Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Dia do Índio: memória das tribos


Hoje é dia do índio. Repito o clichê: antes, todo dia era dia de índio. Hoje eles nem têm terra e só têm um dia.
Os índios, hoje, estão muito miscigenados, mas nem por isso são menos índios. É que causa espécie encontrar índios fenotipicamente negros, mas na Bahia e no Amapá, eles existem, já com os pudores civilizados, integrados à lógica capitalista que construíram para eles.
Lembremos meu querido, grande e fenomenal Antônio Torres, em Meu querido canibal:
"Até eles chegarem, os índios não sabiam que eram índios. Ou antes: não  eram índios nem nada. Eram só um outro povo. Foi o primeiro branco que pôs os pés na América ( o famoso genovês de tanta glória e triste história) que os chamou assim. Tudo começou com um equívoco ou uma sucessão de acasos, como as professorinhas primárias sempre nos ensinaram." (TORRES,2004, p. 19).
E somos condicionados, pela cultura, a acreditar que índio é burro, selvagem, indolente...Ideias que nunca vingaram para mim, porque sempre desconfiei das receitas prontas, da história ensinada na escola e do senso comum.
Aqui brinco com a tribo dos Papachanas, os índios imaginários que adoram mulher, que são heterossexuais, canibais sexualmente falando...Tribo boa, em fase de extinção... 
E cito os Índios Aquidaoânus, tribo imaginária de gays aborígenes. Só brincadeiras porque da história real dos índios brasileiros, o final é trágico.
 A ficção de Antônio Torres dá conta do verossímel e da história da Confederação dos Tamoios, dos Tupinambás:
"Morreram todos.
Todos os que já sabiam que iam morrer.
Potira morreu romanticamente ao lado do seu louro Ernesto.
Morreu o papagaio francês, que resistiu tanto quanto pôde como um autêntico confederado.
E Pindobaçu, o velho Grão Palmeira.
Morreu Iguassu, a amada de Aimberê.
Foi uma carnificina.
Aimberê morreu de pé, como Cunhambebe, o terror dos perós, achava honrado morrer.
E era uma vez os grandes índios.
Não tiveram escolha: escravidão ou morte."
(TORRES,2004, p. 95)
Esta é a história. A história mesmo, quem dá conta é a ficção.
Mas aqui em meu país, idolatram e louvam os brancos, os europeus. Caso surpreendente de simpatia pelo algoz e de desprezo pelas vítimas.
 Isso tudo de luta, coragem, algoz e vítima me fez lembrar a primeira briga real que eu tive, briga de colégio, durante uma partida de handball: a verdade é que a moça de 21 ou eram 23 anos, avançou em mim por saber que o namorado dela me beijou na micareta - eles separados, eu livre - tinha eu 14 anos, o jogo foi só o pretexto. Sei que essa moça era puro músculo. Sei, também, que levei uns três tapas na cara, perdi um dos brincos de ouro que minha tia havia me dado. Mas ainda assim não conseguia desgrudar minhas unhas da pele dela: e levei bons pedaços da pele do braço. Sem arranhões: eram pedaços mesmo: fiz buracos com as unhas, cravei com um ódio intenso as unhas na pele de quem perturbou meu sossego. Apanhei, mas não caí, nem morri. E enquanto há vida,há porrada mesmo!
Tudo foi surpresa: eu estava na beira da quadra, tinha jogado um tempo regulamentar.
Lembro de décadas depois, quando tive medo de fantasmas na casa dos professores. Não tenho medo de gente, neste sentido. Acho que sou belicosa, embora eu não seja violenta. Mas creio que o ser humano tenha uma certa sede de violência. tem gente que não sabe conversar, que não chama o outro para dirimir a divergência, que fala mal pelas costas, que faz o inferno... Isso passaria no embate físico que alivia os ódios. É, herdei esse orgulho de não ser covarde. não sou.
Enfrento a vida, já é prova de coragem.
Não tenho medo, nunca tive, de gente maior de que eu, mais alta, mais forte, mais musculosa: na adrenalina da briga, a gente cresce.
Talvez seja herança da raiz indígena de minha bisavó, apesar de puxarem a brasa para o sangue quente italiano do meu bisavô, Michellangelo.
Penso como um indígena confederado: se a luta está posta, vamos a ela, mesmo sabendo da morte provável.
Nem sempre impera a sabedoria paciente dos meus antepassados negros ("Espere com paciência, aja com rapidez").
 É preciso nunca esquecer a história, apesar da história contada e escrita apagar os vencidos, os dizimados, os desaparecidos, os trucidados. Louvemos à memória dos corajosos, cujo legado foi e é constantamente distorcido em favor da criação de um consenso sempre favorável ao mais forte.
Hoje é dia 19 de abril!

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