Louquética

Incontinência verbal

quinta-feira, 30 de maio de 2024

Veredito

 


Donald Trump foi, há pouco, condenado, em um dos poucos processos movidos contra ele. Esbravejou contra o veredito e contra o juiz. Eu só não acredito que possa haver tanta gente a idolatrar um sujeito desses – e falo dos fãs mundialmente localizados.

Entendo que chegamos a um tempo em que todo mundo quer prosperidade, apostando em bets, acreditando que terão rendimentos de jogador de futebol famoso, sonhando que o ‘trabalhe enquanto eles dormem’ ou que um Deus compensador e justiceiro fará com o que é seu chegue em forma de fortuna. Entendo até quando passamos a declarar termos um ‘sonho de consumo’ que incluía o que não estava à venda e o que sequer tem preço. Entendo, sou humana, frequento shopping, me entulho de coisas que não usarei com frequência e sou daquelas pessoas cheias de roupas novas que, contraditoriamente, sai sempre com a roupa velha, por acreditar que aquela roupa me cai bem e me deixa mais segura. Não me coloco como melhor do que aqueles de quem falo. Sou um deles, num mesmo tempo, sob mesmas influências. De diferente somente o olhar, porque eu não me identifico com milionários toscos e desumanos, nem com uma aberração como Trump, por exemplo.

Objetivamente, momento brasileiro me desencanta. Acabou o presidencialismo. “O rei, reina. O parlamento governa.” Nossos militares (brasileiros) golpistas e vândalos, tal como os torturadores e assassinos do período da ditadura, desde muito foram anistiados. O sonho de correção da ordem, o sonho de justiça desceu a ladeira correndo, dobrou à Direita.

O povo dobrou-se à Direita, à Extrema Direita. O Brasil é uma democracia teocrática e, com sorte por pelo menos ainda ser democracia. Aqui, qualquer canalha que fale em Deus é eleito e tratado como o Próprio.

Somos um país de muitas igrejas e poucas escolas; e de escolas que funcionam como igreja, onde falta a fé na iniciativa individual na construção do conhecimento, ou seja, acham que basta dar escola, prover professores e a educação se fará. Não, não há milagres na área: ou o aluno participa ativamente do processo de conhecimento ou o resultado é zero. Gostamos da lei do menor esforço, de sentar e esperar... Esperar messias, salvadores, quem quer que seja que lute por nós.

Gostamos de magia também: de força do pensamento, de orações e simpatias, de coach e de constelação familiar, gostamos muito de respostas prontas e de guias. Olhando de perto, a falta de maturidade é imensa.

Fica fácil seduzir as massas aqui: basta quebrar coisas, gritar e ameaçar, mostrando a força truculenta do homem com H, porque afinal estamos desolados com a justiça e alguém precisa demonstrar coragem. Gostamos dos mais fortes, como convém a um país que é “Gigante pela própria natureza”.

A política é um campo em que somos despreparados enquanto povo. A gente apenas briga e se divide, como bons analfabetos políticos, conforme ensinou Bertold Brecht. Não gostamos de argumentos, nem de análises: a gente elege por simpatia.

Também caiu o Projeto de Emenda à Constituição que criminalizava a disseminação de notícias falsas. Claro, né? Se a verdade aparecer, fica difícil vencer uma eleição – e o povo foi aprendendo que mentir e ofender é liberdade de expressão.

Na hora da eleição, a verdade pouco importa. Não temos aqui consciência de classe, o trabalhador se acha empresário, empreendedor e patrão; o pobre não sabe que é pobre, se sente classe média e assim vota em favor dos milionários – os mesmos que exploram os trabalhadores.

Interessante é ver os pobres distópicos falando dos supostos socialistas de Iphone. Quem gera riqueza é o trabalhador. O Iphone é feito por trabalhadores. Vício velho, aliás: país que tem trabalho escravo nas páginas de sua história deveria saber que se é o escravo quem trabalha, o que faz o branco? E se a classe senhorial é trabalhadora, para quê foi preciso escravizar o semelhante? Bem, deixa para lá, não se dê ao trabalho...

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