Louquética

Incontinência verbal

domingo, 24 de abril de 2011

Quando bate, fica?


Estar louco de amor, louco de paixão, mais do que uma expressão recorrente, é uma suave admissão de que há qualquer coisa que aproxima o amor e a loucura. Se fosse para tratar de minha vida, eu diria que um terceiro elemento, a burrice, perpassa o amor também. Vivi amores burros! se me apaixono, tiro os pés do chão: os quatro (quadrúpede que fico).
Se é verdade que andei me queixando dos meus contrabandos afetivos, dessa pirataria sentimental que me acomete ultimamente – e quando eu falo pirataria é porque as coisas se mostram originais e verdadeiras na aparência, mas não duram muito tempo, são só cópias baratas mesmo – por outro lado dou graças a Deus por não estar metida em encrencas afetivas.
Minha amiga abandonou o emprego só para ficar cem por cento de seu tempo ao lado do namorido drogado e instável. Ela é uma dessas pessoas que se deve amar à distância. E eu mantenho distância, sim; e não fosse o fato de eu estar teclando com a irmã dela pelo MSN e esta ter dito que iria apartar uma briga, tendo, 05 minutos depois, me explicado sua habilidade de se desviar de caçarolas arremessadas contra ela, eu nem saberia do babado. Mas, o método Von Ritchofen de convívio familiar funciona para alguns, pelo que vejo. E a porrada era justamente porque o pai da moça interferiu, aconselhou a minha amiga a voltar ao trabalho...o sujeitão lá se ofendeu, ok.
Vou só fazer um adendo: a família dela é Adventista e acha que o casal deve ficar junto haja o que houver – neste caso, com drogas, violência doméstica e tudo mais...tudo vale a pena!
E quantas das minhas amigas e conhecidas, assim como essa, com boa formação universitária, independentes financeiramente, pessoas de bem, se arrebentam sustentando o companheiro, apanham, suportam os vícios e fazem cara de paisagem para o próprio sofrimento, fazendo de conta que têm uma união feliz - coisa que alguns olhos roxos desmentem, porque às vezes a infelicidade está na cara.
Destas, principalmente no mundo do Ensino Superior, a maior parte se engaja em Estudos de Gênero, têm discurso feministas, seja para efetuar sua catarse de modo a se realiza na teoria, seja para disfarçar ainda mais o inferno doméstico, pois quem tem conhecimento de causa teoricamente saberia se defender, nunca permitira que acontecesse consigo aquilo que elas apontam em seus estudos, enquanto consequência do machismo. Mas, nada feito:na prática a teoria é outra e o pau come na casa de Noca!
Mas, tirando esses casos extremos, realmente vou voltar atrás: não quero me apaixonar, não.
Amor tranqüilo é coisa rara. Amar sempre pressupõe alguma humilhação, alguém que nos domina, concessões, traições, dores...e aquela aposta ridícula na correspondência. Tem coisa mais ridícula? Você amar certa pessoa e coincidentemente, esta pessoa amar você?
E se há terceiras pessoas, aí o bicho pega. Se a mulher amar alguém que tem outro alguém, a batalha já está perdida de antemão, mas nem por isso a idiota vai deixar de disputar, de odiar a outra, que chegou primeiro, que não tem culpa de nada, mas que precisa ser destruída no mínimo moralmente. Tanta luta e o prêmio é um homem.
Ao contrário de muita gente, quando tive minhas barcas furadas, amores maus, nunca tomei por ofensa e intromissão o caso de um amigo me aconselhar. Em meu caso, podem “meter a colher” porque eu entendo que o amigo está me chamando à razão, me colocando a par da realidade.
Neste momento há outra amiga minha doente, arrasada por um amor sádico: ele faz o que quer com ela, é convencido, sabe que ela sempre aceitará qualquer coisa, que está disponível e que qualquer migalha que ele der sacia a fome que ela tem. O analista já disse para ela cair fora, porque ele é parte das inclinações suicidas dela...nada feito! Ele despreza, pisa, humilha, reduz a moça a uma partícula insignificante, bate a porta. Mas volta quando convém e ela sempre aceita.
Essas são as minhas amigas. São assim outras amigas dos meus amigos, das quais eu própria, que a meu tempo sofri minhas humilhações por amor, embora não tenha sofrido violência física. Nem por isso o amor se esquivou de me deixar cicatrizes profundas, coisa que cirurgia nem curativo jamais irão sanar.
Embora eu já não acredite em Drummond com aquela sua assertiva poética de que “amar se aprende amando” – amar não se aprende é nunca! Cada situação é única e a gente sempre se repete, isso sim – acho que o coração se desgasta .
Amor é uma droga de alto poder de desvirtuamento da realidade. Causa uma dependência indescritível, vicia, tira o sono e o apetite, causa picos de euforia e picos de tristeza, transformando as pessoas em bi-polares, causa transtornos que nem daria para enumerar. E para quem já foi viciado, para quem já amou, sempre desperta um misto de atração e repulsa, pavor, talvez.
Quando às vezes falo do ex-Grande Amor da Minha Vida, por quem, aliás, mais por orgulho do que por lucidez, eu não me humilhei, falo com o trauma muito vivo em mim. Um trauma real que me impede de voltar a Aracaju, que fez com que eu me inscrevesse duas vezes num concurso lá, não tendo comparecido em nenhuma delas; que me impede de pensar em pôr os pés de volta àquela terra e que eu só posso comparar à mesma sensação que alguém poderia ter caso voltasse à cela em que foi torturado. Mas isso me diz: não quero nunca mais sentir essa dor novamente.
Por ser a rima mais óbvia do mundo, não quero nunca mais amor e dor. Se não quero, não procuro e não vai acontecer salvo se eu for tomada de assalto, mas não há quem me encante tanto, não há quem desperte em mim esse sentimento, pelo menos por enquanto...e isso pode ser conseqüência de alguma vigilância interna, de meu sistema de segurança.
Tomei o conselho de Chico Buarque a sério e não quero ser uma mulher de Atenas, não quero repetir os imperativos do meu gênero.

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas:
Vivem pros seus maridos,
Orgulho e raça de Atenas.
Quando amadas, se perfumam,
Se banham com leite, se arrumam
Suas melenas.
Quando fustigadas não choram:
Se ajoelham, pedem imploram
Mais duras penas; cadenas.
Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas:
Sofrem por seus maridos,
Poder e força de Atenas.
Quando eles embarcam soldados
Elas tecem longos bordados;
Mil quarentenas.
E quando eles voltam, sedentos,
Querem arrancar, violentos,
Carícias plenas, obscenas.
Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas:
Despem-se pros maridos,
Bravos guerreiros de Atenas.
Quando eles se entopem de vinho
Costumam buscar um carinho
De outras falenas.
Mas no fim da noite, aos pedaços,
Quase sempre voltam pros braços
De suas pequenas, Helenas.
Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas:
Geram pros seus maridos,
Os novos filhos de Atenas.
Elas não têm gosto ou vontade,
Nem defeito, nem qualidade;
Têm medo apenas.
Não tem sonhos, só tem presságios.
O seu homem, mares, naufrágios...
Lindas sirenas, morenas.
Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas:
Temem por seus maridos,
Heróis e amantes de Atenas.
As jovens viúvas marcadas
E as gestantes abandonadas,
Não fazem cenas:
Vestem-se de negro, se encolhem,
Se conformam e se recolhem
Às suas novenas;
Serenas.
Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas:
Secam por seus maridos,
Orgulho e raça de Atenas.

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