Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Aos pares




Diz a voz da sabedoria que, quando estamos felizes, não devemos clamar a felicidade, a fim de que ela se demore ao nosso lado. Concordo. Como não estou na plenitude da felicidade, mas apenas muito feliz, vou clamar minha alegria no tocante ao trabalho.
Decerto, o trabalho a que eu me refiro é fora da esfera direta do magistério, é o meu trabalho com os livros. Dá um cansaço bom cansar a vista entre os livros, com os livros, nos livros. Caem em minhas mãos muitas obras em espanhol, o que aumenta meu labor, já que tenho que traduzir direto e não é fácil lembrar dos gêneros em espanhol, pois que é muito diferente do que ocorre em português. Por exemplo, o leite é la leche, ou seja, feminino e daí em diante não espere encontrar correspondência entre as partes.
De quebra, no meu trabalho, além da remuneração, fico com o conteúdo, porque aprendo e apreendo o que leio. Gosto do que faço e procuro fazer da melhor forma possível. Não entrei nessa procurando carreira. Achei que seria apenas uma exceção. Ocorreu de ir ficando, desde maio até agora...Embora seja freelancer, ajuda muito em minha vida.
Uma coisa que poucas pessoas entendem é que certas atividades são secretas. A gente assina termos de sigilo e se alguém aí duvida, basta consultar o que ocorre com quem trabalho no ENEM, por exemplo, com quem elabora questões para concursos e seleções no âmbito federal, com quem revisa livros e quem atua em várias outras faixas de trabalho que precisam guardar segredo a fim de evitar implicações éticas, acusações e desconfianças. No meu caso também há o dispositivo do sigilo. Ainda assim, reservo-me o direito de clamar a felicidade pela atividade que desempenho.
Tenho outras crises paralelas a essa felicidade parcial. Embarco nas crises de meu primo, que enfrenta a crise pessoal e a crise no casamento.
Eu sei que pareço negativista e pessimista com relação aos casamentos e relacionamentos em geral: Gente, amor acaba, passa.  No caso deles, lá se vão 15 anos de relacionamento, sendo 12 de casamento. Impossível amar “até que a morte os separe”. Amor sozinho não se sustenta. Se houver cumplicidade, amizade, confiança e etc., dura bem mais. O segredo do relacionamento durável é o medo de se separar.
Nesses dias a esposa dele falou em suicídio e ele falou em desaparecer. Não, eles não vão se matar – a menos que seja se matar entre si. Eles cansaram da relação mas têm medo de que se separar seja pior que ficar junto.
Estão nervosos, exasperados...Como em qualquer crise, basta a poeira baixar para tudo voltar ao normal, à vida insossa que parece normal. Aí eles não notam a infelicidade, que vai camuflada pelo cotidiano e pelas ocupações.
Se eles tiverem juízo, se separam e vão ser felizes, cada qual num canto.
O filho já é adolescente e não justifica o trauma maior que é viver com pais que não se bicam.
Meu primo anda pulando a cerca com profissionais do ramo erótico, pagando caro para não ter vínculo, para ter sexo comercial que não gere vínculo relacional com a prestadora do serviço. Ele é bonitinho, tem 44 anos mas parece ter 35, é bem formado, inteligente, está acabando o mestrado e de maneira direta, não teria dificuldade em arranjar mulheres. Ele não quer. Ele quer um sexo para aliviar as dores da vida e evitar dores de cabeça.
Ele nunca foi afeito a prostitutas. Só agora.
Quando a vida não é da gente, é fácil de resolver. Assim, eu sendo ele, me separaria, ficaria solteiro por, no mínimo, um ano e faria o possível para ter um desenlace amistoso com a mulher dele.
Ela é inteligente, trabalhadora, bonitinha e tem quase a mesma idade que ele. Só é reprimida e chata, mas também não demoraria e ter outro relacionamento, desde que quisesse.
Ela casou e não fez mais nada. Poderia ter feito, porque era boa aluna como é boa profissional. Agora seria a hora. Dizia Oscar Wild: “O casamento é fim do romance. E o começo da história”.
Perderam muitos anos de vida juntos, se detestando, se odiando. Mais do que se amando, como no começo. Ainda podem salvar as próprias vidas se não se preocuparem em salvar as aparências.

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