Louquética

Incontinência verbal

domingo, 21 de agosto de 2011

Um dia de sol


Graças a Deus fez sol aqui, hoje.
Nenhum sol digno de piscina ou de praia, mas o suficiente para alegrar a manhã deste domingo.
Acho que ninguém cuida da minha casa como eu cuido; acho que ninguém cuida do que é meu como eu cuido e por isso aproveitei o sol para lavar roupas e para dar banho no meu cachorro - tarefas nem um pouco enfadonhas para mim. Considero uma higiene mental fazer essas coisas e só mando lavar fora umas roupas da casa, como roupões, cortinas, lençóis e toalhas, quando o tempo realmente requer isso. Gosto dessa banalidade. Sendo louca, gosto de parecer normal à medida que executo coisas normais, sem a menor excepcionalidade - aliás, é excepcional frente a outros domingos em que de manhã ou estou indo à praia, ou voltando de alguma festa, ou, nos maus tempos, estaria dormindo domingo de manhã após oito horas de viagem de volta do trabalho.
Coloquei as luvas e dei banho no meu cachorro, um bruta cachorrão, nos seus onze anos de idade. E pensar na idade de Bruno, o meu cachorro, me deixa toda melindrosa, porque amo o meu cachorro e tenho medo que ele morra.
Por qualquer coisa eu temo que ele morra, apesar do aspecto jovial - recentemente é que me pareceu meio surdo, mas quando meu pai aparece no portão, Bruno sai de sua casa, reconhecendo a voz, todo feliz. Ele adora a minha família, se dá bem com todo mundo - onde será que ele aprendeu isso? - mesmo os parentes que levam anos a vir aqui.
Eu fiquei pensando, de novo, na ação do tempo: O tempo passa para o meu cachorro. O tempo passa para mim. Não brigo com isso, mas não sei viver sem meu cachorro.
Poxa, se o Tempo não trouxesse rugas e levasse os cabelos,a vitalidade, a saúde dos seres humanos em geral, seria tudo mais tranquilo. Morrer em paz.
Meu médico já me dizia há uma década: não quer envelhecer? então morra jovem. Ele sabia que eu não tenho a menor pretensão à longevidade, não quero uma vida longa. Para quê? para olhar do alto da minha caduquice os tostões economizados? para subir em minhas posses e em meus títulos e mirar, lá de cima, os lindos homens que não me desejam? ou para investir tudo em remédios, tratamentos e fisioterapias, de um corpo que, com o tempo, não reconhecerei como meu?
Ainda acho que o melhor da vida é a finitude.
Nao falo com o amargor dos inconformados, nem com ironia alguma: é assim que tem que ser. Eu não suportaria uma vida que nunca acabasse.
Olhando o tempo, enquanto eu dava banho em Bruno, lembrei do meu e-mail e das pastas criadas apenas para guardar as coisas relativas aos amores já passados. Tenho lá uma pasta que se chama: "Como eu fui idiota!" e outra, que se chama "Paixão, súbito rio sem margens", cujo título é paráfrase de um poema de Iderval Miranda. As duas pastas são para a mesma pessoa. O tempo transformou o sentimento e transformou minha percepção sobre o que houve.
Não joguei fora: não merecia a lixeira.
Por mais que haja esse tom derrisório e ao mesmo tempo depreciativo, não subestimo o que eu senti, o que eu vivi. Ora, eu vivi. Meu passado me constitui e, além disso, foi tão bonito tudo o que vivi. Doloroso e bonito - e, poxa, eu escrevia coisas tão bonitas, tolas e bonitas, sinceras, viscerais, reais, intensas...não vou jogar fora tudo isso.
Também olhei outras decisões, por causa das pressões recentes e do meu medo de ter escolhido errado: ah, as coisas da profissão! que negócios difíceis. Já tomei decisões muito mais radicais,do tipo: pedir exoneração e ficar sem emprego, vivendo uma vida de estudante; já pedi demissão por ter entendido que o trabalho me consumia, mas agora, que as coisas são mais simples, é tudo tão difícil. E o preço é tão alto.
Olhei as outras decisões, as da vida pessoal - incluindo os amores traficados, as amizades falsificadas e umas relações com conteúdo adulterado...renovei meus votos: é preciso dizer não, mas a pirataria amorosa, esse amores feitos em fábricas clandestinas...melhor nem comentar.
E o resto é a vida - porque não há fármacos que resolvam problemas da vida real, não é? então o remédio é viver, é assumir a vida e o preço correspondente - a vida não entra em promoção, tudo é sempre muito caro, sem descontos, sem barganhas...mas ela vale,eu acho.
Vou torcer por um novo dia de sol amanhã!

Nenhum comentário:

Postar um comentário