Acho que eu nunca
parei para pensar direito sobre a palavra motivação. Certamente porque, dentre
o rol dos falsos profissionais que estão à nossa espreita, há vários que se
definem como “sei lá o quê motivacional”.
Até crime tem
motivação.
E a gente fica à
procura de estímulos motivacionais. Parece que há uma distância incalculável
entre vontade e motivo, válida e aplicável para qualquer esfera, já que, por
exemplo, tantas vezes eu queria terminar um relacionamento, mas não poderia
fazê-lo sem um motivo. Como se minha vontade de terminar fosse insuficiente; se
eu esperasse a motivação enquanto justificativa. Sejamos justos: não é fácil
terminar “sem mais nem menos” e, por isso, é preciso mostrar ao Outro qual é o
motivo. Neste caso, então, nem sempre o motivo é claro para nós: a gente só
percebe que está infeliz e pronto. Ou que o amor passou.
Motivação
profissional, para certas pessoas, equivale a pressão: prazo, meta para bater,
concorrência, disputa, desafio. A naturalidade, o motivo resumido ao simples
querer, não é elemento suficiente.
Tem uns doidos que
dizem que querer é poder. Até seria, desde que este querer (e vamos convir que
querer, desejar, almejar, são bons motivos) sustentasse ações que propiciassem
a realização do que se quer.
Vontade sem coragem é
o típico motivo vazio.
No outro extremo da
balança estão as nossas compensações: talvez o querer exija esforços e se contraponha
à Lei do Menor Esforço. Então, entre a batalha e o ganho, opta-se pelo cômodo
lugar de manter o desejo como sonho; a vontade como Utopia.
Entre a vontade e o
motivo, nós fazemos cálculos.
Cálculos morais que
nos dirão se valerá a pena. Olha como nos expressamos: “Valer a pena”. Pena é
condenação, sacrifício, prisão, é o preço. Por isso, calculamos.
Como citei uma
questão pessoal de anos atrás, vamos adentrar ao caso subliminar envolvido na situação:
os ganhos paralelos.
Nós pensamos que não
somos calculistas, mas somos o bastante: quem se prende a situações
desagradáveis, fica no emprego ruim, no relacionamento ruim, com certeza tem
ganhos paralelos que excedem a suposta zona de Conforto. Pode ser que o ganho
seja simplesmente se poupar da dor, da dor de uma ruptura, de uma busca, de
estar só, de mil coisas...e aí, invertemos o motivo: temos o motivo para sair
da situação; e criamos o motivo paralelo para permanecer nela.
Existe o certo?
Existe e a gente sabe qual é. Certo é voltar à calculadora moral e pesar,
medir, averiguar nossa vontade real. A motivação vem daí, da vontade
verdadeira. Querer, ter vontade, desejar, verdadeiramente.
Daí advém o plano:
se quero e sei o que quero, o que posso fazer para ter? O que cabe a mim dentro
de tal situação? São as duas perguntas básicas; A partir daí, que tempo e que
meios se pode utilizar para colocar em prática a caminhada?
Ocorre que plano é
um negócio complexo, com lado material, lado subjetivo e o lado das
intercorrências externas (eventos fortuitos, força maior) que faz requerer constante
reorientação de rota.
Outro item
fundamental: pé na realidade. Precisamos ser realistas – para alguns, o
realista é um ser pessimista. Não: o realista acredita e sabe que há um mundo
fora de seu próprio umbigo e que ele não tem o controle de tudo. Então, ele não
vai querer perder 6 kg numa semana, sabendo que a fome lhe trará dor de cabeça,
mas ele vai estipular percentuais, tipos: na primeira semana de meu regime,
comerei vinte por cento a menos; após dez dias, comerei vinte e cinco por cento
a menos e, em um mês minha meta será comer trinta por cento a menos e me
exercitar cinquenta por cento a mais (sendo que se há zero exercícios, a
progressão será calculada também).
Se eu quero comprar
um bem, antes de qualquer financiamento, eu preciso saber poupar. Para isso, eu
não posso dar saltos que comprometam meu empenho. Então, eu começo, por
exemplo, guardando cinquenta reais num mês. Posteriormente, eu sigo guardando
valores mais altos, mas nunca tão altos a ponto de colocar em risco minha decisão.
Assim, melhor poupar cinquenta reais que não vou sacar, a poupar cem e sacar
setenta.
Se quero encerrar um
relacionamento, construo o trabalho diário do afastamento, reconhecendo o que
foi bom e que me atraiu até ali; avaliando o que já não está bom, avaliando a
si/mim mesmo; encarando os medos que se tem. Pode ser que isso leve até pouco mais
de um ano – sem querer sugerir o tipo terrível do relacionamento da ficção para
ninguém, nunca esqueço o velho filme “Dormindo com o inimigo”, em que a personagem
interpretada por Júlia Roberts calcula, ao longo dos anos, como fugir do marido
opressor e tóxico, saindo da ilha em que vive com ele, bastante vigiada.
Aprende a nadar às escondidas, traça um plano e vai embora (causa um blackout
na ilha e, na escuridão, nada até o continente).
Ainda acho que a motivação
maior que uma pessoa pode ter, está diretamente articulada à vontade real.
Quando a pessoa quer, vai em busca – o que significa que ela sabe que nada
acontecerá se ela não fizer por onde. E aí se pode recorrer a outro clichê: “motivo
não falta”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário