Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

A solidão é fera!


"Fundamental é mesmo o amor, é impossível ser feliz sozinho"...ora, claro que há razão neste raciocínio. Não uma razão absoluta, porque há seres humanos que convivem bem consigo mesmo e, não por uma pretensa auto-suficiência, secundarizam ou anulam as relações a dois.
Também ouvimos que "antes só a mal acompanhado". O caso, entretanto, é exatamente a baixa qualidade desta companhia.
No mito bíblico, Adão está sozinho e Deus resolve, após constatar a solidão do homem, presenteá-lo com a companhia feminina. Resultado: é tão bom ser e ter par, casal, companheiros...sim, companheiros= comer do mesmo pão (na maioria dos casos, infelizmente, que o diabo amassou).
Nós, mulheres, aprendemos a querer casar. Fracassei nesta lição: ninguém nunca me convenceu das benesses do casamento. Não conheço casamento feliz. Minhas amigas se queixam muito da solidão a dois, das relações paralelas que surgem para suprir as faltas, das ilusões que vão sendo desconstruídas com o convívio.
Gosto muito de acordar em minha casa, de ter um ambiente meu: sou meio caracol e até para sair gostaria de carregar a casa nas costas. Mas, como é bom!
É tão gostoso ter liberdade. Aquela liberdade clichê: ampla, geral e irrestrita e usufruir do meu território particular.
Como é bom ouvir um CD dos Raimundos bem alto, dançar e pular na sala; entrar no banheiro e tomar um banho interminável, viver os pequenos prazeres da privacidade...ah, palavra que me conquista: privacidade!
Passei um tempo imenso percebendo os rastreamentos que meus namorados e afins faziam no meu celular, nas minhas agendas; ou minha tia, visita rara e bisbilhoteira, fuçando gavetas, vendo fotos particulares minhas e, igualmente, rastreando minha vida.
Privacidade é prêmio incalculável que guardo com cuidado e amor.
O lado bom de estar com outra pessoa é, de fato, a boa companhia, o colo, o carinho, o sexo com sintonia e confiança, as confidências, os cuidados, as emoções da espera...a boa companhia sabe ser necessária, sabe despertar saudade:não sufoca com a presença; a boa companhia conquista, faz a gente desejar, maneja os nossos desejos sem manipular nossas vontades.
Como quem descobriu a pólvora, digo: estou sozinha. Sei disso. Mas queria companhia. Mereço companhia.
Gostaria de chegar em casa, dormir e acordar com um telefonema de algum homem interessante, sei lá, namorado, para almoçar neste domingo. Gosto das coisas simples, a saber: simples almoços em shoppings ou num restaurante chinês - Thin Yen Bao ou Souan Loun; gosto de ver filmes nos cinema, de tomar café gelado, de ficar dirigindo ou passeando de carro, bem lentamente, no domingo, observando as ruas, os cenários vazios. Gosto de dançar e de discutir livros, teorias e assuntos bobos, gosto de ver os programas do domingo à noite - Grey's Anatomy; Pânico, Café Filosófico...assim mesmo, tudo sem efetuar separações intelectuais, sem essa preocupação em não parecer fútil, sem me preocupar em deslindar os substratos da cultura de massa e da indústria cultural. Gosto de rir, de pensar, de me espantar.
Não vejo possibilidades reais de companhia.
Não tenho mais amigos, a não ser os funcionais: nossos colegas de trabalho que partilham de alguns segredos e vivências comuns.
Não tenho uma amiga para quem ligar e compactuar coisas ou propor saídas e aventuras, nem parentes, nem amigos do sexo masculino (heteros ou não) que se mantenham por perto ou se importem comigo a ponto de manter a amizade.
Se a vida fosse prática e descomplicada, alguém chegaria à conclusão de que é preciso intervir no curso do cotidiano, antes que nada aconteça.
Então, o rapaz que pega a mesma fila que eu , no banco ou na padaria, criaria um pretexto para conhecer meu mundo - se é que meu mundo é um outro que não seja o dele; também o sujeito que me vê fazer caminhadas e corridas no final da tarde, sempre por caminhos que se repetem, iria fabricar um pretextopara falar comigo; outrossim, também aquele que me vê no ônibus para Salvador, almoçando no Panela Brasileira do Iguatemi, ou no Instituto de Letras, às terças e quartas, deveria desafia o destino e colocar um pretexto em cena.
Como diria Drummond, "Êta vida besta, meu Deus!". Nada acontece!

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