Louquética

Incontinência verbal

quarta-feira, 20 de abril de 2011

O doce veneno de Bruna Surfistinha


O que surpreende no filme Bruna Surfistinha, baseado no livro O doce veneno do escorpião, é a trilha sonora.
Especialmente para mim, que adoro o Radiohead, nos primeiros minutos em que toca Creep e também, lá no meio do filme, Fake plastic trees, eu viajo totalmente. Já nem presto atenção ao filme, em si, mas na música - que mistura dor existencial, doçura, um amor não convencional...
Da narrativa do filme, em si, nenhuma novidade frente ao que a celebridade em que se tornou a Bruna Sufistinha da vida real já não tenha falado ou divulgado pelos programas de televisão.
Todo mundo quer saber sobre a vida de uma garota de programa: os homens, para inspirar suas fantasias; as mulheres para aprender técnicas e novidades. Mas, não se preocupem: não tem nada disso. É um filme sobre sexo em que quase nada sobre sexo aparece, porque aliás,é sobre a vida de uma mulher que vive do sexo enquanto atividade econômica.
A menina na mesa de café da manhã que aparece no filme em nada condiz com os comerciais de margarina, mas também não cai na mentira de inventar pretextos para a prostituição de Raquel (posterior Bruna): ela é muito amada, sim, está numa família comum e opta por cair fora e entrar na prostituição.
Ultimamente virou moda arranjar álibis para as opções das pessoas, até mesmo para os crimes se procura um álibi subjetivo, tipo um conflito familiar ou um convívio familiar tenso. No filme, não tem isso: ela sai de casa porque quer; ela não volta para casa porque não quer, ela não aceita uma relação estável com um homem porque não quer e segue na prostituição porque assim deseja.
Livro desse tipo vira best-seller porque traz o espetáculo. E o que a gente não vê na cultura sensacionalista é que todo mundo quer o espetáculo, quer ser ator mais do que ser platéia, quer sair da vida para entrar no noticiário e colocar a culpa no bulling nosso de cada dia, porque quem de nós não teve apelidos depreciativos na infância, que atire a primeira AR-15. Mas, está bem, agora é moda e eu não quero ficar out.
De resto, o filme mostra uma moça estratégica e inteligente que encara a prostituição como carreira e, sim, a partir de um blog dá outros rumos à sua atividade de trabalho. Isso também é importante: prostituição é trabalho, ela tem clientes, ela se queixa do cansaço após atender oito clientes numa despedida de solteiro, ela não nega o abismo da cocaína, mas suponho que por questões também estratégicas, há o esforço por tentar encobrir um suposto glamour de ser prostituta.
Suponho que quem chama prostituta de vagabunda, realmente, não tem a menor noção do que seja trabalho - e olha que muitas trabalham menstruadas, usando um absorvente interno ou se entupindo de anticoncepcionais para suspender o ciclo, porque cafetão não aceita atestado médico nem dá trégua para o período menstrual.
Por fim, a prostituição como espetáculo leva a gente para as telas de cinema - demorei a ir, porque afinal me faltava tempo, mas não me faltava curiosidade - mas é uma narrativa boa e a atuação de Débora Seco que seguram o filme.
A Bruna da vida real eu, pessoalmente, acho gorda e feiosinha, o que não diminui em nada os seus méritos, porque ainda assim ela conseguiu atrair sua clientela, se manter na mídia, exercer seu poder de sedução e desbancar muitas garotas bonitas.
Meu amigo não quis ver o filme, porque ele é moralista e não sabe separar ficção de realidade, julga moralmente a arte e certamente tem medo de sentir alguma coisa no corpo de que o Deus dele discorde.
Ok, não é lá um grande filme, mas é um filme que tem boa produção, é bem feito. O resto é o que a nossa curiosidade dita.

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