Louquética

Incontinência verbal

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Abraçando o passado


Fui procurar umas fantasias que eu guardo, de carnavais passados, mas acabei encontrando outros arquivos pessoais: só agora vi que guardo os bichinhos de pelúcia que eu já ganhei, tenho uma coleção de bichinhos do guaraná Antarctica, inclusive, herança de Leandro, que um dia resolveu me dar presente. Meus namorados costumavam me dar coisas de suas coleções: coleções de cristais, de cordéis, de coisinhas da infância e da adolescência deles... Mas eu não lembrava que tinha.
Muitos diários meus sumiram – constatei hoje – e acho isso preocupante. Exceto por aquele que o ladrão levou consigo, durante o assalto em que eu conheci Thales, eu não tinha ideia de ter perdido nenhum. E ainda me preocupo com quem quer que seja que tenha minhas intimidades nas mãos, mesmo que não me conheça pessoalmente: tinha coisa demais, detalhes demais e sinceridade demais.
Abri alguns dos meus diários hoje e encontrei fotografias que eu nem sabia que tinha. Umas fotografias do tempo em que um cara que eu namorei não tinha ainda virado um mercenário, era só um sonhador, uma pessoa adorável; achei fotos da minha grande amiga quase-irmã, antes de ela perder o juízo e achei uma carta maravilhosa, fantástica, de uma pessoa que hoje é nacionalmente famosa, como eu nunca esperei que fosse, apesar dele ser um cara brilhante desde os tempos da universidade – que, por sinal, ele largou e tomou outro rumo.
Tanta coisa interessante. E não sei se é interessante por ser passado e porque o meu olhar agora é de outro ângulo, é de outro tempo... Vi minha cara nas fotografias também, e não pude acreditar em como eu me pareço com qualquer garota de hoje em dia que tivesse aquela idade.
Não acho que recordar é viver, nem revejo as coisas do passado todos os dias, mas é sempre um bom encontro.
Vi o bilhete do camping da primeira vez em que juntei as tralhas e fui à Praia do Forte com os amigos – a vez anterior, com a turma da universidade, eu não considero porque eu era otária, levava tudo a sério e fui fazer trabalho de campo enquanto o povo curtia cachaça, maconha, trilhas e amassos. Só mesmo eu para ter sido tão plenamente careta e imbecil.
E as paixões idiotas? E os namoros imaginários? E as pessoas inesquecíveis? As melhores noites da minha vida: tudo lá, nos meus diários.
Um dia o Pitbull Problemático entrou em minha casa quando eu não estava, procurando pistas das razões porque eu o havia deixado e deu de cara com umas fotos minhas com o sucessor dele: ele queimou as fotografias, ele procurou os negativos e destruiu tudo que eu mais amava dentre as minhas recordações. Nessas horas eu sei muito bem como pode ser o ódio.
Dizemos que temos raiva das coisas, dizemos que temos ódio de coisas bobas, mas o ódio verdadeiro realmente é uma casca grossa e de cor viva como um eclipse sobre o coração. Nunca esqueci aquele ódio.
Meu primo deve vir passar três meses em minha casa e eu já não sei o que vou fazer para evitar a bisbilhotice.
Minha família escrutina gavetas e espreita telefonemas, tira conclusões e quer satisfações, como se eu devesse, de fato, explicações. Já moro sozinha porque não tenho saco para nada disso e sinto que minhas memórias ficarão ameaçadas.
Não tenho esqueletos no armário, mas há partes da minha vida que são só minhas. Há opiniões que eu não compartilho, há segredos muito secretos, sim; há códigos que eu já nem sei decifrar; há declarações polêmicas, há tudo que há em mim nesses últimos quinze anos.
Para não dizer que não achei nada surpreendente, achei uma revista Carícia, de 1995. Eu mal lembrava que eu lia Carícia ( acredito que seja uma revista extinta)! Lia para entender os meninos e aprender sobre sexo... De fato, fui uma garota como qualquer outra.
Sempre que ocorrem essas varreduras, a gente tem o que jogar na lixeira. Faz parte! É uma nota fiscal, um cartão ilegível e corroído, coisas perecíveis que acabam fazendo parte de enfeites, de bilhetes... As cartas de Conceição, todas estão guardadas nos meus diários. Que orgulho tê-las!
E os ingressos dos shows no TCA, No Amélio Amorim, no Santana, no Calypso Heineken Station... Guardadinhos, marcando o dia em que conhecemos (minha amiga-irmã e eu) pessoas que se tornaram grandes amigos e o dia em que eu quis ficar com Ramón, mas não pude, porque eu tinha namorado e seria incapaz de fazer isso – Bom, tem coisas que realmente eu agradeço a Deus por ter passado.
Tem o beijo que Dayan me deu em 2000 e o dia em que a gente finalmente ficou juntos, em 2010 – e o problema era o mesmo: minha fidelidade. Ainda bem que ele esperou por uma década. Ah, tem muitas histórias que hoje me parecem lindas.
Tem decepções que ainda me pesam na cabeça. Tem os meus medos. E no fundo eu tenho muito medo de que alguém um dia leia aquelas coisas. Queria levar meus diários comigo para o túmulo, mas até lá, queria ter um cofre para guardá-los.
“Eu hoje joguei tanta coisa fora. Eu vi o meu passado passar por mim. Cartas e fotografias, gente que foi embora...”

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