Louquética

Incontinência verbal

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Preconceitos ancestrais


Não sei como ele não conseguiu mudar.
Não precisava mudar demais, nem precisa mudar por dentro, mas sempre se espera que as pessoas mudem com o tempo, junto com o tempo que, cultural e coletivamente dita novas regras nos comportamentos.
O caso é que quando a gente fala em preconceito, a genta fala muito abstratamente, como se fala de uma perseguição, um detratar, uma humilhação...e aqui e ali, vai um gesto, uma palavra, uma expressão que atinge as minorias.
O preconceito, contudo, parece não ser percebido na crueldade com que se tratam as pessoas, de modo a desumanizar tais pessoas. Mas eu estou falando é do machismo, que a todo momento é perdoado, relevado, diminuído, porque as pessoas reconhecem que o machismo é constitutivo da nação brasileira: patriarcal na estrutura, patriarcal na religião ocidentalizada e, claro, "o macho, adulto, branco, sempre no comando".
Mas a gente ver o machismo cara a cara - e não pela televisão, e não por ouvir falar dele, e não por saber que ele está em nossa casa, escondidinho nos primos e nas mães - é um espetáculo de horror.
Só sei que o meu amigo correu mundo. Morou dois anos no Rio, três em Miami, um em São Paulo, alguns no interior baiano e muitos em Salvador. E não tem jeito: ele é machista.
Não é machista à toa, desses que dizem frases depreciativas no trânsito ou mandam a gente ir procurar um fogão. Não,esses são só ignorantes: ele é machista na prática, no seu cotidiano,tem ação o seu machismo. Então, ele oprime as mulheres e subestima todas as mulheres moralmente. Uma mulher, na concepção dele, não está apta a falar a verdade, pois mulheres são mentirosas compulsivas.
Mulher não pode ter sexo, não pode ser dona dos seus desejos porque, na concepção dele, só há dois tipos de mulheres: as santas e as putas. Com as primeiras, se casa; com as segundas, sexo e desprezo. Elas são feitas para isso.
O machismo do meu amigo supera qualquer explicação, qualquer definição, desafia a lógica, o bom senso, a sanidade: de fato, ele me fere.
O machismo de meu amigo é caricato: "Homem tem sovaco; axila quem tem é viado"; "Sou o chefe da família"; "Sou o cabeça da relação"; "Mulher minha tem que obedecer".
Ele só tem 36 anos. E já está assim, perdido.
Eu achava que o Brutus de Neanderthal houvesse crescido interiormente, percebido o mundo. Mas, não: e se vai me elogiar, o faz como se eu tivesse testículos e diz algo próximo a "Você deveria ter nascido homem" ou "Você é tão inteligente que nem parece mulher". E como é difícil suportar isso.
Acontece que os amigos ganham os nossos afetos...assim, suportam-se os defeitos.
Vejo com ódio, sempre que ligo a televisão, a propaganda ridícula da Sky, com a Gisele Bundchen esfregando o chão, ou fazendo seja lá o que for, naquela posição submissa, perto de uma televisão, enquanto o ator que interpreta o marido, fica contemplando a televisão e pedindo cerveja...e isso ainda vende, meu Deus! como pode uma propaganda dessa fazer efeito comercial? Só faz porque a sociedade compactua e se identifica.
Por que será que esta minha vontade de partir o maxilar do meu amigo machista em vinte pedacinhos não passa? será que estou meio, sei lá, homem?
Machismo: a gente vê por aí.

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