Dar um tempo. Quem
nunca disse ou nunca ouviu isso de alguém? Porém, o tempo é nossa maior moeda e
a gente não anda dando essa riqueza assim como pensamos, não. Principalmente,
para nós mesmos. Somos econômicos em dar um tempo para nós.
Logicamente, a
expressão ‘dar um tempo’ é mera desculpa para a gente se desembaraçar de
alguém, de acabar discretamente um relacionamento – espera-se que o outro
entenda isso; e é um modo de se desvencilhar de alguém, deixando-o em stand by, porque a gente dá um tempo
para viver outras coisas com outras pessoas e, se der errado, teremos alguém à
nossa espera. Porém, à parte minha ironia e sincericídio, dar um tempo para nós
não é simplesmente reservar uma parte do dia para cuidar do cabelo ou ler um
livro: é ter mesmo paciência consigo mesmo.
Quando a gente ama
quem não deveria amar e, finalmente, se toca da necessidade de cortar o vínculo
e esquecer, somos impacientes com nosso processo de luto e de esquecimento.
Não há cronogramas
fixos, mas a gente sabe que é sempre proporcional ao tempo do relacionamento e
à intensidade do que foi vivido. Mas, um ano é um bom tempo. Eu já disse, aqui,
minha exceção: levei dois anos e sete meses para esquecer completamente o
Ex-Grande Amor da minha Vida. Foi um esquecimento real, de um amor real. Durou
demais o amor em mim.
Ficamos impacientes
conosco mesmos por uma questão lógica: queremos acabar com o sofrimento,
queremos seguir em frente, queremos que a angústia passe.
Por vezes, como não
se sentir otário, um completo imbecil, por sabermos que deveríamos esquecer a pessoa,
termos interesse em esquecer, mas nenhuma condição real de esquecer e somos
surpreendidos, perdendo tempo ao pensar em quem sabidamente não deveríamos pensar?
Nos primeiros meses,
normal é ser lento para esquecer: ainda há esperança de que o Outro reconheça
nossas qualidades; que ele se modifique, que algo aconteça para regenerar o
afeto e a relação...então, jogamos o esquecer-esperar.
Reforço: não seja
besta de achar que amar a quem te ama, amar e ser correspondido, garante
sucesso no amor, na relação. Pode acordar: amor é apenas um aspecto de um
relacionamento – acrescento, ainda, que tem gente amiga que eu amo muito, mas
não quero conta, não quero amizade, não quero perto de mim. E mais: tem parente
que eu amo, amo bem de longe, porque de perto só dá briga. Portanto, peço
desculpas em nome de quem te enganou e vendeu a receita errada. Amor, para dar
certo, precisa mais do que amor (respeito, afinidades, reciprocidades, acordos,
etc).
A hora de desistir
depende de campo de visão, de esgotar dentro de si todas as esperanças, de se
convencer de que basta, que nada mudará. Mas, é um percurso seu, particular. E
dói muito deixar quem a gente ama e quem a gente quer. A meu tempo, doeu largar
um emprego cujo salário eu amava. Tenho muitas saudades daqueles proventos, mas
não me fazia bem. Há custos emocionais, custos do bem-estar psicológico, que
não tem dinheiro que pague.
Não é fácil pedir
exoneração, não é fácil terminar, não é fácil dizer um não, porém, muitas vezes,
é o caminho da cura.
Tenha paciência consigo. Temos nosso próprio tempo. Não há como acelerar esquecimentos com áudios de hipnose, nem com remédios, nem
com outras pessoas, nem com promessas. Mas, não está proibido tentar nenhum
método. Às vezes, a eficácia simbólica
de fazer uma promessa ou de fazer qualquer coisa com o objetivo do esquecimento,
ajudam. É uma ilusão ‘consciente’, como uma meta.
Remédio ajuda, caso
a separação gere sintomas físicos, tipo perda severa de apetite ou insônia. É
um recurso para manter a vida, mas tem tempo determinado para ser usado.
Sem querer repetir
fórmula pronta, afirmo que atividade física ajuda mais do que se pode imaginar:
se mexer é fundamental; ter uma rotina boa, de gasto de energia e de
concentração, ainda que forçados, valem a pena. Incentivar a disciplina e
incorporar um novo hábito ajuda a dar outra cor ao seu dia.
Não caia na loucura
da autoajuda e nos delírios gratiluz: pensamento, sem ação, é sonho vago.
Ninguém vai resolver a sua vida por você. Ela é sua. Ler vai ajudar, viajar vai
ajudar, procurar outras fontes de prazer vai ajudar...a esquecer? Não, a
sobreviver.
O pensamento vai
girar e cair no mesmo ponto, fazendo você lembrar de quem deveria esquecer. Não
se desespere. Aceite. Olhe para si e reconheça se ainda ama, se quer a pessoa,
se tem desejos de vingança...olhe para si com sinceridade e reconheça seus
afetos. Não precisa contar aos outros, precisa identificar o que sente.
Não sinta ódio por não
conseguir atingir a meta do esquecimento. Quando você esquecer, mal perceberá:
é como uma paisagem que vai ficando pequena conforme você se afasta. O outro
vai ficando pequeno, diminuído, até desaparecer. E o afastamento não precisa
ser material, físico, concreto: afastamento afetivo é o que faz, por exemplo,
um casal viver juntos e não se gostar. Nem sempre o estar juntos significa
amor; nem sempre o estar separado significa esquecimento, do mesmo modo que se
pode estar sozinho numa relação a dois, em que o parceiro é distante.
Geralmente, quem termina a relação já estava fora dela, já estava longe em
sentimentos, a gente é que não viu. E assim, para nós, que já gostamos de outras
pessoas e deixamos de gostar, sabemos que isso não dura a vida toda. Tudo
passa. O que não vale é forçar a barra, porque você iria odiar ter que ficar ao
lado de quem você não quer – seria o mesmo que manter na prisão aquele
prisioneiro que já cumpriu a pena, num
castigo desnecessário e injusto, onde estar conosco é um recurso
artificial para mandar na vontade do outro. Tenhamos dignidade.
Tenhamos paciência.