Louquética

Incontinência verbal

quarta-feira, 3 de abril de 2013

No seu lugar


"Coloque-se em meu lugar!" Quantas vezes ouvimos isso, fazendo ouvido de mercador, desdenhando da expressão, mas a verdade é que só é possível calcular atitudes, sofrimentos e angústias alheias quando trocamos imaginariamente de lugar com essa pessoa. É o único recurso já que cada um vive sua vida, tem sua individualidade e há sentimentos e sensações que nenhuma expressão consegue dar conta e exemplificar a contento.
Coloco-me no lugar de todas as minhas amigas que partilham experiências comigo. Coloco-me no lugar delas porque ali também já estive, no mesmo contexto com outras personagens; em outros contextos com mesmas personagens, cenários, enredos... Não tenho medo nem vergonha de ser de carne e osso. Aliás, não me lembro de eu ter incorporando ideais de perfeição e felicidade continua prolongada. Tudo passa! Decerto, umas coisas demoram mais que outras, mas todas passam. E se não passassem, reclamaríamos da rotina.
Sou pouco tolerante com os que se dizem depressivos porque, com raríssimas exceções, tudo não passa de gente com preguiça de viver, que quer crer ser possível um spray repelente de angústias, que quer um céu azul num dia e um céu cor-de-rosa quando lhe aprouver; gente egoísta que quer ser amado, idolatrado e tomar o lugar dos irmãos preferidos na família, ou mesmo marcar a eterna disputa com a irmã mais bonita e mais bem-sucedida, numa alternância de inveja e egolatria, sob o manto do sofrimento – coitadinhos! – porque eles, sim, não podem ser contrariados pela vida.
Quem é meu amigo me suporta porque sabe que eu também suporto a pancadaria moral quando me atiram as coisas à minha cara. Se a gente pergunta, deve aguentar a resposta. Sei que o mundo não existe para me agradar nem para me fazer feliz. Lógico que eu não vou atirar a pá de cal sobre o corpo da amiga morta de desdém porque foi trocada pelo marido por uma mais nova, ou por outro homem... Mas me dizem tantas verdades quanto eu lhes digo. E acho verdadeira esta amizade que não se faz só de afagos e elogios.
Entendo a necessidade de esconder nossas derrotas frente aos outros: é recado que chega rápido aos inimigos e aos despeitados. Mas esconder de si mesmo não resolve nada: o problema existe, não adianta olhar para o outro lado porque ele cutuca seu ombro e mostra que está ali. Assim é que aconselhei a minha amiga a saltar do barco fora de rota e perfurado que é o relacionamento de que falei na outra postagem.
Toda dor que é nossa parece insuportável e interminável, mas se a gente não puser coragem na pauta do dia, não sai do lugar.
Olhar para trás e pensar no tempo perdido, nas frustrações, no que teria sido se assim fosse, apenas amarra a pessoa ao presente, a um presente contínuo, apesar de que o futuro, se é que ele existe, se faz de sobreposições de ‘hojes’. O que a gente tem como futuro é o porvir, é o depois, como se fosse sinônimo de mudança ou de concretização de planos – qual o futuro da relação falida, senão a falência múltipla e total?

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