Louquética

Incontinência verbal

domingo, 11 de dezembro de 2016

Presente!


Hoje eu dei alguns abraços em pessoas desconhecidas, por recomendação do palestrante do Centro Espírita (kardecista) que frequento. Estranho, isso. Não que não seja bom, nem que não seja necessário: há os mais efusivos, os frios, os tímidos, os chocados...Quisera eu que a espontaneidade prevalecesse. Acho que o aperto de mão, sincero, abrevia os desconfortos.
Falei disso porque fujo de visitas e de participar de amigo secreto, coisa que se multiplica nessa época do ano.
Odeio almoços e encontros de confraternização, seja com quem for: acho artificial, esquisito, recurso impessoal travestido de bom momento de fraternidade e amizade. Nunca fui dessas coisas de dar beijos no rosto do inimigo e cumprimentar desafetos. Por mim, troco de calçada. Entretanto, eu jamais seria indelicada a ponto de não responder a um cumprimento, a um aperto de mão, apesar de que quanto mais eu tenha respeitado e gostado de uma pessoa, menos eu tenha condições de perdoar e reatar uma relação com ela. Até meu amigo mais puro em termos de coração, JN, é assim.
O tempo foi me corrompendo. A maturidade também: observem bem que, conforme ouvi de um depoente do AA (eu não bebo álcool, mas fui acompanhar um dependente, para incentivá-lo a se tratar), há coisas que a gente não faz a um inimigo e que, todavia, faz a um ente próximo ou a um amigo. Então, se alguém gosta da gente, nos tem amor de amigo e ofendemos essa pessoa seja por palavras, injúrias, descaso, negligência, nossa ofensa será sempre maior, porque somos amigos.
Aos inimigos, toda ofensa seria compreensível, já que há ali um desamor.
Assim sendo, quem é nosso amigo se ofende e se fere se a gente faz algo cujo prejuízo será nosso. Não gosto de que meus amigos maltratem a si mesmos com vícios, maus hábitos, tendências ruins, escolhas irresponsáveis – e posso dizer que, respeitando as escolhas particulares, se eu pudesse, faria minhas amigas se casarem com gente melhor do que as atuais companhias; faria minhas amigas lerem e serem mais dadas aos livros do que ao Facebook; eu varreria o discurso derrotista fantasiado de superioridade daquelas que dizem que não querem cursar mestrado e doutorado (sabemos que isso é medo de perder, é preguiça de estudar e medo de passar e medo de passar e não conseguir escrever); eu diria para irem à academia e serem mais fortes que a preguiça e certamente ouviria coisa parecida delas para mim - claro que não no tocante ao doutorado, pois já tenho; nem à academia, que já frequento...
Eu deveria ter ouvido meus amigos em várias circunstâncias em que sucumbi a certos relacionamentos ruins que eu tive; assim como deveria ter feito muitas coisas que abreviassem meus sofrimentos, mas não fiz.
Falei dessas coisas todas também observando o quanto não temos atitudes gratuitas: esperamos que alguém nos peça, para então darmos (do abraço ao presente; do conselho à ajuda financeira àquele que está em dificuldade, porque mesmo quem ganha mil reais, pode tirar 50 e dar a um amigo gratuitamente, para que ele não se sinta constrangido em pedir, nem humilhado em aceitar; do chocolate à caixinha de chá, passando por aquelas músicas que você sabe que ele gosta e que pode baixar e dar em arquivo...No meu modo de ver, todo mundo pode, de alguma forma, presentear). Podemos dar a dica do concurso ao desempregado e dar o estímulo para que estude; podemos indicar caminhos e alegrar o outro, ou simplesmente ouvir...Ou simplesmente calar.
Já falei desta minha amiga e vou repetir: Conceição recebia minhas dores, quando eu caía. Quase sempre ela me dizia: “Você já sabe que fez o errado. Agora vamos ver o que fazer para resolver”. Isso era na adolescência. Ela não me dava lição de moral: via que eu já tinha a lição. Como amiga, oferecia o reparo. Presente lindo.

Mesmo de longe, presenteie com coisas silenciosas, sem exibições ou ostentações com orações, mensagens,  dicas ou um convite para dançar. Não somos tão pobres. Sempre que nossa vergonha ou timidez inibe o encontro ou a ação, cabe pensar porque nosso receio é maior do que a vontade. Desta resposta vira uma avaliação do quanto o outro importa para nós.

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