Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Moral das histórias...


Ir contra a corrente, registrar uma opinião fora dos modelos padronizados ou simplesmente discordar das unanimidades suspeitas é sempre se pôr em frente a um pelotão de fuzilamento. Por isso é comum a gente sair pela tangente, a fim de não deixar clara nossa opinião verdadeira e passar por isso mas, ao mesmo tempo, evitando o desconforto da mentira.
Assim agem aqueles que nunca declaram nada, os que não expressam sim ou não diante da arguição ou os que traçam um emaranhado discursivo de modo a que a resposta não expressada passe despercebida.
Já andei por estes caminhos, também. Afinal, quem quer ser odiado?
Mas há coisas que o tempo me fez admitir e me fez lutar para que quem perguntou suporte a resposta que, certamente, será contrária às suas aspirações.
Foi assim que eu assumi a minha vontade de não ser mãe.
Foi assim que eu assumi que sou a favor de todos os direitos da mulher, principalmente os que resvalam na sua decisão e na sua liberdade: sou a favor da legalização do aborto, que para mim é questão de saúde pública antes de ser questão moral e, claro, existe, é praticado e todos sabem que sim e nem mesmo as estatísticas conseguem camuflar uma realidade que dizima a saúde e a vida dessas mesmas mulheres.
Isso ainda não é o pior: eu compreendo a mente dos suicidas.
Toco em assuntos que nenhuma religião admite: aborto e suicídio.
Não quero que ninguém morra nem tenho poderes para induzir ou para evitar nada. Reservo-me o direito de ter opinião. Cada um que fique com a sua!
Acredito que a vida exige muito e que muitas são as pessoas que acham que ela não vale a pena.
Tem uns idiotas que dizem que o suicida não ama nem a si mesmo, quanto mais aos outros...mas é o contrário: um suicida se ama tanto que prefere morrer a ter uma vida que não lhe traga satisfação.
Se isso não for pior, talvez se eu disser que julgo que quem rouba para poder comer não merece punição, uma vez que a vida está acima da lei (vide os códigos penais que versam sobre legítima defesa e temas afins)esse caldo engrosse mais. Neste caso, Lei é um negócio tão difícil que não passa à margem da cultura. É por isso que há coisas que são passíveis de punição num país e em outros não.
Tem gente de coração muito bom e humano que é contra a legalização do aborto, mas a favor da pena de morte. Olha, tem gente de todo tipo, né, gente?
Falei dessas coisas porque ainda vejo uma imensa reprodução de valores conservadores, pratriarcais, atuando na vida da gente.
As mães ainda dão uma educação diferente para o filho, libertária;para as meninas, a vigilância sexual e o recato.
Os pais ainda têm muitas amantes e recomendam: "Ter respeito é trair direito"!
Os filhos têm vida dupla, pondo um pé na moral e outro no exercício dos seus verdadeiros desejos, alimentando a hipocrisia social...e assim seguimos.
Eu também sou hipócrita, especialmente com a minha família, mas é por cansaço: é um desgaste arrolar argumentos para expressar uma opinião. Prefiro fingir, aplico a teoria da lagartixa e balanço a cabeça para tudo, aquiescente.
Faço isso com os meus alunos, também , mas não é por mal: levaria uma vida explicar a minha opinião geral ou a minha opinião poderia sugerir uma discordância inconciliável com um colega de trabalho. Faço silêncio.
Aprendi com alguns professores meus que há momentos em que não vale a pena explicar nada: se o cara está achando uma determinada coisa e você já verificou o grau de ignorância da pessoa, deixe para lá.
Se esta pessoa não altera em nada a sua vida e você não depende dela nem da opinião, dela, caia fora, não responda, não explique. A fibra na defesa de um argumento só deve ser mantida se de fato a questão for importante demais para você e a outra parte também for importante.
Aprende-se muito com os populistas. E não há populista que não seja carismático. Mesmo que tenha cara de poucos amigos, todo populista é sensível aos problemas gerais, morde e assopra, administra sua imagem e mesmo sendo um ditador, "sai da vida para entrar na História" como se fosse o Pai dos Pobres, como se representasse Ação, Competência, Moralidade. É a vida! Não suportamos muitas opiniões realistas, nem gente que gosta das coisas às claras: isso faz parte do convívio coletivo.
Patriotismos piratas, amores clandestinos, contrabandos de afetos, opiniões falsificadas, religiosidades artificiais, moralidades questionáveis...ah, vocês sabem que existe.
Quem pode,pode. Quem não pode, relativiza!

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