Demoramos muito a
aprender o óbvio, ou a aceitá-lo. Recentemente, ouvi de um psicólogo que a
gente não pode julgar a si mesmo com os olhos do presente.
Decerto, quem nunca
fez uma burrada de que se lamenta tempos depois? Quem nunca ficou indignado
porque não deu aquela resposta que só apareceu depois que a briga acabou ou que
a situação passou? Quem nunca se sentiu imbecil por uma amizade ruim, por se submeter a alguma exploração, por ter sido besta num relacionamento amoroso –
aliás, acho que é onde a gente mais se arrepende, porque depois que o amor
passa raramente a gente deixa de constatar, perplexos consigo mesmos, “como eu
pude amar uma pessoa dessas? Onde eu estava com a cabeça?”...Mas, são coisas
humanas.
Os nossos erros, as
escolhas que nos parecem as mais imbecis, as coisas loucas e erradas já
cometidas, talvez, naquele momento, não se apresentaram como erradas e loucas.
Fizemos o nosso possível, dentro de nossas circunstâncias.
Isso de dizermos,
com os olhos de hoje, que faríamos tudo diferente, é algo que não existe, não é
justo e não cabe. Por que? Porque você, hoje, tem domínio sobre o passado. Você,
agora, tem outros elementos, ferramentas, mentalidade, maturidade e saberes que
no momento anterior não tinha. E é preciso se perdoar, a fim de não remoer. A fim
também de se libertar, porque geralmente a gente fica discutindo em diálogo
interior (monólogo interior é coisa de literatura. Na vida real a gente
dialoga, responde a si mesmo com hipóteses), a gente questiona por que esticou
a corda em dadas situações; por que se permitiu passar por determinada coisa;
por que não fugiu, por que não gritou, por que não rompeu, por que não aceitou,
por que prescindiu, por que não fez de outro modo aquilo que a esta altura já
está feito...
Muitas circunstâncias
não são definitivas, não são sentenças de morte: ainda dá tempo de ter outra
profissão, de mudar, de fazer outras escolhas...Mas, o passado passou. Não é
justo que o adulto de 35 anos, de hoje, julgue o jovem de 15 a 20 anos que ele
foi.
As coisas
irremediáveis e imutáveis mostram que o tempo não anda para trás, não tem
retrocesso, não tem tecla backspace nem delete. Paciência! Está
feito.
Eu mesma constatei,
surpresa, que minha madrasta já não poderia mais me fazer mal, porque eu não
sou mais uma criança de sete anos. Ela também já não é uma mulher de 33
anos...está velha, doente e não apenas não me amedronta como desperta em mim
solidariedade e compaixão. Não somos os mesmos e isso não invalida a
experiência. O que eu passei ficou em mim, durou, marcou, fez feridas...Mas,
agora, a menina tem defesas, é forte e grande e não pode se comparar com seu
próprio ontem.
Dificuldade em
perdoar minha família eu tenho e não sou hipócrita. Contudo, preciso me
resolver comigo, apesar de tudo.
No reino do óbvio,
muitas vezes é preciso repetir: a minha vida é minha; a sua vida é sua. Se não,
a gente fica de braços cruzados, dependentes da decisão dos outros, como se não
tivéssemos o poder da escolha.
Aquilo que não
depende de nós – demandas da economia, circunstâncias externas mundiais, como a
pandemia que enfrentamos, coisas fora de nossas esferas de decisão – precisa ser
perdoado também em nós. O que lhe cabe, lhe cabe. Basta ter responsabilidade e
não posar de vítima – se o concurso está cheio de candidatos apadrinhados,
estude, para dar trabalho a quem quiser te reprovar, mas não desista antes de
começar; se você quer ganhar na loteria, pelo menos jogue...crie condições para
seus sonhos, em geral, fazendo a sua parte. E com o que não depende de nós, é
seguir enxergando que não há nada que se possa fazer (extensivo aos amores não
correspondidos, porque nem você tem culpa de amar, nem o outro tem culpa por
não lhe amar e não lhe querer. A cada um, seu pedaço).
A vida da gente não
pode acontecer sem nós. Também não devemos ser carrascos de nós mesmos, castigando
quem fomos no passado. Era nosso possível. Não podemos ser mais um a apontar o
dedo, acusando, condenando...
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