Louquética

Incontinência verbal

quarta-feira, 4 de julho de 2012

O coração e outras pontes



As mais lindas histórias de amor estão fora do universo da escrita, estão na maneira como as pessoas vivem e narram suas experiências amorosas.
Ontem ouvi uma linda história de amor, que certamente não dá sequer quatro linhas de escrita: o pai da esposa da minha amiga veio até a Bahia e convocou às duas ( à filha e à nora) para ir a Sergipe. Todos eles têm parentes lá.
Ele, contudo, propôs outro roteiro, longo, cansativo, estressante para a minha amiga que estava dirigindo nestes 300 km que nos separam do outro Estado.
O sogro, então, contou à minha amiga que precisava ir a uma determinada cidade a que ele não ia desde 1964 ou 1968, porque havia prometido àquela a quem ele denominava de Grande Amor de sua Vida voltar lá, logo que se estabelecesse no Rio de Janeiro, como, de fato veio a se estabelecer.
Chegaram à casa: a mesma casa, na mesma rua, com as mesmas cores, com o mesmo jeito, com os mesmos cheiros.
A esposa da minha amiga saiu do carro, foi bater à porta. Neste momento, o pai dela se escondeu no carro.
Achamos tão linda esta atitude infantil, adolescente, de se esconder – sabe-se lá a quantas estava aquele coração? Sabe-se lá o que é uma saudade guardada desde 1964 ou 1968? Sabe-se lá o peso da honra e da promessa guardada desde 1964 ou 1968? Sabe-se lá o que se passa no coração de um homem quando, transcorrido tanto tempo, ainda suspira por alguém que ficou para trás, apesar de tão desejado? Sabe-se lá o valor da mulher amada, os medos, as apreensões e a falta de jeito para depois de tanto tempo admitir a si mesmo que, em termos práticos, não voltou nem concretizou a vida a dois com quem certamente também sonhou e também esperou e também se desesperou e seguiu a vida com um pedaço de felicidade a faltar?
Bateu-se à porta.
Ninguém.
Ninguém atendeu.
Ninguém perguntou nada, também.
Vão os dois para o túmulo sem saber de nada um sobre o outro.
Será que ela estaria viva? Não havia a quem perguntar?
Como seria encontrar o amor jovem e robusto na intensidade, mas velho na fisionomia? O coração é o mesmo, com ou sem Ponte-de-Safena.
Lembrei de O amor nos tempos do cólera (de Gabriel García Márquez), mas a história deste outros dois é muito mais bonita.

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