, efeito, coerência...sumiu! É cada absurdo, cada pensamento absurdo que encontra amparo nas pessoas...e cada distorção cognitiva, que faz uma parcela da população acreditar em ameaça comunista e desacreditar dos efeitos da ação poluidora do ser humano sobre a natureza; que faz acreditar num mundo de todo tipo de loucura, que faz o Teocentrismo parecer besteira – bem feito! A gente ria dos que achavam que comer melancia de noite causava a morte; dos que queriam se envenenar com manga com leite...mas, olha aí os que nos cercam! Delírios dignos de usuários de drogas sintéticas, psicodélicas ou sei lá mais o que...

Ah, Caetano Veloso, "quem lê tanta notícia?"

sexta-feira, 12 de julho de 2024

O jogo das respostas ocas

 



Às vezes, é preciso dizer o óbvio, porque a gente até esquece o que está à nossa frente. Pois, bem: sou um ser humano, vivo o que vivem os seres humanos em suas intersecções do existir.

Quem de nós nunca rejeitou alguém, não por orgulho, mas por não querer a pessoa? E quem de nós já não esteve na outra ponta da história e foi rejeitado e rechaçado? Humanos que somos, já passamos por isso.

Não é fácil, mas, a gente sabe que tudo passa e, por experimentarmos os dois lados da moeda, se formos adultos normais e saudáveis, a gente segue, a vida segue e deixamos a segunda pessoa da questão em paz.

Isso não exclui, como disse Caetano Veloso, “ondas, desejos de vingança” porque se o caso for de separação, isso inclui a ideia de que fomos trocados. Mas, isso também passa.

Dei muita risada com uma história que ouvi, sobre uma moça que, ao se separar, fez de tudo para melhorar a vida e a aparência; e ainda disse aos amigos em comum com o ex: “Isso é para ele ver o que perdeu”.

Por incrível que pareça, a resposta do ex, dada publicamente como réplica, foi: “Por que somente agora? Por que ela esperou acabar a relação para, então, se cuidar?”.

Tem muita coisa aí: como a pessoa deixa de se cuidar ou volta a se cuidar por causa dos outros, de fatores externos? Que ser humano é este, que não dedica tempo a si mesmo?

A vingança, neste caso, é se tornar atraente. Mas, a pessoa mobiliza energia para melhorar por vingança; e não mobiliza energia para melhorar para si mesma, por necessidade e vontade?

Sosseguem: não existe troca. É que amor passa, desejo acaba. Quem deixa a relação também sofre, porque a vontade de sair da relação é conflituosa e não chega de vez. Também é aos poucos que se vai descontruindo a relação.

Não dá para estar só e se dedicar a si mesmo porque o relacionamento acabou. Dedicar-se a si mesmo é algo constante.

É a pergunta que a gente precisa se fazer: se o relacionamento acabar, o que me sobra?

Deveria sobrar vida própria, amigos, carreira, ambições pessoais e sonhos. Não dá para o relacionamento/ o Outro ser tudo.

Parece de uma recorrência surreal mas, há algumas horas, passei por mais uma onda de insultos por parte de um homem que se sentiu rejeitado por mim. Foi por pouca coisa: colega de centro espírita, ele brincava com gracejos de flertes. Por estar ocupada, não respondi com frequência e fui cobrada nisso. Expliquei – estou ocupada – mesma razão, aliás, porque não tenho vindo aqui no blog.

Acrescentei que achava divertido trocar palavras com ele, haja vista o peso e seriedade dos meus dias. Via leveza e graça nas conversas.

Ele me respondeu com rispidez, alegando não ser palhaço para trazer riso algum a mim e que entendia que minha desatenção era sinônimo de minha rejeição por ele. Acrescentou o peso de palavras estúpidas às quais eu nada respondi nem responderei.

Tiro meu time de campo, não faço o jogo, nem acato provocações. 

Claro, senti o fato de ser mal interpretada, mas ele não tem peso em minha vida, não tenho convívio contínuo, não sou obrigada a vê-lo e a importância dele, para mim, é minúscula, não excedendo a de qualquer outro ser humano ao qual, de modo cristão, dedico fraternal voto de bem-estar. Fica, portanto, a dica: gente, não é preciso responder a tudo e a todos.

