Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Em primeiro lugar...


Nunca deveríamos perder a nossa capacidade de aprender.
Pode ser que do ensinamento mais vago, das proposições mais irrelevantes e até das coisas sem sentido aparente possamos subtrair alguma mensagem válida e conferir outros sentido ou ampliar sentidos mesmo quando eles não estão ali.
Quando escrevo gosto de embolar as coisas. Isso às vezes é para confundir, outras vezes é para ocultar e às vezes é para cansar quem lê, porque não estamos em outro tempo senão o tempo da rapidez - e da fugacidade, claro.
Então ouvi de meu amigo uma daquelas verdades enlatadas, nas quais não costumamos prestar atenção: ele estava me dizendo deste momento, "da sorte de um amor tranquilo", que enfim, chegou.
Ele afirmou que agora tudo mudou porque ele passou a "tratar como opção a quem antes ele tinha por prioridade", explicando que no jogo sujo das relação informais, o cara o tratava como opção e era ele quem o tratava por prioridade.
É difícil conciliar essas tensões, porque a gente acaba sobrevivendo de migalhas, com medo de morrer de fome.
De vez em quando a gente olha a repetição das atitudes dos amigos que parecem não mudar nunca e eternamente narrar os mesmos problemas. Entretanto, quantas vezes adiamos uma decisão, à espera de que alguém decida por nós e nos livre do ônus da responsabilidade e do risco posterior? e o jogo da eterna espera, apostando que alguém vai mudar, que tudo vai mudar e melhorar? e aquele olhar rotacional para o passado, como se o passado nunca passasse, como se as dívidas de mágoas nunca fossem pagas, como se o devir nunca viesse e como se fossemos os mesmos que fomos há tantos anos atrás?
Parece pouco e banal colocar a prioridade como opção, mas não é bem assim: é uma troca valorativa.
Se alguém é, para nós, prioridade, mostra seu lugar na ordem de importância. Isso quer dizer estar em primeiro lugar, ter um valor incomensurável que o coloca acima das coisas mais imediatas e das mais urgentes. Uma vez que deixamos para segundo plano, tratamos a referida pessoa como uma opção, como uma alternativa, estamos não apenas trocando as coisas de lugar, mas trocando de posição - e é a nossa posição em relação àquela pessoa que muda também, porque depois de um tempo as coisas viram submissão.
"O quereres e o estares sempre a fim", conforme cantou Caetano Veloso em O quereres, parece convencer o outro de uma permanência das condições, dos sentimentos, da situação... mas, cá entre nós, eu acho que as coisas mudam não somente porque somos nós a relutar contra o papel secundário de ser "opção", mas porque passamos observar quais são as nossas reais opções - daí optamos, temos escolhas, escolhemos diferente, mudamos.
Devo dizer que foi uma grande lição ouvir isso dele, do meu amigo.
Temos uma certa hipnose em relação ao que desejamos e, talvez por isso, obedecemos ao que nos é solicitado - e eu bem sei o que é a lista de espera e que o humorista está certo ao dizer que "Quem espera sempre CANSA".
Houve um dia em que C. me perguntou sobre os meus desejos. Nesse tempo nós não tínhamos nenhum rolo, mas sabíamos exatamente da tensão do flerte recíproco.
Ele me perguntou tão freudianamente sobre o objeto dos meus desejos e seus entornos e então foi procurar a objetividade sobre sobre o que queria saber. Esta foi uma das nossas melhores conversas, senão a melhor.
Engasguei, gaguejei, fiquei vermelha, rebati argumentos, mas não fugi pela tangente. Porém, ao lhe pedir objetivamente uma resposta, ele se furtou à clareza e à objetividade de que eu também precisava.
Lembrei, todavia, que minha analista me advertia sobre "fazer aquilo que não se deve fazer a um homem", e me resignei, pensando que no meu namoro anterior eu chutei o pau da barraca e fui extremamente castradora com Bruno, em situação análoga.
Eu sempre odiei a lista de espera. Odeio ainda mais porque sou impaciente.
Odeio ser dependente de qualquer coisa - conserto tudo em minha casa, me viro sozinha nas minhas dificuldades, não colocaria a minha vida sob responsabilidade de terceiros, não tenho propensão alguma a vícios de qualquer espécie - e por isso mesmo, qualquer sensação de que dependo do outro para estar bem me faz correr a léguas de distância do que me inclina à dependência.
O problema, que talvez seja a solução, é que a distância começa a se erguer como distância emocional - e esta é invencível. Nossa marca de segurança, a base de contenção e de autopreservação ficam visíveis quando acionamos quando a distância emocional.
Ser a prioridade ou ser " a terceira pessoa depois de ninguém", conforme falava uma ex-colega de trabalho não é disputar o ranking das atenções: é muito além disso - e olha que eu estou só aprendendo.

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