Louquética

Incontinência verbal

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Coisas públicas nas (coisas) privadas



Ontem, enquanto eu falava sobre o fato de ter encontrado uma excelente funcionária pública e que ela havia, realmente, contribuído para solucionar minhas questões, lembrei que voltei da UFBA conversando sobre coisas correlatas com Manoela.
A gente estava discutindo a respeito das pessoas que adoram complicações e burocracias, apenas para emperrar a vida dos outros.
Pensei, de imediato, nos cartórios: embaixadas do inferno em que a gente paga para sofrer em troca de assinaturas que legitimem a honestidade e idoneidade que é nossa ou pelo reconhecimento da legitimidade e idoneidade de nossa própria assinatura.
Lembrei, depois das diretoras de escolas e dos diretores de departamentos de universidade, dos coordenadores de curso, todos da esfera pública, que tendem a encarnar as atitudes senhoriais, travestidos de feitores de escravos. Daí, percebi que no Brasil a coisa pública acabou. Não existe serviço público, República, nada que remeta ao público como pertença coletiva dos brasileiros.
Não, não há corrupção também: há o uso individual e particular do dinheiro público. Aliás, do dinheiro que era público. Uma vez desviado, torna-se particular.
E os que criticam os corruptos, usam o aparelho público para beneficiar seus amigos, seus parentes, seus bolsistas de graduação, seus orientandos, seus chegados, seus coligados, seus interesses individuais.
Se algo é público, ele é uma pertença coletiva: é de todos em geral sem ser de ninguém em particular. Constato que isso não existe por aqui: se você passar num concurso público, conforme sejam a expectativa e o veredicto de quem dirige ou coordena o lugar, o direito público desce pelo ralo. Se insistir no direito público, serão criados mil subterfúgios para que a pessoa desista voluntariamente forçada a isso – ah, entenda aí a contradição do termo.
A repartição, a escola, o curso e a universidade, dentre outros tantos lugares em que caiba alguém a mandar na coisa pública (quando caberia administrar e não mandar) passa a pertencer à esfera do particular e a coisa pública se torna uma posse. Não fosse assim as pessoas não digladiariam entre si para estarem em postos de comando. Ser diretor, coordenador, assessor e etc. é tão ruim que as disputas são acirradas...
E todos sempre saem – quando não conseguem se perpetuar por lá – bem mais ricos do que entraram, bem melhores do que antes, surpreendentemente. Não é incrível?
De uma hora para a outra a casa já não é a mesma, nem a conta bancária, nem os privilégios... Milagrosamente, devido aos esforços do trabalho de mandar em tudo.
Não deixa de ser exceção as pessoas que, no emprego público, na repartição pública e no órgão público, tratam às outras pessoas como pessoas e vejam o ser humano como ser humano. Ainda estou feliz por ter encontrado uma exceção: fico agradecendo a Deus, porque é um milagre escapar à lógica geral. Coincidiu, claro, de sexta-feira, dia 28, ser o dia do funcionário público e, sim, parabéns a estes que suponho representar 03 a 05% do geral dos funcionários públicos e que são honestos, prestativos, idôneos e solícitos, como deveria ser a maioria.

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