Louquética

Incontinência verbal

sábado, 4 de junho de 2011

Pegando fogo!


Como todo mundo sabe, já fui militar e fiquei na Corporação por quase sete anos completos.
Sobre detenção eu sei tudo, porque passei minha vida de recruta pegando prisão. Dizem que ainda peguei a fase boa, porque não tinha xadrez, isto é, você fica preso, mas não fica na cela.
Contudo, toda hora você tem que dar sinal de vida, entrar em forma junto com a tropa e agüentar um carcereiro no seu pé que, aliás, está ali porque o sargento ou o oficial de Dia vai tomar satisfações de onde está o preso a cada momento.
Quando eu era recruta ainda inventavam trabalhos e faxinas para os presos, sendo que muitos de nós, veteranos de cárcere, já havíamos decorado o RDPM (Regulamento Policial Militar) todinho. Assim, despejávamos que não poderíamos ser punidos duas vezes pelo mesmo ato – e aí, nada de faxinas!
Não que eu fosse lá inocente, mas minhas detenções eu conquistava porque aprontava palhaçadas com o nome da farda, inventava coisas para perturbar os superiores hierárquicos ou não aceitava tranquilamente qualquer coisa que era determinada. Na verdade, o que seria de mais grave nunca me rendeu prisão, porque também nunca houve provas a respeito. E eu não estou dizendo que fiz nada, tá? Portanto, sei direitinho que cabe ao acusador o ônus da prova. Sem provas, sem punição.
Eu já estava meio intrigada com o fato do povo querer descer o “madeirol” nuns soldados de Porto Alegre que andaram dançando o hino nacional como funk. Poxa, coisa feita escondidinha, no alojamento, num momento de descontração e laser, teoricamente num campo privativo...e aí o povo descobre (ou um engraçadinho põe no You tube) e é um estardalhaço só, com todos gritando que é um desrespeito a um símbolo da nação, um crime previsto na Constituição e blábláblá. Tenha santa paciência! Todo dia os nossos políticos corruptos desrespeitam a nação, assim como os profetas hipócritas desrespeitam os medos e as fraquezas humanas e seriam tantos os desrespeitos reais à nação, que não caberia mais nesta postagem. Entretanto, para estes há a condescendência.
Então, liguei na Globonews, depois do almoço, e já peguei a parte final da entrevista coletiva ao vivo que o Sérgio Cabral estava dando, todo alterado e irado, chamando os bombeiros do Rio de Janeiro de vândalos, desmoralizando o Comandante do CCB do Rio, Pedro Machado, publicamente exonerado do cargo. Esse estardalhaço todo era já o desenrolar dos protestos dos bombeiros militares, que aliás, vem de muitos dias, reivindicando o pacote de sempre que afeta qualquer trabalhador brasileiro: melhorias de salário, de condições de trabalho e equipamentos de trabalho. Entretanto, o senhor Governador, valendo-se de que militar não faz greve, nem faz protesto e, sim, motim, tratou com severidade e estupidez a questão e os homens da Corporação.
O negócio pegou fogo, se me permitem tão batido trocadilho!
Já haviam ocorrido outros movimentos em favor do atendimento às reivindicações da classe, ao longo do mês de maio, sendo a ocupação do Quartel Central o momento extremo – e que gerou todo esse pandemônio que qualquer um pode acompanhar pela televisão.
Quando eu deixei de ser militar o que eu mais comemorei foi a posse de mim mesma. Penso que sensação igual só quem pode experimentar foi algum meu antepassado escravo, ao obter sua Carta de Alforria.
Viver sob disciplina e hierarquia, todo mundo sabe que vive, independentemente de estar num quartel. Porém, esses são traços próprios da vida militar e o militar não pertence a si mesmo: pede permissão ao Comandante para contrair matrimônio; pede Guia de Trânsito, para poder viajar de férias ou simplesmente para se deslocar de estado, por qualquer coisa está preso, detido, em maus lençóis... tem que agüentar escalas e perseguições, enquanto observa os ‘peixes’ serem beneficiados, enfim, o calvário vai longe.
E de vez em quando o meu pai me vem com uma conversa cretina sobre o emprego que eu deixei: ele é desses tipos de pessoas que pensam que ser militar é ser autoridade. E quem disse que eu, algum dia nessa vida, quis ser autoridade? Eu quero é ter autoridade sobre minha própria vida, essa, sim, área de minha jurisdição.
P.S.: A imagem acima eu peguei lá do Kibeloco, porque tem é tempo que eu não pego num kibe, não é, meus amigos maldosos?!

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