Louquética

Incontinência verbal

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Rio sem margens


Pois é, fiquei um pouco em silêncio porque aconteceram coisas que vão para o baú dos segredos. Eu gostaria muito de contar, mas não seria conveniente - é o lado de A da vida real e o processo de edição que a gente faz para sobreviver.
Instaurei um pouco de censura porque acho que a celebridade realmente leu alguma coisa por aqui. Se não leu, está muito próximo disso: estou perdida!
Esse negócio de segredo é uma faca de dois gumes: às vezes a gente pensa que está escondendo tudo de todo mundo, mas fica deixando pistas que os mais sagazes juntam e formam o quebra-cabeças.
Conforme eu já falei, já peguei os segredos dos outros por meros acasos:abrir a porta bem na hora do beijo; estar próxima sempre que o telefonema secreto acontecia; pegar fragmentos de discursos e atitudes repetidamente suspeitas, esse tipo de coisa.
Ando com o coração meio em suspense: acho que nem tem como esconder certas coisas. Ter, tem, mas quando a gente está envolvido com outra pessoa, dá cada escorrego, essa coisa de estar embevecido, enebriado ou simplesmente besta é a maior bandeira do mundo.
No tempo em que eu namorava o Grande Amor da Minha Vida, ele cometia uns lapsos terríveis porque estava claro que ele queria ser descoberto - a gente começou o namoro quando eu estava indo embora do nosso ambiente comum de trabalho, mas eu não queria que ninguém pensasse que era caso velho, que ele me beneficiava, essas coisas.
Poxa, como eu fui cuidadosa!
Cuidadosa como a mais ardilosa vilã de filme norte-americano: comedida, calculista, observadora, dissimulada, cheia de "senhor" para lá e para cá, num respeito que já é comum com aqueles por quem não nutro o mínimo interesse e que, por isso mesmo, foi muito convincente.
Lá na outra Casa, a mesma coisa: eu nunca estava no mesmo ambiente que ele, nada de aproximações e intimidades. Nunca eu ficaria com ele por ali - menos por falta de desejo do que por excesso de precaução. Se é para esconder, que seja bem escondido.
Acontece que agora parece que está estampado em nossas caras o nosso envolvimento.
Eu não achava que ele quisesse nada comigo - era para mim um flerte imaginário e tolo, coisa para passar o tempo e ter assunto com as amigas. Acho que a recíproca era verdadeira também.
Mas nosso cuidado recíproco, uma saudade disfarsada e incontida que o diálogo revelava, o fato de estarmos juntos, sentando juntos, lendo juntos, discutindo juntos, devaneando juntos, um respondendo pelo outro,trocando atos de carinho e de cuidado, uma série de correspondências, enfim, não passou despercebido pelos olhos atentos do sósia de Otto, nem pelos demais, que certamente viam o estado de tensão da gente, quase a ignorar tudo ao nosso redor.
E que esforço para prestar atenção a alguma coisa e dizer algo que provasse aos demais que, ao contrário do que parece, nós estamos ali, nós estamos atentos... mas eu, Capitu,consegui fazer isso melhor do que ele. Ora, bem melhor.
Juro que eu estava falando sobre Literatura, mas ele viajou no meu comentário, juntou a descrição que eu fazia da personagem à minha própria pessoa e cometeu um ato falho de esbagaçar qualquer dúvida. Ai, caramba!
Eu, Capitu, novamente fiz minha cara de paisagem - e diga-se de passagem: eu sou mesmo desligada de muitas coisas, eu não entendo mesmo, eu não pego, eu não capto no ar certas coisas, mas se é para fazer cara de paisagem, tive Thales como mestre e orientador.
Depois eu lá, com cara falsamente perplexa e ele se desmachando em desculpas, em nossos cochichos e cumplicidades.
O que me tirou o sono foi pensar o que foi que eu vi nele e quando tudo isso começou, sem que eu percebesse que estava dando atenção demais - e agora tenho que ter cuidado para escrever...agora,se ele ler, vai saber que eu estava sustentando flertes paralelos, que descartei um, aquele que eu sepultei ( e nisso sou radical: deleto número de telefone, corto todos os contatos.).
Tem gente que não entende isso: sou uma mulher sozinha.
Se há uma possibilidade de relacionamento, se alguém aparece, se alguém me assedia, se alguém me interessa, levo em consideração e passo a estudar a conveniência e os desdobramentos do contato.
Isso significa um bom tempo de flerte,conversas infinitas, beijos ou amassinhos sem maiores consequências, levantamentos e escrutínios sobre o rapaz em questão. Menos por moralismo do que por precaução, nada disso envolve sexo - esta é uma outra etapa, porque não me sinto bem largando o meu corpo nas mãos de quem eu não tenho intimidade, nem segurança.
A tensão erótica, aliás, é preferível para mim: gosto da neurose da espera e gosto de imaginar...se o passo entre a imaginaçao e a concretização não for satisfatório, não sou mentirosa: tchau! sem sexo bom não há relacionamento bom - salvo, é claro, se o cara trouxer um amigo ou parente que possa compensar esta falta (kkk!!!).
Para não ser dúbia, vou dizer: eu sei o que vi nele, no sentido objetivo: nada de mais. Mas, subjetivamente não sei.
Não sei porque ele.
"Rodei de roda, andei
Dança da moda, eu sei
Cansei de ser sozinha
Verso encantado, usei
Meu namorado é rei***
Nas lendas do caminho
Onde andei.
(***eu sei que vocês vão dizer gay, ao invés de rei, seus pestes! ai, que amigos!)

Mas é assim: vou omitir capítulos lindos e interessantes de um história que me conquistou. Tem que ser assim...ui, que vontade de contar! de contar tudinho! pontos, vírgulas, interrogações...ah, gente, foi tão lindo tudo isso!está sendo lindo!
Se ele ler isso, entro pelo cano, mas lá vai um segredinho revelador: nosso cúmplice foi Zygmunt Bauman, com Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos - meu livro!
Excelente livro, viu, gente? cito apenas o sumário: Apaixonar-se e desapaixonar-se; Dentro e fora da caixa de ferramentas da sociabilidade; Sobre a dificuldade de amar o próximo e Convívio destruído. Estes são os capítulos do livro e eu estou terminando agora o segundo capítulo e sinceramente, tenho tanto a falar sobre tudo isso. Coming soon!
Estou para lá de insegura, confusa e desestabilizada: acho que ele está roubando o meu chão. Como disse meu objeto de dissertação (Iderval Miranda): "paixão: súbito rio sem margens"...ah, se eu não me afogo, me sufoco!

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