Não comprem briga nem percam tempo dando respostas a quem nem interage verdadeiramente em sua vida. Deixa a pessoa lá, no cantinho. Não é vácuo, é a ausência de necessidade de discutir, explicar, justificar.

Não gosto de ser negligente, mas há coisas que a gente não deve mesmo se prestar a priorizar.

Largo meu Facebook por meses, raramente acesso até mesmo comentários em blogs, sites e fóruns também por muito, muito tempo, porque esqueço ou minha vida real não dá conta.

Entre gastar horas respondendo a quem quer briga, holofotes ou biscoitos; ou estar abraçando quem eu gosto, ler um livro, tomar um café, brincar com meus gatos, sinto muito, mas declino de responder. Temos mais o que fazer do que gastar tempo e palavras com esse tipo de situação. Tempo é vida: não vou gastar minha existência com quem pouco conta. Não entre no jogo: vença a partida - caia fora!


quinta-feira, 30 de maio de 2024

Veredito

 


Donald Trump foi, há pouco, condenado, em um dos poucos processos movidos contra ele. Esbravejou contra o veredito e contra o juiz. Eu só não acredito que possa haver tanta gente a idolatrar um sujeito desses – e falo dos fãs mundialmente localizados.

Entendo que chegamos a um tempo em que todo mundo quer prosperidade, apostando em bets, acreditando que terão rendimentos de jogador de futebol famoso, sonhando que o ‘trabalhe enquanto eles dormem’ ou que um Deus compensador e justiceiro fará com o que é seu chegue em forma de fortuna. Entendo até quando passamos a declarar termos um ‘sonho de consumo’ que incluía o que não estava à venda e o que sequer tem preço. Entendo, sou humana, frequento shopping, me entulho de coisas que não usarei com frequência e sou daquelas pessoas cheias de roupas novas que, contraditoriamente, sai sempre com a roupa velha, por acreditar que aquela roupa me cai bem e me deixa mais segura. Não me coloco como melhor do que aqueles de quem falo. Sou um deles, num mesmo tempo, sob mesmas influências. De diferente somente o olhar, porque eu não me identifico com milionários toscos e desumanos, nem com uma aberração como Trump, por exemplo.

Objetivamente, momento brasileiro me desencanta. Acabou o presidencialismo. “O rei, reina. O parlamento governa.” Nossos militares (brasileiros) golpistas e vândalos, tal como os torturadores e assassinos do período da ditadura, desde muito foram anistiados. O sonho de correção da ordem, o sonho de justiça desceu a ladeira correndo, dobrou à Direita.

O povo dobrou-se à Direita, à Extrema Direita. O Brasil é uma democracia teocrática e, com sorte por pelo menos ainda ser democracia. Aqui, qualquer canalha que fale em Deus é eleito e tratado como o Próprio.

Somos um país de muitas igrejas e poucas escolas; e de escolas que funcionam como igreja, onde falta a fé na iniciativa individual na construção do conhecimento, ou seja, acham que basta dar escola, prover professores e a educação se fará. Não, não há milagres na área: ou o aluno participa ativamente do processo de conhecimento ou o resultado é zero. Gostamos da lei do menor esforço, de sentar e esperar... Esperar messias, salvadores, quem quer que seja que lute por nós.

Gostamos de magia também: de força do pensamento, de orações e simpatias, de coach e de constelação familiar, gostamos muito de respostas prontas e de guias. Olhando de perto, a falta de maturidade é imensa.

Fica fácil seduzir as massas aqui: basta quebrar coisas, gritar e ameaçar, mostrando a força truculenta do homem com H, porque afinal estamos desolados com a justiça e alguém precisa demonstrar coragem. Gostamos dos mais fortes, como convém a um país que é “Gigante pela própria natureza”.

A política é um campo em que somos despreparados enquanto povo. A gente apenas briga e se divide, como bons analfabetos políticos, conforme ensinou Bertold Brecht. Não gostamos de argumentos, nem de análises: a gente elege por simpatia.

