Louquética

Incontinência verbal

sábado, 24 de abril de 2010

Minha casa


Experimentei a gostosa e ímpar anestesia/sinestesia de estar em minha casa no final da tarde deste sábado. Ah, como é bom estar em casa.
Vejam que a Odisséia é uma narrativa movida à base da batalha e da jornada: Ulisses precisa retornar à sua casa, apesar dos percalços, apesar do caminho.
O caminho foi meio surpreso: eu ia descer em Irecê e aguardar meu ônibus das 12h 30min, para evitar o desconforto e o calor do ônibus comercial.
Saí no ônibus de seis da manhã até Irecê - e iria esperar cerca de 04 horas para embarcar num outro ônibus. Para minha sorte, o velho e chato comercial tinha ar-condicionado e eu pude permanecer nele até descer em Feira às 15h40min.
Há quanto tempo eu não ficava em casa numa tarde de sábado?
Sabe o que é viajar na noite de sábado e chegar a Feira de Santana às 05 da manhã? é a certeza de acordar às 09 com o culto da Assembléia berrando bênçãos e seguir num domingo inútil, percorrendo o circuito cama-sofá, toda desgraçada, desgrenhada, sonolenta, lenta, no mal-estar da noite desperdiçada...horrível!
Dormi pouco, eu sei. Mas ao chegar no ônibus, após Irecê, imitei aos meus colegas de trabalho que são "bons de cama": dormi até quase meio-dia, sentada na poltrona, sem ninguém ao meu lado para me encher o saco e me acotovelar.
Antes de chegar em casa fui à padaria que eu amo, comprar os melhores pães do planeta - eu não almocei e comi bem pouco durante a viagem, mas nem notei a fome.
Não me importo por chegar em casa e pôr tudo em ordem: tenho orgulho de cuidar do que é meu; de lavar minha própria roupa; de limpar o que o tempo sujou...talvez me dê prazer porque é opcional. Acho que ninguém cuida das minhas coisas como eu cuido.
Tomar banho em minha casa tem outro sabor, é outro prazer...
Amo a minha casa.
Meu sonho (tantas vezes repeti isso) é um dia ganhar o meu pão na cidade em que moro. Sair do trabalho e voltar para casa é uma dádiva! Para alguns pode não ser, mas para mim é o máximo! talvez porque minha vida seja dura - de vez em quando eu nem me importo com isso porque sou independente. Portanto, nao tenho a quem pedir dez reais para nada, nem tenho quem fique comigo se eu adoecer: minha vida é minha, minha existência é uma responsabilidade minha - isso tem suas contrapartidas, mas passei a infância sonhando com a independência e, como Sônia Coutinho,sei que a liberdade é um tesouro duvidoso.
Gosto da minha liberdade e da minha independência.
Não tenho em quem me escorar - ainda que eu tivesse, meu orgulho não me permitiria isso.
Logo que eu tiver um emprego fixo, que deixar de ser substituta e puser o pé em terra firme, quero ter meus 20 metros quadrados em Salvador.
Lógico, prefiro um "barraco" bem localizado, a uma mansão na favela. Então poderei me sentir em casa em mais uma casa quando houver necessidade de ir à capital.
Já tive dois lares quando eu estava em Sergipe: meu apartamento lá, que eu não propus dividir com ninguém, arcando com o ônus desta decisão. Mas casa sempre será esta minha casa.
Amo tanto minha casa que não me sinto bem na casa de ninguém.
Posso, quando me aprouver, chegar em casa na tarde de sábado,dormir até às 22 horas e sair para as festas, que aqui só começam a partir das 23h30min.
Adoro ter o sábado para mim, minha noite de sábado!
Viajar à noite é um martírio para mim. Não sou de dormir sentada sem que isso resulte em mal-estar diurno e indisposição.
Enquanto isso vejo o que fazer com as finanças, já que de forma prudente, o meu chefe disse que salário somente em junho. Prefiro assim: pratos limpos! Conforme ele me disse, pode ser que haja grana em maio, mas essa é uma perspectiva mínima. De modo honesto ele disse que é possível, mas não provável. Assim, me previno, me preparo.
O caso é que Marla me disse uma coisa - e ela é muito prudente neste aspecto - que realmente sacudiu minha alma: consultada sobre a pertinência de eu prestar dois concursos para os quais estou mal-preparada cognitiva e financeiramente, além de indisposta, ela me disse: " Mara, por mais que renovem o seu contrato, é um contrato. Está entendendo? é um contrato!e tudo isso é temporário, instável, inseguro. Pense no exemplo de agora" e ainda me recomendou prestar os dois concursos independentemente de simpatias, de preferências, que neste caso, vale o amor e o interesse.
Pois é, parece que eu não sabia o que era temporário.
Este trabalho é feito para ser mesmo assim, por tempo determinado. E o depois? e o devir? se me falta feijão, não tenho onde ir em busca. Então tenho que ter mais responsabilidades comigo mesma porque dependo de mim.
Há um tempo eu até tinha um amigo para quem pedir opiniões, mas aprendi que ele não quer mais se prestar a isso, nem nutre a mesma simpatia por mim ou interesse pelo meu destino. Mas não tive vergonha de pedir a opinião das pessoas amigas e prudentes que não se importam em me dar esta ajuda de elencar prós e contras contextualizando minhas circunstâncias. Para estes aspectos sou dependente de todos cuja opinião eu respeito. Acho que me sinto em casa para isso.

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