Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Espelho, espelho meu...


Ele me falou meio entristecido: "Ainda mais agora, que ela está largada, desleixada, engordando". E eu tive pena foi dele!
Vi minha amiga, também, uns dias antes, comparecer àquele compromisso vestida com uma roupa que parecia um pijama - e dos de péssimo gosto. Tem sido assim há muito tempo!
Quando uma outra amiga minha teve um surto psicótico, a psiquiatra me deu as dicas de que ela se deixaria desprezar, que descuidaria do banho, que ficaria, enfim, com a possibilidade de não ver razão em cumprir os rituais da higiene e da apresentação pessoal. Dito e feito! mas, depois passou. Que bom que passou!
Futilidade e vaidade excessivas são coisas criticáveis - certamente há bases para os preconceitos, principalmente se pensarmos o fútil literalmente (frívolo, superficial, vazio, leviano), mas numa situação extrema, melhor ser fútil a ser largada.
Houve um tempo em que para ser intelectual ou para provar que alguém tinha alguma idéia política, algum senso crítico e coisas do gênero, era necessário ser desleixado.
No meu curso de História, isso era representado pela imposição da indumentária do Mercado de Artes, da sandália de couro artesanal, da saia indiana, das camisetas de Guevara e da Juventude Socialista, tudo mesclado a jeans. Dizem que Heloísa Helena aderiu a essa moda e até hoje permanece nela.
Ser básico já é ser fashion.
Sob tudo isso, a idéia de que intelectual não pode perder tempo com superficialidades - logo, a roupa aí no seu lugar semiótico. Pelo ocorrido com Geyse Arruda, quem duvidará que a roupa comunica? eu é que não quero mandar mensagens de desleixo.
Um mulher pobre pode ser deveras elegante, ou bem vestida ou simplesmente apresentável - para isso, camisetas básicas de fios bons, como as da Hering, acessórios, como lenços e colares, coisas que não excedem 03 a 15 reais - sem violentar o que ela realmente quer para si, e jeans.
Somos julgados por nossas imagens, sempre. Se houver tempo, exibimos nosso interior.
Eu até gostaria de nem dizer isso mas acho horrível mulher sem batom: abominável.
Unhas francesinhas e unhas quadradas: o cúmulo da feiúra.
Calça sarouel: troféu breguice e feiúra permanente, parece calça geriátrica, fralda, sei lá.
Luzes no cabelo: pensem, luzes prateadas num cabelo escuro conferem um visual de velhice que é de cair o queixo! de onde tiraram que isso é bonito?
Mas aqui foi só um desabafo de ordem estético-fútil, porque eu realmente acho que estarmos bem com nossa imagem é algo com outros significados para além deste "bonito e feio" de todo dia.
Eu estou com pena da minha amiga. É que ela não era assim: o cabelo desgrenhado, ela que tem fios louros que já foram bonitos e hoje destilam opacidade, desleixo absurdo e inclassificável.
Ela, que arrasava nas festas a que íamos, agora está completamente largada, gorda, com cara de uns 20 anos a mais...e dela não exala nada, como se não usasse perfume (que pecado!gente sem perfume é triste!).
Não é depressão, ela continua na ativa, tudo bem: acho que é estabilidade emocional mesmo, porque o casamento está mais do que consolidado, ela não faz questão de estar bonita de estar bem e isso revela que talvez todo o cuidado que ela manteve anteriormente foi para os outros, não para si.
Estar arrumada deve ser um prazer, não uma imposição ou um artifício da futilidade. Por isso mesmo, quem gosta de ver a si mesmo feio e desperezível, largado, desleixado? certamente aqueles que estão se amando pouco, que não vêem razão em se arrumar ou aqueles que são interiormente vaidosos a ponto de não quererem manter a aparência para agradar a outrem, é uma forma de egoísmo bem discreta.
Mas eu tive pena dele. para quê esconder? ele não reconhece mais a pessoa com quem casou.
o tempo passa, nossa fisionomia muda, mas ninguém nunca espera que o tempo transfigure ou desfigure quem nos seduziu. E assim está sendo: ele não entende mais quem é aquela pessoa, ele me pede ajuda, mas não há como dizer o que ela já sabe. Num ocasião me limitei a dizer a ela: "ele gosta de mulher glamourosa!". Ela entendeu e relembrou o aspecto que ela exibia quando eles se conheceram.
Eu não suporto hipocrisia estética: ora, gostamos do que é bonito.
Se os padrões foram impostos e sob eles educamos nossa opinião estética, sinto muito: isso não quer dizer o louvor extremo a um padrão branco-europeu topmodel, impossível para os mortais, mas quer dizer que unhas pintadas, higiene e cabelos bem tratados são questões inerentes oa bem-estar e a saúde. Você se transformar em perua, em fashion ou em glam é outra coisa - coisa que eu apóio também, e muito! não estamos nos anos 60, honey, a era hippie já passou.
E afinal, você trabalha para quê? para ter bens? para realizar sonhos? ah, ótimo: dinheiro é para tornar a gente feliz, seja como for. Porém, se você tem pena de dar uns tostões a mais para ter aquela peça de roupa ou o acessório que você tanto desejou, com certeza tem alguma coisa errada aí.
Se você, por outro lado, só vive para isso, para supremo mundo da imagem, cuidado: pode estar desviando do que realmente lhe incomoda.
Essas querelas entre aparência e essência são velhas conhecidas, trazidas pela Filosofia de Platão, retomadas por Aristóteles, opondo o peso da essência como Verdade ao status ilusório da aparência e aos simulacros.E que eu, com a licença-loucura a mim conferida e no uso de minhas atribuições, posso dizer que a aparência é importante, sim. E que essência, mais ainda: as que eu mais gosto e uso são Eden, da Cacharel (eau de parfum) e Atractive, da Água de Cheiro, embora para dormir eu use Lavanda Pop de O Boticário em dias mais quentes, Kenzo 5:40 PM in Madagascar.

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