Também caiu o Projeto de Emenda à Constituição que criminalizava a disseminação de notícias falsas. Claro, né? Se a verdade aparecer, fica difícil vencer uma eleição – e o povo foi aprendendo que mentir e ofender é liberdade de expressão.

Na hora da eleição, a verdade pouco importa. Não temos aqui consciência de classe, o trabalhador se acha empresário, empreendedor e patrão; o pobre não sabe que é pobre, se sente classe média e assim vota em favor dos milionários – os mesmos que exploram os trabalhadores.

Interessante é ver os pobres distópicos falando dos supostos socialistas de Iphone. Quem gera riqueza é o trabalhador. O Iphone é feito por trabalhadores. Vício velho, aliás: país que tem trabalho escravo nas páginas de sua história deveria saber que se é o escravo quem trabalha, o que faz o branco? E se a classe senhorial é trabalhadora, para quê foi preciso escravizar o semelhante? Bem, deixa para lá, não se dê ao trabalho...

sábado, 4 de maio de 2024

O amor, depois de um tempo


 

Quem não quer um relacionamento bom, com entendimento recíproco, carinho, acordos, cumplicidades? E diante de uma decepção amorosa ou diante da simples necessidade de esquecer, quem não deseja que tudo passe logo?

Para esquecer alguém, a gente precisa se convencer de que deve desistir, que o que a gente PRECISA é muito diferente do que a gente QUER. Então, se precisa esquecer, isso vai levar meses, ter altos e baixos, dores e angústias. E um dia passa. Apenas se ajude: crie coisas para se ocupar: um plano, um curso, uma meta...se precisar, viaje e fique longe, largue a vida do ser amado, corte laços e contatos; sustente sua solidão e um dia tudo finda.

Amar não é divertido: é um exercício pesado que pode ser gostoso, mas também cansa e desgasta.

Ao contrário do que eu pensava, agora que não amo ninguém não estou melhor que antes. Continuo sofrendo, só mudam as causas e os contextos. Mas, admito: é melhor sofrer por mim mesma do que por terceiros.

Aliás, há um prazer delicioso em poder dizer: “Dane-se! Foda-se!”, e não precisar mais viver à mercê de correspondências afetivas.

Concordo com meu primo: segurança é fundamental. Ele diz que mulher gosta é de segurança. Eu me incluo entre estas. Não quero gente que não inspira confiança nem me dá segurança. Definições, cartas claras, margens de certezas e poder contar com as pessoas com quem nos relacionamos é a base de poder desenvolver o circuito das trocas.

A vida volta para o eixo – um pouco mais vazia, porque eu já não amo e também não tenho com quem sonhar. Sonhar é fundamental para tocar o barco.

O Homem de Capricórnio já se convenceu que eu não vou atrás dele, que não escrevo, nem busco criar coincidências. A gente se viu há uma semana, depois de dez dias de tentativas dele de se aproximar de mim. Fomos ao cinema, conversamos vagamente coisas aleatórias.

Depois, um contato íntimo e sem sabor me mostrou o quanto eu desejava estar em paz na minha casa. Eu achei que o amava, que tinha por ele os mesmos sentimentos de um ano atrás. Não, não tenho.

O amor acabou, a paciência e a espera também acabaram. Eu não sei se ele fez acabar ou se esvaziou sozinho. Tem um resquício de um gostar, as doçuras de lembranças passadas, esse tempo imemorial que turva a percepção e só nos dá resumos de uma satisfação de outrora.

É muito triste procurar o homem que eu amei e ver: não existe mais. Era o amor que fazia este homem ser o Grande homem. Apequenou-se. Daí que eu fico distante, ele diminui, não faz falta, não causa as preocupações da insegurança que um dia eu tive, aquele medo da perda, aquele medo da falta. “E onde não queres nada, nada falta” – não há mais o meu querer. A falta volta-se para meu umbigo.

Meu analista me disse que tudo que agora vejo, é porque olho para mim.

Eu disse que não me reconhecia. E é verdade. Cadê eu? São as minhas diferenças que se mostram no espelho.

Vi o Homem de Capricórnio e o meu coração não acelerou. Não tive coragem para mentir um “eu te amo!”; não cobrei conversas nem acertos, não fiz propostas nem esperei promessas. Acabou.