Louquética

Incontinência verbal

domingo, 10 de julho de 2011

Assim falou Belchior


Eu sei que dizer isso é ir contra a corrente das opiniões convenientes em sentido político, mas não é qualquer Zé Mané que é cantor, não, gente boa! e aí, para quem quer promover a inclusão, favor não me incluir entre os chamados ecléticos - a orgia brega musical supostamente em favor dos menos favorecidos pela escolaridade e pelos ganhos materiais.
Eu não espero que um Belchior vá ter o mesmo espaço na mídia que têm os grandes nomes da música atual, como Restart, Fiuk, Calcinha Preta. Nem se compara!
Mas, pensando em quanto eu gosto do Belchior, faz muito tempo que eu fico tomando de empréstimo as palavras dele, porque "Eu não estou interessada em nenhuma teoria, em nenhuma fantasia, nem em romances astrais"...não sou da auto-ajuda, não sou esotérica e não acredito em cartomantes: tenho a mais honesta orfandade espiritual que alguém pode ter.
E de mim, também: "longe o profeta do terror", porque eu não estou nem aí para o fim do mundo. O fim está próximo? pois, que seja próspero!
E assim como Belchior, "Meu delírio é a experiência com coisas reais": tem alucinógeno pior do que a realidade? tem horas em que a gente vê cada coisa que chega a questionar se vê mesmo aquilo ali ou se está delirando.
E das imagens da vida urbana, olhe que o cara, o Belchior, já se espantava com o Rio e com São Paulo na década de 70. Que diríamos de hoje? "Um preto pobre,um estudante, uma mulher sozinha,Blue jeans e motocicletas, Pessoas cinzas normais, /Garotas dentro da noite,
Revólver: cheira cachorro! /Os humilhados do parque /Com os seus jornais..."
Será que assim como falou um certo humorista há uns anos, "Ainda somos os mesmos e vivemos/como Belchior?".
O que é mesmo estarrecedor são essas "pessoas cinzas normais": as pestes das pessoas normais são cinzentas como o cimento, não têm cor, não são nada, se confundem com a paisagem arquitetônica da cidade. Eu é que não quero ser cinza, não quero ser normal. E não quero ser cinza porque não quero ser cremada: deixe que os vermes se alimentem, me deixem barro, me deixem voltar à terra - eis quem vai me comer, porque por enquanto quem anda me comendo, quem anda me dando uns pegas é o tempo. E eu já disse antes: como sou heterossexual, deixem o chão me comer, porque ele é substantivo masculino. E heterossexual que se preza gosta do sexo oposto até debaixo d'água...ou melhor, da terra!
E a solidão das pessoas nessas capitais é mais que óbvia - e já não falo disso porque passei meu mestrado escrevendo sobre. Basta!

Belchior - Alucinação

Mas, eu não estou interessado
Em nenhuma teoria,
Em nenhuma fantasia,
Nem no algo mais.
Nem em tinta pro meu rosto,
Ou oba oba, ou melodia,
Para acompanhar bocejos,
Sonhos matinais...
Eu não estou interessado
Em nenhuma teoria,
Nem nessas coisas do Oriente,
Romances astrais.
A minha alucinação
É suportar o dia-a-dia
E meu delírio
É a experiência
Com coisas reais...
Um preto, um pobre,
Um estudante,
Uma mulher sozinha;
Blue jeans e motocicletas,
Pessoas cinzas normais,
Garotas dentro da noite,
Revólver: cheira cachorro!
Os humilhados do parque
Com os seus jornais...
Carneiros, mesa, trabalho
Meu corpo que cai
Do oitavo andar
E a solidão das pessoas
Nssas capitais.
A violência da noite,
O movimento do tráfego,
Um rapaz delicado e alegre
Que canta e requebra
É demais!
Cravos, espinhas no rosto,baby
Rock, Hot Dog
"Play it cool, Baby"
Doces jovens coloridos,
Dois Policiais
Cumprindo o seu duro dever
E defendendo o seu amor
E nossas vidas;
Cumprindo o seu duro dever
E defendendo o seu amor
E nossa vida...
Mas eu não estou interessado
Em nenhuma teoria,
Em nenhuma fantasia,
Nem no algo mais.
Longe o profeta do terror
Que a laranja mecânica anuncia.
Amar e mudar as coisas
Me interessa mais
Amar e mudar as coisas
Amar e mudar as coisas
Me interessa mais...

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