Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Pelo amor de Deus!


Você não precisa ser mulher para defender uma mulher oprimida, carente, ou que sofre violência;
Você não precisa ser negro para protestar contra o racismo;
Você não precisa ser gay para lutar contra a discriminação, para combater a homofobia, para protestar frente à violência contra eles.
Você não precisar ser do candomblé para defender o livre culto e as manifestações religiosas.
Eu não luto as guerras que não são minhas, isso no plano pessoal. E também não obrigo meus amigos a se tornarem inimigos de meus inimigos- cada um com suas experiências.
Sócio-politicamente, é bem diferente.
Das brasas que puxo para as minhas sardinhas, no plano político, claro que estão as questões de gêneros (porque sou mulher, mas ainda que eu não fosse, não poderia ignorar as desigualdades entre os gêneros, a violência contra as mulher, as discriminações sociais, as recriminações morais)e as questões que concernem aos negros e índios (claro, sou afro-indígena que, na maior parte do tempo, lembra mais do afro e se diz afro-brasileira).
Mas, fico pasma pelo pensamento cristalizado e obtuso de um certo amigo meu - não, não adiantam títulos: preconceito se relaciona com ignorâncias maiores que aquelas que cercam a escolaridade.
Ah, eu defendo os ateus, também: não acreditar num Deus centralizado ou ver os delírios coletivos que medeiam todas as crenças, não faz de um ateu um ser humano menor. Os que eu conheço, ao contrário, são mais que humanos, porque fazem o bem sem negociar com Deus as recompensas post-mortem, posteriores. São generosos porque querem e acham certo, sem temer castigos divinos e por aí vai.
A gente nunca se lembra que Hitler era crente em Deus, mas Charles Chapplin, não.
E o Deus do meu amigo é o deus hegemônico, é ortodoxo, é fundamentalista - e contra os fundamentos, não há argumentos.
Para o meu amigo, o Deus dele, implacável, é o Deus. O Deus preconizado em outras religiões, é assim, um deus, escrito em minúsculas.
Este Deus não une, tem escolhidos, tem preferências e discrimina muito. Por isso, ele, meu amigo, aprendeu a discriminar os outros.
Para ele, quem é do candomblé, é do demônio, faz macumba, bate o tambor, faz despacho, amarra o nome dos outros na boca do sapo, só faz o mal e está ao lado do mal.
Pior não é pensar isso, pois o pensamento corrente é mais ou menos esse: é não querer saber, não querer conhecer a fundo aquilo que ele critica e, ao contrário, aceitar um ponto de vista trazido pelo europeu, um fundamento colonialista e exploratório, sempre a serviço de ganhos políticos, financeiros, geográficos; sempre para legitimar o mal praticado contra os diferentes.
Sob o pretexto da diferença tivemos a Inquisição, a escravidão,o apartheid, o holocausto e vários atos monstruosos, porque a diferença é tomada como sinônimo de inferioridade.
Ele se acha um filho de Deus e odeia aos que ele julga órfãos!

Se o rei zulu já não pode andar nu
Salve a batina do bispo tutu
Ó deus do céu da áfrica do sul
Do céu azul da áfrica do sul
Tornai vermelho todo sangue azul
Tornai vermelho todo sangue azul
Já que vermelho tem sido
Todo sangue derramado
Todo corpo
Todo irmão, chicoteado,
Senhor da selva africana
Irmã da selva americana
Nossa selva brasileira, de tupã
Senhor irmão do tupi fazei
Com que o chicote seja por fim
Pendurado
Revogai da intolerância a lei
Devolvei do chão a quem do chão
Foi criado
Ô cristo rei
Branco de oxalufã
Cristo rei
Branco de oxalufã
Zelai por nossa
Negra flor pagã
Zelai por nossa
Negra flor pagã
Sabei que o papa
Já pediu perdão
Sabei que o papa
Já pediu perdão
Varrei do mapa toda escravidão!

(Gilberto Gil - Oração pela libertação da Africa do Sul)

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