Louquética

Incontinência verbal

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Beba do momento (a todos os bêbados do momento)


Como de vez em quando acontece, embora eu não vá atrás de festas, as festas vão atrás de mim. E, apesar de minha rinite e de todos os outros fatores que me distanciam de festas juninas – não tomo licor, não gosto de bombas e não sei dançar forró nem qualquer outro ritmo que exija ser dançado a dois – a festa começou a me chamar antes mesmo das 19 horas.
Desde que na minha rua se instalou uma escola de samba e que pelo menos vinte e cinco por cento da agremiação resolveu vir morar aqui, qualquer batizado de boneca é motivo de festa. E fecham a garagem de minha casa, porque têm que interditar a rua, e enfeitam tudo, de cima a baixo, de modo que começo a questionar a masculinidade do meu cachorro mais novo, que fugiu e voltou cheio de colares ou eram coleiras feitas de material de frescura, uma verdadeira alegoria de plumas, lantejoulas, frufrus e purpurinas.
Mas o som estava bom, a dupla que cantava era boa e apesar de eu falar tantas coisas, gosto de qualquer expressão de alegria desde que não descambe para a baixaria. Então, a festa foi na minha rua e eu não precisei sair de casa, senão ficar ali mesmo na frente, dando risada dos bêbados, porque eu os acho muito engraçados. Bêbado, quando não e violento, é muito engraçado.
E tem bêbado de todo tipo: bêbado generoso, que quer pagar a cachaça para todo mundo; Bêbado megalomaníaco, que se diz dono de tudo que há no mundo; Bêbado amnésia, que não sabe quem ele é, nem aonde ele vai, nem o que está acontecendo (é daquele tipo que fala assim: “On co to?” e você tem que entender que ele está dizendo “onde que eu estou?”, no vocabulário etílico); bêbado galanteador, que fica de graça e quer pegar a gente de qualquer jeito; bêbado cantor, que vive ensaiando músicas sem o menor sentido; bêbado persistente, que é o tipo mais comum na minha rua, porque a rua que eu moro é tão grande quanto uma avenida. Os dois extremos da rua formam uma ladeira absurda. Convenhamos, bêbado na ladeira é uma aporia: não tem como resolver isso.
Ficam, então, os bêbados querendo seguir em frente. E como seguir em frente, se a gravidade os puxa para baixo, para a descida da ladeira, enquanto o mundo gira na velocidade do álcool?
Sem coordenação motora, tentam também fazer xixi – no poste, no muro de minha casa, onde for – e se conseguem abrir o zíper, não conseguem seguir adiante no processo. E se finalmente conseguem fazer xixi, não conseguem se recompor. E se há alguma verdade no ditado brasileiro que diz que “c* de bêbado não tem dono”, aumenta a vulnerabilidade desses sujeitos à medida em que não conseguem cobrir a citada parte após fazerem xixi.
Minha amiga me acha cruel porque eu rio dos bêbados: a ela tudo isso desperta pena. Sinto muito, mas acho engraçado e não sou de perturbar os bêbados. Observo tudo e não seria capaz de permitir que nenhum deles caísse num buraco ou sofresse acidentes de outra natureza, mas não me furto a dar risada com eles.
Entendo a minha amiga, porque a vivência dela com os bêbados foi outra, de observar violência e valentia de alcoólatras profissionais e não exatamente de Bêbados eventuais. Para ela, eu rio porque ninguém em minha família bebe e por isso eu me julgo imune. Digo-vos, entretanto, que a lógica é bem contrária a esta: o álcool me tirou tudo.
Desde que as pessoas sabem que eu não bebo, ficam cochichando sobre “como é que eu me divirto”; Quando algum rapaz finalmente se aproxima de mim, vem com um copo de cerveja e me oferece. Uma vez que eu declino da cerveja, os homens me julgam esnobe.
Da primeira vez que C. criou coragem e me chamou para sair, ele disse: “Vamos tomar um drink depois da aula?”. Fiquei vermelha, sem saber o que dizer para não afugentar quem eu tanto queria. Não teve jeito, eu disse que não tomava álcool e ele ficou sem graça, achando que aquilo era um “não” para ele, quando o “não” era para a bebida.
Mais recentemente, L. E. (porque minha amiga fica me enchendo o saco sobre o porquê de eu não escrever o nome de Luís Eduardo, já que ela fica traduzindo para os meus amigos chegados quem é quem neste universo de abreviações) me propôs: “Vamos tomar um vinho?”. Eu juro que eu fico muda, eu não sei o que dizer... mas quando eu quebrei o silêncio e lhe disse que não tomava vinho, o mundo caiu.
E coquetel sem álcool e tudo mais que eu bebo serve é de chacota para as minhas amigas que dizem que drinks sem álcool são sucos. Que humilhação!
Se eu tomasse álcool, minha vida seria diferente: eu iria rir mais, seria menos tímida, talvez perdesse o pudor – meu primo me diz que álcool dá problemas nas pernas das mulheres, que abrem com uma facilidade incrível... Porém, por questões congênitas, álcool me dá sono e mal-estar.
Por odiar o sabor do álcool, resolvi desafiar a mim mesma, em algumas vezes. Nada me converteu em usuária, nada agradou meu paladar – acho é terrível aquela porcaria quente atravessando a minha garganta, queimando, amargo, enfim, Deus me livre! – e o que eu senti foi sono, falta de coordenação motora, a sensação de que havia buracos no chão a cada vez que eu pisava e que o mundo girava rápido demais. E isso com uns 20 ml de álcool, porque toda a minha família é assim, acho que a intolerância é mesmo genética – pai, tio, tia, primos e só não posso dizer de irmãos porque não os tenho, mas ninguém mesmo de minha família é chegado na cana, nem socialmente. E por isso o álcool me tirou tudo, porque eu não pego ninguém, já que os homens preferem as que bebem e, além disso, a bebida dá pretextos e álibi para muitas coisas que a gente quer fazer, mas não pode fazer de cara limpa.

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