Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Vivendo, aprendendo e ensinando a aprender


Andei repassando um e-mail engraçadinho sobre as "fases das professoras", porque gosto mesmo da brincadeira e acho que é professor quem pode.
As agruras da profissão - salários baixos, cargas horárias absurdas, violências físicas e simbólicas por que se passa cotidianamente, diretores que se comportam como se fossem feitores de escravo ou "altas autoridades", horários incongruentes, condições de trabalho precárias, estabelecimentos de ensino que se comportam como empresas, dando sempre razão ao cliente-aluno, independentemente da coerência e da justiça ali arroladas,formulações teóricas distantes da realidade, daquelas que falam da tal realidade do aluno sem levar em conta as partes envolvidas no processo ensino-aprendizagem, feiras de ciência sem Ciências, feiras de cultura sem Cultura e todo um calendário artificioso a cumprir, coação para aprovar quem não tem condições de ser aprovado...enfim, a lista é longa - todo mundo conhece, todo mundo sabe disso, mas se metem nas Licenciaturas.
Não concordo que devido ao fato de cursar uma Licenciatura a pessoa esteja predestinada e obrigada a ser professor.
Nem me venha com esta história de dividir Licenciatura e Bacharelado: este último não é o único voltado para a pesquisa. Todo aluno de licenciatura faz pesquisa sim!mas é preciso ver que muitos não têm vontade de estar em sala-de-aula. E daí? podem ser felizes e úteis em outras funções dentro das disciplinas-alvo de seus cursos.
Não concordo com estágios - e quem diz sou eu, que fui professora de Prática de Ensino de Português I e II na UFS: é um negócio artificial, doloroso, superficial,inconsistente.
Profundo exercício de desgaste porque se "amar se aprende amando", você só sabe o que é dar aula na vida prática real, não num pedacinho de semestre, com um bando de gente te olhando e te avaliando, com um regente e um professor de disciplina no seu pé, com a turma notando aquela presença e adotando outros comportamentos, tudo fingido, porque há visitas na classe.
Como eu sei que os hipócritas também lêem o que eu escrevo, eu já espero a reação: se você reclama de algo, então que apresente uma solução. Adoro os hipócritas: eles conseguem calar as pessoas através desse sofisma, de que não se deve criticar nada a menos que tenhamos solução melhor. Calemo-nos! deixa tudo estar como está.
Mas, todo mundo sabe o que cerca a profissão de professor.
Claro que eu gosto de ser professora, porque eu descobri qual é o meu público, em que grau eu me sinto bem atuando e, enfim, sou feliz na profissão e ser feliz na profissão não quer dizer estar satisfeita com o quadro geral que cerca meu cotidiano profissional.
Digo que duvido da vocação para qualquer profissão e acredito mais na INVOCAÇÃO, ou seja, o sujeito invoca que quer ser professor, médico, advogado... e aí está: uns são aptos para as séries inciais, outros para o Fundamental, outros para o Ensino Superior...e outros invocam que querem ser professor e, de repente, alguém patrocina esse sonho favorecendo o dito cujo. Está feito: um amigo na praça e uma idéia na cabeça e tudo se realiza.
Se alguém ainda tiver dúvida, eu me importo com nota: me importo com a minha nota, quando sou aluna e me importo com a nota que os meus alunos obtém.
Já fiz experimentos perversos: dei uma nota altíssima a uma apresentação bem abaixo da média - isso foi lá na UFS. Juro: ninguém reclamou de ter tirado uma nota acima de seu merecimento.
Recentemente, numa defesa de mestrado, Joaquim calou a minha boca: a candidata ao título de mestre escorregou totalmente nas assertivas.
Como a banca a apertasse, ela jogou sobre o orientador todas as culpas e ainda alegou ter sido assediada por ele, o que desarticulou seu bem-estar familiar e determinou as insuficiências de sua dissertação.
Joaquim então me disse: "Mara, se ela tivesse sido aprovada,reclamaria dos assédios?expunha isso publicamente?"
Que é que eu poderia dizer? eu me calei.
Nunca vi, nesses meus anos de profissão, um só aluno reclamar e fincar pé porque tirou uma nota acima de seu merecimento. A lógica do lucro, hein, gente?
Pelo contrário, tem os que se acham o supra-sumo do saber, aqueles que se julgam perseguidos, aqueles que acham que o professor lhes atribuiu uma nota baixa por mera injustiça.
Estes gênios nunca percebem que os que se tornam queridos e louvados tiram notas altas por seus méritos.
Também tem os esforçados, os atentos e participantes, mas que não decolam na hora de expor idéias de forma escrita. Tem de tudo!
Eu tenho sérias dificuldades em reprovar por faltas.
Para a minha sorte, isso é prescrito nas leis da universidade: na graduação exige-se 75% de frequência às aulas.
Vejam: muitos estão na sala só por isso,para obter presença.
Mas é um tocar infinito de celulares, é o papelzinho correndo na sala, é a formiga no assento, fazendo com que a toda hora saiam, é uma agonia e uma angústia compartilhadas porque eles refletem o quanto não querem estar ali, nós percebemos. Eu interiormente digo: também não quero que você esteja aí. Vá cuidar de sua vida. Vá ser feliz lá fora.
São o cúmulo da falta de educação, em classe, para mim: colocar os pés sobre a cadeira e atender o celular. Mesmo que não atendam, só em tocar o celular já é horrível - putz, aquele é o horário da aula. Restam tantas outras horas do dia para atender o telefone...
Tenho auto-vigilância para não reproduzir as coisas de que fui vítima e as coisas que eu abomino, por isso procuro ser boa aluna e ter educação e respeito pelos meus professores.
Escolhi esta imagem para o post porque os homens são minorias entre os professores - aí entram os fatores relativos às questões de gênero e a clássica condição da professora, especialmente a do Ensino Superior,fadada a sustentar um marido ou um namorado explorador, aquele que nunca tem dinheiro para nada; que confirma a condição de exploração da docente, tão típica, supostamente estereotipada, mas que o exame acurado dos exemplos próximos vão confirmar como verdade - e aí a realidade da vida no magistério também varia conforme o gênero.
Sendo homem, e ainda por cima, heterossexual, no ramo do Ensino (ah, não sejam hipócritas: as disciplinas da área de Exatas são todas dominadas pelos homens!), o sujeito está feito: é assédio de colega, de alunas; é carinha sorridente para lá e para cá, é disputa por ele o tempo inteiro...eu, se tivesse um coleguinha como este aí do post iria trabalhar bem mais feliz! eis um bom incentivo profissional. E para terminar, lembremos Gal Costa: "Quanto mais a gente ensina, mais aprende o que ensinou."

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