Louquética

Incontinência verbal

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

A sombra da inveja


Se tem uma dor que incomoda incessantemente, é a de notar que aquele amigo, pessoa próxima ou parente ao qual dedicamos amor e confiança, expressa inveja de nós.
Há quem goste de ser invejado. Eu, não. Acho a inveja uma afronta ao meu merecimento.
Meu poeta e ficante desfez uma amizade, recentemente, por isso. A inveja do amigo dele ficou bastante explícita. Eu entendi. Talvez o cara nem tenha percebido que a máscara caiu – digo que senti muito, porque um amigo é sempre alguém de quem a gente gosta. Desfazer uma amizade não é um ato prazeroso. A gente simplesmente não bloqueia, exclui e tira a pessoa de nossa história – ficam as marcas, ficam até as boas lembranças, mas, por outro lado, fica, em primeiro plano, o fator gerador da inimizade.
Nem sempre deixar de ser amigo significa passar a ser inimigo. Pode acontecer, claro. Contudo, respondendo por mim e por meu par, pode ser apenas a anulação daquela pessoa.
Há pessoas que eu gosto, tenho por amigas, mas não tenho confiança
Meu caso particular de enfrentamento de inveja foi doloroso: minha amiga, a quem eu costumava dar sapatos, bolsas e perfumes muitas vezes sem um único uso, viu meu guarda-roupa, meus perfumes, minhas roupas...Sentou em minha cama e chorou. Chorou de inveja e verbalizou sobre as escolhas que ela fez. Isso tem um tempo!
Falou da má escolha por parceiros e por ter tido filhos, disse que meu tesouro era minha liberdade e que tudo que eu tinha era, antes de tudo, porque eu não tinha filhos.
Vamos traduzir: era inveja de minha vida, da vida que eu tinha, uma vida que pertencia a mim e que me permitia bater a porta e sair pelo mundo; ou trancar a porta e ficar no meu mundo particular, de minha casa.
Já tive episódios de inveja, coisas esparsas, sempre no plano de admirar quem tem família culta e educada, com a qual se pode trocar ideias; mas me serviria, igualmente, uma família pobre e analfabeta que reconhecesse o valor do estudo.
Os amores bem correspondidos, quem não inveja? A beleza, a riqueza, a inteligência, a felicidade...Mas não é a inveja de querer tomar o que é do outro, nem de maldizer o merecimento a pessoa ou de atacar moralmente quem tem o que não temos.
Quando a gente é invejado, perde muito. Perde a paz e perde a confiança nos outros, logo de cara.
Tem mais medo de mal olhado e teme gente interesseira. Fora que constantemente se é vítima de maledicência e armações – quantos não morrer por serem invejados por gente doentia? Entendo muito disso, porque convivi com madrasta e sei o que passei.
Ando magoada com uma amiga que foi morar longe: todas as vezes em que mantive contato, ela foi fria e distante, monossilábica e antipática, a tal ponto que cogitei influência de terceiros.
Não procuro mais. Acabou o contato, para mim. E sinto muito, porque eu gosto dela de verdade, desejo o bem, gosto gratuitamente mesmo, sem querer empréstimos, favores ou benefícios. Todavia, acho muito escrota a atitude dela, de uma frieza sem causas. Amizades tem isso também: a gente precisa se tocar quando o outro dá claros sinais de desimportância ao nosso contato. Neste caso, acionei o ‘foda-se’ e nunca mais quero saber nada sobre ela, nem vou perguntar...E se nenhuma circunstância favorecer um encontro, nunca mais a verei – e numa boa, que seja feliz e foda-se! Tenho mais o que fazer.

Isso também é parte da autoestima: não pense que autoestima é estar bonitinho, se achar bonitinho do jeito que se é. Autoestima é ter estima por si. Se você tem um bichinho de estimação, sabe que há ali uma relação entre o amor e o cuidado. Logo, se você se ama, se cuida – por dentro e por fora. Isso inclui se preservar da maus tratos, de relações que fazem mal, inclui não fugir da balança e fazer sacrifícios pela saúde e pela preservação de si, inclui não se deixar pisotear pelos outros e agir com a devida prudência para estar bem e se melhorar. Inclui aquilo de que você se livra por não te fazer bem – seja um vício, um hábito ou uma amizade.

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