Louquética

Incontinência verbal

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Não é brincadeira!

Não reclamo mais de ser um ser afetivo. Amo, odeio, tenho preferências, tenho aversões. Posso me considerar uma pessoa privilegiada por isso, nestes tempos em que já não se pode odiar ninguém, porque o certo é parecer bonzinho. Também nunca tive ódios gratuitos: todos têm uma razão de ser. Amor, sim, meus amores, quaisquer que sejam, sempre foram de graça. Acho até bonito quando as pessoas dizem: “Gosto de você de graça!”.
Falando nisso, eu nunca mais havia falado com meu amigo Léo Bernardes. Aí, na hora da emergência, aciono o coitado e sei que ele entende a situação. Talvez eu não o fizesse se fosse para pedir coisas materiais, mas sei que ele é muito gente fina, que se ficar dez anos sem falar comigo, deduz que eu tive ocupações e embaraços que me emudeceram, que me fizeram negligente de contato, mas em nada diminuiu meu amor e minha amizade. Especialmente por ele, que é heterossexual, lindo, inteligente... E incompetente que eu sou, acho uma exceção dessas e sou simplesmente amiga, sem a menor maldade!
Meu amigo Chuck também inventou de casar, defender a dissertação de mestrado e não me comunicar senão mediante meus pedidos de prestação de contas! Ele sabe que eu me importo com ele, vendo ou não o vendo, longe, perto, tanto faz... A gente entende de saudades e entende quando um resolve ficar enclausurado em sua própria casca, quieto, calado...e até brincamos que quando um de nós for morrer, que comunique ao outro.
Às vezes me reconcilio melhor com os amigos mediante a distância, porque me canso mesmo! Ah, me canso de egoísmos, me decepciono quando percebo defeitos inaceitáveis, tipo a usura, por exemplo. Não tem coisa mais execrável que gente usurável. Já pensou, você lidar com uma pessoa que faz qualquer coisa por dinheiro, qualquer coisa por lucro, que não mede consequência por centavos a mais no orçamento? Estou declarando minha decepção com uma amiga. Não que eu não soubesse, é que eu não tinha clareza.
Às vezes as pessoas que têm atitudes nobres podem ser filhas da puta terríveis no trabalho e boas mães, bons pais no seio da família, tudo numa mesma pessoa. É que vergonha na cara é coisa em extinção e a compaixão pelo semelhante foi pelo ralo. Pode até ser o discurso mais batido do mundo, mas quem não tem não é: valemos o que temos, porque o mundo não tem valores morais, só monetários.
Sei que não me contenho: numa dada vez ela comentou acerca do namorado de alguém com que ela tem parentesco. Eu perguntei: é médico, advogado ou empresário? Era médico o namorado da moça. Claro! E eu consigo ser amiga desta pessoa, amar de graça esta pessoa, mas não sem me perguntar por que demorei tanto a perceber que ela faz qualquer coisa por dinheiro – não há limites.
Tenho outros amigos maravilhosos que me fazem falta, que sabem que eu gosto de ir jogar besteiras nas Playland da vida, que riem das bobagens que falo e entram no jogo; que param um momento para parar de levar a vida a sério e um, muito especialmente, me pediu para eu ir a Aracaju dois dias antes do necessário, porque ele odeia estar lá sozinho, ele detesta estar lá e sabe que comigo pode assumir que não gosta. Detesto a patrulha que quer forçar a gente a declarar amor ao que não amamos. Ah, menino, assuma seus ódios, suas aversões, suas desavenças... e este filho de Oxóssi deu para estar irado com a amiga chata e negligente, a tal ponto que não transmitiu o recado que mandei para “ela”. Disse ele: “Ah, não falei, não avisei! ela que se dane!” eu não disse nada, mas a moça mereceu! Não é porque são amigos que todo dia é dia de festinha bajulatória. Hoje percebi que gosto muito de Neide. Gosto. Acho que percebi ali uma amizade real, um afeto. Não vivo de ódios: vivos os ódios e não quero ser mais uma hipócrita a brincar de arco-íris cor de rosa onde todos amam tudo e todos amam todos como não é próprio à espécie humana. Aliás, lembrei bem de um professor de ginástica (ou era pediatra?) falando que as crianças podem se exercitar mediante jogos recreativos. Aí ele separou o que é uma atividade recreativa do que é uma atividade competitiva.
Pensei nas tantas vezes em que a gente quer ganhar, que vencer, e fica ensinando as crianças a ganharem, a vencerem... e não há prêmios: apenas se ganha para ser ganhador. Não quero ser perdedora, mas defendo fair-play. Ganha mais quem recreia do que quem compete, na ânsia de ser o melhor, de levar a melhor, de ganhar prêmios imaginários... Talvez eu esteja pensando nisso porque o Dia das crianças está chegando...
Quero mais é brincar!


É Tão Lindo (A Turma do Balão Mágico)

Se tem bigodes de foca,
Nariz de tamanduá...
-Parece meio estranho, hein?
-Hum!
Também um bico de pato
E um jeitão de sabiá...
Mas se é amigo,
Não precisa mudar:
É tão lindo!
Deixa assim como está.
E eu adoro, adoro!
Difícil é a gente explicar
Que é tão lindo...
Se tem bigodes de foca,
Nariz de tamanduá...
-E orelhas de camelo, né tio?
-É!
Mas se é amigo de fato
A gente deixa como ele está...
É tão lindo!
Não precisa mudar,
É tão lindo!
É tão bom se gostar.
E eu adoro!
É claro!
Bom mesmo é a gente encontrar
Um bom amigo...
São os sonhos verdadeiros
Quando existe amor
Somos grandes companheiros,
Os três mosqueteiros,
Como eu vi no filme...
É tão lindo!
Não precisa mudar
É tão lindo!
Deixa assim como está
E eu adoro e agora
Eu quero poder lhe falar
Dessa amizade que nasceu
Você e eu!
Nós e você!
Vocês e eu!
E é tão lindo!...
-Tio!
-Hein?
-É legal ter um amigo, né?
-É maravilhoso
Mesmo que ele tenha
Bigodes de foca
E até um nariz de tamanduá
-E orelhas de camelo tio, lembra?
-Orelhas de camelo?
-É tio!
-É mesmo, orelhas de camelo!
Mas é um amigo, não é?
-É!
-Então não se deve mudar!
Composição: Al Kasha/Joel Hirschhorn/Edgard Poças

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